Olho para trás,
sinto um vazio imenso. Sou o único que
resta de uma amizade entre três amigos, ontem me aposentei, a festa foi
concorrida, embora sentisse já esse vazio, faltavam meus amigos mais íntimos
ali. Olhava pelo vasto salão, cheio a
rebentar, mas não os encontrava, me dei conta que finalmente estou ficando
velho, que olho para trás procurando esses amigos que já não estão.
Foram tantos anos
de amizade, que só de pensar, as lagrimas escorrem pela minha cara, sem
vergonha nenhuma. Neste casarão que
pertenceu a minha família por gerações, que em breve ficará vazio, o deixarei
para uma instituição de caridade, que o venda, faça bom uso dele.
Olho os quadros
de J. Mara pelas paredes, fico pensando, se pudesse levar para o outro lado,
qual levaria, todos tem grande importância na minha vida. Mas acredito que levaria, um que tenho na
minha mesa de cabeceira, que Jiro fez, quando estávamos na escola, é um desenho
a lápis, aonde estamos os três. Ele
dizia que tinha se colocado no retrato, porque sempre seriamos amigos de
alma. Grande verdade.
Nos conhecemos no
primeiro dia de aula, os três descobrimos depois, nascemos com dias de
diferença, mas na mesma semana. Íamos de
mãos dadas com nossas mães, os três diferentes como gotas de água. Jiro
descendente de japonês, Bruno de italianos, eu de irlandeses, nada mais
distantes um do outro. Mas nós olhamos,
vimos que o resto da turma não interessava.
Nos sentamos
todos juntos, um perto do outro, quando a professora disse o nome de cada um, o
guardamos para sempre, no recreio já nos juntamos.
Cada um também
tinha pais com empregos ou trabalho diferentes, meu pai, era advogado, o do
Jiro tinha um restaurante de Sushi, além de dar classe de artes marciais, o do
Bruno era gerente de um restaurante italiano em Little Italy, mas vivíamos
todos no mesmo quarteirão em Staten Island.
Acabou que nossas
mães tão diferentes uma da outra, acabaram amigas, pois todos os dias iam nos
levar, como buscar. Com o tempo, começaram
depois de nos deixar, irem tomar um café, fazer compras juntas, foram amigas
para o resto de suas vidas.
Já nossos pais,
foi mais difícil, meu pai dizia que o pai do Bruno era da Máfia, pois o
restaurante que dirigia pertencia a uma família mafiosa. Descobriria depois que ele odiava esse
trabalho, quanto ao pai do Jiro, não gostava por causa das artes marciais.
Mas sem querer
acabaram amigos.
Sem dúvida
nenhuma devíamos ser uma grande decepção para eles, nenhum dos três, gostava
muito do esporte, mas nos saímos bem nas aulas do pai do Jiro. Acabaram indo nos ver lutar, nisso na verdade
erámos bons, todos chegamos à faixa preta a categoria máxima, creio que foi
isso que no final os uniu. Num dos
campeonatos, defendendo Staten Island, ganhamos os três, fizeram uma
comemoração conjunta, imagine a confusão de comida, churrasco, com sushi e
macarrão, isso virou uma coisa de sempre, pois passamos a comemorar nossos
aniversários juntos.
Depois já
maiores, não necessitávamos que nossas mães nos levassem, os três caminhávamos
para a escola todos os dias, o ponto de partida era a esquina da minha casa,
dali partíamos.
Começamos a
aprender artes marciais, pois, o famoso bullying que se fala hoje em dia, já
existia. Assim nos defendíamos uns aos
outros. O que incomodava os outros, era
que estávamos sempre conversando, fazíamos tudo juntos, um ia ao banheiro, os
outros dois também, se jogávamos bola, ou basquete, na mesma equipe
sempre. Não adiantava o professor tentar
nos separar, nos recusávamos a fazer o que ele dizia.
Em contrapartida,
fomos sempre as notas mais altas da classe, um ensinava ao outro o que não
entendia. Nas provas os professores nos
separavam, pois achavam que copiávamos um do outro, o que não era verdade.
Quando chegou a
idade de descobrir o sexo, o fizemos juntos, nos escondíamos no porão da casa
do Bruno, experimentamos tudo. No fundo
creio que nos amávamos muito, quanto ao amor de um pelo outro, descobri muito
mais tarde que era como um círculo.
Mas sexo,
descobrimos com um vizinho do Bruno.
Esse um dia nos contou que tinha um vizinho, inspetor de polícia, que a
mulher tinha abandonado, vivia ao lado de sua casa, de sua janela dava para ver
o quarto do homem. Ele chegava em casa,
ficava de cuecas nada mais que isso.
Tinha um corpo
fantástico. Descobriu um dia que Bruno o
olhava, mas nunca fechou cortina, nada disso.
Um dia nos pegou
os três olhando através da cortina, mas sabia, que estávamos os três nos
masturbando por causa disso.
Nessa época,
nossas mães, voltaram a trabalhar, minha mãe era secretária em um escritório de
advogados, a mãe do Bruno, era caixa no restaurante que trabalhava seu pai, a
do Jiro, ajudava o marido no restaurante.
Então estávamos depois da escola os três juntos.
Teve um ano que
pedimos o mesmo de presente de aniversário, um Walk Talkie, nunca deixávamos de
nos falar o tempo todo.
Dias depois,
estávamos indo para a casa do Bruno, quando vimos fumaça saindo por baixo da
porta da garagem do homem, tentamos levantar a porta da mesma, era impossível,
Bruno sabia que ele nunca fechava a porta da cozinha, entramos por ela. Ele estava na garagem, com o motor ligado, já
estava desmaiado, Bruno abriu a porta do carro, desligou o motor, entre os três
o arrastamos para a cozinha.
Semanas antes
aprendemos numa das aulas, os primeiros socorros. Começamos a nos revezar a fazer respiração
assistida. Gostei de colocar meus lábios
em cima do seu.
Quando ele voltou
a si, ficou olhando para nós, dava pena.
Estava
completamente nu. Jiro lhe trouxe água, ele só perguntou por que o salvamos,
ele não queria viver, se sentia sozinho.
Se tornou a
partir desse dia nosso mentor. Uma coisa
nos ligava, os três amávamos os livros, ele também, por toda a casa, estava
cheia de livros.
Ele se levantou,
colocou um shorts, nos contou tudo. Sua
mulher o tinha abandonado, porque descobriu que ele era gay. Se divorciaram, em seguida ela tinha se
casado com outro.
Meu amante também
me deixou, pois queria aventuras, minha vida perdeu sentido. Viu que Jiro tinha um livro nas mãos que tinha
encontrado no chão. Sem querer começamos
a comentar o mesmo, os três já conhecíamos a história. Foi algo sensacional, cada um tinha um ponto
de vista diferente, quando vimos estávamos sentados na cozinha, comendo uma
pizza, falando de livros.
Por aonde se
andava na casa, tinha livros. Ele disse
que era sua paixão desde criança.
Quando falamos em
sexo, ele nos olhou, perguntando se fazíamos sexo entre os três.
Rimos muito, lhe
dissemos que a muito tempo, era esse nosso grande segredo.
Quando vimos
estávamos na cama com ele, seu corpo era alucinante. Fomos amantes dele, mais
de 5 anos. Nos seus dias livres nos
avisava, nos levava a praia, muitos pensávamos que éramos seus filhos adotivos,
nunca desmentimos.
Chegou um momento
que começou a frequentar o lugar que aprendíamos artes marciais, um dia se
apaixonou por um japonês, passaram a viver juntos, através do pai do Jiro, se
tornou amigo dos nossos pais. Descobríamos
anos mais tarde, que seguia fazendo sexo com Bruno.
Chegou a época de
ir à universidade, discutimos muito com nossos pais, bem como entre nós, com
ele, Bernal tinha uma cabeça para entendermos perfeita, não colocava as dúvidas
que nos colocavam nossos pais. Não
argumentava, mas sim nos fazia pensar.
Eu queria fazer
direito, bem como o Bruno, já Jiro queria fazer Belas Artes, ele era o mais
decidido, já Bruno queria fazer direito, para me acompanhar.
Fomos juntos a
universidade, Bernal nos ensinou a conduzir, nos deu de presente o carro que
tinha sido de sua mulher, estava a tanto tempo abandonado na garagem, mandou
arrumar o motor, nos deu de presente no Natal.
Creio mesmo que
as três famílias se juntaram por uma coisa, meus pais, tinham imaginado ter
muitos filhos, principalmente por causa da casa imensa que ele tinha herdado,
mas minha mãe quase morreu no meu parto, ficou incapacitada para ter mais
filhos. A mãe do Bruno foi a mesma
coisa. Já os pais do Jiro, porque
queriam ter um filho só, mas que pudesse ter futuro, que eles não tinham tido.
Bruno também era
o primeiro da sua família a ir à universidade, o sonho de sua mãe. Mas ao contrário dos nossos companheiros, não
saímos de casa. Íamos de manhã os três
juntos, voltávamos de tarde, ainda usávamos o Walk Talkie para nos comunicar,
até surgir o celular.
Fizemos outros
conhecidos, mas amigos nem pensar.
Eu estava
entusiasmado com a universidade, já o Bruno não. Um dia tivemos uma conversa séria com o
Bernal. Ele tinha escutado seus pais,
falando com um parente, que era mafioso, esse dizia que com o Bruno como
advogado, não iam mais precisar contratar nenhum advogado.
Isso o colocava
com um pé atrás. Ele era intuitivo,
inteligente, Bernal o questionou de que lado queria estar. Ele respondeu que da lei. No último ano da universidade, a deixou,
conversou com seus pais primeiro a respeito, entrou para a academia de
polícia. Com o curso mesmo inacabado,
entraria depois como inspetor.
Perdi meu
companheiro de debates sobre as coisas do curso. Jiro sim tinha conhecido muita gente louca,
nos apresentou, mas ele nunca se drogava como os outros.
Foi interessante,
pela primeira vez tínhamos aventuras com outros rapazes. Nessa época Bernal, tornou a ficar sozinho.
Seu companheiro disse que estava farto de dividi-lo conosco, pois se estávamos
juntos, a conversa girava em torno ao que estávamos fazendo.
Agora ia conosco
pela noite de NYC, de uma certa maneira nos protegia, contra os que andavam nas
drogas essas coisas. Descobri anos
depois, que todos encontrávamos uma maneira de estar com ele só para nós. Eu adorava ter longos papos com ele, fazíamos
sexo, depois ficávamos fumando, conversando sobre lei, como eu devia encarar o
que devia fazer a seguir. Nunca
escondemos um do outro isso, mas creio que ele gostava mesmo era do Bruno.
Me questionou
muito se queria ser como meu pai, um advogado de um escritório, ele achava isso
chato, me dizia que eu devia tentar primeiro ser fiscal. Fazer uma carreira, além destes terem um bom
salário. Podes ser que ganhes menos,
mas poderás construir uma carreira.
O mesmo fazia com
o Jiro, um dos programas que fazíamos, por causa dele, era irmos a exposições,
ao museus, ver o que havia de novo. Isso
gerava papos homéricos, em seguida, pois com ele podíamos falar de tudo.
Talvez por isso
de uma certa maneira estávamos apaixonados por ele. Ele gostava disso, dizia nunca me encaixei em
turma nenhuma, mas com vocês me sinto vivo.
A única coisa que dizia era que nunca entrássemos para o exército, para
não ser bucha de canhão.
Os livros agora o
comprávamos de uma maneira interessante, cada um comprava um, as visitas as
livrarias eram todos juntos, íamos passando um para o outro, inclusive,
fazíamos anotações em papeis a parte, marcando o número da página, o que
pensávamos a respeito.
Depois claro isso
gerava largas discussões. Não sei se
nossos pais, algum dia desconfiaram de alguma coisa, mas nunca falaram a
respeito.
No inverno
alugamos uma vez uma cabana, para ir esquiar, mas nunca fizemos tanto sexo como
desta vez.
Eu tinha uma certa
paixão pelo Jiro, seu corpo liso, sem pelos, me excitava sempre. Eu pensava que
ele também, pois estava sempre me desenhando.
Hoje pela casa inteira, tenho retratos meus.
Bruno conseguiu
ir trabalhar na mesma delegacia do Bernal, esse foi seu instrutor durante muito
tempo.
Eu entrei para os
escritórios de fiscais, como ajudante de um que me indicou o Bernal, o sujeito
era mal-humorado, estava sempre com a cara fechada, mas nunca aprendi tanto com
alguém como ele. Me dizia leia todo o
processo, analise, mil vezes, de todos os ângulos possíveis, olhe bem as
provas, bem como as analises dela. Não
deixe escapar nada. Foi o melhor
professor que tive. Um dia me soltou em
plena cara, me olhando muito sério, estávamos almoçando no escritório, estou
apaixonado por ti.
Fiquei olhando
para ele de boca aberta, sabia que tinha se divorciado a muitos anos atrás,
Bernal comentou alguma coisa a respeito.
Um dia acabei na
cama com ele, tudo ficou mais completo.
Mas era um sujeito fechado em si mesmo.
Tinha sido capitão do exército, as vezes quanto tinha muita pressão,
tinha pesadelos.
Se agarrava a
mim, como se fosse seu salva vida.
Tudo acabou de
uma maneira bruta, acabava um julgamento, que tínhamos conseguido a vitória,
ele estava falando com os jornalistas, eu estava mais atrás, de repente vi
saído entre as colunas, um sujeito com uma arma na mão, gritei, mas aquela
confusão de jornalistas falando ao mesmo tempo, ele não escutou, levou um tiro
na cabeça. Fiquei ali segurando a mesma
nos meus joelhos.
Foi meu primeiro
encontro com a morte, uma bofetada das duras.
Mas meus amigos estava aí para me ajudar.
Nessa época,
dividíamos um apartamento imenso no Soho, ainda não era famoso, Jiro acabava de
ter sua primeira individual, já tinha dado entrevistas na televisão, era cotado
como uma revelação, seus trabalhos tinha influências orientais, bem como
adorava usar papel. Depois de ganhar um bom dinheiro, foi passar um ano no
Japão, aprendendo técnicas de lá. Nas
férias fomos os outros passar uns 20 dias com ele.
Na volta, outro
pancada na cabeça, meu pai morreu, de uma maneira totalmente idiota, vinha
andando pela rua, tinha ido visitar um cliente, de repente, começou um tiroteio
na rua, voaram sua cabeça. Mas claro,
todos se juntaram para nos apoiar.
Minha mãe tomou
uma resolução dura, fechou a casa, como eu vivia na cidade, ela foi viver com
uma irmã dela, que era viúva, essa sim falava das nossas vidas. Dizia que não entendia esses garotos, todos
bonitos, solteiros. Minha mãe respondia,
que a vida era nossa, que podíamos fazer o que quiséssemos com ela.
Depois foi o pai
do Bruno, uma briga entre facções da Máfia, entraram pelo restaurante adentro
dando tiros, ele se jogou em cima de sua mulher para defende-la, acabou ele
morrendo.
Todo mundo junto
outra vez. Minha mãe, que estava farta
de sua irmã, voltou para casa, convidou a mãe do Bruno para viver com ela. Anos depois foi a mãe do Jiro, seu pai teve
um largo processo contra o câncer, as três se juntaram para cuidar dele.
Depois o mesmo,
as três foram viver juntas. Claro,
aniversários, todas as festas, nos deslocávamos para lá. Bernal estava para se aposentar, as ajudava
no que elas não podiam resolver. Depois
da morte do meu namorado, me agarrei a ele como um salva vidas, os dois tinham
a mesma idade. Ele ria, estava com os
cabelos ficando branco. Talvez dos três
foi o quem mais perto esteve dele.
Analisava isso, como cada um o via.
Para Bruno ele era como o mestre, para o Jiro, alguém que o entendia na
sua arte, na sua busca. Mas a mim, tinha
me orientado, podia discutir com ele os casos.
Quando me nomearam fiscal, pedi para que ele viesse trabalhar comigo,
como meu inspetor. Foram os melhores
anos da minha vida. Todo mundo achava
natural, ele estar sempre ao meu lado.
Foi talvez a melhor
época da minha vida, era a pessoa que podia discutir de tudo. Os outros sentiam ciúmes, isso se via, mas
claro, o dividia menos com eles. Bruno
estava num relacionamento com um sujeito que nenhum de nós gostava, mas era a
vida dele, ninguém interferia, estávamos sempre para ele, quando vinha lamber
suas feridas.
Jiro ao contrário
tinha se fechado completamente, o mais importante para ele era seu trabalho.
As vezes passava
semana sem vê-lo, mas quando nos encontrávamos, eram horas falando, cada um do
seu trabalho. Sua última exposição
tinha sido um sucesso tão grande, que o convidaram para fazer uma em
Paris. Lá foi ele, mas nós falávamos
horas pelo telefone, quando tiramos férias fomos visita-lo. Bernal lhe perguntou num jantar, por que ele
não tinha namorado?
Soltou que a
pessoa que ele amava, estava com outra pessoa.
Vimos sua
exposição, saímos pela cidade com ele, nos mostrou o lugar que ele adorava,
ficaria mais dois anos por lá. Desta
primeira vez, um dia que Bernal saiu para comprar um presente de última hora,
ele se agarrou a mim, fizemos sexo, em pé no corredor do seu studio. Me disse ao ouvido, te amo muito.
Depois descobri
que Bernal tinha feito de propósito, me diria que não sentia ciúmes, porque
sabia que ele me amava.
A seguinte perda
balançou todo mundo, Bruno morreu no famoso 11S, estava justamente no andar que
entrou o primeiro avião, para prender um homem envolvido numa desses desfalques
piramidais. Não sobrou nada dele, se
sabia que estava ali, pois tinha falado instantes antes com seu superior,
morreu ele, bem como seu companheiro, além de outros dois policiais.
Foi uma porrada
em toda regra. Para Bernal, foi outra
vez como perder mais um amigo querido, levamos todos muito tempo para nos
recuperar.
Nesse dia os dois
fomos buscar o Jiro no aeroporto, pois voltava para NYC, vimos de longe o que
acontecia. Foi uma tragédia
impressionante. Sua mãe quando recebeu a notícia, teve um
enfarte fulminante, ele era seu garoto, tinha falado com ele essa manhã.
A ele não
conseguimos enterrar, o enterro foi o dela. Depois foi como conta gotas, minha mãe, a do
Jiro, ao final ficamos os três. Convenci
o Jiro de usar dois quartos grandes da casa como studio, nos dois também
voltamos a viver nela.
A tristeza do Bernal,
era impressionante, se aposentou, se sentia desorientado, foi quando
descobrimos que tinha Alzheimer, nos tocou aos dois cuidar dele. Na mesma época, consegui meu cargo final, ser
juiz. Tinha um bom salário, sabia investir o que ganhava, como não tinha que
pagar aluguel, além do carro de juiz, com um chofer, era mais fácil. Pagávamos dois enfermeiros que se revezavam
para cuidar dele.
Acho que a única
coisa, real que disse, antes de se fechar num mutismo impressionante, foi para
o Jiro, cuide do meu garoto, amo os dois.
Meses depois morreu dormindo.
Se não fosse o
Jiro, nem sei o que seria de mim. Me
ajudou, eu tinha realmente chegado a amar profundamente o Bernal. Tinha sido meu mentor, meu amigo, meu
protetor, era muita coisa na vida de uma pessoa.
Agora na casa só
sobrávamos os dois, as nossas conversas de noite quando chegava, era
impressionante, seguíamos lendo os livros, comentando entre nós dois.
Um dia Jiro me
disse, que tinha descoberto que me amava, num dia que fazíamos sexo todos juntos,
que eu fazia sexo com ele, não queria que eu saísse de dentro dele, me queria
só para ele. A partir desse dia foi
assim. Apesar dos convites, só aceitava
expor fora, se pintasse no seu Studio, que viesse buscar, eu ia com ele as
vernissages, voltávamos juntos.
Seguimos com o
hábito de ir a exposições, aos museus, dizia que comigo podia discutir qualquer
coisa. Que ele um tempo tinha pensado
que amava o Bruno, mas esse como ele dizia gostava de explorar horizontes
novos.
A dez anos atrás,
cheguei em casa, estava tudo a escuras, subi para os quartos que ele usava como
studio, o encontrei morto, sentado na sua mesa de trabalho, debruçado sobre um
dos muitos retratos que fazia de mim. Um
dia me explicou, cada artista tem uma mania, um desenham mãos, ou alguma outra
parte do corpo, antes de começar uma nova série, eu desenho a ti, pois eres meu
talismã. Tinha acabado uma trabalho
imenso, que a maioria tinha ido para museus de vários países. Tudo em papel, ali estava ele me desenhando
novamente, quando teve um enfarte.
Senti abrir um
buraco embaixo de mim, tudo que pude fazer, foi chamar a emergência, a tempos
tínhamos conversado sobre dinheiro.
Bernal deixou tudo que tinha para mim, eu tinha a casa dos meus
pais. Ele dinheiro do seu trabalho,
gastávamos pouco, então decidimos, que ajudaríamos a gente jovem. Ele deixava dinheiro para bolsas de estudos,
para jovens com talento. Tudo estava
estipulado. Eu tinha feito o mesmo,
para algum bom estudante de direito, que pensasse em fazer pós-graduação.
Segui
trabalhando, pois era o único que tinha, viver na mesma casa seria um suplício,
fiz o que minha mãe tinha feito, embora algumas pessoas não entendesse, aluguei
um pequeno apartamento sem luxo nenhum, só necessitava de uma mesa grande para
colocar os processos que levava para ler em casa. Tentava me confraternizar com os outros
juízes, fiscais, mas os via como uns tontos que não tinham vivido nada.
Escolhi como
ajudante um jovem negro, com um futuro promissor, tinha sido fiscal adjunto,
era brilhante. Foi como o filho que não
tive, quando resolvi voltar a viver na casa, ele veio junto, as conversas eram
impressionante, me surpreendia sua inteligência, ele tinha usado uma das bolsas
de estudos que eu pagava para seguir em frente, se sentia agradecido.
Um dia lhe contei
toda a história dos meus amigos. Ele
ria, me chamava de velho malandro. Um dia me contou que quando jovem tinha
sofrido abuso de uma gang, que depois disso, nunca mais tinha feito sexo. É o meu companheiro do ocaso, agora será
fiscal, nomeado pelo novo governador, eu me aposentei, contei para ele o que
tinha sentido na festa, ele estava ao meu lado, mas os outros três não.
Agora o espero
chegar todos os dias, para conversar, colocar em dia as novidades, da cidade.
Lhe disse que no
momento que se apaixone por uma pessoa mais jovem, ele está livre para
voar. Me diz que nem pensar, que
primeiro o ensinei a amar a si mesmo, que me ama com paixão. Fazemos dois tipo diferente, eu velho,
cabelos brancos, posso ser seu pai, ele negro, com uma barba imensa, pois é mulçumano,
me ensinou a rezar com ele.
Um dia o
surpreendi em seu escritório quando trabalhava comigo, abrindo um tapete,
rezando, eu tinha perdido a fé a muito tempo, começamos a conversar sobre
isso. Aprendi a rezar, não vou a nenhuma
mesquita, como ele vai, mas rezo em casa, arrumei uma poltrona, que fica em
direção a Meca, rezo pensando nos meus amigos, que dia desses com certeza irei
encontrar novamente.
As vezes sonho
com eles, esperando ansiosamente esse dia, como será vivermos juntos outra vez,
mesmo que seja em outro plano. Na
verdade amei a todos, mas nenhum como o Bernal, me lembro sempre, que quando o
tiramos do carro, que fazíamos respiração assistida, o primeiro beijo que lhe
dei, como ele dizia, pois foi na hora que voltou a si. Disse que nunca tinha esquecido aqueles
lábios contra os seus, nem eu tampouco. Anos depois me daria beijos larguíssimos, que
eu adorava.
Com ele sonho
muito, as vezes me desperto procurando por ele, mas já falta pouco, isso
espero.
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