SCOTT
STRAUB
Apesar do meu nome,
parecer alemão, erámos descendentes de judeus convertidos da Irlanda, meu nome
inteiro era Scott Smith Straub, o Smith era de minha mãe, uma mulher
fantástica, judia por um acaso também, tinha já nascido na América, mas sua
família tinha vindo da Áustria.
Meus avôs tinham
um sotaque divertido, mas não suportavam meu pai, representava para eles toda a
repressão que tinham sofrido.
Explico, por
parte de pai, era como uma organização, seu avô tinha sido polícia, seu pai
também tinha chegado a chefe de polícia, ele, meu irmão mais velho.
Erámos 4 filhos,
meu irmão mais velho, um homem imenso, forte como um touro, tinha sido jogador
de futebol americano, minha irmã, que escapou da saga, se formou em filosofia,
dava aulas, Bobby meu ídolo, o irmão mais próximo de mim, por último eu, que
foi um filho temporão, nasci com uma diferença de seis anos. Foi um parto complicado, nessa época veio
morar com a gente Gertrudes, mais conhecida como Trude.
Ela não era
parente, era a melhor amiga de minha mãe, desde jovem, conheceu ao mesmo tempo
um companheiro de meu pai, que morreu num tiroteio. Veio para ajudar a cuidar da minha mãe,
depois foi ficando, era mais uma da família, ajudava na cozinha, as duas tinham
manias parecidas, podiam conversar horas e horas sobre algum assunto, se
matavam de rir, eu adorava a gargalhadas das duas.
Minha mãe, morreu
de repente, quando eu tinha 10 anos, de uma certa maneira tudo mudou depois
disso, era mais ou menos mantinha a família unida.
Bobby, bem como
eu, erámos seus filhos preferidos, ela não escondia isso, meu irmão mais velho
John, era o querido do meu pai, minha irmã era a menina dos seus olhos.
Trude, fez tudo
para manter a família unida, era a única que ousava enfrentar meu pai, bem como
meu avô, como faria minha mãe, foi ela que acabou de me criar, era seu
preferido, isso ninguém discutia.
As vezes na hora
da comida, reclamavam, que sempre tinha que ter um prato meu favorito, que nem
sempre os outros gostavam.
A coisa ficou
preta, quando minha irmã apareceu em casa com um namorado, era companheiro dela
de universidade. Meu pai, chegou
analisar a família dele, a reciproca era verdadeira, seu namorado não suportava
o velho.
Quando se casaram
foram viver em San Francisco, os dois eram professores da Universidade, quando
muito vinham para o Natal. Seus filhos
tinham uma educação diferente da que tivemos.
Ele por acaso era
judeu, o casamento foi feito em duas vezes, uma na igreja católica, para
agradar a família, outra no rito judaico, para sua família. Meu pai nunca tinha perdoado isso.
Meu irmão mais
velho se casou tarde, já tinha quase 28 anos, seguia sempre as influências de
meu pai. Um belo dia apareceu com uma
mulher completamente diferente, era uma mistura de mexicana com índio
navajo. Para meu pai, meu avô era um escândalo,
a tinha conhecido, pois tinha atendido uma emergência, tinha sido assaltada,
agredida, ele pegou o ladrão, estava por ali tomando café, a levou para o
hospital, foi visita-la todos os dias, era de uma beleza diferente, era
professora de crianças com síndrome de Dow.
Contra vento e maré, bateu o pé se casou com ela, meu pai tinha um certo
preconceito contra os mexicanos, costa Riquenhos, pois achava que todos eram
traficantes.
Ela era uma
mulher especial, quando meu pai lhe enchia o saco, se levantava da mesa, pegava
o prato, jogava no chão, dizia na cara dele, não me casei contigo, mas sim com
teu filho, a vida é nossa, fazemos o que queremos.
Acabaram se
mudando para uma pequena cidade perto de Filadélfia, meu avô reclamava, pois
John era seu neto favorito, ao contrário do meu pai, acabou achando Dorothea,
uma mulher fantástica, acabou indo viver com eles, pois adorava seus
filhos. Tinham três filhos, o último na
verdade era adotivo, esse era o querido do velho, tinha síndrome de Dow, tinha
sido abandonado pela família. Eu também
o queria muito.
Em casa durante
um tempo, só sobramos Bobby, eu, Trude, que dizia na cara do meu pai, queria
que tua mulher estivesse aqui, ia acabar contigo.
Eu compartia
quarto com o Bobby no sótão, na parte de cima, minha mãe tinha mandado arrumar
para os dois, tínhamos todo espaço para a gente.
Meu pai quando
estava em casa sempre vinha bisbilhotar o que estávamos fazendo, um dia, sem
que ele soubesse, Bobby mandou trocar a fechadura, ficou como uma fera.
Bobby jogava
basquete, eu ficava de saco cheio pois todos gostavam de desporte, me cobravam
isso, mas eu odiava, não encontrava graça nenhuma nisso.
Assistia os
partidos de basquete com o Bobby, só para estar ao seu lado, me explicava mil
vezes os passes, mas ria, porque sabia que não me fazia graça. Um dia me perguntou, então porque vais me ver
jogar, ou assiste os jogos comigo?
Lhe respondi
olhando na cara dele, eres meu irmão preferido, adoro estar contigo.
Quando foi para a
Universidade, foi como perder uma parte de mim, pois sentia sua falta, andava
pela casa como um fantasma, ele foi estudar direito, porque meu pai queria.
A grande surpresa
foi que de repente largou tudo, entrou para o exército, pelo seu tamanho, seu
porte, ele foi ser Policia Militar, meu pai a contra gosto concordou, porque
assim ele voltava já para entrar na polícia.
Vivia me cobrando
que eu me preparasse para seguir a carreira do Bobby, que estudasse direito,
que assim quem sabe entrava como inspetor na polícia.
Quando ele ia a
algum julgamento, eu passei a ir, para ver como era, se gostava ou não. Estava num julgamento impressionante, o juiz
tinha proibido fotos durante o processo, eu entrei, arrumei um lugar perto de
um homem que me chamou a atenção. Estava
ali desenhando cada coisa que acontecia durante o processo. Eu adorava desenhar, no dia seguinte, trouxe
um bloco como o dele, uma caixa de lápis todos apontados, prontos para serem
usados.
Me sentei ao seu
lado, fui fazendo o que ele fazia, prestava atenção em quem estava sendo
interrogado, fazia o retrato da pessoa muito rapidamente, as expressões das
mesma, ele de vez em quando olhava o que estava fazendo. Quando chamaram o réu para depor, tinha que
ser ligeiro, pois a cara do homem a cada pergunta, mudava, ora era irônico, colocava
uma cara de chulo, quando o fiscal começou a fazer pergunta se irritava, eu ia
virando a página, só desenhava a cara, algum gesto de mão, a forma da cabeça o
faria depois, o que me interessava era a expressão.
Quando acabou o dia,
o homem me convidou para tomar um refrigerante, eu fui. Ele discretamente pegou meu caderno, começou
a olhar cada desenho, comparar com o seu, me disse, eres melhor do que eu
desenhando, olha que desenho a anos.
Consegues captar
as expressões muito bem, agora tem que encaixar tudo isso, num contexto maior,
me mostrou o que queria dizer, observar o juiz, o fiscal, fazer com simples
traços, aonde se sentava cada um, a postura.
No dia seguinte
fiz isso, mas tinha que ser rápido. No
final, quando o réu foi condenado, consegui captar toda a sensação de derrota
que ele expressava.
Impressionante,
me disse, me perguntou meu nome, quantos anos tinha, tens futuro disse ele,
gostaria de ver mais trabalhos teus, me deu um cartão com seu nome, Peter
Evangelist, marquei de ir a sua casa, para mostrar meu trabalho.
Era uma arapuca,
queria sim que eu conhecesse sua mulher, que era uma pintora com um certo nome,
quando viu o que eu fazia, se propôs a dar aulas para mim.
Lhe disse que não
tinha dinheiro para pagar. Levantou os
ombros, dizendo, eu tampouco pensava em cobrar.
Conversei com a
Trude, me disse que o fizesse sem que meu pai soubesse, pois iria fazer um
escândalo. Saia depois da aula, ia para
a casa dele, Beth Evangelist, vendia seus trabalhos, nas galerias de NYC, era
muito conhecida.
Me escapava aos
sábados para ir a algum museu com eles, foi me educando, para que eu entendesse
os estilos, os pintores antigos, falava sempre na emoção, que eu conseguia
captar a emoção das pessoas nos meus desenhos.
Um dia Trude
quase morreu, abriu a porta de casa, estavam dois militares, para dizer que
Bobby tinha morrido.
Me chamou, estava
branca, pediu que me explicassem, ela estava aturdida. Eu queria que a terra me tragasse, pois mal
escutava o que os homens diziam.
Chamamos meu pai,
que veio com um carro patrulha. Ficou
branco, com os olhos cheios de lagrimas, depois furioso, queria saber os
detalhes. Bobby tinha ido apartar uma
briga entre dois soldados que se odiavam, um deles lhe cortou a garganta de
lado a lado. Tinha morrido no ato.
Eu me fechei em
nosso quarto, chorei como um condenado, nesse dia me neguei a comer, a fazer
qualquer coisa. Só avisei a Beth que não
podia ir a aula.
No dia do enterro,
notei um rapaz da mesma idade do Bobby, numa das idas a casa no seu período da
faculdade, lhe perguntei sobre seu companheiro de quarto, me falou dele, senti
que ele gostava do sujeito. Era o mesmo.
O convidei para a
recepção em casa, na verdade o arrastei, queria conversar com ele, o levei ao
nosso quarto, tinha colocado numa moldura, um retrato do Bobby, ele ficou ali
em pé chorando com os ombros caídos, se sentou no chão, ou melhor foi caindo de
joelhos, ficou ali chorando.
Fiquei
impressionado, lhe perguntei por que disso?
Me disse que era
o culpado que o Bobby tivesse entrado para o exército, me contou o que tinha
acontecido, saiam sempre juntos, um dia beberam demais, os dois se sentiam
atraídos um pelo outro, acabaram fazendo sexo.
Fiquei confuso,
pois não sabia que ele albergava esse sentimentos por mim. Tinha uma namorada, mas tu conhecias teu
irmão, fazia tudo como se fosse o último dia na terra, disse que me amava desde
o dia que tinha me visto.
Fiquei sem saber
o que fazer, por um lado o queria, mas não sabia analisar meus sentimentos,
pedi para trocar de quarto, arrumei uma desculpa qualquer, ele me seguia por
todos os lados, tentava me fazer entrar em razão, me dizia que o que lhe tinha
mostrado, o amava também.
Arrumei aquela
desculpa, que das depois de uma noite de bebedeira, que tínhamos feito sexo
porque estava bêbado.
No dia seguinte
ele desapareceu, trancou a matricula, entrou para o exército, tentei
localiza-lo mas não consegui. Tua tia
Trude, como telefonou para seus amigos, para o enterro, encontrou o meu nome na
sua agenda de telefone.
Sou honesto de
dizer que meu mundo caiu, pois nunca deixei de pensar nele, descobri depois de
tudo que ele tinha razão o amava. Agora perdi tudo, esperava que ele
recapacitasse. A última vez que veio,
estivemos juntos uma semana, disse que ia pedir baixa do exército, que iriamos
viver juntos, que enfrentaria teu pai, o resto da família, o que fosse
necessário, pois me amava.
Agora estou
fudido, o abracei, eu sabia que meu irmão era gay, sempre tinha sabido, como
ele sabia que eu era também. Na última
vez que ele veio, mostrei meus desenhos para ele, me disse que eram
fantásticos, que eu devia estudar Belas Artes, que não ficasse preso as ideias
de meu pai, o via feliz. Quando o fui
levar até o ponto de ônibus, me segurou pelos ombros, me disse que tinha
reencontrado seu companheiro, que agora iria tudo bem entre eles.
Ficamos ali
conversando, dei o quadro para ele.
Quando descíamos
meu pai ficou olhando para os dois, viu o retrato, perguntou quem tinha feito o
mesmo, só me disse quero um.
Não sei o que
aconteceu, quando chegou o Natal, meu avô soltou uma bomba, disse que ia viver
com o John, sei que houve uma discussão entre os dois, tudo que escutei, foi o
velho acusando meu pai de querer mandar na vida dos filhos, acabarás ficando
sozinho. Pois meu pai, na ceia pediu ao
John que viesse viver em casa, com a mulher e os filhos. Quem respondeu não foi ele, foi sua mulher,
que de jeito nenhum queria viver na mesma casa com ele. Que ia amargar o casamento deles. Principalmente que meu pai, nunca se
aproximava do filho adotivo deles com síndrome de Dow. Dizia que não era do nosso sangue.
Fez o mesmo com
minha irmã, que soltou na cara dele, que tinham ido embora, que já era difícil
conviver com ele no Natal, se mamãe estivesse aqui, nunca ia permitir que te
mete-se na vida dos filhos.
No ano seguinte,
eu teria que ir a Universidade, ele começou uma campanha, nas comidas, sempre
tocava no assunto, porque eu não estudava em NYC, sem sair de casa.
Trude lhe chamava
a atenção, mas ele ignorava.
Um dia entrou no
meu quarto, viu as paredes, cheias de quadros de pinturas, coisas que tinha
aprendido a fazer. Ficou uma fera, nessa
noite a bronca foi imensa, que ele não queria um filho gay, pintorzinho de
merda.
Me lembrei da
minha conversa com o Bobby, que eu não deixasse que ele dirigisse minha vida.
Desceu uma calma
impressionante em mim. Olhei bem na cara dele, lhe disse que ia estudar Belas
Artes, tinha uma bolsa de estudo, podia fazer o que quisesse. Antes de mais nada, saiba que eu realmente
sou Gay, ainda não estive com nenhum homem, mas um dia como o Bobby,
encontrarei alguém para me amar.
Ficou uma fera,
como podia falar assim do meu irmão, manchar sua lembrança.
Lhe disse na
cara, sabe por que o Bobby entrou para o exército, contei para ele a história,
pela sua cara, corriam lagrimas.
Não vou suportar
mais isso na minha vida, amanhã quando volte, quero que não esteja mais
aqui. Trude que estava quieta até então,
soltou, não se preocupe meu filho, minha casa que estava alugada esta livre,
vamos para lá.
Virou-se para o
meu pai, soltou, tua mulher tinha razão, eres um bom homem, mas um cabeça dura
de fazer gosto, quero ver você viver agora, nessa casa imensa sozinho, até o
velho foi embora porque já não te suporta mais.
No dia seguinte,
arrumamos nossas coisas, fomos para sua casa, não era muito longe, há dois
quarteirões dali.
Comecei a estudar
Belas Artes, me saia bem. Ia sempre
conversar com a Beth, ela me aconselhou fazer aulas com um professor novo. Tinha vindo de Paris, cheio de ideias, me
apaixonei, nada mas olhar para ele. Devo
ter parecido um pateta, pois fiquei olhando para ele de boca aberta. Começou a rir, me disse que fechasse a boca,
pois alguma mosca entraria com certeza.
Comecei a
aprender com ele, me dizia sempre, tens técnica, sabes captar as emoções, agora
tens que desenvolver um estilo só teu.
Falava todo o tempo nisso com os poucos alunos que tinha.
Um dia nos levou
ao seu studio, quando estávamos lá, entrou um negro imenso, nos apresentou como
seu companheiro, ele era do Senegal, cozinhava num restaurante ali perto.
Quando vi os dois
abraçados, todas minhas esperanças foram para a merda, pois vi que entre eles
existia o que eu sonhava, amor.
Passei um tempo,
pintando em branco/negro. Me lembrei das
conversas com o amigo do Bobby, o procurei, estava tentando endereçar sua vida,
com ele tinha largos bate papos.
Notei que bebia
demais, falei com ele sobre isso.
Quando não estou
trabalhando, é o único que me sobra, já tentei fazer sexo com outros, mas só
consigo se a pessoa for parecida com o Bobby.
A falta dele me faz doer todo o corpo.
Vivemos tão pouco
tempo juntos, mas foram muitas emoções.
Eu entendia,
apesar de nunca ter sentido essas emoções, tinha vergonha de dizer que ainda
era virgem.
Comecei a
analisar meus sentimentos, sempre tinha essa coisa da perda, primeiro minha
mãe, depois o Bobby, essa angustia, comecei a retratar, com pessoas com a boca
aberta, gritando, fiquei imaginando que os gritos de cada um poderia ser
proveniente de alguma coisa, comecei a fazer em grande, um na universidade, era
um grito de solidão. O professor quando
viu, trouxe o dono de uma galeria, para ver.
Me perguntou se eu queria fazer uma exposição.
O levei a casa
aonde vivia com a Trude, mostrei toda a serie que tinha feito a respeito.
Ficou olhando, me
disse que tinha material bastante para uma exposição, que a chamaríamos de “O
Grito”.
O professor, Beth
me ajudaram, queriam que eu assinasse um contrato, os dois disseram que não,
ela ainda me sugeriu uma coisa, que o professor concordou. Se fosse bem a
exposição que eu pegasse esse dinheiro fosse estudar um ano ou dois na École de
Beaux Arts de Paris, que ali poderia melhorar mais.
Fizeram um
catalogo todo em Branco/negro, além de um convite muito bonito, na primeira
página dediquei a exposição ao meu irmão, que me tinha feito decidir sobre
minha vida, a Trude que me tinha incentivado a ir em frente.
Mandei convite,
catálogos ao John, bem como minha irmã.
Levei pessoalmente um para meu pai, a porta estava fechada, abriu uma
senhora maior que eu sabia que estava cuidando da casa para ele, entreguei o
convite, o catálogo, ela me sorriu, disse que entregaria a ele.
Deixei de me
preocupar, pois tinha outras coisas em que pensar.
Quando levei o
convite ao amigo do Bobby, ele me deu um beijo, disse que não me preocupasse
que um dia conheceria alguém para amar.
A noite da
exposição foi um sucesso, Trude estava ao meu lado, meu irmão John veio com a
família, minha cunhada, me abraçava dizendo que o trabalho era perfeito, os
meninos estavam contentes, meu avô veio numa cadeira de rodas. Já não estava muito bem, mas sempre de mãos
dadas com seu bisneto favorito.
Fui entrevistado
por dois programas de televisão, jornalistas, a Beth veio, com Peter, que
soltou que quando te vi ao meu lado, sabia que ali estava um grande artista.
No final da
noite, entrou meu pai, meio sem graça, sem dizer uma palavra andou a exposição inteira,
quando me olhou, tinha os olhos cheios d’agua, tua mãe tinha razão, eres um
jovem especial.
Depois fizemos
uma foto com toda a família, ele me perguntou que significava essas etiquetas
vermelhos ao lado dos quadros, lhe disse é que tinha sido vendido.
Só então me dei
conta que tinha na inauguração vendido tudo.
Comecei a chorar,
abraçado a Trude, agradeci ao Peter, a Beth por terem me ajudado.
Pensei no Bobby,
fui me sentar numa praça em frente a galeria, o John veio falar comigo, contei
para ele tudo do Bobby, ele sabia. Como
tu ele também era especial.
Me disse que
incentivado pela sua mulher, estava fazendo um curso de escritura, ele sempre
tinha gostado de ler, agora começava a escrever, me estendeu um livro, o
primeiro a ser editado, o dedicava ao nosso avô, que tinha sido o primeiro em
ler o que ele escrevia.
Agradeci, depois
quando entrei, vi meu avô entregando o livro para meu pai.
Quando soube o
que tinha ganho com a exposição, fiquei orgulhoso, resolvi seguir a ideia de
que que me tinha dito a Beth, bem como o professor.
Ele se informou
para mim, me deu a dica de um lugar para ficar, fez inclusive o contato, de um
studio aonde poderia viver é pintar.
Estava feliz por mim.
O tinha
apresentado a família toda na exposição, ele apresentou seu companheiro a
todos.
Meu pai fechou a
cara como sempre, mas ignoramos como sempre, já não tinha poder nenhum sobre
mim.
Assim que aos 21
anos, resolvi voar, conversei muito com a Trude, que agora iria ficar sozinha,
mas ela, não se apertou, foi viver com minha irmã em San Francisco, que
precisava de alguém para cuidar dos meninos.
Ela fez uma
coisa, vendeu sua casa, me deu uma parte do dinheiro, para que eu nunca
passasse necessidade, avisei meu pai, que depois mandava meu endereço em
Paris. Só me disse uma coisa, sejas
feliz.
Fomos os dois
para o aeroporto, eu para embarcar para Paris, Trude para San Francisco.
Nos abraçamos
muito, como uma mãe, faria com um filho.
Cheguei em Paris,
no final do dia, me relaxei no avião, era pleno inverno, tudo estava cinza, mas
imediatamente me apaixonei pela cidade.
O studio era em Montmartre, o homem colocou imediatamente a calafetação
para esquentar o lugar, de noite senti frio, mas estava tão feliz que não me
preocupei.
No dia seguinte
fui a École de Beaux Arts, procurei o amigo do meu professor, esse riu, pois
tinha o meu catalogo, terei pouca coisa para te ensinar, fui almoçar com ele,
me deu uma lista dos museus que deveria visitar primeiro, aonde comprar
material, foi comigo até lá, me disse que eu logo apresentaria um cartão da
escola, para conseguir descontos.
Escolhi fazer
aula também de escultura, teria dois professores, um me ensinaria a trabalhar
com as mãos, outro seria mais conceitual.
Quando voltei o
studio já estava quente, coloquei o material que tinha comprado, depois
trouxeram mais coisas que não podia levar nas mãos, talvez por entusiasmo,
nessa noite, pintei um grande retrato do meu irmão Bobby, mas de uma maneira
moderna. Era como se ele fosse um grande arco íris. Pequenas pinceladas de várias cores, fiquei
depois conversando com ele, me preocupava agora, que ainda fosse virgem, que
sempre me apaixonava pela pessoa errada.
Dias depois
estava no banheiro da escola, escutei o sujeito mais bonito que tinha na minha
classe falando com outro, quer apostar que vou fazer com que o americano se
apaixone por mim. O outro riu muito,
disse não duvido nada, pois tua beleza ainda vai estragar sua vida.
Dito e feito, se
aproximou, começou um jogo de gato e rato comigo. Mas claro sabendo, fiquei quieto, ele um tipo
muito bonito, alto como eu, loiro, olhos azuis, uns cabelos largos um corpo de
fazer inveja.
A aposta era que
em dois dias me levaria a cama, deixei passar os dois dias, o vi pagando a
aposta, chegou-se para mim, me disse, agora estou sem moral, apostei que ia
para cama contigo em dois dias, perdi a aposta, mas na verdade acabei
interessado por ti.
Vivíamos relativamente
perto um do outro, o convidei para ver meu trabalho, amou o quadro do meu
irmão, caramba que homem interessante.
Lhe contei a história do Bobby, colocou a mão no meu ombro, sinto
muito. Acabamos na cama, lhe disse que
era virgem em todos os sentidos, riu muito, deixa comigo. A imagem que ficou na minha cabeça, era
ele sentado em cima de mim, com os cabelos largos caindo pela cara, suando
sorrindo, feliz da vida. Fizemos sexo
de todas as maneiras, riu depois dizendo que devia colocar uma coroa de louros
na sua cabeça, pois tinha um recorde, tinha me livrado de todos os pontos
virgens do meu corpo.
Os outros
colegas, já sabiam que estávamos juntos, pensei que o amava, mas ele tirou isso
de letra, o que temos é um desejo sexual, eu não te amo, gosto de estar
contigo, mas se aparecer alguém que me atraia, irei à luta, temos que
aproveitar a vida, somos jovens.
Dito e feito, mas
como agora éramos amigos, me contava, no principio fiquei com ciúmes, mas
depois pensei que seria perda de tempo.
Nunca mais voltamos a estar juntos na cama.
Fui conhecendo
gente, ia a festas, tomava um copo de vinho, nada mais, não gostava de drogas, nem
nada parecido. Queria ter a cabeça despejada para saber o que fazia. Quando algum que estava bêbado ou drogado
queria ir comigo para cama, tirava o corpo fora. Lhes dizia quando tiveres a cabeça livre
disso, tiveres certeza realmente vou para cama contigo.
Tive muitas
aventuras, mas agora sabia que não iam durar, aproveitava o momento, me
protegia, pois tinha medo de doenças, era consciente, não queria estragar a
minha vida.
Mostrei meus
trabalhos, para o professor de escultura, gostou muito, foi ao studio, fez
fotografia de tudo, foi comigo a uma galeria, aonde ele fazia exposições,
mostrou o meu catalogo de NYC, os trabalhos novos, o dono, Marcus Aurélius, riu,
dizendo que diferença de uma para a outra, gosto muito, olhou sua agenda, me
perguntou quantos trabalhos tinha pronto, me pediu mais dez, foi conosco ao
studio olhou tudo, inclusive as esculturas que eu tinha feito, amou uma que
tinha feito, era como um elfo, mas era o Bobby, disse que lhe impressionava os
detalhes do rosto, do corpo. Virou-se
para mim muito sério, perguntou se tinha sido de algum amante meu.
Lhe disse que
não, era meu irmão, que tinha morrido.
Não tinha medo de
contar sua a história dele, apenas mencionava que o tinha adorado desde minha
infância.
O professor ficou
depois, bom me disse, agora é tocar em frente, me orientou como devia agir com
o dono da galeria, é um tipo estupendo, mas gosta de ter as pessoas presas a
ele.
Fui lhe dar um
abraço para agradecer, nos beijamos, me soltou ao ouvido, estou interessado em
ti, desde que entraste pela porta da minha sala.
Ai
verdadeiramente senti algo, ele era totalmente diferente de mim, moreno,
cabelos negros totalmente cacheados, imensos, uns olhos negros que pareciam
duas bolas. Um sorriso imenso. Não posso esquecer que me apaixonei perdidamente
por ele. Jean Pierre, era além de tudo
muito másculo. Mas os dois na cama, era
uma batalha campal.
No dia seguinte,
despertei com ele me olhando, me disse que não queria me assustar, pois era
mais velho do que eu, me contou sua história, que tinha amado alguém que o
tinha feito sofrer muito, mas que gostava imenso de estar comigo.
Agora as vezes
dormia no seu studio, estava fazendo uma escultura imensa para o governo
francês. Outras ele vinha ver o que eu
tinha feito, jantávamos por ali, depois ficávamos conversando, acabávamos como
sempre na cama.
Fiz um quadro
dele, segundo ele muito onírico, pois o pintava como um centauro, ao mesmo
tempo pedi para usar seu studio, fiz um centauro imenso, era ele também o dono
da galeria quando viu, colocou numa sala a parte, todos os desenhos, bem como o
quadro a escultura.
Quando montou o
catalogo, ficou estupendo, Jean Pierre me ajudou a fazer. Dediquei a exposição aos meus novos
professores, bem como os que nunca tinha esquecido.
Mandei o
catalogo, para os Estados Unidos, meu pai telefonou eufórico, que tinha gostado
muito, se ele podia ir. Acabou vindo
ele, Trude, John, foi ótimo, passeamos com eles pela cidade, íamos jantar,
conheceu o studio do Jean Pierre, quase morri de vergonha, ao mesmo tempo ri
muito, apontou o dedo para o Jean dizendo, se fizeres meu filho sofre, vou
atrás de ti, te mato, depois o abraçou.
John era mais cauteloso, conversei em particular com ele, me disse que
seu filho mais velho, era diferente dos outros, acreditava que era gay, como
devia trata-lo.
Conversamos muito
sobre isso, lhe disse que não trata-se diferente dos outros, apenas lhe desse
amor.
A inauguração foi
um sucesso, fui entrevistado antes num programa ao vivo, estavam todos sentados
na plateia.
O centauro, bem
como tudo da sala, foi vendida para um colecionador. Só não vendi o quadro do
Bobby, queria o ter como um talismã, meu pai chorou muito quando viu o quadro.
Me soltou,
quisera ter entendido teu irmão, apoiado, quem sabe não estaria vivo.
A vida depois
voltou ao normal, Jean Pierre me disse que agora era da família.
Posei para uma
escultura que estava fazendo, me disse que tinha agora um receio imenso, pois
tinha a ameaça do meu pai pendente na sua cabeça.
No Natal fomos
para NYC, fazia muito tempo que não nos reunimos todos, até meu avô veio, o
menino do John, o adotado, estava imenso, conversava normalmente, quando viu o
Jean Pierre, o abraçou. Agora estava
sempre agarrado com ele. O mais
interessante era que o velho o tinha ensinado a se comportar normalmente na
mesa, ele era mais um.
Segundo ele, era
muito inteligente.
Conversei com o
filho mais velho do John, foi interessante, me disse na cara, que ainda não
sabia o que era, mas se sentia diferente dos outros.
Temos sempre este
estigma que somos diferentes, mas lhe disse que cada pessoa era única na vida.
Acreditava que uns mais que os outros, pensava nesse assunto, alguns tentavam
ser iguais aos demais, esses nunca seriam nada na vida.
Agora de qualquer
maneira eu era o tio que era diferente, que tinha ido à luta, que tinha
literalmente vencido.
Meu avô morreu
logo depois que tínhamos voltado, nos últimos anos, tinha voltado a ir a
sinagoga, abandonando a igreja católica.
Nesse inverno,
Jean Pierre, pegou uma pneumonia impressionante, acabou no hospital, não havia
maneira de melhorar, inclusive fizeram exames para saber se não era Aids, nada
disso, não sabia como tratar. Depois de
um mês com máscara de oxigênio o tempo todo, um dia parecia melhor, fui ao
studio, buscar roupas, tomar um bom banho, quando voltei tinha morrido.
Uma enfermeira me
entregou uma carta.
Foi difícil
encontrar sua família, acabamos os amigos fazendo um enterro como ele queria, ser
cremado, que suas cinzas fossem colocadas ao pé de uma escultura sua, a
primeira que o tinha lançado ao mundo, assim fizemos.
Eu parecia não
sentir nada, mas me balançou completamente, meu pai me telefonou abalado, todos
me chamavam.
Pensei ir passar
uns tempos por lá, mas tinha que acabar um projeto, para a próxima exposição.
Ele tinha me deixado o seu studio como herança, lá tinha mais espaço,
aproveitei, fiz um escultura dele, como eu o via quando fazíamos sexo, ele
ficava esperando que eu tivesse prazer, para o termos juntos, era essa a imagem
que eu queria ter dele para sempre.
Os detalhes do
rosto estavam todos dentro de mim, não deixe nada fora. Pela primeira vez me tinha atrevido fazer
também um quadro, perto de casa tinha um bistrô, no inverno sempre nos
sentávamos na esquina, um dia um amigo fez uma foto, os dois rindo.
Pintei esse
quadro, tinham sido cinco anos de vida em comum. Na exposição, apareceram professores da École
de Beaux Arts, bem como companheiros, levei um susto quando vi o que era
bonito, estava muito mal, drogas, excessos demais, a imagem tinha ido para a
casa do caralho. Fiquei com pena dele,
foi como uma aparição fullgáz, da mesma maneira que entrou, desapareceu.
Quando voltei
para casa, fiquei sentado na frente do quadro do meu Bobby, voltava a conversar
com ele como sempre fazia. Se alguém
entrasse ia pensar que estava louco.
Ele seguia
fazendo parte da minha vida.
Fechei o studio,
tinham me avisado que meu pai não estava bem, fui para NYC, passar uma
temporada. Fiquei com ele em casa, arrumei o meu quarto
que era imenso, para seu meu studio. As
vezes ele subia, ficava conversando comigo, horas e horas, enquanto eu pintava.
Se lembrava da
sua infância, de seus sonhos, queria fazer outras coisas, não queria ser
policial, queria ir pelo mundo sem rumo, mas conheceu minha mãe, o jeito foi
ter um emprego.
Um dia não
levantou, morreu dormindo, John foi quem chegou primeiro para me ajudar com
tudo, deixou uma carta para cada filho, pedindo desculpas, mas a culpa era
dele, se todos tinham se afastado. Deixava
tudo que tinha, além da casa, para seus netos, que pudessem ser na vida o que
quisessem.
Ainda usei a casa
um tempo para acabar o material que estava trabalhando, fiz mais uma exposição
em NYC, voltei para Paris, lá era minha casa.
Conversando um
dia, com o dono de um bistrô, me disse que devia ir ao Marrocos, pois gostaria
muito da diversidade lá, me fez um roteiro, arrumou um guia para mim, fui
munido de blocos de desenho, podia fazer fotos, mas não tinha pressa.
Levei meses
viajando por lá, ao final tinha material impressionante, desenhava os
pescadores nas praias, as vezes o ajudava.
Quando voltei,
trabalhei imenso, um dia conheci no bistrô um professor, era um pouco mais
velho do que eu, estava na França desde garoto.
Me apaixonei completamente por ele, tinha sido casado, mas não tinha
filhos. Era um romance a quatro
paredes, ele dava aulas na Sorbonne, tinha medo de muitas coisas.
Mas depois de um
tempo, viu que eu não estava passando tempo com ele, se atirou de cabeça no
nosso relacionamento.
Fomos juntos
visitar minha família, depois passamos um tempo visitando o que ele queria
conhecer, as aldeias nativas.
Voltamos para
casa, seguimos até hoje juntos, encontrei o equilíbrio que tinha buscado desde
minha juventude. Ele não era uma beleza,
mas sua cabeça, sua maneira de comporta-se era o que eu buscava.
Podíamos debater
horas algum assunto, um dia me contou sua história inteira, desde quando era
criança no Marrocos, até me conhecer.
Eu tinha me
apaixonado no primeiro dia, mas tive que o ir conquistando, agora não
imaginamos a vida um sem o outro.
Já não corro
tanto para fazer exposições, vou mais lento, me conformo com uma por ano, com
muitas esculturas, pinturas, dizem que evolui muito desde que cheguei aqui, eu
digo que foi um amor à primeira vista, ter chegado num dia cinzento como era
minha alma nesse momento, depois ir descobrindo as cores da cidade, quando
chega a primavera.
Alguns me chamam
de louco por gostar de Paris no inverno, mas eu sempre digo que as cores que
desaparecem no verão, no inverno são mais interessantes. Ficam rindo com isso, mas na verdade a cor
está dentro da gente, por isso amo meu companheiro, suas cores estão todas
guardadas na sua memória, quando me conta alguma coisa, sou capaz de sentir
todas as cores do que ele descreve.
Viver com ele, me
enche de alegria, claro como todo mundo temos nossos momentos complicados, mas
nós aceitamos. Ele me chama de seu
branco azedo, mas claro no inverno, minha pele fica mais branca do que é na
realidade.
Adoro o contato
da sua pele na minha, esse calor que ele irradia, me faz sentir paixão.
Já estamos mais
velhos, sábios como ele diz, o que interessa é o que temos um com o outro, o
resto é besteira.
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