martes, 27 de octubre de 2020

MAN - MADE

 

                   

 

Nem tudo são rosas, isso todo mundo sabe, que a vida é difícil também, mas algumas vezes a resoluções que tomamos, os caminhos, nos levam a pensar que o mundo virou uma loucura.

Tenho um irmão gêmeo, somos idênticos um ao outro, desde criança sentíamos as mesmas coisas, embora em alguns aspectos somos totalmente opostos, como em gostos musicais, ideia de como levar a vida, amar, etc.

Nossos amigos mais próximos, com quem fomos criados juntos, são outros dois que também são gêmeos, fomos concebidos mais ou menos ao mesmo tempo.

Segundo minha mãe que tem um sentido de humor afinado, já nos conhecíamos da sala de espera da clínica de fertilidade.   Nossa mãe, era produtora de moda, inclusive para o cinema, moderna, era pouco para defini-la, gostava de tudo que fosse novidade.  Quando tínhamos uma idade para entender por que não tínhamos pai, ela nos explicou.                              Estava farta de relacionamentos complicados, de homens que entravam, saiam de sua vida, num abrir e fechar de portas.   Estava com 30 anos, viu que nunca chegaria a casar-se, tampouco tinha vontade de despertar todos os dias com o mesmo homem.  Fazendo uma reportagem junto com uma jornalista, conheceu uma clínica de fertilidade, tinha encontrado a solução.

Já a mãe dos outros dois era uma alta executiva de uma empresa, tinha levado tanto tempo para chegar até sua posição atual, que não tinha tempo para homens, nem mulheres, tudo tinha que ser como tirar um sapato porque os pés estavam doendo, palavras dela.

As duas se conheceram na sala de espera da clínica, souberam que estavam gravidas, de gêmeos, ao contrário de minha mãe, os seus eram de óvulos diferentes.   Saíram para tomar um café para conversar.   Minha mãe, Mae, de Margareth, a dos outros dois Bessie Walter, mais conhecida como Walter, assim a tratavam na sua empresa, seria assim que os dois a chamariam.

Está tinha tudo organizado, quem ia cuidar dos garotos enquanto trabalhasse, o quarto já estava pronto.

Nossa mãe ao contrário, nem tinha pensado no assunto, já se veria, essa era sua maneira.

Nascemos os quatro no mesmo dia, na mesma clínica.  Os meninos de Walter eram diferentes, um era loiro, o outro moreno, um tinha olhos negros o outro azuis. Ela ficou encantada com isso, pois não teria trabalho em reconhece-los, nos dois ao contrário, éramos idênticos, cabelos castanhos, olhos verde escuro, como os da minha mãe,  num primeiro momento pensou em nos chamar de zip -  zap, todo mundo riu disso, mas acabamos levando os nomes de seu pai e de seu avô.  Albert e David, quando erámos garotos nossa distração, era a deixar confusa, por mais que as roupas eram iguais, as trocávamos, para confundi-la.   Um dia nos ameaçou, que ia mandar fazer uma tatuagem em cada um com os nomes.  Ficamos pedindo que sim, queríamos as tatuagens, eu como um louco, pois me atraiam os homens com tatuagem.

Talvez o doador, fosse um homem tatuado, pensava eu.

Não frequentamos as mesmas escolas, nem tínhamos amigos em comum, pois a situação financeira das duas era diferente, mas íamos aos aniversários, quando crescemos íamos ao mesmas colônias de férias.  Até que nos desentendemos de um deles, o mais agressivo, o loiro de olhos negros, ele era brutal, adorava pegar meu irmão, sabia o distinguir de mim, não sei como.  Albert sempre foi mais frágil do que eu, na escola, eu tinha sempre que protege-lo, por isso nos gozavam, pois, estávamos sempre juntos.   Menos na sala de aula, que as professoras nos colocava a uma boa distância.   Quando passamos a escolher nossa própria roupa, comprar a mesma com nossa mesada, tínhamos gostos completamente diferentes.   Ele gostava de uma camisa polo, calças jeans justas, jaquetas de equipe de beisebol, eu ao contrário, amava uma camiseta, calças mais largas, bermudas no verão, sempre escorregando pela bunda, tênis, cabelos compridos, se acabou a coisa de irmos por ai, como dois vasos iguais.

Minha mãe permitia perfeitamente isso.

No secundário, como queríamos carreiras diferentes, íamos juntos, mas fazíamos classe distintas, eu queria fazer artes, desenhava como um louco, gostava também de moda, queria ir para estudar na Parsons School of Design ou na FIT, Fashion Institute of Tecnology, quando consultei minha mãe, ela disse que a Parsons poderia me abrir outros caminhos.

Meu irmão ao contrário queria estudar direito, ser advogado, nunca entendi essa escolha, ainda brincava com ele, como um banana mole podia  ser um bom advogado.

A partir desse momento de definições, fomos nos afastando, tínhamos amigos diferentes, eu nem conhecia com quem saia.   O meu grupo era diversificado, tínhamos negros, amarelos, gays, lesbianas, heteros, enfim era mais colorido.  Riam de mim, pois não tinha me definido ainda, tinha experimentado fazer sexo com garotas e depois de um tempo com um garoto da turma, não saberia dizer qual tinha me gostado mais.

Albert chegava sempre tarde em casa, quando lhe perguntava aonde tinha estado, me dizia, cuide da tua vida que teu grupo é o pior da escola.   Mas minhas notas eram fantásticas, poderia escolher uma bolsa de estudos para qualquer universidade.

Mal começamos a universidade, mudamos para um apartamento maior, com três quartos, ele reclamava que não podia estudar, nem se concentrar com as minhas loucuras, eu ajudava minha mãe em alguns trabalhos, para ganhar um dinheiro por fora, ela se surpreendia, pois lhe entregava inteiro.  Para ajudar em casa, sabia que ter o luxo de ter um quarto só para mim, com uma mesa grande no centro para desenhar, projetar meus trabalhos, custava caro.

No final do primeiro ano, Albert desapareceu, passou uns cinco dias fora de casa, ficamos como loucos, não atendia o celular nada.   Convenci minha mãe de ir a polícia, foi ela que o encontrou num lugar cheio de drogados, totalmente grogue, ficou mais de uma semana no hospital.  Eu mesmo não podia entender o que se passava.   Tentei falar com ele, me dizia que eu não o entenderia.   Quando estava em casa, tinha sempre a porta do quarto fechada a chave, não permitia que ninguém entrasse.

Ficamos preocupados, minha mãe lhe conseguiu um psicólogo, mas só foi a uma seção, antes de desaparecer novamente. 

Desta vez minha mãe correu como uma louca a delegacia, fez a queixa, nesse dia não tínhamos visto sair, quem falou que roupa vestia foi o senhor que trabalhava na portaria, disse que tinha entrado num sedan negro, mas que não tinha visto a placa.

O foram encontrar semanas depois atirado numa lixeira, dentro de uma bolsa destas que usam para levar cadáveres, tinham lhe cortado a cabeça, bem como as mãos, os pés, mas estava tudo costurado, com pontos de linhas coloridas.

Foi um choque para minha mãe, chegamos então a certeza que ele estava metido em alguma coisa complicada, o que tinha logica, sendo ele uma pessoa certinha, ela mesma disse ao inspetor, se fosse ele, que vive no meio de artistas, gente considerada louca tudo bem, mas Albert era quieto, calmo, não tem lógica.   Antes que a polícia revisasse seu quarto, encontrei um diário, sabia que quando ela o encontrasse, o levaria, tirei uma cópia do mesmo, assim depois o leria.

Não deu outra, o diário foi levado embora.

Dias depois, me chamaram para perguntar se podia ir a delegacia, me fizeram sentar frente ao dito diário, para ler o mesmo, mas ele não citava nomes, agora entendia que saia com alguém que curtia sadomasoquismo, drogas duras coisas do gênero.

Fiquei chocado, pois espera um tempo para ler o mesmo.  O inspetor que levava o caso, me olhou curioso.  Vocês como gêmeos deveriam saber o que o outro fazia.

Eu fechei os olhos tentando me lembrar de coisas, lhe disse que quando tínhamos ido ao último acampamento de verão, ele já tinha um grupo diferente, que tinha voltado estranho desse acampamento.   Eu participei de coisas de teatro, de leitura, ele honestamente não sei o que fez, estava com uma turma de filhinhos de papai, sempre com brincadeiras brutas.  O que eu não entendia porque ele era mais frágil de nós dois.  Quando lhe cobrei porque não participava das coisas comigo, me disse que o que eu fazia eram coisas de gays.

Estou confuso, o senhor me desculpe, nem sabia que tinha essa roupa preta com a que foi encontrado, no último ano, estive trabalhando com minha mãe, em duas montagens de teatro, bem como num filme.  Quase não o vi.

Sim, ele fala disso, que sente que te perdeu de vista, que devia ter te escutado.

Me passou as últimas páginas.     Vou te passar uma parte do relatório, porque mesmo tua mãe sendo uma mulher moderna, creio que a afetara.   Ele tinha o anus dilacerado, creio que alguém vinha abusando dele sistematicamente. Talvez por isso usasse roupas negras.

Sai dali, com as pernas bambas, o inspetor me alcançou, me fez sentar num banco de uma praça, não podia imaginar meu irmão nisso.  Ele era tão certinho, quando o encontramos drogado, já tinha sido uma paulada, eu quando muito tinha fumado marijuana, nada mais.

Quando liberaram o corpo para enterrar, o caixão estava fechado, eram muitos os conhecidos de minha mãe, os poucos diferentes eram Walter com o que era moreno, lhe perguntei pelo seu irmão, levantou os ombros, desde os dezoitos se foi de casa, não sabemos nada dele, a policia o procurou, mas não temos ideia.

Ficou assim, depois que invadiu uma noite a clínica de fertilidade, para descobrir quem eram os homens que tinham doado o esperma.  Depois disso, nunca mais soubemos dele.  Eu não me interessei.   Nessa época o vi algumas vezes com teu irmão, aliás depois da colônia de férias os dois andavam juntos com essa turma de metidos a duros.

No dia seguinte, com a dúvida corroendo minha cabeça, fui falar com o inspetor, a respeito. Eu nunca tinha gostado do Joseph, ele sempre estava provocando confusão, preferia o Brian que era mais tranquilo, mas depois quando ficamos maiores, só nos encontrávamos na colônia de Férias.

Comentei o que tinha me contado o Brian, mas nem tinha ideia do que poderia ter unidos os dois, voltei a ler o diário, alguma coisa não encaixava, num determinado momento ele falava no judeu, que tinha sido um encontro que ele queria muito.  Disse ao inspetor, só pode ser isso, Joseph, judeu, mas não tenho certeza se a senhora Walter seja ou não judia.

Eles ficaram de procuras saber aonde andava o Joseph.

 

Quando me chamaram novamente, a coisa piorou, o Joseph, tinha morrido mais ou menos no mesmo dia que meu irmão.  Seu corpo não tinha sido reclamado, tinha sim desenhado num dos braços por isso o identificaram, uma numeração.  Que era do doador, sua mãe disse que um dia apareceu com essa tatuagem como se fosse um judeu, mostrou para ela, dizendo que sabia quem era seu pai. 

A coisa piorou quando foram checar na clínica, realmente coincidia o dia mais ou menos que o Brian tinha dito que sabia que o irmão tinha ido a clínica.  Mas não se lembrava da historia da tatuagem, o vi um momento, saindo carregando uma mochila, minha mãe chorando. Nada mais.

Na clínica levantaram o historial do doador, era um homem que atualmente estava ingressado num hospital psiquiátrico, era um catatônico, drogas e muitas outras causas, um militar retornado da guerra que não tinha se ajustado.  Pela foto, ele era igual ao Joseph.

Tinham roubado também todo o historial do uso do semem do doador,  revisaram a autopsia do que creiam que era o Joseph,  não encaixava a dentadura,  revisando todos cadáveres desconhecidos, encontraram mais dois, com a mesma tatuagem de números, o último encontrado dava para perceber que a tatuagem tinha sido feita, pós morte, todos tinham morrido da mesma maneira que meu irmão, todos eram gays.

No final reconheceram que nenhum era o Joseph.  Voltaram ao hospital, com uma ordem para saber se a pessoa tinha recebido visitas. Havia sim um mister Walter, uma semana antes do assassinato do meu irmão.

Quando a polícia, conseguiu por fim levantar a ficha militar do mesmo, descobriu que tinha sido por baixa desonrosa, tinham encontrado o mesmo numa orgia sadomasoquista, numa de suas folgas, totalmente drogado, com o anus dilatado ele algemado numa espécie de cadeira de couro suspensa. Segundo o laudo, estava totalmente drogado.

Agora começava a fazer sentido tudo isso. Mas aonde estava o Joseph?

Ninguém sabia.  Tudo que se sabia que estudava medicina, tinha abandonado os estudos, dai talvez a destreza em fazer o que tinha feito.

Minha mãe estava abalada, aceitou fazer um filme em Los Angeles para se afastar de NYC, eu tinham um trabalho novo, não podia ir.    Estava desenhando o figurino de um musical, era minha primeira oportunidade.   Voltava todos os dias tarde para casa, notei que estava sendo seguido umas duas vezes, falei com o inspetor.

Lhe disse meus horários, o ensaios eram pela noite, tinha que os acompanhar, para transformar a roupa em algo prático.

Uma das noites ao sair, nem bem tinha andado dois quarteirões quando me agarraram por detrás, me chamando de Albert.  Por sorte dois policiais a paisana, que estava cuidando de minha segurança, sem eu saber, conseguiram depois de muita luta pegar o agressor.

Era o Joseph.  Gritava Albert me perdoa, eu te amava, eras o melhor de mim, mas tinhas que dar exemplo aos outros.

Dois dias depois conseguiram finalmente interroga-lo como devia.  Todos os outros eram de um grupo que estava sempre na Colônia de férias, sem querer ele tinha descoberto que a maioria eram de mães solteiras, que tinha tido óvulos fertilizados na mesma clínica.  Juntos na última férias tinham feito uma orgia, o mais fraco tinha sido meu irmão, que tinha sofrido abuso de todos, mas ele não contava se apaixonar por ele.   Quando se reencontraram, voltaram a sair juntos.   Gostavam de praticar sexo duro, um com o outro.  Quando tomavam drogas as coisas iam além.   Quando encontramos meu irmão a primeira vez, tinham participado de uma orgia com os outros naquele lugar, o abandonaram, pois, pensavam que estava morto.

Foi quando descobriu do seu verdadeiro pai, no hospital roubou sua ficha médica, fazia o mesmo que eles, orgias a troco de dinheiro, drogas. 

Entendeu seu prazer, mas começou a matar um a um, os que tinham provado a morte do meu irmão.  Fazia igual, que tinham feito com ele.  Nos exames médicos, seus braços estavam cheios de picadas de agulhas.  Se negava a ver a mãe, bem como o irmão.   Pediu se podia me ver.

Quando me viu ficou me olhando e chorando ao mesmo tempo, se eu o amava, devia tê-lo protegido melhor, ele era o mais frágil do grupo, deixou tudo acontecer, porque me amava desde criança.  Tu sempre o defendeste, mas ele dizia que não te entendia, como podias ser igual a tua mãe, serem iguais fisicamente, mas que mentalmente ele não era igual a ti.

Eu o amava, mas chegou um momento que as drogas puderam conosco, as orgias foram cada vez mais pesadas, quando o mataram, pensei que tinha ficado louco, mas consegui juntar suas partes para colocar naquele saco.   Iam jogar em vários lugares, ele não merecia isso, me perdoe.

Eu o olhava, não conseguia entender, porque meu irmão, não me tinha falado comigo a respeito, eu tentaria ajuda-lo.   Foi o que lhe disse.

Ele não queria mais tua ajuda, era um homem, tinha direito a escolher seu caminho.

Minha mãe tinha resolvido não voltar a NYC, me perguntou se queria tentar Los Angeles, não tinha parado de trabalhar desde que chegara, encontrarei trabalho para ti.  Separe os livros que gostamos, tudo que aches necessário, as coisas de teu irmão acho melhor que desapareçam para podermos guardar só o que temos na memória.

Isso podia ela, mas eu, sabia de toda a história, embora não entendesse o porquê de algumas coisas.

Resolvi sair dali, tudo naquele apartamento me fazia me lembrar do meu irmão, quando ela conseguiu uma casa, me avisou, mandei tudo que tinha ali que fosse importante, tinha avisado para virem recolher os moveis restantes, bem como as roupas, coisas do meu irmão, no que afastei a mesa que usava para escrever, encontrei outro diário, falava principalmente de nós dois.

Avisei minha mãe, que iria acabar um trabalho, fiquei num hotel em Times Square lendo o mesmo.  A data que ele começava, era de um aniversário nosso, eu lhe dei esse diário como presente.  Pois o tinha encontrado escrevendo num caderno, pensei ele gosta de fazer um diário, fui e comprei um.

Ele começava dizendo que eu era uma pessoa que se podia esperar isso, o observava nos menores movimentos.  Sempre estava preocupado com ele, o defendendo, querendo resolver as coisas por ele.   Começava a falar do amor que sentia pelo Joseph, com uns doze anos, que os dois tinham se masturbado escondido dos outros, que gostava do sabor da sua boca.

Mais adiante falava da primeira penetração, o prazer que sentia com o Joseph. Os encontros escondidos que tinham em casa, quando eu estava na escola, minha mãe trabalhando fora, as descobertas de prazer que iam tendo. As saídas escondidas dos dois.  Depois quase no final, falava do abuso sofrido no acampamento.  Dizendo que se eu soubesse, ia chamar a polícia, ia ser um escândalo, embora achasse que ele mesmo tinha provocado essa situação.  Gostava da violência, já que ele não era forte.

Essa parte li chorando, como podia ser, o ponto que nós tínhamos afastado tanto.  Que eu só pensava em trabalho, era como minha mãe, nos realizávamos fazendo nosso trabalho.  Que quando estávamos fazendo algo, o resto do mundo deixava de existir.  No caso dele, era quando estava sendo violado, adorava a sensação de pertencer a todo mundo, que a violência o fazia extrapolar junto com as drogas.

Levei o diário comigo, em seguida comecei a ir a um psiquiatra, pois sentia que tudo isso estava me desequilibrando.   Minha mãe entendeu.   Me bloqueei tanto que não podia mais ter relações sexuais.   Tinha um medo horroroso, as cenas que tinha imaginado estavam em minha cabeça.

Tinha feito um trabalho para um diretor francês, esse me convidou para ir fazer outro em Paris, pedi perdão a minha mãe, mas precisava me evadir.

O studio me arrumou um apartamento, aonde na verdade ia dormir.  A filmagem levou quase seis meses, mas foi importante, pois me desliguei completamente de tudo.  O diretor dizia que eu era confiável, pois esquecia até quem eu era.   Minha assistente me tinha que lembrar de tomar banho, de dormir.

Quando acabou, senti um vazio imenso.   Agora precisava de um lugar tranquilo para passar um tempo. Um dos atores me ofereceu sua casa em Cap D’Antibes, me deu as chaves, fique tranquilo ninguém aparece por lá.

Foi como entrar no paraíso, esqueci de tudo, escrevendo nossa história, agora juntava a sua com a minha, me lembrava dos comentários das pessoas, como éramos idênticos.  Agora entendia que ele odiava isso, o fato de sermos fisicamente parecidos, tudo que ele tinha feito para ser diferente de mim.  De como nem minha mãe, nem eu percebemos nada, que ele precisava de uma ajuda de um psicólogo.   Depois de tanto pensar, como era um observador nato, alguns signos que tinha passado por alto, coisas de seu comportamento, alguma que outra agressividade com respeito a minha mãe, por nos ter parido a partir de alguém que ela nem sabia quem era. Sem se preocupar com o que podia acontecer conosco.  Ou alguma brincadeira que eu fazia, querendo fazer um retrato dos dois juntos, mas diferentes.  No fundo como ele me dizia, eu te amo e odeio ao mesmo tempo, porque sei que tens coragem de enfrentar a vida de peito aberto.  Vais vencer.

Quando o filme que tinha feito, ganhou um Cesar, eu um outro pelo figurino, bem como  cenário, surgiram mais convites, avisei minha mãe que ficaria mais tempo, se ela queria vir, mas claro estava metida num filme complicado.  Quando acabe irei.

Tinha aprendido a amar esse meio, desde pequeno, metido entre suas pernas, olhando como desenhava, imaginava alguma coisa.  Era capaz de ficar quieto muito tempo observando tudo, mas que Albert, nem se aproximava, as vezes chorava, querendo atenção, mas era eu quem ia abraça-lo como sempre, primeiro me empurrava, pois queria minha mãe, não seu irmão.

As lembranças do passado foram voltando, fui me lembrando de detalhes, o quanto ele odiava que nos colocassem na frente do espelho, para ver como estávamos iguais.   Odiava isso.

Eu ao contrário amava, o amava com todas minhas forças.

Um dia nas filmagens quando estava provando a roupa de um ator, que tinha inclusive conhecido no anterior.   Me disse, que era impressionante, como eu não prestava atenção, a nada a não ser o que estava fazendo. 

Te enganas, queres que te diga, que vens fliteando comigo desde o outro filme, que me convidaste para almoçar umas duas vezes.  Isso?

Ah, então não passei desapercebido. Me tornou a convidar para almoçar no seu apartamento no final de semana.

Aceitei a contragosto, mas fui claro com ele, não estou preparado para ir para a cama com ninguém.    Não faço sexo desde a morte de meu irmão.

Ficou me olhando, imagino que alguma coisa te traumatizou, sem querer me vi contando para ele, segurando um copo com Coca-Cola, ele só balançava a cabeça.

Te entendo, me contou dias depois alguns detalhes de sua vida, que tinha chegado aonde estava, primeiro se prostituindo, depois que conseguiu um bom papel, deixou de fazer isso, mas trabalhou duro.   Depois amei uma pessoa muito mais velha do que eu, que era um artista completo, pois não só atuava, escrevia, pintava, imaginava as cenas.  Quando morreu, fiquei seco, só voltei a me interessar por alguém, quando te conheci no outro filme, pensei, esse homem é completo.

Passamos a nos encontrar, sair juntos para jantar, fomos passar um fim de semana depois do final do filme, em sua casa em Saint-Malo, ele tinha herdado a mesma de seu amor.

Ali passávamos tempo conversando, eu escutando os planos dele de dirigir um filme, quando fui avisado que tinha mãe tinha tido um enfarte, que estava muito mal, foi comigo para Los Angeles, ainda a encontrei com vida.   O reconheceu em seguida, disse seu nome, obrigado, tome conta de meu menino.

Me pediu perdão, tinha noção que não tinha estofo para ser mãe, mas eu acalmei, devo tudo a senhora, comecei a falar quando ficava vendo como trabalhava, como aprendi a amar esse trabalho a partir dela, morreu sorrindo.

Levei suas cinzas para ficar perto do meu irmão, recolhi algumas fotos, me livrei de tudo, voltei para a França.  Fui cotado para outro Cesar pelo trabalho que tinha feito.

Mas desta vez o trabalho seguinte, foi dirigir junto com meu amante, o filme que tinha imaginado, discutíamos tanto tudo, que era capaz de imaginar as cenas completas, ele se admirava desse meu lado.

O filme foi um sucesso, foi também o lançamento dos dois como diretores.

Escrevi um texto baseado no que nos tinha acontecido, claro, mas mudando a história, de dois irmãos gêmeos, mas totalmente diferentes um do outros, desde a infância, como vão tomando caminhos opostos.

Minha gente pensou que era totalmente minha vida com meu irmão, disso só tinha tomado a ideia, não ia expor sua memória, para que falassem dela.

Nunca mais voltei ao Estados Unidos, pensar em ir a New York, era como pensar em tocar na ferida outra vez.   Agora que estava em paz, disfrutava do que a vida tinha me dado.

Quando não estávamos trabalhando, ficávamos em Saint-Malo, falávamos o dia inteiro sem parar, as pessoas não entendiam isso, mas nos completávamos.  Fizemos mais uns quantos filmes juntos, alguns ganhamos prêmios, outros só aplausos.  Isso bastava.

Escrevíamos alguns, juntos, quando ele quis contar sua história, escrevi por ele, como me tinha contado.   Foi um grande sucesso, a dirigimos juntos, como uma catarse.

Ao final olhando para trás, apesar de tudo posso dizer que fui feliz.  Sentirei sempre porque meu irmão não foi em frente, mas o amarei sempre.

 

 

 

 

 

 

 


    

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