lunes, 6 de julio de 2020

GET AWAY


                                                       GET  AWAY

Tinha escapado outra vez da casa aonde estava sob custodia, era sempre mais o mesmo, queriam abusar dele.  Agora com 16 anos, já não era um tonto, com 12 anos tinha conseguido escapar, delatar o sujeito que estava abusando dele.  Um pédofilo procurado, tinha sido vendido basicamente pelo sistema.   Quando o recolheram, prometeram que se testemunhava contra o sujeito, cuidariam dele.   Nada aconteceu, acabou o juízo, foi levado para um albergue de menores, de aonde não podia sair, em seguida, outra vez sobre a guarda de uma família que era desconcertantes, pois ora o homem, ora a mulher invadiam seu quarto atrás de sexo.
A mulher dizia que a culpa era dele, ser um moreno tão bonito.
Nem sabia direito quem era, pois tinha ido passando de mãe em mãe, o que se dizia seu pai, era um louco de muito cuidado, tinha uma aparência espetacular.  Fazia com que as jovens se apaixonassem por ele, dizia que precisava de alguém para ajudar a cuidar do filho, quando a coitada já estava na sua rede a colocava para se prostituir, passar drogas.                  Elas nunca o denunciavam pois achavam que ele as ajudaria.   Só uma não caiu nesse conto, o denunciou, foi preso, condenado, descobriram muitas coisas no seu passado.             O teste de ADN, dele, não coincidia com o meu, fui levado em seguida para um orfanato.  De lá adotado num sistema mal cuidado por um casal, logo fui vendido.    Assim fui levando a vida. 
Desta vez tinha jurado que não voltaria para o sistema de governo, ia arrumar minha vida de qualquer maneira.
Estava ali na parada de ônibus, abaixo de uma chuva torrencial, quando parou um carro ao seu lado, o sujeito já tinha passado antes, ele sabia o que o homem estava buscando.   A conversa mole, queres companhia nessa chuva toda.  Esta ameaçando um temporal de fazer gosto. Venha moro perto.
Ele aceitou, pelo menos, quem sabe podia dormir numa cama.  Mas mais uma vez viu que tinha errado no seu juízo.   O sujeito era daqueles, cheio de músculos, forte, com a cabeça raspada, apesar de tudo conforme o ângulo, era bonito.
Quando entraram na casa, ele já temendo o pior, ficou de sobreaviso.  Viu que o homem tinha todas as janelas fechadas por dentro com cadeado, a porta da cozinha também, o banheiro tinha a janela tapada.  Mal entraram ele fechou a porta com outro cadeado, estava prisioneiro.   O mesmo disse como desculpa, estavam na zona dos tornados.    Estava ameaçando um, que parecia forte.   Realmente o vento fazia um ruído na casa imenso.
Tentou alcançar as chaves, que estavam presas na calça do homem, este lhe deu um murro no peito o jogando longe.  Não tente me roubar.
Eu só quero a chave do cadeado para ir embora.
Nada disso, ainda não fizemos sexo, garanto que vamos fazer muito.
O levou para a parte de baixo da casa, aonde ele viu, aqui posso gritar, que ninguém vai me escutar.   Porra estou fudido.
Viu ali toda espécie de aparelhos para musculatura.   O sujeito, simplesmente arrancou sua roupa, mas quando ele pensou agora ele vai me arrebentar, nada, ficou parado olhando para seu sexo.  Não me enganei, poderemos nos divertir horrores.  Começou a o provocar de todas as maneiras, mas ele estava desesperado, não conseguia ficar excitado.  O homem o algemou mesmo ele lutando contra ele, numa tabua que estava ali meio inclinada.  O fez cheirar algo de um vidro, mesmo contra sua vontade ficou com o sexo duro.  O outro fez de tudo com ele, não podia se mexer ou defender.  Tentou com as pernas dar-lhe patadas, levou foi um puta murro na cara.
Tens que colaborar bonitão, pretendo fazer muitos vídeos contigo.   Os velhos vão adorar, ver esse caralho bonito, moreno.
O deixou ali, ele escutava movimento no andar de cima, mas perdeu a noção se era dia ou noite.   Vou ter que ser engenhoso se quero sair daqui.
Ele desceu com um prato com um sanduiche, coca cola de lata, o soltou, vê se te comporta, abriu um armário que estava na parede, feito de madeira bruta.  Viu uma quantidade de CDs arrumado em fila.  Tudo garotos com quem fiz sexo.
Todos colaboraram, depois foram embora tranquilos, pelo sorriso dele, viu que de tranquilos nada.
Ele colocou uma rádio, com notícias, está dizia que o tornado alcançaria terra dentro de momentos, que todos estivessem abrigados.  Talvez seja minha chance nesse momento, o homem olhava para ele, passando a língua nos lábios.  Não terei como escapar disso, seu caralho ainda estava sob efeito do que ele o tinha feito cheirar.  Passava por ele o alisava, tentava beija-lo. Mas era bruto em tudo que fazia.   Ouviram um estrondo imenso, parecia que a casa se balançava, ele subiu correndo a escada, tinha certeza que se ficasse o homem o mataria, ficaram correndo na parte de cima, como num jogo de gato atrás do rato, não havia muito aonde se esconder, num determinado momento, quando já estava quase sem folego, ele foi se aproximando, com uma faca na mão, desta vez tu passaste não acabou a frase, o teto inteiro desabou em cima dele, as vigas todas da casa de madeira, caíram sobre suas costas.  Ele correu na parte de baixo, procurou roupa para vestir, encontrou roupa que devia ter sido de algum outro garoto, cheiravam a mijo, seja quem fosse tinha mijado na calça, não importava, uma camiseta que também cheirava a mal,  escutou outro estrondo, se caia mais uma parte da casa.
Apesar das luzes piscando, viu que no armário aberto, tinham um portátil, bem como uma caixa de metal. As chaves estavam na porta, procurou uma que pudesse abrir a caixa, dentro muito dinheiro, bem como uma agenda de direções, deviam ser seus clientes.  Na parte de baixo viu uma mochila de couro negra, enfiou o dinheiro dentro de um saco de plástico meteu tudo ali.
Buscou um casaco para sair no meio do temporal.  Calçou seus tênis velhos, ainda dava para usar, todos seus movimentos eram automáticos, desesperados.
Pegou uma barra, que dessas que se usam para colocar pesos, subiu, viu que ele tentava sair debaixo das vigas.  Chegou por detrás, acertou na sua cabeça a barra várias vezes, viu quando ele caiu. Foi a cozinha lavou a barra, desceu, a colocando no lugar.   Esses anos todos presos em casas desconhecidas, aonde o que podia fazer era ver filmes, por puro instintos, pensou tenho que destruir tudo, levou as chaves para cima, abriu a porta da cozinha, que dava para uma garagem.   O carro estava ali, viu vários galões com líquidos amarelos, cheirou, era gasolina, subiu com dois, foi jogando nos moveis, gastou esses dois, voltou por mais, um derramou pela escada abaixo, inclusive no armário.   Foi até o homem, se lembrou de um filme que o sujeito coloca o celular no micro-ondas, esse explode, colocando fogo na casa, de um outro filme Shooter o ator Mark Wahlberg, explode a casa, rompendo a tubulação do gás,  procura como tinha visto no filme a ligação, a rompe abre a porta da cozinha, joga uma caixa de fosforo que estava por ali, na gasolina, foi como se iniciou o incêndio.   A explosão já escutou um tempo depois escondido detrás de um tronco de árvore imenso que tinha caído com o tornado.
Depois correu o mais que pôde, com a mochila nas costa, com a chuva lhe atrapalhando a visão, vais adiante, viu como um celeiro, a casa tinha voado inteira, mas o celeiro só estava inclinado, não viu viva alma.    Ali encontrou um baú cheio de roupas de algum garoto de seu tamanho, inclusive umas botas, de couro.  Trocou rapidamente a roupa molhada, a colocando num saco de lixo.     Como lhe ficavam bem, escolheu mais uma calça jeans velhas, bem como camisa de quadros, camisetas, uma cueca já amarela pelo tempo.
Nesse momento a chuva e o vento, deram uma parada, saiu correndo, por detrás se via uma estrada em direção a cidade de aonde tinha vindo.  Sabia que a parada não estava muito longe, viu ao longe ainda as chamas da explosão.   Correu tudo que pode.  Quando estava na parada passou uma senhora num chevrolet velho, parou dizendo, hoje não creio que apareça ônibus nenhum por aqui, vou a cidade mais próxima, que está fora do círculo do furacão, esse vai voltar logo, é um perigo ficar ai.   Era uma senhora de idade.
Não parou de falar, sem perguntar nada a ele, minha casa ficou arrasada, o celeiro meio caído, menos mal que me abriguei na casa de uma vizinha que é de material resistente, vou para a casa da minha filha, os telefones não funcionam.    Parece que a casa do homem estranho que se mudou a meses atrás, foi destruída por uma explosão.   Aquele homem me metia medo.
Estava sempre com todas as janelas fechadas.  O único momento que perguntou o que fazia ele por ali.   Estava esperando um ônibus, para ir para San Francisco, foi o nome que saiu nesse momento.
Então te deixo na estação de ônibus.  Acho que tem um que sai dentro de duas horas, disse olhando seu relógio.   Como é seu nome?
Mark Berg, disse usando o nome do ator, mas só o final de seu sobrenome.
Muito bem Mark, espero que o tornado não alcance o ônibus, riu muito de sua piada.
O deixou justo na frente da estação.   Espere, abriu uma bolsa que estava no chão, minha amiga é exagerada, me deu dois sanduiches imensos, não acredito que bar da estação esteja funcionando.   Pelo menos ainda estava seco.
Viu numa placa que o ônibus para San Diego saia em 15 minutos, correu ao guichê, pedindo um bilhete, o homem mal olhou, se tivesse olhado, teria visto um garoto assustado.
Até a metade do caminho, só tenho um lugar no final do ônibus, depois troque de lugar. 
A ele lhe importava uma merda isso, pagou, entrou correndo no andem da estação, viu aonde estava o ônibus, o condutor já estava dentro, vamos, que o temporal volta em minutos, se consigo pegar a estrada, será mais fácil.
Mesmo assim o começo da viagem foi emocionante, pois ao longe conseguiam ver os estragos que fazia o furacão, animais voando, telhados desaparecendo num sopro.   Parecia um filme de ação, ficou colado a janela, até que toda essa paisagem desapareceu, ficou escuro como a noite, começou a chover sem parar.    Na parada seguinte, uma família que estava mais à frente desceu, mas não subiu ninguém, o condutor ainda esperou uns minutos, mas nada.  Creio que com esse tempo desistiram da viagem.  Seguiu o caminho, ele mudou de lugar, pois o final do ônibus era desconfortável.  Em seguida se relaxou, usou a mochila que com as roupas, lhe serviam de travesseiro, ao mesmo tempo que a protegia com o dinheiro que tinha dentro.
Não tinha ideia de quanto tinha, mas era algo para ele começar a vida. Dois dias e meio depois iria chegar a San Diego, ficou tentado em várias cidades a descer, principalmente em San Antonio, ou Tucson, ao descer na Estação, mudou de pensamento, se me buscam, irão a San Diego,  comprou um bilhete para San Antonio, tinha deixado no ar, San Francisco e San Diego, se é que iam procura-lo.
Quando chegou a San Antonio, buscou um hotel pequeno para se hospedar.  Nessa noite contou o dinheiro que tinha na mochila, tinha mais de dez mil dólares em notas grandes.  Uau pensou, posso me virar, mas na verdade preferia procurar um trabalho.  Entrou numa loja que vendia de tudo, comprou umas calças, bermudas de surfistas, duas camisetas, cuecas e meias, viu um tênis barato também colocou no carrinho.
No caixa quando estava pagando, perguntou se não sabia de nenhum emprego para um jovem, preciso trabalhar.
O homem chamou uma senhora de cabelos compridos brancos que estava falando com outra senhora.   Melissa, não procuravas alguém para fazer pequenos serviços, o rapaz está procurando emprego.
Ela o olhou de cima a baixo, que sabes fazer?
De tudo um pouco, vivi em casas de acolhida, aonde me faziam trabalhar de tudo, até cozinhar um pouco eu sei.  A mim me basta olhar para aprender, gosto de prestar atenção aos outros trabalhando, nunca se sabe se vamos precisar ou não.
Como te chamas?
Mark Berg, nem sei por que tenho esse nome, já que meu pai era mexicano, minha mãe não sei, pois nunca a conheci.
Bom eu moro perto da praia, posso precisar que venhas comprar material para mim, passar máquina no jardim que dá para a praia, as vezes preciso de algumas coisas da cidade. Sabes conduzir?
Não mas posso aprender, ou posso ir de ônibus se for longe, ou andando se for perto.
Bom tenho um pequeno apartamento no fundo da casa que antigamente quando vinham muitos surfista por aqui eu alugava, mas acabavam me dando dor de cabeça.   Podes ficar lá, tem cama, banheiro com chuveiro, até uma pequena piscina.
Ela transmitia confiança. Na caminhonete velha, foi dizendo que era pintora, mas hoje em dia vivendo de sua velha gloria, pois ninguém se interessava mais por seu tipo de pintura, herdei de meu marido, essa casa, por isso vivo aqui.  Não é nada demais, na verdade não passa de uma cabana, no meio dessas casas de veraneio.
Tens bagagem?
Não senhora, só o que acabei de comprar, essa mochila, com outra muda de roupa, mas a cueca já está cheirando mal, bem como a bota.  Tenho que jogar fora, pois estiveram molhadas, nem eu aguento o cheiro. 
Devias ter comprado um chinelo para andar pela praia, mas no puxado atrás, deve ter alguma esquecida pelos surfistas.
Quando chegaram mostrou primeiro o lugar para ele, ficava na frente da praia, ele ficou deslumbrado, era muito bonito.  Depois de colocar o carro num puxado ao lado da casa, lhe mostrou o que ela chamava de apartamento,  era um quarto comprido, com uma cozinha num armário, bem como um banheiro pequeno, mas ele podia tomar o banho ali.
Devias ter comprado escova de dentes, sabonete, bom eu te arrumo isso, da próxima vez, compras, reponha na minha dispensa.  Venha lhe vou dar uma toalha de banho, roupa de cama, depois também compras para ti, pois sou muito desligada, sempre me esqueço de comprar essas coisas.   A cozinha de sua casa era boa, grande, ali estava a televisão, com duas poltronas, faço meu final de dia aqui, ou sentada na varanda vendo o por do sol.   Não gosto muito de cozinhar, faço o básico.  De noite sanduiches.  Ao falar isso a barriga dele começou a roncar.
Ela riu, toma a toalha o sabonete, a roupa de cama, tome um banho, jogue essa roupa suja no lixo, bem como essa bota, agora sinto o cheiro.
Ele fez isso, quando saiu do banho, ela o chamou, vamos sentar na varanda da frente, olhar o pol do sol acompanhada, será bom,  deu uma lata de coca cola para ele, atravessaram o salão ele ficou de boca aberta, o salão era seu studio de pintura, ficou parado na frente de um quadro que era a paisagem de um por do sol.  Chegou a sentir lagrimas nos olhos de tão bonito que era.
Ela sorriu, ganhaste meu coração garoto.  Amanhã durante o dia, me limpas o studio, eu te mostro meu trabalho.  Se sentaram fora, ficaram vendo o por do sol  em silencio, era impressionante, a praia estava vazia.
No sábado iremos a um lugar que fazem um mercado, isso se fizer sol,  ali aproveito para vender telas pequenas com paisagens, que uso como dinheiro para comprar material, algo de comida.  Assim economizo, me ocupo também, enquanto não vem o click para pintar algo grande.
Se sentia bem ali com o corpo lavado, a cabeça parecia que tinha barro de tanta sujeira que saiu. Ficou super contente.                       
Ela disse que gostava de dormir cedo, no verão é mais problemático, porque tem muito turista, no final de semana sempre, gente que vem ou de San Francisco, ou de Los Angeles, que tem casa aqui na praia.
Se tem ondas, muitos surfistas, jovens, os que tem carro, essas coisas vão a outras praias.
Pela primeira vez em dias dormiu contente, enfiou a mochila no fundo da cama, se ela tentasse pegar, ele saberia.
Mas acabou dormindo como uma pedra, só despertou com o ruído na casa.  Se levantou lavou a cara, colocou uma camiseta nova, as bermudas de surfista, como ela disse, ali tinha uma sandália dessas de dedo.  Descobriu também uma bicicleta que os pneus estavam murchos além de um skate.  Isso ele sabia usar.
Ela o chamou para tomar café.  Depois o levou para o studio, varra tudo por aqui, tinha um pote cheio de pinceis sujos, ela lhe ensinou como limpar, como os deixar secando.  Tinha um bloco imenso num cavalete preso com uma pinças, o desenho de um homem, velho, cheio de rugas.
Ao lado uma foto de aonde estava tirando o desenho.   De um viagem a Marrocos que fui, a muitos anos atrás com meu marido, ele escrevia, eu pintava, ficamos mais ou menos 3 anos percorrendo o Pais, por isso tenho muitas fotos que estou usando agora.
Veja esse quadro, era uma garota, com um menino pendurado atrás, recolhendo ervas, muito bonito, a expressão da garota era de tristeza.  Quando comentou isso, rapidamente ela respondeu, a vida das mulheres nesse lugares é uma merda, estão desde criança fadadas a serem uma mulas de carga.   Os homens não fazem grande coisa, a maioria fica rezando ao Alah, tomando chá.
Quando ele acabou de limpar os pinceis, pediu que limpasse umas espátulas, tenho horror a fazer isso, com os anos piorou, explicou como se limpava, deixar de molho, ir raspando uma com a outra.
Olhe a geladeira, vê se consegue preparar algo de comida com o que tem.  Para mim pode tostar pão.
Ele olhou, procurou aonde cozinhar, preparou uma salada com o que tinha na geladeira, depois fez ovos fritos dois para cada um, tostou o pão.
Quando a chamou, teve que o fazer várias vezes, estava tão concentrada no que fazia que não via mais nada.
A chamou de perto, ela levou um susto, me esqueci de ti.
A comida vai esfriar.
Se sentaram para comer, disse que os ovos estavam como ela gostava, para molhar com o pão, me lembre de te dar dinheiro para comprar comida no supermercado, lhe explicou como ir.
Vou arrumar aquela bicicleta que está no quarto detrás.
Era do meu marido, creio que ao lado do supermercado tem um senhor que arruma. Ele sempre levava lá.
Lhe deu dinheiro, para compras, a bicicleta ele disse que tinha um pouco de dinheiro.  Foi andando até aonde ela tinha falado, deixou a bicicleta com o homem, que ia arrumar enquanto ele fazia compra.   Tinha olhado tudo que faltava na geladeira. Anotou mentalmente, não sabia escrever direito, ler sim, mas escrever tinha dificuldade.
Comprou com seu dinheiro, blocos de desenho, lápis de cor, um estojo de aquarela de criança, de tarde se sentou olhando o mar, foi desenhando, depois tentou usar a aquarela, ria como uma criança, porque ia fazendo por intuição, não notou que Melissa estava atrás dele olhando.
Não está mal, mas o papel não é apropriado para isso, espere, foi buscar um bloco especial para aquarela, lhe explicou como se fazia. Tens quer ser rápido, pois o papel absorve a tinta, precisas tentar colocar uma por cima da outra para dar certo, fez um exemplo para ele.  Entendeu?
Sim, vou experimentar, um pouco depois fazia numa velocidade boa para quem faz aquarela.
Ela ficou admirada com a destreza dele, foi ensinando ele a trabalhar.   No final de semana, se sentou depois de suas obrigações, observando os surfistas, pintando os mesmo, ia fazendo tirando a folha do Bloco para  secar, as vezes retornava a mesma para mais alguns detalhes.
Melissa estava encantada com o trabalho, lhe ensinou como fazer sua assinatura, com um pincel mais fino.  Podes fazer um M.B. junto o ano. Assim documentas que época pintaste isso.
Ele sorriu sem graça, disse para ela, na verdade não sei meu nome, pequei esse nome de um ator de cinema, abreviei para não ser igual ao dele, Porque para mim é difícil escrever o nome inteiro dele.
Não sabes escrever?
Muito mal, nunca ia a escola tempo demais, pois ou era abandonado, ou ia para outra família, algumas não me colocavam em nenhuma escola, queriam o dinheiro que o governo paga para elas.
Vamos resolver isso, vou arrumar uma professora para ti, mas tens que te aplicar.
Tinha uma vizinha na parte de trás, tão antiga como ela ali na praia, tinha sido professora, quando ele lhe quis pagar.        Disse que não cobrava, porque seria uma distração para ela, se aborrecia de não ter o que fazer.          Ficou pasma com a facilidade que ele tinha de aprender, misturada como desejo de saber mais.   Ensinou tudo o que pode para ele, inclusive matemática prática, de como conferir um troco, coisas assim.   Uma vez por semana ele fazia compras para ela nunca ficava com o troco, prestava contas exatas.  Melissa achava isso engraçado, porque os de sua idade, com certeza iriam ficar com o troco.
Sempre tirava tempo para andar de skate pela linha de praia, pois mais adiante havia uma avenida que na verdade não passavam carros, era como um passeio largo acompanhando a praia.
Depois se sentava ali na frente da casa, desenhando ou fazendo aquarelas, quanto teve uma boa quantidade, acompanhou Melissa a feira, ajudou a carregar a barraca que ela usava, a arrumar os quadros pequenos, o ensinou a colocar as aquarelas, num envelope, que um lado era transparente.  Resulta que no primeiro dia ele vendeu todos, gostavam da coisa do surf.
Para a próxima prepare mais, vou te ensinar a trabalhar com tinta acrílica, que pode ficar melhor, preparou das duas coisas, um dia ficou de boca aberta, ao longe apareceu um veleiro, ele foi desenhando a aproximação do mesmo, depois ficou na linha atrás dos surfistas.   Ele desenhou e pintou os dois juntos.
No dia da feira, foi vendendo, até que parou um casal na frente deles, dizendo olha nosso veleiro aqui, o rapaz nos acompanhou.  Era um homem alto, com uma mulher muito bonita, um rapaz da idade dele.  O  mesmo disse que o tinha visto desenhando na praia.
Não sabes fazer surf?
Não, mas gosto de olhar mais do que pensar em fazer.
Nos dias de feira de peixes, ia ficava anotando detalhes dos peixes, passou a ilustrar com eles seus desenhos.  Cada vez ia acrescentando mais coisas.
Os anos foram passando, quando acreditava que fazia 18 anos, já tinha aprendido a conduzir a caminhoneta de Melissa.  Mas precisa de documentos.
Um dia a viu remexendo umas gavetas, procurando documentos.  Até que achou.
Meu filho morreu no Marrocos, contraiu uma doença, nunca disse aqui que tinha morrido, que achas de usar o nome dele oficialmente.
Como era o nome dele?
Robert Montgomery, mas podes seguir usando esse de Mark Berg como se fosse teu nome artístico, fica melhor.
Foi com ele, tirar os documentos, meu filho precisa de seus documentos, para tirar carteira de motorista.  Atualizaram tudo, oficialmente ele era agora Robert Montgomery, além de filho da Melissa.
Agora ela a levava a todos os lados, um dia pediu para colocar na caminhoneta os quadros grandes que estava no studio.    Os embalou todos antes, depois entre um e outro, colocou lençóis velhos que ela usava para limpar pinceis.
Quando chegaram a San Francisco, ela tomou a direção, pois conhecia o caminho aonde iam.
Foram a uma galeria, que comprou todos os quadros dela.  Dali foram a um banco, ela abriu uma conta no nome dele, depositando tudo.  Assim se me acontece alguma coisa, estas coberto, depois ela foi a um advogado, lhe mostrou ali perto uma loja de material de pintura, os alunos de Belas Artes, compram ali.  Leva meu cartão de artista, diga que é uma encomenda para mim, olhe o que queiras, assim podes seguir pintando. Ele fez todas as encomendas dela, foram dormir num hotel, ela se registrou com seu nome, o apresentou como seu filho.
No dia seguinte foram visitar um museu, que ela queria mostrar umas obras suas antigas, que vais gostar, são de uma época que pensava diferente.
Tinha um muito grande, ele ficou sentando num banco mais atrás admirando.  Te sentias exuberante não é, qual idade tinhas.
Quando ela disse, ele sorriu, estavas solteira e apaixonada, não é verdade.
Sim, mas era por outro homem, o verdadeiro pai de meu filho, me abandonou no dia que ele nasceu, disse que não tinha madeira para ser pai. 
Mas quando me casei, meu marido adotou meu filho.    Infelizmente ele não viveu muito, tinha uma saúde frágil, no Marrocos contraiu uma doença normal ali nas crianças, mas não resistiu.
Agora que falas nisso, quando eu morrer levas minhas cinzas para enterrar com ele, vou deixar escrito aonde ok.   Foi em Fez uma das antigas capitais do pais.  Foi lhe falando da cidade, da sua cor, do Zocco, era como se ele estivesse vendo, eram tantos os detalhes que ele ficou com a cabeça cheia.   Em casa tenho uma serie de fotografias de lá, depois te mostro.
Agora dava aulas para ele de pintura a óleo, lhe foi aumentando o tamanho dos quadros, em breve os dois dividiam o studio.
Um ano depois, estava trabalhando, quando olhou para ela, estava sentada, sem se mover, ficou assustado, chamou uma ambulância como tinha aprendido fazer.  Eles a levaram para o hospital, ela tinha tido um pequeno enfarte, mas em consequência disso passou a ter os movimentos complicados, ficava horas sentada na varanda, as vezes a via falando com alguém.             Um dia perguntou com quem falava.   Com meu marido, com meu filho, amigos que já partiram.  Explicou a ele o que deveria fazer se ela morresse, quero ser cremada, nada de missas ou qualquer outra coisa.  Lhe entregou um cartão, chames imediatamente esse advogado. Se for num final de semana, chame esse outro número que é o seu particular.   Escreveu num papel tudo como queria.
Ele pediu se ela podia posar para ele, fez um quadro grande dela sentada numa cadeira da varanda dessas trançadas, com um vestido florido que tinha, com seus imensos cabelos brancos soltos pelos ombros.    Ele pensou que não conseguiria, mas ela ficou emocionada ao se ver através dos olhos dele.
Está perfeito meu filho, agora só o chamava assim, nunca podia imaginar que herdasses de mim o talento, as vezes confundia realmente ele com o filho que tinha tido, o chamando inclusive de Robert ou Bob.
Os da galeria vieram visita-la, ela pediu para ele mostrar todos os quadros que tinha feito do Marrocos a partir das fotografias dela.   Parece como se estivesses lá, ela teimou dizendo que seu filho tinha estado lá com ela.  Ele tinha escutado ela falando de cada fotografia com tanta paixão, que sentia isso ao pintar.
Ficaram interessados em fazer sua primeira exposição.  Quiseram lhe oferecer um contrato, ela telefonou ao advogado que mandou um rapaz recolher o contrato para ver.   Disse ao Robert pois o conheciam assim, que não assinasse nada, que fosse sempre livre.
Marcaram a exposição, parecia que era ela que ia expor, foram juntos para San Francisco, ele disse como era para colocar os quadros, disse para escreverem ao lado a história, ela ditou a uma secretária o que devia escrever.  Ele tinha pintado suas memorias.  Ela nunca tinha pintado nada de lá, porque lhe lembrava o filho.   Agora que ele voltou, eu amo isso.
Na inauguração, estava sentada num cadeirão como num trono, falando com as pessoas, os que a conheciam murmuravam, como esse reencontro com o filho lhe fez bem, está menos agressiva.
Venderam 90 por cento dos quadros, saiu matéria no jornal.   Ele só não quis vender o quadro grande dela.
Semanas depois morreu dormindo, com um sorriso nos lábios, ele pensou ela encontrou com o marido e o filho.   Avisou o advogado, ela deixou uma serie de coisas para serem feitas, não tenho experiencia nenhuma nisso.
Um deles veio, providenciou tudo, como ela queria ser cremada, num caixão simples de pinho, com a mesma roupa do quadro.  Que ele levasse suas cinzas para Fez, tinha uma indicação, tumulo número 97.
Ele devia depois escutar a leitura do testamento.
Perguntou que é um testamento.  O advogado lhe explicou.
Foi até lá com o coração apertado, teria que deixar a casa aonde tinha sido tão feliz, tinha aprendido uma nova profissão ali.  Agora tinha dinheiro no banco, não só o que ela tinha depositado, bem como o da sua própria exposição, numa das vezes que foi ao centro da cidade depositou o dinheiro que tinha escondido, não tinha usado quase nada.
Estranhou, pois pensou que teria mais gente para escutar o que o advogado ia falar.
Eres como seu filho o único benificiário de seu testamento, ela te deixa tudo, a casa, o dinheiro que tinha no banco, bem, como a caminhoneta.  Deixou uma carta para ti também.
Voltou para casa, agora era dono de uma, depois iria ao banco, se sentou na varanda para ler a carta.
Meu querido Bob,
No dia que te vi na loja, primeiro levei um susto, eras parecido ao meu filho, tinha a mesma cor de pele dele, dos olhos, esses teus cabelos que estavam tão sujos.
Quando te vi desenhando pela primeira vez, pensei meu filho vive nesse garoto, passei a te amar como se fosse ele, tratei de te ensinar tudo que sei, pois tenho certeza que serás melhor do que eu fui.
Eres rápido desenhando, eu sempre fui lenta, por isso fazia fotografias.
Encheste meu final de vida, que não podia ser melhor, te deixo o meu studio, tudo o que possa possuir, só te peço aquilo que te disse, leve minhas cinzas para perto do meu filho.
Um beijo nesse teu coração imenso.    Melissa.
Ele ficou ali na varanda, tinha realmente perdido a mãe que nunca tinha tido,  olhava agora o por do sol, com que esperando que ela viesse se sentar ao seu lado.   Continuava dormindo no quarto detrás.
Nunca tinha subido ao andar de cima, era somente dela.
Foi uma surpresa, encontrou quadros dela quando jovem, fotos imensa dela, sentada como no quadro que ele tinha pintado.  Ela o marido, o filho, esse realmente se parecia com ele.
Quando recebeu as cinzas, procurou saber como devia fazer para ir até Fez.  Dali não havia voos diretos, na agência de viagem lhe aconselharam ir até Londres, de lá a Casablanca, alugar um carro, ir a Fez.    Lhe arrumaram um Riad para se hospedar.  Lhe explicaram que a maioria falava francês, mas alguns falavam inglês.
Conseguiu uma licença para levar as cinzas, dentro de uma maleta de mão.  Fez um voo San Diego, Londres, de lá outro até Casablanca, eram muitas horas de voos para quem nunca nem tinha subido num avião,   Arrumou um hotel, perto da praia para se hospedar.  Ficou dois dias ali, sentando olhando o mar, estava guardando tudo na sua cabeça.   Mas no segundo dia, saiu com seu bloco de desenho, sentou-se no cais, começou a desenhar tudo, as crianças vinha ficar perto dele.  Ele lhes dava uma moeda, ela se sentavam quietas para que ele as desenhassem, ficavam impressionada com a rapidez com que ele desenhava.  Alguns realmente posavam, gostavam de fazer isso.
Falavam com ele em sua língua, era como se ele as entendesse.
No dia seguinte recolheu o carro comprou um guia, conversou numa agencia de viagem, que lhe fizessem um roteiro,  iria primeiro a Fez para cumprir sua obrigação,  depois iria devagar aos lugares que lhe interessavam.
Lhe traçaram um roteiro.   Iria direto a Fez, aonde tinha o Riad reservado, de lá na volta iria visitar umas ruinas romanas, entre Fez  e Mequinez,  lhe disseram o que visitar lá.  Foram reservando para ele todos os Riad.  Voltaria a Casablanca, de lá iria bordeando o mar até Esauíra, lá ficaria 10 dias num Riad, depois iria a Marrakesh, a Uazazate, voltaria a Marrakesh, Casablanca, por último se ele decidisse a Rabat, mas lhe disseram era francesa demais.
Levou três meses fazendo esse viagem, a quantidade de blocos de desenhos que comprou era imensa, caixas de lápis de cor, outra quantidade, ainda material para aquarela.  Em alguns lugares dormiu no furgão que tinha alugado, em praias, em aldeias de pescadores, aonde parava para conversar, desenhar.   Estavam acostumados com turistas que faziam fotos, mas que desenhasse não. Ainda mais que tinha a mesma cor que eles, deixou os cabelos crescerem, estava sempre com um turbante em volta da cabeça, como eles usavam.  Sem sentir foi aprendendo a falar, a entender o que lhe diziam.  Em Esauíra, se deliciou desenhando, fazendo aquarela dos barcos, de uma praia cheia de surfistas.  Um deles inglês, lhe perguntou se queria fazer sexo, pensando que ele era dali.  Quando disse que era americano, ficou olhando para ele, nesse dia ele se questionou, porque nunca se interessava em fazer sexo.  Talvez pelo que tinha sofrido, não sabia explicar.
Em Marrakesh, fez a mesma coisa, entrou nos palacios que podia se visitar, desenhou os pátios, contratou um guia que o levou aonde ele tinha pedido.  Foi visitar a casa Majorelle que pertencia ao YSL, passou horas ali desenhando, bem como La Cotovia uma torre impressionante de uma mesquita. Visitou também La Menara, um belo lugar, mas sua paixão pelas cores o levou mudar toda sua viagem, em Uazazate.  Ficou conhecido por lá, passava os dias pelas ruas estreitas, desenhando as mulheres com ruas roupas coloridas, bem como os homens com seus turbantes, anotava detalhes de portas de madeira, bem como lâmpadas.   Comprou tapetes de Lã para levar para a casa da praia.  Voltou a Marrakesh, mas só dormiu uma noite, foi para Casablanca, conseguiu despachar tudo que tinha comprado, que lhe aguardasse no aeroporto de San Diego.  Mesmo assim pagou um excesso pelos seus cadernos de desenhos.  Quando desembarcou em Londres, uma aeromoça lhe chamou atenção pois estava de turbante, cuidado pode complicar sua entrada.    Claro ele estava de barba grande,  cabelos imensos, chamava muita atenção.  Mudou de roupa no banheiro do aeroporto, seguiu para San Diego.  Alugou um furgão tinha se acostumado a usar um.  Levou horas para liberar tudo que era seu que estava no aeroporto como coisas despachadas.  Só o seu material, eram duas caixas de cadernos.
Avisou o Advogado que já estava de volta, contou como tinha sido emocionante, encontrar o que ela tinha lhe pedido.  Tinha feito inclusive um desenho baseado na fotografia que tinha encontrado no andar de cima, o tumulo, o jarro com sua cinzas, ela junto como filho como na fotografia.
Os da galeria queriam ver todo material que ele tinha trazido.  Os convidou para passarem o final de semana, pois era um casal gay, lhe cedeu o quarto dela. Que estava igual. Os deixou foleando horas e horas todo os cadernos.
Disse que faria por sequência da viagem.  Que pensavam em arrumar o studio primeiro, depois começaria a trabalhar.  
Os dois comentaram com ele, que nessa viagem ele tinha deixado de ser um garoto, para ser um homem diferente.                  Lhes contou o que tinha acontecido com o Surfista em Esauíra, da confusão que o rapaz tinha feito.
Porque não ficaste quieto, aproveitavas fazia sexo com ele.
Isso queria falar com vocês, tenho confiança para isso, fui tão abusado em criança, que não me sinto a vontade, nem com vontade de fazer sexo.  Pode me aconselhar um psicólogo para que eu possa conversar, terei que ir a San Francisco.   Assim converso com um.
Aqui mesmo vive um amigo nosso, já tem uns cinquenta anos, mas é uma pessoa agradável, telefonaram para ele, este foi até a casa.  Ficaram andando na praia, ele contou mais ou menos o que tinha acontecido, os primeiros abusos que tinha sofrido nas casas de acolhida.
O Cristóbal, disse que tinha encontrado um lugar incrível para conversarem, podia usar sua varanda.
Estiveram ali sentados conversando muito tempo.  Falou da viagem que tinha feito ao Marrocos, a emoção que tinha sentido, cumprindo os sonhos de sua mãe postiça, na praia, quando perguntaram se queria fazer sexo, que se deu conta que não pensava no assunto.
Evidentemente estás te protegendo a muito tempo dessas recordações,  quando chegaste aqui encontraste um lar, um oásis para descansar.  Seguiram falando vários dias.
Um dia Cristóbal chegou o encontrou colocando na tela um desenho, perguntou de aonde era?
Fez, Marrocos, aonde estive como te contei.  Estive andando pela Judiaria de lá, vi esse símbolo numa sinagoga antiga, pegada ao cemitério. 
Minha família esteve por lá, contou o Cristóbal, meu filho acaba de retornar de uma viagem que fez a España, buscando a origem dos nossos antepassados, foram expulsos primeiro de Castilla, foram para Granada, finalmente atravessaram o estreito, viveram em Fez, para ele foi muito importante isso.  Ele encontrou um diário de meu bisavô, quando veio para América, aqui foi interessante o mesmo deixou de acreditar em qualquer deus, nunca mais praticou nada, nem o Sabbat, nem circuncisão dos filhos nada. Meu pai tampouco, sabia que era judeu, mas isso não lhe importava, o meu filho ao contrário, necessitava depois de ler o diário, refazer o trajeto do avô, inclusive fala o dialeto Sefardita, bem como o Árabe.   Como te entedias por lá.
Foi interessante, pois ao final eu os entendi. Aonde ia estava cercado de garotos, eles falavam sem parar, só faziam silencio quando me viam desenhando.  Em Uazazate, aluguei um burro, para levar cavaletes, meu material, para desenhar a cidade por fora, me acompanhavam o tempo todo, espera.
Procurou um desenho que tinha feito, dos meninos cercando o burro, tomando banho num riacho ali.   Fiz esse auto retrato também, ele no meio da garotada.   Um dia no Riad, me olhando no espelho, com turbante, roupas dali, me fiz um autorretrato assim também, sempre me parecia mais um deles.       Os velhos também me recebiam bem, pois era educado, antes de desenha-los, perguntava se podia.  Oferecia chá para eles, eles achavam graça dos garotos me seguirem.   Dizia que eu os estava ensinando a serem respeitosos com os mais velhos.
Posso trazer meu filho aqui?
Claro que sim, não tenho amigos da minha idade, as vezes o filho do vizinho vem de férias, mas como faz surf o tempo todo quase não o vejo.    No último verão veio acompanhado de um amigo da universidade, fez que não me conhecia.
Essa coisa dos preconceitos já conheço de longa data, quando era mais jovem me incomodavam, um dia perguntei a Melissa, ela disse que todos não passavam de uns tontos porque tinham dinheiro.
Dias depois ele apareceu com o filho, estava justamente pintando um homem do Zocco de Fez, sentado em sua pequena loja de telas de lã.   Tinha lhe encomendado um traje, um casaco que o homem tinha costurado tudo a mão, numa velocidade espantosa.   Esse seria o seguinte quadro.
O filho era mais moreno que o pai, talvez pelo sol da praia.  Joseph estendeu mão, que maravilha teu trabalho. Eu atravessei o estreito, para ir a Tanger, aonde se perde a pista da família, para aparecer mais tarde aqui.
Na sinagoga de Fez, tem uma lista de pessoas que habitavam ali, pode ser que consiga alguma informação, a dona do Riad, era uma Francesa, Judia segundo ela, tinha se casado com um árabe marroquino, por isso vivia lá.   Te dou o telefone, pede para ela verificar.
Ficaram conversando um tempo, perguntou se podia voltar no final do dia para seguirem conversando.  
Lhe disse a hora que costumava parar para ficar olhando o pôr do sol.
Na hora exata, ele tinha acabado de tomar banho, estava com os cabelos molhados, como um cachorro, o outro riu, fazendo a comparação, balançou a cabeça, o molhando, pediu desculpas.
Foi buscar Coca-Cola, ele seguia sem gostar de bebida alcoólica. Joseph perguntou porque, não sei talvez da minha infância, quando via gente drogada ou alcoolizada, peguei pavor de me imaginar assim.
Agora ele vinha todo dia conversar.  Lhe falava de Sevilla, Córdoba, Granada, aonde tinha estado na España, buscando fontes de referência da família.
Acho interessante meu pai nunca se interessar por isso, mas creio que foi sua educação, ele disse que leu o diário do bisavô, como se fosse um romance.
Cada um na verdade tem uma maneira de reagir.  Eu só comecei a me questionar minha sexualidade, quando me confundiram com um marroquino, me perguntando se queria fazer sexo.  Quando respondi em inglês, que era americano, desistiram no ato.
Levo tanto tempo embutido nessa capa de proteção que nem sei como será o dia que me interesse por alguém.
O outro ria, eu ao contrário, imagina, queria descobrir de aonde tinha saído, quando cheguei na España, era um gringo, todos queriam fazer sexo comigo.  Os olhava, meu interesse era outro, quando perguntava se tinham alguma ascendência Moura, como eles chama os árabes, mudavam de assunto no ato.
Também tinha colocado minha sexualidade a parte.   Me questionava coisas que mais tarde quando estendi minha viagem a Israel entendi.   Agora os Gays de lá são mais livres, mas antes estavam dentro de um armário a sete chaves.    Mas realmente sou como tu, necessito de tempo para me interessar, me tornar amigo pelo menos.    Acredito sempre nisso, que há que ter uma amizade também nesse relacionamento, não pode ser só sexo, pois este acaba, o que fica é a amizade.
Vinha ver todos os dias seus trabalhos, viu o desenho do seu autorretrato, soltou que ele ficava super interessante vestido assim.  Se fosse contigo para cama, ia pedir que colocasse um turbante.  Ficaram rindo.
Se queres posso colocar, não sei por que fiquei excitado.
O levou para seu quarto no fundo da casa. 
Joseph perguntou se esse era seu quarto apenas para fazer sexo?
Olha podia ter-me mudado para o quarto da Melissa, mas para mim é um santuário, gosto de continuar vivendo aqui.  É simples não preciso de muita coisa, tirei sim a estante aonde tinha o fogão, coloquei um tapete de lã que comprei por lá,  um cadeirão para ler as vezes que não tenho sono.  Nunca pensei em me mudar para a casa.  Lá está a cozinha, o meu studio, raramente subo para o quarto que tem lá em cima.
Ficaram um longo tempo se beijando, conversando, até que realmente partiram para o sexo, foram se explorando devagar, quando chegaram ao clímax os dois ao mesmo tempo, foi ótimo.
Agora vinha dormir todos os dias com ele, meu pai outro dia me abordou, estando preocupado por ti, não por mim.  Lhe contei como levamos a coisa.  Ficou mais relaxado.
Buscou para saber como era as roupas safardi, mas fazia quando ele não estava, sempre cobria a tela com um lençol velho.  Até que terminou.  O deixou ali a mostra,  Joseph entrou, esteve falando por celular com alguém, até que se deu conta do quadro.  Parou de falar, ficou com a boca aberta.  Se aproximou dele, o abraçou.    Incrível isso.  Quero ele para mim.
É um presente para ti, pelos momentos maravilhosos que temos passados juntos.
Tenho uma má notícia, me chamaram para dar aulas na Universidade em San Diego, estaremos mais afastado.
Eu entendo, deves ir, estás a tanto tempo esperando essa oportunidade, que deve ir.
Mas, nós dois?
Venhas quando queira, sabes que eu sentirei tua falta,  mas os caminhos são assim, tua vida profissional tem que ter importância, a quanto tempo estas esperando essa oportunidade.
Já perdi a conta, se não aceito, será mais difícil sair outra.
Então, se podes escapar para os finais de semana, afinal não estamos tão longe.
Passavam o final de semana juntos, até que um dia Joseph lhe disse que tinha conhecido um professor, que lhe interessava.
Conversaram a respeito, se despediram como amigos que sempre tinham sido.
Realmente sentia falta dele, principalmente para ter com quem falar.
Quando tinha uma boa quantidade de quadros, avisou os da galeria, que vieram como loucos para ver, estamos esperando a muito tempo essa oportunidade.
Estavam maravilhados com o que tinha feito, a única concessão de avanço, tinha desenhado dois quadros grandes, com os barcos de Esauíra.   Eles queriam fazer dois catálogos, um com os desenhos, outro com a pintura.  Eram tantos os desenhos, que esse seria o número um, só com Casablanca, Fez, algo de Esauíra,   Um dos primeiros grandes de  Uazazate, uma panorâmica da cidade que ficaria no final da Galeria.
Esperaram os catálogos ficarem prontos, começaram a divulgação, foi entrevistado pela televisão, contou o que tinha ido fazer lá, não disse que o rapaz de quem levava o nome estava enterrado lá.   Expos o desenho de Melissa com o filho, mas este não estava a venda.
Antes mesmo, recebeu um convite para expor em NYC, pela primeira vez.
Os quadros estavam vendidos, agora levavam o nome dos compradores que emprestavam os mesmos.   Mesmo assim como a galeria era maior, preparou mais 10 quadros imensos, o dos garotos, ele com o burro, foi vendido rapidamente para um museu.   Os outros, as mulheres carregando agua,  os velhos na frente da sinagoga, todos vendidos, eram imensos todos.
A capa do catálogo de NYC, era seu autorretrato de árabe.  O de desenho, já tinha esgotado a primeira edição, agora estava na segunda.
Na de San Francisco, Joseph apareceu com seu pai, além de seu namorado, imediatamente não gostou do sujeito, mas não comentou nada, achava que era porque estava com ciúmes.
Antes de ir para NYC, Joseph apareceu para conversar, o viu com uma cara de fazer pena, mais uma vez me enganei, meu pai quando o conheceu, disse que não confiava nele, eu fiz ouvidos surdos, me dei mal.
Lastima que vou para NYC amanhã, senão iriamos conversar muito a respeito disso.   Joseph perguntou se tinha conhecido alguém.
A verdade, verdade é que não tinha muito trabalho, tampouco saio tanto para conhecer gente.
Em NYC, foi uma roda viva de entrevistas para jornais, televisão, as perguntas as vezes eram cretinas, ele não respondia, só dizia a seguinte.   Uma entrevistadora lhe perguntou por que fazia isso.
Porque as perguntas são cretinas, não gosto de perder meu tempo falando besteiras.  Se me perguntas algo interessante respondo.
Esteve contente, mas louco para voltar para seu atelier, queria seguir trabalhando, tinha uma outra viagem em mente.   Mas ainda lhe faltava muito para acabar.
Seria como uma segunda exposição sobre o mesmo tema.  Agora o catalogo era sobre Marrakesh, Uazazate, as marinhas com os barcos, eram imensas, sempre com surfistas misturados,  um dos quadros lhe deu trabalho, pois tinha mais de dois metros, eram os barcos chegando as pessoas ajudando a traze-lo até a praia, fazendo uma fila imensa, puxando a corda, num desses, se colocou junto.  Fez um auto retrato dele de peito nu, com turbante colorido que usava nesse dia, ajudando os homens a arrastarem o barco.  Depois ao lado retratos de todos eles, assim sem camisetas, com panos na cabeça, alguns com uma caixa de peixes na cabeça, os peixes como que saltando da mesma.   Os garotos na praia, querendo aprender surf, fazendo com pedaços de madeira.   Revendo todos os desenhos, riu, pois tinha sido feliz ali, bem como Uazazate, pois tinha sido considerado um deles.  Isso que não usava todos os desenhos, pois eram muitos.
Tinha também muitas paisagens das ruas estreitas de Uazazate, a cor da terra subindo pelas paredes, alguns velhos sentado na porta de suas casas, com quem tinha parado para desenhar e conversar.
Quando tudo ficou pronto, estava exausto, pois se levantava as vezes a seis da manhã, porque a imagem esta ali em sua cabeça viva, querendo sair.
Um dos críticos comentou justamente isso, que seus personagens estavam tão vivos que ele não estranharia que se levantassem, saíssem andando dos quadros.
Lhe convidaram para sair, para conhecer a cidade, foram jantar, não conhecia direito o grupo, um deles lhe disse, não entende as indiretas não?
Indiretas, não sei do que falas.
Estão todos se oferecendo para ti, é como se nada, contínuas na tua.
Desculpe não estou acostumado a conviver, passo muito tempo no studio, gosto de coisas simples.  
Para complicar o arrastaram para uma discoteca, primeiro ficou surdo com tanto barulho, não bebia, viu que todos fumavam erva.  Foi saindo de fininho, na rua parou para respirar, um homem ficou rindo.   Se vê que não gosta de ambientes assim, eu tampouco, fui arrastado por um grupo de amigos.
Vim ver uma exposição, amanhã, de um artista que gosto muito, ele me faz lembrar o tempo mais feliz de minha vida, quando vivi no Marrocos.
Estas brincando comigo, não é?
Não, porque ia brincar contigo, era um tipo completamente diferente, barba grande, cabelos como o dele compridos, mas ruivos misturado com branco.  Eu vivo basicamente perto do mar, venho raramente a cidade, tenho apartamento aqui, mas desde que fui viver em Fire Island, deixe de vir a cidade.   Aproveito a paz para escrever.  Como sabem que vivi muitos anos no Marrocos pediram para que eu escrevesse sobre o assunto no Times, inclusive amanhã tenho uma entrevista com o rapaz.
Ficaram conversando, foram tomar um refrigerante ali perto.  Ele se identificou como Thomas Brookmaster, escrevi vários livros sobre o Marrocos, agora escrevo romances.
Tu com te chamas?
Robert Montgomery.  Não disse o nome que usava para assinar os quadros.
Quer vir até minha casa, ou preferes que marquemos alguma coisa amanhã?
Prefiro amanhã depois que tenhas tua entrevista.  Aonde vai ser?
Na Galeria, ira um fotografo, vou entrevistar o rapaz.
Se lembrou disso, que tinham lhe pedido que colocasse o turbante, para a entrevista.
O levou até seu hotel, antes que ele entrasse, posso pedir um beijo de boa noite?
Sim claro, trocaram número de celular, amanhã nos falamos.
Achou interessante o homem lhe interessar, afinal era um tipo diferente, relaxado na maneira de vestir, como ele, viu que tinham algo em comum.
No dia seguinte se vestiu como sempre, nem notou que a camiseta estava suja na parte de baixo de manchas de tinta, nunca dava muita importância para isso.   Como fazia frio, colocou o casaco que tinham feito para ele em Fez, bem como um pano em volta do pescoço, se lhe pedisse, colocaria na cabeça.
Foi para a galeria, atendeu a primeira entrevista, numa sala a parte, posou para as fotos, voltou para sala para descansar, 15 minutos depois lhe anunciaram o Thomas, ficou de costa para a janela, esperou que entrasse, então se virou.
O que fazes aqui? Foi sua pergunta.
Sou Mark Berg, o pintor que vais entrevistar, mas também me chamo Robert Montgomery, uma larga história.
Ficaram os dois rindo, o fotografo não entendia nada. Quando esse pediu que pusesse o pano na cabeça como turbante, lhe perguntou sério.  Tens certeza disso, o uso com orgulho, porque me sentia um deles, mas fazer pose de uma coisa tradicional, me parece fútil, desagradável.
As perguntas era sérias.   Como sabia dos lugares aonde tinha estado, falou o que tinha se sentido em cada um.   Mas te confesso que talvez tenha sido Uazazate, aonde me senti em casa, me receberam como um igual, talvez a cor da minha pele, ou minha postura, estão acostumados com turistas que vem fazem uma fotografia, ou um selfie, que esta mais de moda, vai embora em seguida, ou fica fechado dentro de um Riad, porque acha bonito.
Eu me levantava cedo, pois gostava de pegar a luz da manhã, para fazer aquarelas, desenhar, venha, foram a sala de exposição, apesar de ser um auto retrato, pois não fiz baseado em fotografia, mas sim num desenho, os meninos me acompanhavam o dia inteiro para  me ver trabalhar.  Conversava com ele, numa mistura de língua ou sinais.  Se riam muito comigo, como eu com eles.     Os velhos, ah, com esses tens que ser respeitoso, mas isso me ensinou minha mãe Melissa.  Ela tinha vivido um tempo por lá, então estava sempre falando.  Eu fui na verdade levar suas cinzas para deixar no cemitério de Fez.  Foi uma das coisas mais emocionantes da minha vida.   Tinha uma ideia, mas pensei que não aguentaria ficar três meses por lá.  Agora não consigo tirar isso da cabeça.  Se eu quisesse ainda faria outra tanda de  quadros, os tenho dentro de minha cabeça.  Tomei consciência de que tinha sido os melhores momentos da minha vida.  Talvez volte, depois entre por cima no Senegal, mas dizem que é perigoso.
De uma certa maneira quero me adentrar na arte negra.
A cada pergunta do Thomas que estava gravando, ao mesmo tempo que um dos homens que lhe acompanhavam faziam um vídeo.
O que fazia o vídeo lhe perguntou se não tinha relacionamentos, nem família.
Não tenho ninguém na minha vida, como desde da morte de Melissa, não tenho família, ela foi o melhor que aconteceu na minha vida, me ensinou a pintar, quando observou que eu tinha um certo talento.  
O mesmo fez outra pergunta, alguém ventilou que você continua dormindo num quarto pequeno atrás da casa, quem falou sobre isso, disse que ganhaste muito dinheiro, mas continua vivendo como se não tivesse, agora mesmo, se nota que sua camiseta está suja de tinta.
Primeiro claro que esta suja, sou um pintor, não vou me vestir uma roupa nova porque estou dando uma entrevista. A única coisa nova aqui é esse casaco que esta aí, mostrou o casaco numa poltrona.  Gostei como costuravam em Fez, a mão, se tens o catálogo de desenhos, verá dois, um eram os movimentos da mão do homem, que o fazia numa velocidade incrível.                Outra porque foi feito com amor pela sua profissão.                    Isso eu sempre respeito, mas não vou te responder, eu gosto da minha vida como esta.   Talvez o fato de dormir no pequeno quarto, me faça ter os pés no chão, me lembrar quem sou, de aonde sai         .  Isso é só meu, está guardado dentro de mim.
O homem ia fazer outra pergunta, mas Thomas lhe cortou, lhe perguntando se tinha feito contato com o mundo intelectual do pais.
Na verdade não Thomas, sou tímido, creio que prefiro estar entre a gente do povo, pois eu sai daí,  aprendi a escrever tarde, a ler, leio os livros velhos que  Melissa tinha em casa, li o que ela tinha sobre Marrocos antes de ir.      Imagina, nunca tinha viajado de avião, lá aluguei um furgão para andar pelo pais.  Dormi em praias, algumas vezes em Riad, uns bons outros nem tanto.
Gostei por exemplo que vi em Esauíra, de todos ajudando o barcos chegarem à areia, a descarregar os peixes, mas sempre com cuidado como se fosse seu.            Isso não vemos aqui, todos querem saber até a cor da merda que fazes.   Com quem vais para a cama, ou quem te incomoda, então vamos falar mal da pessoa.
Vivo numa casa velha, que era de minha mãe, continuo pintando no atelier que era o seu,  de vez em quando encontro algum tubo de tinta esquecido por ela em algum lugar.      Por isso não vou embora.            No verão a coisa fica mais complicada, pois a praia está cheia, nunca fecho a porta, as pessoas entram para olhar o que estou fazendo.   Como comecei pintando surfistas, me perguntam por que agora retrato essa gente feia.    Tento ser educado, para não dizer, não te olhaste ainda no espelho.   Outros querem encomendar um retrato, lhes digo que não faço isso, ao menos que o rosto da pessoa me diga algo.
O dono da galeria fez um sinal, dando por acabada a entrevista.
Mark, Robert, foi um imenso prazer em te conhecer.  Queres jantar comigo essa noite?
Sim, mas vou embora amanhã, sinto saudade de ver o mar.
Foram jantar, ontem parecias duvidar que eu não te conhecia, nunca tinha visto uma foto tua, as únicas que me mandaram era as que estavas com turbante.  Ficas diferente, gosto também como falas, sem problema nenhum de ser franco.
Depois foram andando pela ruas sem rumo, até que Thomas lhe disse, vivo ali, mostrou um edifício antigo, queres subir?
Foi como entrar num mundo caótico, cheio de mascaras, coisas dos países por aonde ele tinha andado.
Se aproximou, aquele beijo de ontem a noite só me deu vontade de dar mais beijos.  Aviso não tenho ninguém, vivo sozinho como tu, adoro minha solidão para escrever.
Estavam nus em cima de uma cama, me senti atraído por ti, na hora que te vi na discoteca, tinhas uma cara de chateado por estar ali, bem como eu, houve uma época que eu necessitava dessa musica no último volume, para abafar o que tinha na cabeça.   Mas hoje o silencio para mim é importante.   Ficaram juntos a noite inteira.
De manhã, ele se despediu, tinha que passar no hotel, para pegar sua bagagem, para ir para o aeroporto. 
Não se preocupe eu te levo.  Quero que tenhas meu endereço, pois se queres estar de novo comigo, como eu quero o teu, caso tenha vontade de ir te ver.
O levou ao hotel, depois ao aeroporto, se despediram com um beijo.  Assim que tiver o texto te mando uma cópia.
Uma semana depois recebeu um envelope daqueles antigos pardos, dentro estava o texto que ele tinha escrito.
Começava, tive a oportunidade de conhecer um grande artista, que retrata a terra que amo, fui esperando encontrar alguma brecha na sua história, mas esse homem, é fiel à si mesmo, vive como quer, sem se importar com o glamour de ser o pintor da moda.  Foi criado por uma mulher que não conheci, mas que sei que pensava da mesma maneira.
Posso dizer abertamente que me apaixonei por essa pessoa.   Quando vês em seus retratos, os personagens saindo do mesmo, parecem ter a intensão de falar alguma coisa, de se expressar seus sentimentos, tens realmente a ideia de que esse homem captou tudo.   Pelo que sei, não faz fotografias, ficou dias convivendo com essas pessoas desenhando cada expressão.  Espero que um dia me receba em seu atelier.  As fotos que acompanhavam, era ele ao lado dos quadros que Thomas mais tinha gostado.    O melhor era ele na frente do quadro com os meninos, o burro.  Embaixo, estava escrito, isso diz tudo dessa pessoa.
Lhe chamou, não atendeu, meia hora depois, ele lhe chamou, perdão, não tenho o hábito de levar o celular nos meus passeios pela praia.
Ficaram conversando.  Num rompante lhe perguntou por que não vinha passar uns dias com ele.    Dois dias depois estava trabalhando, ainda tinha ideias sobre Marrocos, estava pintando uma sinagoga de Fez que tinha entrado, era cheio de detalhes, um único homem com uma chilaba branca, estava lavando seus pés para entrar na sinagoga, ele tinha ficado impressionado com isso, estava acostumado a ver as pessoas colocarem suas melhores roupas, para irem a igreja.   Esse homem estava com a roupa do dia a dia, mas tinha lavado suas mãos, seus pés, o rosto, o braço.
Sentiu uma sombra na porta, Thomas, com a bagagem no chão encostado olhando para ele, senti que falavas com esse homem.
Estava pensando no respeito que tem pela oração, eu não acredito em Deus ou Deuses, mas admiro quem tenha uma fé assim.
Correu para ele, se abraçaram.   Então aqui é teu pequeno paraíso.  Levou as coisas dele para seu quarto, depois foram se sentar na cozinha para conversarem.   Num determinado momento ficou quieto, se levantou, foi para a varanda.
Isso  é a minha reza diária, me sentar aqui, como sempre fizemos, olhando o mar, deixando que a nossa cabeça, flutuasse além do horizonte.
Ficou ali de mãos dadas com o Thomas.
Este foi ficando, entendia agora o que ele dizia, ele realmente podia escrever sem ser perturbado, podia passar dias até que aparecesse alguém pela porta.   O observava agora uma pintura que fazia, era as mulheres subindo uma rua, em fila, cada uma com um alguidar de  barro na cabeça, com água para suas casas.  Algumas eram crianças ainda.
Ficava sempre de boca aberta, com sua concentração total, a sensação que tinha tido no primeiro dia, era a mesma, ele estava falando com essas pessoas.
Nesse dia ao olharem o por do Sol, contou o relacionamento que tinha tido com o Joseph, o que este tinha ido buscar do passado de sua família Sefardita, pensei em fazer isso, ir a España.
Sevilla, Córdoba, Granada, depois cruzar o estreito, entrar por Tanger, Tetúan, Rabat, depois descer outra vez, indo para Uazazate.   Desta vez quero aproveitar, vou levar para esses meninos, lápis, cadernos, passar um bom tempo por lá, me impregnando de tudo isso.
Thomas o ficou olhando, creio que vais precisar de um companheiro, para irem trocando a direção da Motorhome que fores alugar. 
Ele riu, estava mesmo pensando em comprar uma, depois vender antes de voltar.
Queres realmente ir comigo.  Levo o mínimo de bagagem, mas material muito para poder desenhar, pintar, essas coisas.  Que precisas tu?
Meu laptop, o amor de minha vida, alguma coisa de roupa, porque gosto de estar nu com ele.
Desfrutaram muito, porque agora um chamava a atenção do outro para algum detalhe, o mais interessante foi um dia que estavam os dois na praia, em Casablanca, prontos para adentrarem rumo a Uazazate, quando um rapaz parou na frente de Mark, voltaste, eu sabia que um dia voltaria,  era um dos meninos do quadro.
Que fazes aqui tão longe de casa.   Estou trabalhando na construção, mas é o que me toca, não tenho muitos estudos.   Gostaria, pensei que aqui poderia trabalhar, aprender.  Mas vejo que não, venho dormir aqui na praia, pois não tenho casa.
Nos vamos amanhã cedo para tua cidade, queres vir, passe esse tempo conosco, vou ver se te levo comigo.    Era o garoto que lhe fazia milhões de perguntas sobre américa, como era  viver lá.     Ele lhe olhou sério, sempre foste honesto comigo, isso não significa que queres fazer sexo comigo, como todos esses que se aproximam de mim.
Não para nada, tenho o que quero, colocou a mão em cima do Thomas,  Olha essa noite, de dou um saco de dormir, amanhã, vamos embora, queres vir.
Sim quero voltar para casa. Lá pensarei na tua oferta.  Foram a viagem inteira, com Thomas ensinando o rapaz a falar inglês.   Quando chegaram a Uazazate, saiu correndo, voltou com os meninos, agora todos grandes, gritava, eu não disse que ele ia voltar um dia.
Thomas tinha a revista com a reportagem, mostrou a foto dele, na frente do quadro.
Aquilo era uma festa, ficaram na motorhome, fora da cidade, mas todo o dia tinha garotos, os velhos vinha conversar com ele, se deixarem desenhar, falavam com ele, o rapaz de se chamava Mahamud, dizia, sabes o que ele disse.
Ele respondia perfeitamente, sim, não sei por que os entendo.   Perguntou se ali havia uma professora.  Sim apareceu dois jovens, não muito maior do que os outros rapazes.  Ele era do grupo, como a família tinha mais dinheiro, tinha ido estudar em Marrakesh,  aonde conheceu a jovem, com quem tinha se casado.    Perguntou o que precisava para a escola.  
Nos falta tudo, cadernos, lápis, livros, tudo.  Thomas arrumou uma caminhonete, foi com eles até Marrakesh, compraram tudo o que eles precisavam, mas em grande quantidade, Mark tinha dado o dinheiro.   Depois começou a ajudar as famílias, que os velhos diziam que mereciam ser ajudadas.
Como uma maneira de pagar ou retribuir o dinheiro que tinha ganho com os quadros. Numa das idas a Marrakesh, foram ao consulado americano, para conseguir visto para o Mahamud, lhe disseram que era menor de idade.   A solução foi o Thomas que era conhecido, no consulado, adotar o rapaz.
Deixou a Motorhome para que os professores pudessem ter uma casa, viviam os dois num quarto, foram até Marrakesh, para pegar um voo para San Diego, via Madrid, depois Miami, finalmente em casa. Antes de voltarem, conversaram como iriam fazer. Thomas não pensava deixa-lo, foi a NYC, vendeu tudo que tinha por la, inclusive a casa da praia. Enquanto isso, ele comprou a casa dos herdeiros da vizinha, ampliaram a deles.  Mas a casa de Melissa ficou igual.   Como ela tinha feito com ele, conseguiu uma professora, que lhe ensinou a falar, escrever direito.  Perdeu um ano recuperando tudo.   Hoje em dia fazia universidade, sempre falava, como era o mais velho da turma, os outros o respeitavam.
Era um exímio surfista, tinha inclusive ensinado ao Thomas, ele não podia perder tempo, tinha que pintar.   Tinha altas conversas com o Thomas sobre a idade de ouro dessa parte de Andaluzia, quando estiveram habitada pelos Árabes, então todos os quadros referentes tinham uma figura como ele tinha visto nos livros que tinha comprado, mas com a cara dos habitantes de Uazazate.
Tornou a pintar várias coisas.       Começou a sentir dores nas articulações, os médicos atribuíam o fato de ele ter sido desnutrido em sua infância.   Diminuiu o ritmo, não pintava por dinheiro, não necessitava de muito para viver, mas sim, agora usufruía mais da conversas intermináveis que tinha com Thomas.    Mahamud ou Mud, como o chamavam os amigos, dizia, que os vê de longe, parece que vão sair aos tapas.  Eu sempre digo, estão apenas conversando.
Ele mesmo entrava as vezes nas conversas, colocando seu ponto totalmente oposto, por ter vivido tudo aquilo.
Um dia contou sua verdadeira historia aos dois.   Ficaram olhando para ele, sem saber se acreditar ou não.  Mas pela força dos detalhes, acabaram acreditando.
Quando Mud, se formou na universidade, era o orador, falou de aonde tinha vindo, um paraíso miserável, sem futuro.   Um dia quando era criança, apareceu um homem da mesma cor que a minha, com um furgão, carregado de blocos de papeis, eu ia aonde ele ia, queria ver o que ia desenhar ou pintar, as figuras pareciam sair do papel.  Procurei não perder nenhum dia de sua companhia.   Dava gosto ver esse homem, conversando com os velhos da sinagoga, com todo respeito do mundo, ao mesmo tempo que ia desenhando seu rosto.  Bom esse é um dos meus pais, quando o reencontrei com meu outro pai, em Casablanca, estava cansando de tentar melhorar minha vida, me apresentei diante dele, me disse amanhã vamos para aonde vivias, depois te levamos para América.   E assim fizeram, sempre me cuidaram como seu filho, me deram a oportunidade de estudar, me formo hoje graças a eles.  Obrigado por serem meus pais.  





  

  

  









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