Depois de mais de
20 anos retornava aos Estados Unidos, para quem tinha saído de casa uma noite
escondido, tinha vencido na vida, era alguém respeitado, conhecido.
Tinha sido
reconhecido na televisão pelo seu velho amigo de infância John, quando falou
com ele, sentiu como se voltasse tudo outra vez. Se abraçou ao seu filho, agora com a idade
que ele tinha quando fugiu, lhe contou toda sua história verdadeira.
John lhe contou
que sua mãe ainda era viva, que vivia numa residência, que tinha uma memória
fantástica, as vezes vou visita-la para falar de ti. Nunca
fala mal de ti, nem de como escapaste, diz que tinha feito a mesma coisa na tua
idade.
A história inicial
que ele tinha acreditado durante anos, era que sua mãe trabalhava de garçonete
num bar, perto de uma base do exército, perto de San Francisco, que ali
conheceu meu pai, que o tinha esperado retornar da guerra do Vietnam, ele
voltou com os últimos.
Mas a realidade
era bem outra, nunca tinha entendido esse pai, que jamais chegava perto dele,
nem para fazer uma foto, alias naquela casa só tinha uma foto, dos dois no dia
de seu casamento.
Com ele nenhuma,
sentia inveja quando ia a casa do John, ali tinham muitas fotos, deles três,
dele com sua mãe, muitas, uma mesmo quando estava para morrer, depois muitas
com seu pai.
Quando seu pai
voltou da guerra, foram viver na cidadezinha da qual ele tinha saído para o exército,
a casa de sua família, já não tinha parentes nenhum.
Entrou logo para
a escola, aonde conheceu o John, eram completamente diferentes um do outro, ele
era moreno, cabelos negros, olhos negros.
John ao contrário, era loiro, olhos azuis, cheio de sardas, seu pai era
igual. Ele ao contrário não podia ser
mais diferente de seu pai, que também era loiro.
Quando chegou aos
8 anos, se percebia que seu pai não suportava sua presença, ele se escapava
para a casa do John, nessa época sua mãe era viva, o abraçava, beijava, como
fazia com seu filho. Isso em casa ele
não tinha, sua mãe quando muito passava a mão na sua cabeça.
Se aborrecia nas
aulas, pois aprendia com facilidade, quando entraram no ciclo, antes da
universidade, ele fez umas provas, falsificou a assinatura da sua mãe para
fazer os testes, acabava o curso antes, com 16 anos. A anos, acontecia uma coisa que era o
grande segredo familiar, seu pai quando bebia um pouco demais, o queria fora de
suas vistas, o fechava numa parte embaixo da escada, que seria antigamente o
lugar para guardar lenha. Tinha que
dormir ali, no dia seguinte ele passava como se nada, abria o trinco, sua mãe,
deixava ali sua roupa para ir à escola.
Quando contou ao
John, esse lhe deu um saco de dormir, negro, assim quando ele abrisse a
portinha, não veria, pois ali não havia luz. Com o tempo, foi juntando coisa, tinha uma
lanterna, escondia ali o livro que estivesse lendo no momento. Começou a trabalhar de tarde, na loja de
ferragens do pai do John, conseguiu um imã com o qual abria a porta para se
escapar para se encontrar com o John.
Iam os dois na caminhonete do pais deste até a beira do lago, nos dias
de verão, para tomar banho, levavam o John uma manta, dormiam ali. Mas ele colocava o despertador para chegarem
antes que seu pai se levantasse.
Os dois tinha
descoberto o sexo, juntos, apesar do John ser mais alto, mais forte, era além
de amigo, o a única pessoa que o abraçava, beijava, fazia carinho. Eles se matavam de rir, pois mesmo assim quem
tinha o piru maior era ele. Era ele que
penetrava o John, não ao contrário, achava normal isso.
Mas claro um belo
dia seu pai o pegou voltando para casa, foi a loja de ferragens, comprou um
cadeado, assim ele não tinha como sair.
Mas claro, ele não era tonto, essa parte dava para a garagem, ele com um
serrote, fez uma abertura, que estava escondida atrás de uma placa de madeira,
que sempre esteve por ali. Seguiu
saindo.
Um dia escutou
uma discussão entre seus pais, foi quando entendeu tudo. Ele dizia que assim que ele fizesse 18 anos,
o faria entrar para o exército, para aprender a atender ordens, obedecer. Afinal não era filho dele, ele que se
apanhasse.
Finalmente
entendia tudo, nesse dia sua mãe chegou mais cedo do trabalho, sentou-se com
ele, contou que realmente tinha conhecido seu marido, durante a guerra, quando
trabalhava nesse bar, que estiveram juntos cinco noites, ela tinha sido a
primeira mulher dele, prometeu voltar para se casar com ela. Mas ela nunca lhe escondeu, que já tinha
feito sexo com outros soldados a troco de dinheiro, sonhava em fazer teatro,
poder ir para Los Angeles, ser atriz.
Depois que ele
foi embora, ela seguiu com sua vida, não tinha ideia na verdade de quem era seu
pai, eram muitos os rapazes que tinham passado pela sua cama, nunca perguntava
os nomes.
Quando ele
voltou, tu já tinhas três anos, veio me buscar, primeiro pensou que era seu
filho, mas lhe contei a verdade. Mesmo
assim nos casamos, ele te adotou, por isso tens o nome dele na certidão de
nascimento, tirou outra para ti, nada mais ao chegarmos aqui.
O levou a garagem,
mostrou uma lata que estava em cima de outra igual, ali guardei todo o dinheiro
que ganhei nessa época para um futuro melhor, tem também teus documentos. Caso me aconteça alguma coisa, já sabes.
Nesse dia estava
furioso, aguentar tanto desprezo do que pensava que era seu pai, afinal ele
tinha razão, não era nada dele, apenas um recordatório dos erros de sua mãe.
Sempre tinha tido
ciúmes, pois os dois sempre estavam de mãos dadas, saiam para jantar fora, ir
dançar, mas ele ficava fechado embaixo da escada.
Perguntou a ela,
porque o deixava fazer isso, ela respondeu que era o melhor, assim ele não te
pega, pois fica muito descontrolado quando bebe, tem pesadelos, sou a única que
consegue acalma-lo.
Perguntou por que
não o deixava, o sorriso dela, era triste, pois foi o único que me ofereceu uma
vida honesta.
Seu pai, sempre
guardava todos os dias o dinheiro da sua loja, num cofre que ficava à vista de
todos na sala, ele dizia que era melhor que no banco, que não confiava. De uma certa maneira sabia que ele não era
muito esperto, pois nunca sabia direito o código do cofre, ele o memorizou,
48-33-75-58, dava para ver as pilhas de dinheiro, estavam em três pilhas, em
cada espaço.
Ele se preparou a
consciência, não iria para o exercito de maneira nenhuma, iria viver sua vida,
tinha descoberto também, que não era uma caixa como ela dizia, eram duas, a de
baixo tinha notas maiores.
Como era final de
curso, os dois não sabiam que na verdade ele tinha terminado antes, no dia da
formatura, se escapou, foi até ao colégio, ajudado pelo John, entrou na
secretária no escuro, procurou seu expediente, bem com o diploma, mudou a data
de nascimento, para que parecesse que tinha 18 anos, que era maior de idade,
tirou uma cópia na maquina Xerox imensa que tinha ali naquela sala, saiu
batido, ajudado pelo John, fez uma bolsa com tudo que tinha dentro das duas
latas, a esconderam aonde iam sempre.
Na noite antes,
percebeu que ele nunca olhava o fundo do cofre, quando saíram para tomar umas
cervejas, ele abriu o cofre, usando uma luvas da cozinha, retirou o dinheiro
debaixo da última fila, nem como algum de cima, colocou na sua mochila, colocou
um casaco por cima.
Quando este
chegou meio bêbado, sabia, que o fecharia ali embaixo da escada, a mochila já
estava lá, tinha combinado como John, uma determinada hora. O
velho o fechou como sempre com o cadeado, o escutou rindo sozinho, comentando
para si mesmo, logo me livro de ti.
Esperou o
silencio da casa, saiu pelo lugar que tinha feito, agora que estava um pouco
maior, era mais difícil, mas conseguia passar, saiu pela garagem, John o
esperava mais embaixo, foram buscar a outra bolsa.
John queria ir
com ele, o convenceu, teu pai te quer, vais querer voltar para cá, eu não nunca
mais voltarei.
Fizeram pela
última vez sexo, agora de uns tempos para cá permitia que John o penetrasse,
gostava também, o que mais gostava na verdade era o carinho, os beijos que este
lhe dava.
Depois o levou
até a cidade seguinte, entrou ele na estação comprou um bilhete até a próxima
cidade, de lá ele faria seu rumo, era melhor ele não saber.
Entregou o
bilhete, se despediram com um forte abraço, quase se beijaram, mas tinha gente
olhando.
Na cidade
seguinte, olhou qual era o primeiro ônibus que saia, foi fazendo assim até
chegar a Chicago. Depois de tantos dias
dormindo em ônibus, entrou num hotel pequeno, pediu um quarto, disse que estava
muito cansado, que não o despertasse de manhã.
Dois dias depois
tinha um emprego, ao contrário de seu quase pai, como ele dizia, abriu uma
conta num banco, depositou metade do dinheiro das caixas, viu que era fácil, fez
o mesmo num outro banco, lá viu que ofereciam caixas de segurança, perguntou se
podia ter uma, pois tinha documentos de família para guardar. Foi quando descobriu que tinha uma outra
certidão de nascimento com o nome de outro homem. Guardou tudo lá, bem como o resto do
dinheiro, o do cofre, se o depositasse chamaria muita atenção.
Arrumou um
emprego, começou a trabalhar, mas não se sentia seguro, um belo dia, viu um
anuncio numa pagina de jornal velho deixado por algum cliente, no restaurante
aonde trabalhava, vivia num quarto alugado na casa de uma viúva.
Era sobre cursos
de teatro em Toronto, pensou muito, tirou um passaporte, comprou um carro de
segunda mão em seu nome, foi para lá, arrumou um pequeno apartamento, se
informou, conseguiu entrar para universidade, tinha dinheiro para se manter,
mesmo assim arrumou um emprego de meio expediente numa loja.
Começou a fazer
amigos. Tinha uma facilidade incrível,
para os textos, os decorava perfeitamente, era um apaixonado de Willian Shakespeare,
sabia todos os textos do mesmo, logo conseguiu trabalhar numa obra na
Universidade, quando esteve a primeira vez no palco, com público aplaudindo, se
sentiu pela primeira vez feliz na vida, era isso que queria para ele.
Foi subindo,
começou a atuar com uma companhia, de papeis secundários, foi passando para os
melhores, fazia uma coisa que um professor tinha lhe ensinado, construir um
personagem, era um professor que tinha fugido da Rússia, tinha um método de
ensino próprio, dizia que ele era seu melhor aluno. Um dia lhe disse, estás perdendo teu tempo
aqui. Eu vou para Londres, porque não vens também.
Procurou um
banco, aonde depositou todo o dinheiro que tinha guardado, disse que tinha
acabado de receber uma herança, o banco era inglês, então não havia problema,
era só chegar a Londres, pedir a transferência.
Primeiro ficou
dividindo uma casa com o professor, mas quando ele quis algo mais, se mandou,
não se sentia atraído por ele, se tinha mantido casto todo esse tempo, não era
para isso.
Ia assistir todos
os espetáculos clássicos do teatro inglês.
Fez um teste para entrar, com o tempo, no emprego que tinha num dos grandes
armazéns, tinha aprendido a falar como sotaque dos seus clientes finos.
Logo estava
fazendo pequenos papeis, arrumou uma casa, num subúrbio, como considerando o
que ele podia pagar, viveu nessa casa uns cinco anos, também foi subindo de
categoria, quando substituiu um dos galãs favoritos do teatro, no papel de
Romeu, esse ia fazer um filme, ficaria ausente vários meses. Ninguém esperava que o público adorasse sua
interpretação. Ficou com o papel por
muito tempo, logo era o segundo da companhia.
Depois chegou a
primeiro, mas as longas temporadas o cansavam, quando chamaram para fazer um
filme, foi sua primeira e última experiência, não gostava, embora o vivessem
chamando para outros papeis, não queria.
Começou a aceitar
outros papeis, quando o chamaram para fazer “Esperando Godot” de Samuel Becket,
foi a gloria, adorou fazer outras coisas, ficaram um ano em cartaz, ao final
ele já inventava texto, para não ter que repetir o mesmo.
Nessa época tinha
uns vizinhos na casa dos fundos, estavam sempre discutindo, passou a usar o
quarto da frente, para não ser incomodado, um dia ao abrir a porta da cozinha
para colocar o lixo fora, viu um garoto, ali sentado. Este lhe fez sinal de silencio, com o dedo,
estão discutindo.
Ficou com pena do
garoto, perguntou se ele tinha tomado café, disse que não, venha, lhe colocou
café com leite, pão com manteiga, ele devorou, perguntou se queria mais. Lhe perguntou como chamava?
Samuel,
educadamente lhe perguntou o seu, Albert Mark, o levou para a sala, o deixou
vendo televisão, isso se tornou um hábito, cada vez que se discutia na casa dos
fundos, ele aparecia, era pequeno, mas esperto.
Cada vez se soltava mais com ele.
As vezes ficava
vendo desenho animado, passando a mão na sua cabeça. Quando sua mãe o chamava, ia embora, mas
sempre dizia obrigado.
Um dia conheceu a
senhora, era ainda bonita, segurava uma menina nos braços, Samuel, lhe disse
olá vizinho. Ah então é na sua casa que
ele se esconde.
Desculpe, meu
marido voltou da guerra cheio de problemas, estamos sempre discutindo porque
gasta todo seu dinheiro em bebida.
Por duas vezes
viu que ela fazia compras, mas o dinheiro não chegava para tudo, ele se
oferecia para pagar.
Agora tinha
sempre em casa, biscoitos, coisas para o Samuel.
Um dia estava
estudando um texto novo de Brecht, quando escutou tiros, desceu correndo, abriu
a porta, o menino entrou como um foguete, o levou para o quarto da frente,
escutou tiros que alcançavam sua janela dos fundos, bem como as da
cozinha. Chamou a polícia, está disse
que os outros vizinhos já tinha chamado.
Levaram horas
para tirar o homem da casa, ele tinha matado a mulher, bem como a filha, o
Samuel, como sempre por instinto tinha escapado.
Quando a
assistente social apareceu, o garoto estava agarrado com ele, disse que fazia muito
tempo que o garoto vinha para sua casa escapando das discussões.
Lhe perguntou o
que ia lhe acontecer?
Vai para um
orfanato. Como o pai com certeza terá
cadeia perpetua, pois não é a primeira vez que sai dando tiros, tiveram que se
mudar da casa anterior por isso.
Eu posso
adota-lo, quando disse quem era, a mulher disse que já o tinha visto no teatro.
Ela perguntou ao
Samuel, se queria ficar com o Albert, ele se abraçou a mim, já sabia que sua
mãe, bem como sua irmã tinha morrido.
Não havia mais
familiares.
Fazemos o
seguinte, vamos conversar com um juiz de menores.
Foram os dois com
ela, por curiosidade perguntou por que ele morava ali.
Respondeu que
todo mundo o tratava bem, que vivia nessa casa desde que tinha vindo para
Londres, podia viver num lugar melhor, mas aqui todos são família, me sinto em
casa.
O juiz concordou
em lhe dar primeiro a guarda, depois a senhora ia acompanhar como funcionária
tudo.
Logo o colocou
numa escola, contratou uma senhora para ficar com ele, nos dias que tinha teatro,
esta acabou ficando definitivamente.
Acabou se mudando para uma casa num outro lugar, porque as crianças da
escola apontavam para ele. Era uma casa
muito bonita em Portobello Road, a senhora Hilde, passou a viver com eles, tinha
verdadeira paixão pelo Samuel, quando contou ao juiz por que tinha se mudado,
não queria que o garoto fosse vitima da curiosidade alheia. Este então autorizou sua adoção. Um advogado falou com o pai, que assinou a
autorização.
Passou a se
chamar Samuel Mark.
Nunca tinha encontrado
um amor por assim dizer, tinha algumas aventuras, mas romances nenhum, preferia
ficar sozinho que ter aventuras, nunca tinha se esquecido do John.
Samuel tinha 18
anos quando lhe contou a verdade, quando John lhe chamou, estavam os dois em
NYC, ele tinha aceitado fazer uma temporada com a peça que estava fazendo no
momento, claro saiu na televisão do pais inteiro.
Disse ao John que
lhe faltavam duas semanas ainda, que depois tomariam um avião, iriam a cidade
mais perto com aeroporto.
Arrumas um lugar
para me hospedar.
Claro ficas na
minha casa.
Não tens família?
Nunca me casei,
só amei uma vez na vida. Nunca te
esqueci.
Não disse nada, a
não ser que ele tampouco o tinha esquecido.
Vou preparar tua
mãe, dizendo que vens.
Quem estava
ansioso era o Samuel, era um filho espetacular, já tinha feito pequenas
aparições nos espetáculos que fazia, mas queria fazer belas Artes.
Tinha feito
muitos anos de tratamento psicológico, principalmente depois que soube que seu
pai verdadeiro tinha sido assassinado na prisão. Nunca chegaria a entender por que ele era tão
violento.
Nada realmente
era perfeito na vida, lhe dizia a ele, tentou descobrir de aonde tinha saído,
seus pais, vinha de um orfanato, depois os anos que ele esteve na guerra,
alguma coisa se fudeu aí.
Tomaram o avião,
não sabia como estaria o John, o imaginava como seu pai, que na época era
gordo, mas para sua surpresa, encontrou com um homem forte, mais alto que ele,
com um sorriso franco na boca, o beijou, apertou num abraço forte, meu amigo,
abraçou o Samuel, que filho bonito tens amigo.
Venham tenho o
carro fora. Era um carro moderno. No caminho para a cidadezinha, foi dizendo
não mudou muito, cresceu um pouco, ainda vou no nosso lugar favorito muitas
vezes, as vezes acampo ali, lembrando de nossa juventude.
Contou ao Samuel
que ia a esse lago, que dormiam até uma determinada hora, imagina se alguém que
vai acampar, leva relógio despertador, mas o fazíamos para que ele chegasse
cedo para se esconder do pai dele.
Não era meu pai,
nesse conceito nunca foi. Não se
preocupe, eu contei tudo para o Samuel, inclusive o que fazíamos os dois.
Tens alguém na
tua vida?
Nunca tive. Tive sim aventuras, nada demais, estava
sempre muito ocupado, depois tinha Samuel para criar.
Ele sempre
inventa esta desculpa para estar sozinho, quero ver como fará agora quando eu
estiver na universidade, talvez estude em NYC.
Porque nunca
fizeste cinema, como os outros atores Albert.
Porque gosto
muito de estar num palco, de sentir quando acaba a função, o cinema é uma coisa
de minutos, não é o que quero para mim.
Antes de vir, fiz
uma série para a BBC, porque tinha feito esse personagem no palco. Mas sigo sem
gostar.
Fale de minha
mãe?
Parece que quando
foste embora a vida deles se tranquilizou, ela seguiu vivendo para ele, não
fizeram nenhuma denúncia, tampouco te procuraram. Ele viveu mais dez anos, depois morreu de
enfarte vendo um jogo de futebol americano, pela televisão no bar com uns
amigos.
Ela seguiu
vivendo sua vida, até ir a pouco tempo para essa casa de pessoas de idade, mas
sempre ia conversar comigo, sobre ti, se arrependia de muitas coisas, achava
que agora era tarde. Quando te vi na
televisão, consegui gravar o vídeo, levei para que ela vise, ria muito, dizendo
que sem querer tinhas realizado o sonho dela.
Quando falei que
tinhas um filho, ficou contente. Tem uma
saúde forte para sua idade, vai adorar ver-te.
Amanhã é dia de
visita, podemos passar o dia inteiro lá.
Levaremos comida, fazermos um pic-nic no parque da residência.
Ele seguia
vivendo na casa do pai. Não cheguei a ir
ao exército, pouco antes, meu pai teve um enfarte, ficou com dificuldades para
falar, então assumi os negócios dele.
Nunca sai
daqui. Queria ir atrás de ti, mas não
sabia aonde estavas.
Eu levei muito
tempo para superar, ter que dormir naquele vão da escada, fechado, a primeira
vez que tive um quarto só para mim, foi como ir a Disney. Só tive uma casa grande quando o Samuel veio
viver comigo.
Antes que ele
perguntasse, o Samuel contou sua história, não tinha vergonha disso, tenho um
pai impressionante. O tinhas que ver no
palco. O papel que fazia nessa última
peça de teatro, ele fica irreconhecível, faz um mendigo. Mas o publico vem
abaixo quando descobre que é ele.
Mesmo já sabendo
que ele faz esse papel, se esquecem no momento que ele entra em cena.
Nunca me cansei
de ver meu pai no palco. Isso que
ensaiamos juntos os textos antes, ele discutia sempre comigo desde criança,
para que eu entendesse o personagem.
Colocou a mão
sobre o braço do pai. Sempre foi
honesto comigo.
Não me esqueço da
primeira vez que busquei refugio na sua casa, era pequeno, estava sentado nos
degraus da cozinha de sua casa, quando ele abriu a porta me viu, me sorriu,
escutou o que se passava, perguntou se eu tinha tomado café. Nos sentamos na cozinha, só perguntou meu
nome, ficamos amigos nesse momento.
Depois cada vez que ia tinha biscoitos, bolos ele sempre foi um péssimo
cozinheiro, Hilde a senhora que sempre cuidou de mim, ria muito dizendo que na
cozinha ele era um desastre.
A contratou para
ficar comigo, nos dias de espetáculos, acabou vivendo conosco, agora esta lá
como grande senhora da casa, enquanto estamos aqui.
Ele quando eu era
criança, me contava sempre as histórias da infâncias de vocês, eu as vezes
pensavam que ele inventava um personagem.
Mas quando me contou a história de vocês, entendi que ele te amava.
Albert, cortou,
já basta disso Samuel.
John ria, não te
preocupe, ele era igual, quando nos encontrávamos para ir a escola, quem falava
era ele, o livro que tinha lido essa noite no desván, ali embaixo da escada,
depois me dizia que o saco de dormir que lhe emprestei, tinha meu cheiro, que
isso o fazia se sentir acompanhado. Íamos
para escola, ele falando da personalidade do personagem da história, o
analisava a fundo. Dizia que nunca
saberia analisar o que pensava que era seu pai, pois este nunca falava do seu
passado.
Com o tempo
basicamente morava nesse pequeno espaço, escuro, mas quando estávamos juntos
nos divertíamos, dizia que eu era seu sol.
No verão,
escapulíamos para ir nadar nesse pedaço do lago, que ninguém até hoje vai,
tirávamos a roupas, ficávamos nus, nos divertíamos.
Samuel para
provocar, soltou, faziam sexo que ele me contou.
Ficaram os três
rindo muito.
A casa de meu pai
é a mesma, mas a reformei depois que ele morreu, graças a deus morreu
dormindo. Foi um pai fantástico.
Mal entraram, não
podia dizer que era como retornar ao passado, mas a casa parecia realmente um
lar.
A pouco tempo,
vendi a loja para um chinês, porque já estava farto, nunca foi meu sonho cuidar
da mesma, meus sonhos ficaram para trás.
Venha mostrou os
quartos preparados para eles.
Samuel que tinha
um bom humor, soltou, ué, pensei que o ia arrastrar para teu quarto.
Se ele quiser,
será bem-vindo, mas iremos devagar.
Foram almoçar no
único restaurante da cidadezinha, agora pertencia a uma família que tinha vindo
de fora. Mas claro todos o
reconheceram da televisão.
Afinal era um dos
filhos da cidade.
No outro dia de
manhã, saíram para visitar sua mãe.
Esta estava
sentada numa cadeira de braços, fazendo tricô.
Riu de observar de longe, ele seguia bem cuidada, bonita como sempre
tinha sido.
Quando o viu, se
levantou, ele correu para ela, abriu seus braços, ah meu filho.
Quando viu o
Samuel, o abraçou, beijou muito, tens sorte aprendi a abraçar, beijar os outros
depois de velha, quando jovem era muito seca, com as pessoas, quando muito
estendia a mão, talvez pela educação que tive.
Sentou-se no sofá, entre os dois, ah que bom te ver, realizaste meus
sonhos de juventude, queria ser atriz, acabei aqui nessa cidade, mas fazer o
que, eram coisas da época.
Depois os dois
ficaram sozinhos, ela soltou, talvez foi a melhor coisa teres ido embora, ele
nunca reclamou nem disse nada do dinheiro que levaste, me queria somente para
ele.
Nos poucos anos
que esteve vivo, a sua maneira foi feliz, deixou de beber tanto, mandou abrir
aquele pedaço embaixo da escada, riu quando descobriu por aonde escapavas. Me dizia ele vai sobreviver, pois é
inteligente. Foi quando descobrimos que
estavas adiantado na escola.
Eu também fugi de
casa, erámos muitos, nem sei hoje em dia aonde era o lugar que vivi minha
infância, aprendi a ler direito a escrever, quando fui trabalhar nesse bar.
Se perguntas se
eu o amei, não sei dizer, só sei que ele cumpriu o que prometeu, voltar para me
buscar. Apesar de não seres filho dele
te adotou, embora não gostava de crianças, não sabia lidar com isso, depois me
contou que tinha sido muito infeliz em criança, por causa de seus pais.
Tinha dificuldade
em lidar com isso.
John tem sido um
filho para mim, agora na minha velhice, vem sempre que pode conversar comigo,
na verdade o assunto dele, eres tu, sempre te amou essa é a verdade, falam dele
na cidade, mas não parece se importar de estar sempre sozinho.
Nessa noite,
ficaram os dois sentados no sofá da casa do John, ele contou sua vida para ele,
como tinha ido, até chegar a Toronto, do professor que o levou para Londres,
seus começos, seus sonhos alcançados.
Podia vir conosco
passar uma temporada, se gostas, pode ficar.
Eu agora dou mais
espaço entre os espetáculos que participo, viajamos quando Samuel esta de
férias, vou aonde ele queira. Quero
sempre ser para ele o pai que não tive, tinha inveja de ti com o teu.
Mas nunca ninguém
me abraçou, me cuidou como tu. Talvez
por isso, fiquei sozinho, não gosto de sexo sem carinho, erámos como fazíamos.
Pela primeira
vez, John segurou seu rosto, lhe deu um beijo terno, nunca me esqueci de ti.
Tive também aventuras em outras cidades aqui perto, mas nunca quis ninguém.
Nessa noite
dormiram juntos, foi como voltar ao tempo, se divertiram como faziam.
Se lembra,
inventávamos maneiras de fazer sexo, sem saber direito como era.
No dia seguinte
tiveram que aguentar Samuel, que ria dos dois.
Foram até o lago,
o tempo estava bom, fazia calor, se jogaram na água, depois Samuel, foi fazer
uma caminhada, os dois ficaram ali namorando, lembrando das coisas.
Uma coisa
importante incutiste em mim, adoro ler por tua causa.
Dias depois
quando analisava sua vida, o que deveria fazer, antes de conversar com o filho
ou mesmo com John. Recebeu uma chamada
da casa de maiores aonde vivia sua mãe.
Esta tinha falecido durante a noite.
Procederam seu
enterro ao lado do marido, bem como teve que ir a leitura do testamento, era
muito dinheiro, decidiu que uma parte iria para o fideicomisso do filho, outra
parte para a residência, para ajudar as pessoas que não podiam pagar, o resto
ele doou a escola aonde tinha estudado, para que se modernizasse.
Feito isso se
sentiu livre, foi quando se sentou com os dois para conversar. Tinha que voltar para Londres, as férias
tinham terminado.
Sentiu imediata
repulsa do John que disse que nunca tinha pensado em sair dali, que não saberia
viver numa cidade grande. Que tinha
pensado que ele tinha vindo para ficar ali definitivamente com ele. Falou tanto que ficou olhando, desconhecia
essa parte dele, o medo de sair para o mundo.
Tinha se acostumado a sua pequena vida, que não pensava mais além.
Estava feliz com
ele ali, mas seguira estando se ele não estivesse.
Bem eu tenho
compromissos, tenho que ir, afinal é a minha vida, tu vive de rendas, eu
seguirei sempre trabalhando.
Samuel, ia
experimentar estudar em NYC, caso contrário voltaria para Londres.
Quando chegou em
casa, sentiu-se pela primeira vez sozinho.
Principalmente porque seu filho não estava ali. Ficou imaginando John descobrindo a cidade,
mas por sorte em seguida começou os ensaios, quando viu estava mergulhado na
sua vida, a que amava.
Dois meses depois
Samuel, voltou, não tinha gostado de estudar na América, para todos era um
idiota Britânico.
Quando o
espetáculo estreou, chamou o John, para saber se queria vir, ele respondeu numa
conversa amistosa, que o retorno dele, os dias que estiveram juntos, o tinha
liberado do passado, que estava tentando ter um relacionamento com um homem que
conhecia de tempos atrás da outra cidade, agradecia o convite, mas que sua vida
estava ali.
Samuel, pensava
como ele, John sempre tinha sido uma pessoa acomodada, seus sonhos eram
restritos a vida da cidade.
Ele seguiu em
frente, a série tinha feito sucesso, principalmente pelo seu personagem,
queriam que fizesse outra tanda de capítulos. Acabou aceitando, visto ser um
trabalho continuado, que podia fazer durante o dia.
Durante a
filmagem se reencontrou com um ator, com quem já tinha feito teatro, começaram
a recordar os velhos tempos, o outro disse que tinha se divorciado finalmente,
que sem filhos, tinha resolvido sair do armário, era muito pequeno dizia, pois
eram um homem grande. Saiam para almoçar conversavam sobre o assunto do seu
mundo o teatro. Os dois tinham um ponto em comum, amavam o que faziam.
Resolveram fazer
uma peça juntos para relembrar os velhos tempos, foi um sucesso impressionante,
ficaram meses em cartas, tinham pensado em três, acabaram ficando seis.
Um produtor
queria fazer do espetáculo um filme.
Pela primeira vez analisava com outra pessoa se deviam ou não fazer o
mesmo.
Um dia
conversando sobre suas vidas particulares, os dois comentavam que sentiam falta
disso alguém com quem compartir as coisas, que as aventuras eram como
relâmpagos, pois na verdade sonhavam com outra coisa, sem querer acabaram
experimentando fazer sexo, como diriam depois rindo um para o outro, que tinha
sido muito, mas muito bom. Eram iguais
na cama, gostavam das mesmas coisas, aprenderam a se explorar.
Agora quando um
estava fazendo um trabalho, o outro ajudava a preparar texto, personagem,
debatiam o que entendiam.
Quando a segunda
parte da série estreou nos Estados Unidos, John ligou, tinha se esquecido
completamente dele.
Reclamou que o
que tinha tentado com seu namorado, não tinha dado certo, pois o outro queria
explorar o mundo, ele não.
Poderia lhe dizer
como forma de vingança, agora tenho alguém, mas não o fez, escutou, disse ao
amigo que ele devia revisar sua vida.
Ele, com Magnus,
foram convidados para levar um espetáculo na Broadway, sentaram para conversar
a respeito, justo nesse dia Samuel, trouxe sua namorada para conhecer os dois,
uma garota agradável. Estavam os dois
fazendo parte de um espetáculo moderno do West End, com relativo sucesso,
Samuel tinha desistido de Belas Artes, estava fazendo um curso de escenografia.
Estava
coordenando o cenário que queriam para a peça que levariam para a NYC, queriam
que fizessem uma turnê por várias cidades americanas. Mas os dois não queriam. Era muito tempo fora
de Londres.
Fizeram a
temporada americana, voltaram para casa, agora tinha certeza de que seu lugar
era em Londres, aonde na verdade tinha escolhido viver a tanto tempo.
Ele bem como o
Magnus, viviam juntos a muito tempo, tinham o mesmo grupo de amigos, o que era
interessante, os dois não gostavam de festas.
Quando Samuel se
casou, os dois se sentiram felizes por ele, Magnus tinha aprendido a conviver
com o filho dele.
Samuel, lhes
perguntou por que não se casavam, fariam uma cerimônia só.
Conversaram muito
a respeito, depois se sentaram-se com os dois para debater o assunto.
Acabaram
aceitando o convite, mas a festa era só do Samuel com a Noiva.
Quando nasceram
os primeiros filhos do casal, eram os avôs perfeitos.
Muitos anos
depois, recebeu uma carta do John, enviada pelo seu advogado, lamentava sua
covardia, devia ter fugido contigo quando partiste, mas tinha medo, esse sempre
foi meu problema, medo, não querer me arriscar, talvez a única coisa que eu
tinha como suporte foste tu. Te
entendia, bem como invejava teus sonhos.
Conseguiste tudo que eu não fui capaz, viver, acabei numa residência
como tua mãe, me sentindo um idiota, pois mesmo as pessoas que estava ali,
tinham vivido, eu nunca tive nada para contar.
Mas segui o que
fizeste com o dinheiro de tua mãe, doei para os que tinha sonhos.
Eu fio parco
deles, o único que tinha era viver uma vida contigo, mas isso era impossível,
pois querias mais.
Deu a carta para
o Magnus ler, tinha contado toda sua vida para ele.
Quando os meninos
do Samuel já eram grandes, este perguntou se não pensavam em parar. Os dois
riram, queres é nos matar, somos da casta que quer morrer em cena.
Foi o que
aconteceu com Magnus, estava fazendo um texto de Shakespeare, morreu no final
do espetáculo, no camarim, quando trocava de roupa. Um enfarte fulminante.
Seu enterro foi
impressionante, na cerimônia ele falou, que não só perdia seu companheiro, mas
também, um amigo, camarada, a pessoa com quem compartia um amor maior o Teatro.
Em seguida estava
fazendo a primeira montagem do Samuel, de um texto que os dois desde que ele
era criança debatiam “Rei
Lear”, foi uma montagem premiadíssima.
Os garotos do Samuel, sempre iam ver o avô ensaiar. Os dois tinham o teatro na veia também.
Ele seguiu em frente trabalhando, claro agora escolhia os
papeis condizentes com sua idade, uma vez brincando disse ao Samuel, não vais
querer que faça um Romeu e Julieta.
Meses depois, Samuel apareceu com um texto, lhe entregou para
ler. Quando leu o nome do autor, riu,
era o primeiro texto que ele escrevia.
Uma adaptação de Romeu e Julieta aos tempos modernos. Só que desta vez, era a paixão de dois homens
que se reencontram depois de muitos anos, que as famílias separaram.
Foi um dos produtores do espetáculo, avisavam que só era uma
adaptação, não o texto original.
O único que aceitou fazer o outro papel, foi um ator de sua
mesma idade, que sempre disputava com ele os papeis. Nunca se bicaram, mas ao primeiro beijo que
tinham que trocar em cena, se apaixonaram.
Riam pela idade deles, Gregory, era viúvo como ele, tinha um
casal de filhos, já com suas vidas feitas, um era advogado a filha era diretora
de um banco.
Não se esconderam, riam muito do fato de terem idade avançada,
mas se completavam, amavam estar no palco, bem como estar com suas famílias.
Gregory, ria dizendo que finalmente tinha se encontrado,
sempre tinha tido medo da relação de dois homens, tinha tido muitas aventuras
com mulheres, mas resolveram não se casar, viver juntos, sem problemas.
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