MOSHÉ
Sou Abe, Abraham Sian, meu pai, meu irmão mais velho se chamavam
Moshé, era tal para qual, pois eram cabeças duras. Adorava meu irmão, tínhamos uma diferença de
idade, ele era quase quatro anos mais velho do que eu, só muito anos depois foi
que descobri numa discussão dele com minha mãe, que não era seu filho, sim do
primeiro casamento de meu pai, desses arranjados.
Meu pai era francês,
minha mãe, alemã, mas os dois eram judeus.
Também foi um casamento arrumado pelo pais dos dois, ambos joalheiros de
renome.
Estou escrevendo
isso, por sentir que com a minha idade, em breve perderei as faculdades de me
lembrar de tudo com detalhes. Ou
acredito que me é mais fácil me lembrar desse passado que do que comi de manhã,
brincadeira, sei que foi um café forte como gosto, com croissant que são minha
perdição. Outro dia o médico disse que
não deveria comer tantos, o mandei tomar no cu, o que me importa isso, já estou
velho mesmo, para que ficar me privando de uma coisa que adoro.
Passamos muitos
apertos, mas sobrevivemos, essa é a verdade.
Tinha verdadeira
paixão, por duas pessoas que foram muito importantes em minha vida, meu irmão
Moshé, bem como meu tio Henry, nunca soube por que tinha um nome que escapava a
tudo que era judeu.
Ele como eu, era
filho do segundo casamento de meu avô.
Era considerado o ovelha negra da família, segundo meu pai, meu avô
acusava sua mulher de ter estragado o filho.
Meu pai dizia que um dia Henry quando fez 18 anos desapareceu, foi para
a Palestina, segundo ele para aprender árabe.
Isso deixaria meu avô furioso.
Um dia, apareceu
em Berlin, eu adorava abrir a porta de casa, quando chamaram a porta, fui
correndo, meu pai gritando, devagar, queria chegar antes do Moshé a porta, sempre
disputávamos, ele sempre ganhava, mas desta vez eu cheguei primeiro.
Me apaixonei por
ele nesse momento, diante de mim, estava um homem completamente diferente de
meu pai, alto, loiro, com imensos cabelos cacheados, não se usava assim naquela
época, uma roupa completamente sui generis, nunca tinha visto nada igual.
Fiquei com a boca
aberta, me pegou nos braços, dizendo, tu deves ser Abe, a partir desse momento
sempre me chamaria assim.
Meu pai correu
para ele ao escutar sua voz, se abraçaram, eu achava interessante, meu pai,
repetia o abraço, segurava sua cara com as duas mãos, beijava seu rosto varias
vezes, me disse, esse é meu irmão pequeno Henry, mas como pronunciava, parecia
dizer Enry.
Minha mãe, veio
correndo, se jogou nos seus braços.
Quando Moshé
chegou da escola, o olhava com desconfiança, pela sua roupa. Levei anos para descobrir por que se vestia
assim, nada combinava com nada. Quando
lhe perguntei, me deu uma explicação que me pareceu logica com o passar dos
anos, que ele era assim, não combinava com nada do pré estabelecido.
De noite depois
de minha mãe ter posto para dormir os gêmeos, que eram os pequenos da casa,
Roger e Rufus, nomes escolhidos por ela.
Fiquei sentado
aos pés de meu tio, estava muito sério, irmão, tens que ir embora daqui, a
coisa vai ficar feia. Ou pelo menos
mande sua família para Paris.
Meu pai
argumentava sobre a loja, como ia fazer.
Henry era
enfático, isso tudo vai desaparecer, esses nazistas acabaram com tudo, pode ter
certeza do que falo, sabes que tenho minha fontes.
Meu pai não
arredava o pé, minha mãe concordava com tio Henry.
Tanto falaram,
que no dia seguinte ele tentou negociar a venda da loja para o vizinho, um bom
filho da puta diga-se de passagem.
Henry convenceu
minha mãe, uma bagagem para cada um para não chamar a atenção, era aquelas
malas tipo papelão.
Moshé queria
ficar com meu pai, mas esse disse que em breve quando vendesse tudo iria nos
encontrar. Mas de qualquer maneira levava uma maleta na mão. No ultimo momento decidiu ir, mas teria que
ir em outro vagão, pois no nosso já não tinha lugar.
Na estação havia
imensa confusão, meu tio Henry, levava os meninos nos braços, minha mãe a
bagagem deles, além da sua, Moshé me empurrou para subir antes, eu fiquei ali
olhando meu pai, lhe disse, te amo pai.
Ele olhou para trás, fez uma coisa que não entendi na hora, trocou minha
bagagem pela sua, olhava para trás, o trem começou a se movimentar, ele correu
para o vagão que lhe correspondia, eu corri para a janela para olhar, mas ele
não subiu no trem, dois homens com o filho da puta do vizinho o pegaram, estava
deitado no chão com uma arma na cabeça.
Falei com tio
Henry, mas já era tarde o trem tinha saído da estação ganhava velocidade.
Ele foi correndo
ao vagão aonde meu pai deveria estar, mas claro, nem tinha entrado no trem.
Quando chegamos a
Berna, ele se reuniu com dois tipos estranhos, que ficaram de informar.
Ficamos dois dias
esperando, um dia o vi chegar na porta do edifício, ficou parado, quando olhou
para cima me viu, estava chorando, limpou a cara, se fechou com minha mãe, ouvi
que soltava um grito.
Nesse dia
reclamou porque não trocava de roupa, lhe disse que não podia, porque meu pai
tinha minha maleta, quando abriu a que me tinha dado, tinha roupa por cima, mas
por baixo era muitos saquinhos de diamantes.
Ela mostrou ao
Tio Henry, esse me perguntou como meu pai tinha se comportado na plataforma,
lhe disse que não parava de olhar para trás, foi quando trocou as maletas.
Ah, então foi por
isso, segundo os informantes tinham destruído toda a loja, procurando os
diamantes.
Nesse mesmo dia,
meu tio saiu comigo, Moshé, para não chamarmos atenção, comprem roupas
diferentes, nos deixou escolher. Eu
queria algo como ele, ria muito, escolhi coisas que não se combinavam entre
si. Minha mãe com os pequenos, entrou
em outra loja, saiu vestindo calças compridas, nunca mais colocaria saias ou
vestidos. Era como se a partir de agora
ela fosse o homem da família. Me
explicou nesse dia o que tinha acontecido.
Quando chegamos a
Paris, fomos para o apartamento que era do nosso avô, nunca o tinha visto na
vida, sabia que tinha morrido no ano anterior.
Por isso Henry tinha voltado da Palestina, para cuidar do pai.
Quem abriu a
porta, foi um homem imenso, de uns dois metros de altura, negro, que levantou
Henry nos braços, acabou sendo um homem importante em minha vida. Era músico de
Jazz, tocava clarinete, seu nome era igual ao meu Abraham, talvez daí meu tio
me chamar sempre Abe.
Ajudou minha mãe
com as crianças, lhe deu as boas-vindas, creio que Henry a preparou para isso,
viviam os dois juntos.
Eles ficariam nas
dependências de empregados, nós como o resto da casa. Fiquei num quarto com Moshé, o que era um
inferno, pois ele não dizia palavra.
Estava furioso
com o mundo.
Dias depois,
fomos todos a uma sinagoga ali perto do apartamento, em Marais, um desses
homens vestidos de negro, nos negou a entrada, ele pediu para falar com o
Rabino, Michael, saiu um homem jovem que o abraçou. Lhe explicou a situação, queriam rezar um
Kadish por meu pai. Mas os velhos não
permitiam a entrada dele, nem de minha mãe, pela maneira como estavam vestidos.
Michael, disse,
me espere um minuto, voltou com seus paramentos, fomos a Place Les Voges,
rezamos ali, me tinha ensinado durante a noite.
Moshé não abriu a boca, mas as lagrimas corriam pela sua cara, minha mãe
o abraçava.
Meses depois,
tivemos outra reunião, Hitler se preparava para invadir Polônia, Henry dizia,
ele não vai parar, nada aqui é seguro para a gente, devemos ir embora. Lhe deu a opção de ir para NYC, mas ela não
queria, vou contigo para Palestina, acho melhor.
Uma noite, ele
saiu com Abraham, no dia seguinte tínhamos um carro na frente de casa, era
grande, cabíamos todos.
Ele disse, como
sempre, leve somente a maleta do Moshé, ele sabia o que fazia.
Fomos descendo a
França inteira, mas quando chegamos a Marseille, não conseguíamos nenhum barco
para nos levar para a Palestina. O jeito
foi ele convencer um pescador que tinha um barco grande, para nos levar, pagou
um bom dinheiro para isso.
Moshé queria
ficar para brigar com os alemães, se viessem por terem matado nosso pai. Foi então que descobri que minha mãe, não era
a sua. Quando ela lhe deu uma ordem, ele
não obedeceu dizendo que ela não era a mãe dele, que faria o que queria.
O jeito foi o
Abraham, pega-lo, levantar do chão, colocar nos seus ombros, entrar no barco.
Quando ele se
livrou, já estávamos longe, além dele não saber nadar.
Henry disse ao homem
aonde devia nos deixar, tinha que ser de madrugada, por causa da vigilância
britânica.
Desembarcamos
numa praia, ele tirou nossos sapatos, meias, amarou os cordões, nos colocou
pendurado no pescoço, a maleta tinha que ficar na cabeça. James desceu com os meninos um em cada braço,
Henry levava seu instrumento, de novo Moshé disse que voltava com o homem para
a França, desta vez foi o homem que perdeu a paciência, o tirou pela borda, bem
como sua maleta. Merece uns cascudos.
Foi embora, no
final o único que acabou molhado foi ele.
Estava furioso, quando ficava assim não falava nada.
Na praia tinham
um amigo do Henry nos esperando com um velho ônibus escolar, nos levou a Tel
Aviv, num apartamento que o Henry seguia pagando.
Vinham
conversando em uma língua diferente, eu adorei ao instante, o homem segundo
Abraham era um sabra, me explicou o que era.
O apartamento era
menor, mas teríamos que nos apanhar, por enquanto iriamos dormir em dois
quartos, eles em um, nos no outro, mas resolvi que podia muito bem dormir na
sala, de noite arrumei uma manta, de madrugada me despertei, com Abraham indo
ao banheiro nu, tinha uma pele incrível, mas o que me apaixonava nele, era
quando ficava pela manhã, ensaiando com o clarinete, o som enchia minha alma.
As vezes saia com
ele pelas ruas da cidade, ele parava numa esquina, ficava tocando para ganhar
uns trocados, outras lhe chamavam para tocar com algum grupo.
Eu sempre tinha
milhões de perguntas para ele. Me contou de aonde era, que lá matavam os
negros. Era do Mississipi, que tinha
aprendido música com sua mãe, não sabia quem era seu pai. Ele tinha conhecido Henry na França, aonde
achou melhor viver. Tocava Jazz nos
clubes de Saint Germain de Prés. Foi
aonde se conheceram, ajudou Henry a cuidar do pai, o amava com loucura.
Foi duro o Henry
conseguir documentos, escolas para todos, por isso acabou trabalhando para os
Ingleses, pois falava várias línguas, era uma espécie de secretário, que fazia
as funções de filtro nas reclamações dos árabes, esses pensavam que ele era um
deles, pois falava perfeitamente a língua.
Nos fomos para a
escola, era complicado, pois o único lugar que nos aceitou, foi uma escola
inglesa. Os argumentos do Henry sempre
batiam contra os de Moshé, assim vocês aprende outra língua, nunca sabemos o
dia de amanhã, se vossa mãe tivesse resolvido ir para os Estados Unidos, teriam
que aprender. Moshé ao contrário, queria falar o ídiche,
minha mãe o levou para falar com um rabino, era um velho simpático, esse acabou
convencendo o Moshé que podia estudar inglês, de tarde ir conversar, estudar
com o velho em ídiche. Foi a solução,
mas sempre estava metido em alguma confusão.
Eu ia a escola
contente, tinham aulas de música, comecei a tocar piano.
Minha mãe
conseguiu um apartamento só para nós, quando conseguiu um emprego, ela também
falava várias línguas, então foi fácil.
Agora eu tinha
meu quarto, às vezes, tentava entender o Moshé, mas ele sempre me rejeitava,
mas quando tinha algum problema, vinha falar comigo. Achava divertido, pois me contava coisas que
lhe afligiam, que eu não entendia, mas escutava.
Um dia me soltou,
que não suportava esse relacionamento do Henry com o Abraham, eles dormem
juntos, como se fossem marido e mulher.
Não esperava
minha resposta, o problema não é teu, é deles, depois uma coisa meu irmão eles
se amam, nos ajudaram a escapar, agora com a França invadida, ficávamos sabendo
que nos esperava se estivéssemos lá.
Ele queria voltar
para lá, para entrar para os Partisans, sempre tinha isso na cabeça.
O amigo de tio
Henry, nos levava para o campo para fazer exercícios, nos ensinava a atirar. A primeira vez, cai sentado de bunda no chão,
fazia os exercícios, apesar de não gostar.
Ao contrário Moshé, parece que encontrou seu mundo.
Com 16 anos se
engajou num grupo clandestino, desaparecia semanas, minha mãe ficava aflita,
mas tinha que cuidar além de trabalhar, dos pequenos, eu ajudava no que podia.
Fui crescendo, ao
contrário do Moshé que eram mais moreno, com os cabelos negros, eu era como
ela, loiro, olhos azuis, fui esticando.
Em 1947, passamos
quase um ano sem ver o Moshé, quando apareceu, foi para avisar minha mãe, que
ou ela ia para os Estados Unidos, ou teria que nos proteger direito, pois ia
começar a guerra pela emancipação de Israel.
Ela começou a falar com ele, mas como sempre saiu com, você não é minha
mãe.
A resposta dela,
foi, mas sempre te amei como meu filho, quando teu pai chegou contigo na
Alemanha, eu te aceitei como meu filho, sempre te quis assim. Pare de colocar isso como defesa, para nunca
escutar os demais, se teu pai tivesse escutado o Henry como devia, estaria aqui
conosco, mas como ele és um cabeça dura.
Ele saiu batendo
a porta. A mim me disse, preciso de ti,
não te metas nessa guerra, eres muito jovem.
Mas ela sim se
meteu, ajudava nos hospitais, a mim me tocou cuidar dos meninos, que ficavam
como loucos para saber de tudo. Eu os ia
levar na escola, tinha que tomar cuidado para não escaparem. Abraham, com meu tio Henry se meteram direto
nessa guerra, mas o pior parado foi Abraham que voltou com um braço a menos,
minha mãe o levou para casa, para cuidar dele, as vezes o via chorando, pois
nunca mais poderia tocar seu saxofone, sem querer, eu comecei a tocar todas as
musicas que o tinha visto tocar, ficou com a boca aberta, com era que eu tinha
aprendido. Lhe disse que lhe ver tocar,
começo a me ensinar, desde melhorar minha embocadura, como devia posicionar os
braços, cantava uma música americana, eu tinha que conseguir tocar. Os meninos ficavam sentados quietos
escutando, isso os deixava relaxado, mas eu adorava aquele homem por causa
disso, da sua música. Depois começou
comigo um outro aprendizado, a emoção, tens que pensar o que significa essa
música, o que ela quer dizer, me fazia repetir um cem número de vezes a mesma.
Os meninos como
eu, o adorávamos. Quando Henry
finalmente apareceu, tinha dois ferimentos graves, ficou entre a vida e morte
muito tempo, quando saiu do hospital, minha mãe fez a mesma coisa, o levou para
casa. Nos dois cuidamos dele, os meninos
os dois eram super agitados, mas Rufus tinha uma coisa, adorava ler, se sentava
na cama do tio, contando o que estava lendo, inventava as histórias que ele
achava que no livro não estavam bem, discutia com Henry os personagens, porque
tinha feito, ou deixado de fazer.
Roger era ao
contrário, com o rádio sempre pegado a orelha, para saber alguma coisa do que
estava acontecendo.
Minha mãe quando
chegava em casa morta de cansada, dizia que bem que vivia numa república de homens,
pois os meninos lhe tiravam os sapatos, lhe faziam uma massagem nos pés, Abraham,
saia da cozinha, com uma caneca de caldo que estivesse fazendo, tinha aprendido
a cozinhar com um só braço, queria ser útil.
Ajudávamos meu tio se sentar na sala para conversar com minha mãe. Quando esta perguntou de Moshé, ele não
tinha ideia de aonde estava.
Quando Henry se
recuperou, estava diferente, como ter visto a morte de perto o tivesse afetado,
logo assumiu um cargo na Mossad, ai a relação com Abraham se foi ao caralho,
simplesmente o abandonou, não podia ver o mesmo com um braço só por culpa sua,
pois ele tinha insistido que luta-se do lado deles.
Ia fazer 17 anos,
quando Abraham que seguia vivendo lá em casa, me perguntou se eu iria servir o exército
ou queria ser um músico de verdade.
Viram outras guerras por aí, quero saber se estas disposto a perder como
eu um braço, ficar sem poder fazer música.
Ele tinha
recebido um convite para trabalhar com jovens músicos na Juilliard em NYC podes
vir comigo se quiseres. Minha mãe na
surdina, preparou meus documentos, me emancipou, me deu dois diamantes dos que
tinha guardado, deus sabe aonde. Bem
como um contato lá para que pudesse fazer dinheiro com os mesmo, anotou num
papel, o peso, os colocou numa pequena bolsa, que eu levava presa nas minhas
calças. Comprou ela mesma o bilhete de
avião, no mesmo voo do Abraham.
Minha mãe contou
que quando o Henry descobriu, ficou uma fera, como ela podia fazer isso nas
costas dele. Não sabia o quanto ele
queria o Abraham.
Se o querias
porque o deixaste abandonado. O teu
irmão vivia dizendo que a família estava acima de tudo, mas se não fosse cabeça
dura tinha saído com a gente muito antes.
Sempre é muito
tarde para chorar o leite derramado.
Ela seguiu em
frente com os dois, Rufus não dava problema, estava bem direcionado, queria ser
escritor, mas Roger, ah esse era um caso a parte. Seu deus era o Moshé, ninguém sabe como
descobriu aonde estava, foi ficar com ele.
Henry contou a
minha mãe, que ele era o braço pesado do Mossad, era como um agente especial
encarregado de execuções, ela ficou horrorizada, tira teu sobrinho disse, não
se referia ao Moshé, mas sim ao Roger.
Henry conseguiu
traze-lo para trabalhar com ele, mas ele queria ação.
Na guerra do Yom Kippur,
perdeu a vida de maneira bestial. Logo
em seguida, agora eu participava de atuações com um grupo de jazz, estava
entrando em cena, quando me disseram que tinha uma chamada para mim. Respondi, me que me chamassem dentro de uma
hora.
Não suportava que
me interrompessem antes de uma atuação, pois gostava de me concentrar, entrei
em cena, no fundo do local, estava o Abraham com seu novo namorado, eu morria
de ciúmes, pois o queria. Toquei como se
minha alma estivesse destroçada.
Quando acabamos o
show, me avisaram da chamada outra vez, era minha mãe para dizer que o Roger
estava morto, se arriscou numa batalha, por nada, morreu da maneira mais idiota
possível.
Me perguntou se
podia ir para rezar o Kadish, eu lhe respondi que pegaria o primeiro voo, falei
como Abraham, ele disse que iria junto.
No voo me
perguntou por que tinha tocado dessa maneira.
Fui honesto, lhe
disse que não podia suporta vê-lo com um novo namorado. Que sempre tinha sido apaixonado por ele.
Colocou a mão que
lhe sobrava em cima da minha, me disse que podia ser meu pai, que isso era uma
honra para ele, mas eu tinha que pensar que entre nós dois isso era impossível,
que eu devia procurar alguém que realmente merecesse isso. Creio que confundes, que estou junto contigo
desde criança, te ensinei a tocar, me vês como um pai que orienta um filho.
Talvez fosse
isso, pois aquele desabafo me ajudou a encarar de outra maneira. Quando
voltasse gravaria meu primeiro disco.
Estava muito nervoso com isso, mas ele estava sempre comigo.
Chegamos a Tel
Aviv, fomos direto para o cemitério, rezei o Kadish por meu irmão, maldizendo
ter herdado de meu pai, a cabeça dura.
Minha mãe, disse
que pensava ir para NYC, por causa do Rufus, queria estudar lá, não quero que
outro filho meu morra numa dessas guerras não vou aguentar.
Voltou conosco,
foi viver com o Rufus, num pequeno apartamento perto do meu. Para ele agora eu era seu referencial. Era quem lia o que escrevia, com quem
conversava.
Seu outro
referencial era o Abraham, que estava sempre conosco, ele era a única família
realmente que tínhamos agora. Um dia Henry
apareceu, tinha vindo a uma conferência na ONU, estava chateado, porque
tínhamos vindo embora sem nos despedir dele.
Abraham, me
ajudava num trabalho que estava preparando para meu segundo disco, o primeiro
tinha ido bem, nesse agora, eu tocava uma música que amava, a Suíte Bergamasque
de Debussy, a fazia com uma interpretação toda minha, quando saiu o disco com
uma foto minha, Abe Sian, a primeira que recebeu foi minha mãe, me abraçou
chorando.
Henry ainda
estava por lá, foi assistir a apresentação, nos disse que era hora que
voltássemos para lá.
Ficou furioso
quando no dia seguinte numa entrevista na televisão, me perguntaram de aonde
era, lhes disse que tinha nascido em Berlin, mas que tinha aprendido amar a
Paris.
Não falei em
momento algum em Tel Aviv, Israel, nada disso.
Sempre me tinha sentido como um estrangeiro por lá.
Me deu um sermão,
dizendo que eu não podia renegar meus laços de sangue, soltei na sua cara que
laços de sangue eu tinha com o Abraham que sempre tinha estado ao nosso lado
quando necessitávamos, que ele só nos queria para dizer que tinha uma
família. Segundo minha mãe, ele foi ao
enterro do Roger, porque não teve escapatória.
Tentou falar com
o Abraham para convence-lo, este lhe soltou na cara, não sou judeu, perdi um
braço lutando uma guerra que não era minha, esse menino, me salvou a vida,
tocando meu instrumento, para me dizer que precisava de mim. Estarei aonde este essa família que agora é
minha.
Tínhamos deixado
a muito de ir a sinagoga, ele ao contrário agora ia, dizia que precisava disso
para poder respirar suas culpas. Minha
mãe perguntou pelo apartamento do meu avô, ele disse que estava alugado, mas o
conseguiria para nós.
Quando acabou a
temporada, fui chamado para tocar com a orquestra da Opera de Paris, todo meu
repertório clássico. América tampouco
era meu lar, tinha sido um lugar de aprendizado.
Minha mãe fez uma
reunião, os quatro nos sentamos, falamos no assunto. Rufus foi o primeiro a dizer que queria ir
estudar na Sorbonne, a duvida era o Abraham, ele soltou rindo, que aonde a
família dele fosse ele iria.
Nos instalamos
num outro apartamento primeiro, enquanto ele com minha mãe, reformavam o do meu
avô, que segundo ela era muito escuro, arrancou todos os papeis de paredes, mandou
pintar tudo de branco, reformou os banheiros, fez um apartamento para o
Abraham, que ele podia entrar por outra porta, se trouxesse um namorado.
Enquanto faziam
isso, eu ensaiava com a Orquestra, era um concerto fantástico, me apaixonei,
ele me ajudou, ia para lá, anotava as coisas me dizia o que tinha que melhorar.
Na estreia foi um
sucesso, tínhamos saído para jantar os quatro para comemorar, quando chegamos
em casa, levamos um susto, lá estava Moshé, nos esperando, tinha ido ao
concerto, pensou que viríamos diretos para casa.
Era uma outra
pessoa, a cara tinha duas cicatrizes feias, de noite no meu quarto quando tirou
a camisa, vi várias cicatrizes.
Fiquei olhando a
cara dele, se irritou, que queres dizer, podes falar.
Não eu só estou
procurando o irmão, que amava, que significava muito para mim, que o ódio, a
vingança pelo que fizeram contra nosso pai, arrancou da minha vida.
Ficou me olhando
demoradamente, como se estivesse pensando, virou-se de costa, deitou na cama,
mas vi que chorava. Me sentei ao seu
lado, fiquei segurando sua mão, finalmente me disse uma coisa, que tinha se
emocionado muito me vendo tocar, que pelo menos eu tinha defendido nossa
família, mantinha o que sobrava junto, que ele nem sabia hoje em dia quem era,
talvez eu seja um mero fantoche nas mãos da Mossad.
Ele ficou fechado
em casa conosco, uns quinze dias, ninguém lhe cobrou que saísse, nem nada
parecido, quem notou que algo estava errado foi o Abraham, pois tinha visto um
carro parado ali perto, vigiando o apartamento.
No dia que a policia francesa, entrou procurando por ele, tinha passado
para o pequeno apartamento do Abraham, tínhamos colocado um armário tapando a porta.
Não o
encontraram. Minha mãe, perguntou o que
se passava.
Contaram que ele
tinha assassinado um homem que pertencia a SS Nazista que estava escondido na
França, como ele tinha descoberto não sabiam, pois eles mesmos não sabiam.
Por eles o
agradeceriam, mas o governo não queria a Mossad operando em terras francesas
sem autorização.
A Mossad disse
que não tinha ordenado nada. Ele foi
ficando lá em casa, de vez em quando ficava ao meu lado, me abraçava, chorava
como um condenado.
Fui de viagem
para fazer uma série de concertos, pela Europa, me sentia seguido o tempo todo,
mas ignorei. Pensavam que de alguma
maneira ele entraria em contato comigo.
Achava
interessante, pois nas minhas conversas com Abraham, ele ia ao Bar de um amigo
para falar comigo, me contava as novidades, mas nunca falava do Moshé, falava
do Rufus, como ia na universidade, do Roger, que na verdade era o Moshé, que
estava bem.
Quando voltei, os
homens que me seguiam, no aeroporto me aproximei deles, muito obrigado por
cuidarem de mim toda minha turnê, ficaram surpresos.
Lhes disse na
cara que eles eram judeus demais para que eu não desconfiasse.
Mas que perdiam o
tempo, eu não via meu irmão, desde que tinha ido de casa para ir lutar no Yom
Kippur, portanto estavam perdendo o tempo.
Nunca perguntei
como o Abraham conseguiu documentos franceses para ele, com o nome de
Roger. Ele agora usava cabelos muito
curtos, óculos de graus, pois dizia que não via as coisas direito. Uma das primeiras coisas que minha mãe, fez,
era que ele sempre saísse com Rufus, tinham a mesma altura, o obrigou a treinar
em casa, tinha os ombros muito caídos, ela o maquilava para sair, escondendo
suas cicatrizes.
Mais tarde ele
fez uma cirurgia estética retirando as mesmas.
Voltou a estudar ou melhor fazer classes de desenho, usava meu quarto
como seu studio, nunca deixava ninguém ver o que fazia.
Voltou a ter
largas conversas comigo, falava justamente isso, que se ele tivesse força, não
tinha podido exigir isso de mim, teria puxado nosso pai para dentro do trem.
Eu lhe disse, que
se fizéssemos isso, teriam entrado no trem, levado todo mundo. Ele se sacrificou pela família, mas mamãe tem
razão, foi preciso que Henry ficasse uma semana falando na cabeça dele, que
tinha que ir embora, ele não queria se desfazer da loja. Tua como ele sempre foram teimosos.
É verdade, tinha
tanto ódio dentro de mim, queria ter ficado na França para matar os alemães
quando chegaram, só matando era capaz de ir retirando a dor que sentia, mas
quando passei a matar por matar, minha cabeça foi se enchendo de horror. Já não suporto mais isso, afinal, se
fossemos ter pátria, essa seria a Alemanha, pois nascemos lá.
Nem somos franceses,
embora nosso pai fosse daqui, tampouco criamos raízes em Israel, não nos
casamos lá, nunca fomos a sinagoga, o único que temos lá é Roger enterrado,
nada mais.
Eu lhe passava a
maquina na cabeça todas as semanas, o deixava falar tudo que queria, me soltou
um dia, eres melhor que um psicólogo, sabes me escutar, não me recrimina,
procura que eu veja algo mais à frente.
Eu agora me
apresentava com um grupo de noite nos sótãos do Rive Gauche, tocando jazz, as
vezes Abraham o levava com ele, quando os via no fundos, tocava para os dois,
tinham sido sempre as pessoas que eu admirava.
Um dia Abraham,
me esperou na saída, fomos sentar num bistrô, que ainda estava aberto, chovia,
fazia frio, comentou mais um inverno que chega.
Olhei para ele, tinha cabelos brancos começando a aparecer. Institivamente passei a mão pela sua
cabeça. Apesar de tudo eu o seguia
amando. Tinha aventuras, mas nada era
como eu queria.
Riu, sei que me
amas de verdade, tive meu coração fechado a muito tempo, mas estou melhor.
Mas o que quero é
falar do teu irmão, algo dentro dele se rompeu, está se desequilibrando, tenho
medo de que faça alguma coisa contra ele mesmo.
Ele só escuta a ti.
Nessa noite ao
chegarmos em casa, me perguntou se queria entrar no seu apartamento, nunca mais
tínhamos retirado o armário que separava um do outro. Sabia que ele nunca trazia ninguém, entrei,
nos sentamos, ficamos escutando música, solos de clarinete, que ele tanto
amava, um ao lado do outro, encostei minha cabeça no seu ombro, fiquei ali como
me sentido num porto seguro. Comentei
das minhas conversas com o Moshé.
Também me
preocupava por ele.
Tu estás sempre
preocupado pelos outros, as vezes te esquece de ti mesmo.
Me beijou
suavemente na boca, quando o vi nu, foi como o tinha visto quando andou naquela
noite pela casa, comentei isso com ele.
Puxa faz muito
tempo.
Pois eu já
gostava de ti, nesse dia, não me pergunte por que me apaixonei.
Foi um sexo
perfeito, eu era inexperiente, mas me ajudou.
Me perguntou por que nunca tinha feito sexo com outros.
Lhe disse que
tinha tentado, mas que o tinha na minha cabeça.
Não comentamos
com ninguém, acredito que minha mãe deve ter percebido. Eu dava desculpa que como Moshé dormia no
meu quarto, ali era seu studio, eu dormia na casa do Abraham para não incomodar.
Moshé foi cada
vez se fechando mais, tinha dias que mal falava, passava o dia inteiro
escrevendo ou desenhando.
Saia para comprar
papel, lapises, voltava para casa, seguia trabalhando, comia mal, era preciso
insistir com ele. Um dia me disse,
tens razão, teríamos acabados todos num campo de concentração.
Um dia, sentou-se
ao meu lado, respirou fundo, me disse, coloquei tudo para fora, mas só posso
mostrar a ti.
Entramos no
quarto, me abraçou, me pediu perdão pelo que ia ver. Ele tinha desenhado tudo que tinha passado
com ele, começava conosco na estação de trem, com meu pai atirado ao chão
enquanto íamos embora.
Seguia por Paris,
nosso embarque clandestino, Israel, foi quando começou a trabalhar para a
Mossad, depois de esta na guerra, contava detalhadamente cada pessoa que tinha
matado, desenhava perfeitamente a cara da pessoa, ele era um franco atirador,
sempre trabalhava sozinho em tudo. Das
famílias que tinha assassinado, sempre cumprindo ordens, as cara das pessoas
morrendo, ele executando. Até a última,
que tinha feito sem autorização, um dos homens que prenderam nosso pai, ele
descobriu quem era, era o único sobrevivente dos três, dois eram da SS, além do
vizinho. Contava que tinha liquidado
todo o resto da família dele, não sobrava nenhum, o da SS que estava vivo, um
dos filhos do homem contou que era seu tio, que vivia escondido numa vila na
França. Foi até lá o matou diante de toda
sua família.
Tinha se vingado,
mas claro tinha contrariado as ordens do Mossad, que queria prender esse homem
fazer um julgamento. Me olhou quando via
o desenho, eles não julgaram nosso pai, simplesmente o mataram, porque não
tinha mais os diamantes, tinha trocado de bagagem contigo. Confiou em ti, não em mim, por isso as vezes
te odiava.
Lhe disse, já
tinhas entrado, quando ele viu alguma coisa, creio que foi um gesto instintivo,
como de defesa de nossa família. Ele não
me escolheu por algum motivo, simplesmente estava ali, pois tinhas entrado
primeiro.
Eu sei, agora
entendo tudo isso.
Me entregou, um
maço de papel, guarde bem isso, um dia quem sabe poderás escrever sobre mim.
Dois dias depois
desapareceu, tinha se jogado no Sena, lhe enterramos com seu nome verdadeiro,
eu rezei o Kadish por mais um. Henry
ficou sabendo, telefonou para minha mãe, mas ela lhe bateu como telefone na
cara.
Eu tinha lido o
que ele tinha escrito, contava que tinha sido Henry que quando voltou da
trabalhar, que o tinha recrutado por saber que era excelente franco atirador,
para fazer esses trabalhos.
Depois tentou
falar comigo, me neguei, Abraham, tinha ficado horrorizado com o que tinha
lido, se apareces por aqui, sou capaz de te matar. Fique aí escondido porque se te encontro te
mato.
Segui vivendo com
ele, agora quando ia de viagem ele me acompanhava, trabalhava com vários
músicos, os ensinando a colocar a alma na execução de uma peça, dizia a técnica
é importante, mas a emoção é vital.
Trabalhava pelas manhãs no conservatório de Paris, pela tarde com a
orquestra.
Muitos diretores
de orquestra pediam auxilio a ele.
Reclamavam que eu nunca aceitava convites para fora da Europa, o que não
deixava de ser uma verdade.
Quando Rufus
lançou seu primeiro livro, foi um sucesso imenso. Era a história de um garoto que inventava
histórias para sobreviver ao horror de tudo que via em sua volta. Era assim que ele tinha superado sua
infância. Na parte final, falava de
Israel, nunca tinha se sentido lá como se fosse sua pátria, ao contrario do
Roger que fazia tudo para ser aceito.
Lhe passei os
desenhos de Moshé, o texto que ele tinha escrito, escreveu mudando os nomes das
pessoas, para não ter problemas. Na
verdade Moshé só sabia que tinham jogado nosso pai no chão, para prendê-lo
porque Henry tinha contado o que seus informantes disseram.
Ele não tinha
visto nada, lhe contei que na hora de subir no trem, ele como sempre tinha que
fazer tudo na minha frente, tinha subido, eu fiquei por último, contei como
tinha sido a cena, pois as vezes tinha pesadelo com ela. Meu pai olhando para trás, vendo algo que eu
não via, o movimento rápido, trocando nossa bagagem, como eu tinha imaginado
anos depois as duas noites que passou na joalheria, desmontando joias,
retirando as pedras preciosas para nossa sobrevivência. As bolsas que tínhamos encontrado, na bagagem
que me tocou, que até hoje minha mãe, ainda tinha umas quantas, na caixa forte
de um banco. Vendia alguma quando
precisava de dinheiro, podíamos viver anos com o lucro.
Rufus conheceu
uma professora como ele, que dava aulas na mesma escola, ela era mulata, se
apaixonaram, foi um casamento distinto, os dois não tinha religião, podiam ter
se casado por qualquer ritual, mas não, se casaram no civil, depois fizemos uma
festa, entre sua família e a nossa ou o que sobrava dela.
Eu oficialmente
contei a minha mãe o que acontecia comigo, ela riu, sempre soube, pela maneira
como o olhas. Não se preocupe.
Rufus veio morar
com ela, a família não parava de crescer, pela casa sempre tinha uma criança
correndo, o que provocava risadas altíssimas da minha mãe. Ela ensinava as crianças a falar o ídiche
como tinha ensinado para nós.
Há uns dez anos
atrás, um dia Henry apareceu, velho, usando um bastão, num carro oficial, veio
falar em particular com ela, lhe pediu perdão, mas pela cara que saiu, vi que
não o tinha dado, tentou falar com Abraham, mas quando o viu com o braço no meu
ombro, desistiu, desceu a escada mais curvado que tinha subido.
Depois ela
conversou conosco, chamou o Rufus, sua mulher para escutar, não posso perdoar, ele
arrebatou dois dos meus filhos, não eram dele.
Agora tem
remorsos, quer se livrar disso tudo, lhe disse que não iria ter ninguém da
família para rezar o Kadish pela sua morte, pedi que saísse de nossa casa.
Tempos depois nos
informaram de sua morte, mandaram uma fotografia, um grupo de homens ali em pé,
na traseira, da foto, ele pediu que ninguém rezasse o Kadish para ele.
Para mim a morte
que mais me tocou foi a da minha mãe, um belo dia não se despertou, era
interessante nunca se queixava de nada, como odiava ir aos médicos, o que veio
testemunhar, disse que tinha tido um enfarte dormindo.
Eu rezei mais um
Kadish, agora os meninos do Rufus tinham aprendido, pois eu os tinha ensinado,
me acompanharam como num coro. Mas no
seu enterro só fomos nós como ela queria.
Nesse dia lhe disse ao Abraham como estamos ficando velhos. Ele riu a bessa, nem sabia a idade real que
tinha, me contou toda sua infância, até que fugiu das mãos de sua mãe, que era
uma cantora de Jazz, para fazer o que queria da vida. Tocar clarinete. Quando fui tirar documentos,
me perguntaram quando tinha nascido, não sabia, porque nunca tinha comemorado
nenhum aniversário. Acreditava que tinha
18 anos, quando procurei por ela para perguntar, ninguém sabia, tinha
desaparecido, quando sua carreira começou ir a pique por causa das drogas.
Então resolveram
que eu tinha 18 anos, precisava de documentos para poder viajar como grupo que
tocava.
Agora devo ter
quase noventa anos, ou mais, mas não me importo, tenho alguém que me ama como
sou.
Eu estou com
quase 85, ele já passou dos 100, mas vivemos bem, no mesmo edifício, com a
família imensa do Rufus, que para escrever, escapa para nossa casa. O livro sobre o Moshé fez muito sucesso, mas
impediram sua publicação em Israel, a nós nos dava igual.
Reservei uma
bolsa de últimos diamantes para mim, entreguei o resto para ele, pois tinha os
meninos para mandar para a universidade.
De qualquer
maneira, quando eu morra, será deles da mesma maneira.
De ser músico,
passei a professor de músicos, substituindo o Abraham, mas vi que não era o que
gostava, passei a me reunir com colegas que gostavam das mesmas músicas, íamos
tocar pelas arcadas de Paris, para simplesmente fazer música.
Fizemos um pacto,
que queríamos morrer juntos. Um dia
desses terá que ser, pois já só podemos usar o elevador que puseram no
edifício, porque subir e descer essas escadas, nem por deus.
Os meninos, agora
estão sempre lá em casa, eu ensino o pequeno do Rufus que se chama Abraham ou
pequeno Abe, como dizemos, a tocar o clarinete, como diz o Abraham esse tem
mais estradas que muitos por esse mundo afora.
Eu concordo, por
isso o pequeno é uma sumidade, creio que já nasceu com a alma de músico, pois
entende de tudo, isso que é o menor, algumas vezes, vamos ver seus concertos,
mas antes toca para os dois, para ver se encontramos algum defeito na sua
maneira de tocar.
É como se
fossemos seus avôs. Pelo menos essa
parte segue.
O mais velho tem
o nome de Moshé, Rufus reclama, que é um cabeça dura, eu lhe digo que a culpa
tem o nome, tivesse escolhido outro.
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