lunes, 14 de febrero de 2022

JAGUARIBE

 

                                       JAGUARIBE

 

Agora depois de tantos anos vivendo fora do Brasil, voltava, finalmente os detetives tinha descoberto aonde sua mãe estava.  Queria vê-la, agradecer a saída que tinha dado para ele, uma nova vida.

Viviam no interior do Rio Grande do Sul, no final do país, nas terras de seu avô alemão, como descobriria depois, um fugitivo da justiça da segunda grande guerra, como muitos aliás nesse interior do Brasil.

Ele era o terror dos vizinhos, chegou com a mulher, uma austríaca, um filho pequeno, uma mão na frente, outra atrás, de repente, tinha dinheiro para comprar terras, ninguém sabia de aonde tinha tirado.

Comprou de um alemão, que a família toda tinha ido embora, pela dureza de trabalhar as vinhas.  Cultivavam uvas, a maneira alemã, para fazer vinho branco, mas não tinha muita saída.

Ele insistiu ano atrás ano, enquanto todo mundo passava aperto, ele nunca tinha problemas.

Quando meu pai ficou adulto, mal tinha ido a escola, quem lhe ensinou a ler, escrever foi sua mãe, mas falava um português carregado, como se tivesse chegado no dia anterior da Alemanha.

O obrigou a casar-se com a filha de um vizinho, que era solteira, tinha voltado a pouco tempo de Porto Alegre, para ajudar a família, era professora na vila mais próxima.  Ele queria sim aumentar suas terras, com as do vizinho que criava gado.

Meu pai, era um perfeito boneco nas suas mãos, fazia todas suas vontades.

Quando nasci, o velho ficou satisfeito, dizem que disse, um perfeito exemplar de raça ariana, mal sabia que a mulher do vizinho era uma mulata muito clara, mas claro a mesma já tinha morrido.

Minha avó, era uma mulher que nunca dizia uma palavra, pareciam que lhe tinha cortado a língua, ele a destratava na frente de todo mundo.

Eu escutava em pequeno todo mundo o chamar de filho da puta, quando pediu que eu dissesse avô, lhe disse filho da puta, se matou de rir.

Primeiro aprendi alemão, mas minha mãe só falava comigo em português, ele ficava furioso, mas ela o ignorava para tudo, continuou dando aulas, quando ela foi morar na casa deles, chegou o final do mês, ele pediu o seu salário, o mandou tomar no cu.

Ele começou a gritar, dizendo que meu pai devia dar uma surra nessa mulher que não obedecia, meu pai levantou os ombros, pois tampouco conseguia que ela o obedecesse.

A primeira vez que o velho ousou a levantar a mão para ela, ela estava cortando carne na mesa da cozinha, enfiou a mesma em sua mão apoiada na mesa.

Seu velho filho da puta, experimente outra vez, que lhe corto esses ovos nazistas, exibo em praça pública.

Ele nunca mais ousou nada com ela.   Ela incentivava meu pai se rebelar, mas ele tinha sido treinado pelo velho, para lhe obedecer.

Fui a escola, ia com ela todos os dias, passava pela casa de um vizinho, eram italianos, recolhia o filho deles,  Giovanni, íamos os três na caminhonete Ford que ela usava.  Na casa dele era igual, só falavam italiano, então instituiu, na caminhonete só falaríamos português, que ela ia corrigindo.

Éramos bons alunos, foi meu único amigo na minha infância, logo quando acabamos esse período escolar, ela nos levava até a vila, depois íamos de ônibus com outros garotos até uma cidade maior, a uns 40 quilômetros.  A tarde se não voltávamos de ônibus ela ia nos buscar.

Os dois sempre que podíamos, íamos tomar banho de rio, que passava justo na divisa das terras do velho, com a dos italianos.

Descobri o sexo com ele, adorava segurar meu caralho, colocar na boca, finalmente consegui enfiar aonde devia, ele delirava.    Um dia fui chegando ao rio, não tínhamos combinado, mas minha mãe me liberou, quando cheguei o vi dando o rabo para um peão de seu pai.

Eu fiquei de longe me masturbando, o homem viu.   Já não quis nada com ele, vinha pelo que via pendurado entre as minhas pernas.   Com ele descobri toda a sacanagem.

Mas acabou despedido, porque o pai do Giovanni viu o homem comendo seu cuzinho.

Ainda ficou uns dias ali perto do rio, escondido, eu lhe levava comida, ele me ensinou como fazer as coisas.

Giovanni a partir desse momento deixou de ir a escola, seu pai dizia se tinha tempo para fazer sacanagem, devia trabalhar.  Agora o via raramente, num domingo, quando fazia calor, no Rio tomando um banho, com o tempo ficou com um corpo perfeito, me deliciava dele.

Nunca o mencionava em casa, para não ter problema.

O velho agora ficava sentado na varanda, reclamando ora do calor, ora do frio, alguma coisa acontecia com ele, mas se negava ir ao médico.

Quando acabei o segundo ciclo, tinha 17 anos, minha mãe, vinha a um ano falando com meu pai, que eu deveria ir para Porto Alegre fazer a faculdade, ele como nunca tinha estudado, queria que eu viesse ajudar na fazenda.  Minha mãe dizia, que nem pensar.

Eu queria fazer Engenharia Mecânica, mas isso na época só em São Paulo ou Rio de Janeiro.

Nunca lhe perguntava, mas ela conseguia folhetos para que eu olhasse aonde queria estudar, dizia que tinha amigos em Porto Alegre.

O velho cada vez mais estava inchado, gordo ali sentado, gritando com meu pai, que abaixava a cabeça, ou com ela, mas isso é nada era a mesma coisa.

Um dia começou a gritar que na caixa que guardava dinheiro escondido, tinha desaparecido quase tudo.   Quando falou com ela, fez cara de santa dizendo que nem sabia que ele tinha dinheiro guardado, que deveria estar num banco.

Ele gritou que os bancos era de judeus, esses nunca veriam a cor do seu dinheiro.

Um final de semana que havia festa na vila, ela me disse, te prepare para ir para a universidade, não leve muita, coisa, depois compras o que necessitas.

Avisou meu pai que iriamos ajudar na barraca da escola.   De madrugada a vi se mexendo pela casa, deu uma medicina para o velho, depois saiu por detrás, abriu a caixa que ele tinha escondido, colocou tudo numa mochila que era minha, eu estava na cama, mas vestido para ir embora.

Subimos na velha caminhonete, o velho reclamou quem ia lhe dar o café da manhã, ela respondeu rindo, ao bunda mole do teu filho.

Saiu as gargalhadas, me disse, a vingança, quando é cozinhada em fogo lento, sempre sabe melhor.   Para que nunca te enganes na vida, saiba valer a tua vontade.

Paramos, recolheu uma caixa que tinha enterrado embaixo de uma árvore, me disse rindo mais dinheiro do velho filho da puta.

Me contou quem ele era na verdade, um oficial nazista que tinha se escondido ali, o pai dela também era, pois tinha se casado com uma mulata muito clara, pode ser que algum dia tenhas tu um filho negro.

Eu era loiro, alto, com corpo forte de trabalhar duro no campo, olhos azuis, mas tinha os cabelos loiros crespos.

Nunca poderás usar o nome de teu pai, pois acabaram vindo atrás deles, por isso não queria que fosses a universidade, mas esses filhos da puta não sabem com quem estão lidando, com uma descendente de escravos que sobreviveu a muitos abusos.

Contou de quem descendia sua mãe, de escravos que sempre tinha trabalhado na lavoura, era tinha sido a única que tinha saído para estudar, porque sua mãe, controlava seu pai.

Tinha borogodo, me explicou o que era.

Quando vi, entramos na estrada que ia para Porto Alegre, antes, parou a caminhonete, virou-se para trás dizendo, by, by filhos da puta.

Sabia que nunca mais voltaria para lá.

Chegamos tarde, já quase noite em Porto Alegre, paramos uma vez para colocar gasolina no carro.  Comprou sanduiches, coca cola que era a primeira vez que eu tomava, inclusive dei um arroto, ela riu muito.

Abriu a caixa que tinha recolhido, estava até a borda com dinheiro, depois minha mochila, tinha por cima uma muda de roupa para mim, o resto a todo era dinheiro.

Amanhã vamos a luta, na portaria do pequeno hotel, falou com uma pessoa, um amigo da época que estudava aqui, ele vai nos ajudar.   A tempo venho me comunicando com ele, para isso.

Ela tinha na sua bolsa os documentos da escola, em que eu tinha boas notas, mas me disse se apresentasse isso numa universidade, saberiam logo de quem é neto ou filho.

Seria uma merda, precisas meu filho pensar que agora serás livre para fazer o que quiser.

Talvez ela tenha visto que um dia meu avô me segurou, abaixou as minhas calças, ficou esfregando a mão no meu piru.

Ele fazia isso com meu pai.  Nessa noite ela disse que ele sempre tinha abusado do filho, tu serias a próxima vítima, mas tomei precaução, venho lhe dando a muito a tempo remédio para ratos, ele não vai durar muito tempo, pois esta sendo envenenado aos poucos.

Mas não podia esperar mais.  Conversei com teu pai, ele sabe de tudo, mas foi treinado para isso, fazer as vontades dele, na verdade nem sabe se é filho dele ou não.

Para todos os efeitos os documentos deles de entrada no Brasil, consta como filho, mas se negou a que lhe trocassem o nome, sempre teve orgulho disso.

Mas isso vamos mudar, tu deves ir para o Rio de Janeiro, eu disse ao teu pai que ia te mandar para São Paulo que a universidade era melhor, mas na outra, serás uma pessoa diferente com outro nome.

Me mostrou as cartas de Jarbas Jaguaribe, seu amigo, era professor na universidade, li todas, sempre terminava, dizendo minha querida, venha que eu te ajudo, bem como ao teu filho.

Numa das primeiras falava que agora era viúvo, finalmente minha mulher descansou, agora estou livre para viver minha vida.

Na verdade, eres filho dele, eu quando voltei, estava gravida, ele não podia fazer nada, pois sua mulher estava muito mal, o prendia com os dois filhos que tem.

Não te espante, pois es a viva imagem dele, por isso teu avô as vezes te olhava diferente, procurando de aonde tinhas tu esses traços.  O que te salvou sempre, que eres loiro, olhos azuis, porque senão ia desconfiar.

No dia seguinte de manhã, quando tomávamos café ele apareceu, era como me olhar num espelho, como seria daqui alguns anos.  Foi carinhoso comigo, coisa que o homem que pensava que era meu pai nunca tinha feito.

Nesse dia, fomos a um cartório de um amigo dele, passei a ser George Jaguaribe, no registro constava ele como meu pai, ela Marie Louise Klaus, seu nome de solteira como minha mãe, depois fomos a um lugar que administrava os currículos escolares, ele mudou tudo, manteve o nome das escolas, minhas boas notas, mas mudou o meu nome, assim não terás problemas.

No dia seguinte saímos para comprar uma maleta, bem como roupa para mim, nunca tinha tido roupas assim de boas, não eram de marcas, mas para mim eram excelentes.

Me deu um envelope, é a direção de uma prima, que vive no Rio de Janeiro, ela é enfermeira no Souza Aguiar, ficou viúva a pouco tempo, disse que te pode alugar um quarto, pelo menos para os primeiros tempos tudo bem.

Tinham aumentado minha idade nos documentos, para todos os efeitos eu tinha 18 anos.

Me colocaram num avião, por sorte minha mãe tinha criado um lugar para esconder o dinheiro, tinha repartido meio a meio.   Para a época era muito dinheiro, daria para estudar toda a universidade, ainda me sobraria, mas me disse para arrumar um emprego.

Era ainda o tempo dos aviões da Varig, que hoje em dia nem existe mais.  Tinha me dado dinheiro bem como o endereço, tinha o endereço deles, ficamos de nos escrever, abracei os dois agradeci meu pai o Jarbas Jaguaribe.

Me avisou, nos primeiros meses não nos escreveremos, mas resultou, que nunca iriamos nos comunicar.  Entendi depois por quê.

Fui para o endereço que tinham me dado, a senhora só me esperava para uns dois dias depois, me mostrou duas opções, o apartamento era grande, dos antigos, na rua Esteves Junior, 22 Laranjeiras, me mostrou um quarto, mas teria que compartir banheiro com ela, ou podia usar as dependências de empregados, eram dois quartos pequenos juntos, um banheiro normal, com chuveiro, uma pia, um cagador, melhor que a casa que vivíamos era.

Fiquei com esse, tinha uma entrada independente, uma outra chave se queria entrar para a cozinha, mas no Largo do Machado que estava perto, tinha aonde comer, desde um sanduiche, como uma comida completa, muitos restaurantes, além de um que adorava o Lamas.

Ela só entrava aonde eu vivia, para pendurar roupa lavada.

Mas eu fechava o quarto, tinha meu sistema, sabia se ela tentasse entrar, coisas da minha mãe.

Escondi bem o dinheiro nos primeiros dias, depois abri uma conta num banco, assim teria um talão de cheques, nessa época ainda não existiam os cartões de crédito.

Consegui passar nas provas, entrei na faculdade, era tudo que eu sonhava, era muito bom em matemática, além de um raciocínio especial dizia um dos meus professores.

Como me sobrava parte do dia, arrumei um emprego de meio expediente numa livraria ali no Largo do Machado, chegava em casa só para tomar um banho, descansar, me sentar para estudar, de manhã me levantava cedo, as vezes via a senhora uma ou duas por semana.

Um dia fazia um calor horrível, eu estava estudando, escutei um ruido estranho, resolvi encher uma garrafinha de água, para não tomar agua direto.

Entrei escutei pequenos gritos, quando me aproximei do quarto, ela estava sentada de costa, em cima de um mulato, ele me viu, mas fiz sinal de silencio, ela poderia ficar aborrecida comigo, mas tirei o pau para fora, para me masturbar, ele ficou me olhando sorrindo, senti que lhe dava prazer isso, ela teve seu orgasmo, caiu para o lado, dormiu, eu sai de fininho, ele me alcançou na cozinha, tinha um corpo estupendo, passou a mão pelo meu pau, dizendo garoto tens um instrumento especial.

Disse que tinha que estudar.

Ah eres o estudante que ela aluga a área de serviço, espere, foi buscar suas roupas, eu fechei a porta ficamos conversando, acabamos na cama, ele foi me ensinando coisas novas, adorava que eu mordesse seus mamilos, sentou-se em cima do meu pau, delirou, puta que pariu, eres muito gostoso, mas essa velha não sai do meu pé.   Ele era do parque de bombeiros ali perto do edifício.

Agora ficava me esperando os dias que sabia que ela estava no turno da noite, vinha ficar comigo, eu gostava porque ele era especial.  Foi quem me levou a primeira vez a praia, passou protetor solar nas minhas costas, dizendo que eu era muito branco.   Me apresentou alguns amigos que ficaram examinando, todos eram muitos discretos, mas um em particular me interessava, usava óculos, era diferente, depois me contou que era advogado num escritório no centro da cidade.  Fui conhecendo todo mundo.

Um dia ela o pegou sentado em cima de mim.  Fez um puto escândalo, então era por isso que ele não atendia as chamadas dela, descobri que lhe dava dinheiro para fuder com ela, mas comigo era grátis.   Com este viras uma puta.  Fora da minha casa.  Ele apanhou suas roupas, me fez um sinal que me esperava em baixo.

A mim me deu um prazo de dois dias para desaparecer, quando ela virou as costas, ele disse que me esperava no dia seguinte na praia.

O inverno estava chegando, tinha menos gente na praia, enquanto ele contava para os amigos, seu amigo, Duarte Cavalheiro, me disse que o apartamento ao lado do seu, um studio ali mesmo em Copacabana, me disse o preço, era quase o mesmo que pagava para ela, se conseguisse me transferir para a livraria de Copacabana, poderia pagar o aluguel, além de ter dinheiro para isso no banco, mas tinha sempre receio de usar esse dinheiro, sabe-se lá de aonde tinha saído.

Fui com ele ver o apartamento, gostei, falamos com o porteiro, me disse que o proprietário, uma senhora que vivia no primeiro andar, fomos até lá, paguei 3 meses de aluguel, me disse se quisessem sem moveis, ela mandava tirar, pois tinha outro apartamento vazio.

Fui olhar o outro, esse era especial, ficava de esquina, se podia ver a praia, a diferença era mínima, fiquei com esse.

Duarte me disse que estava de férias, podia me ajudar a conseguir os moveis.

Não se preocupe muito, pois aqui em Copa, tudo se consegue.

Se quiseres podes dormir em casa esses dias até teres tudo. Tenho um sofá cama.

O bombeiro não gostou muito, mas teve que engolir, em seco, pois se sentia culpado de eu ter perdido minha casa.

Mas eu não me preocupava, afinal, tinha um lugar só para mim.  Além de pagar quase a mesma coisa.  Na Barata Ribeiro, tinha um ônibus que me levava até a faculdade.

Duarte me disse, porque não vamos os três até lá, pega as tuas coisas, sai chispando de lá. Foi a melhor coisa que fiz. 

Ribeiro o bombeiro ia entrar de férias, ia para sua cidade visitar sua família.

Peguei minhas coisas, mas não deixei o endereço.  Me despedi do porteiro, esse me disse que mulher escandalosa, se mete com esses homens do corpo de bombeiro dá nisso.

Duarte me levou para sua casa, na verdade nunca dormi no sofá, dormi foi na cama dele, ele era diferente do Ribeiro, gostava de umas preliminares cheias de beijos, carinho, depois sim, esquentava os tamborins, gostava de fazer tudo.

O que eu gostava, era que ele era mais moreno, eu muito branco, parecia ter sempre a pele em chamas.

Me perguntou por que não ficava vivendo com ele?

Fui honesto, gostava de ter um lugar meu, para estudar, pensar, gostava do silencio, essas coisas que as pessoas vão adquirindo quando vivem sozinhas. 

Me ajudou a comprar uma cama para o apartamento, tudo o que eu precisava, seguiria durante um tempo comendo na rua, as vezes ele subia para dormir comigo, antes perguntava se não me incomodava. 

O inverno foi passando, eu adorava os dias de neblina, para caminhar na praia, o Ribeiro também aparecia, nos dias que estava livre, agora era bombeiro no Campo de Santana, ficava mais longe, mas aparecia.  Como eu dizia, estava bem abastecido de homens.

Seguia trabalhando no livraria, lá vendiam jornais, um dia vi numa manchete de O Dia, que na época era um desses jornais que se apertasse saia sangue.

Falava que dois homens tinham entrado na casa da senhora, que ela tinha saltado pela janela.

O porteiro que tinha sido agredido por eles, disse que eram altos, loiros, com uma gabardina, o que ele achava estranho, se não chovia.

Eu sabia, minha mãe tinha me avisado.  Será que o velho não tinha morrido.

Tinha o telefone da casa do Jarbas Jaguaribe, telefonei de um orelhão, a telefonista dizia que esse número não existia mais.  Fui a Biblioteca nacional, pedi jornais de Porto Alegre desde a época que tinha vindo.

Depois de muito procurar, se falava que o professor Jarbas Jaguaribe se tinha enfrentado com dois alemães, que tinha levado um tiro, mas que também tinha ferido os dois.

Que sua mulher tinha desaparecido.  Dias depois se falava de sua morte.

Fiquei chateado, mas não podia fazer nada.

Foi então que na universidade se falava de uma bolsa de estudos, para os Estados Unidos, para a Universidade de Massachusetts, o MIT, começava a dar seus primeiros passos.

Com as notas que tinha foi fácil, a bolsa era americana, eu passei fácil nas provas de língua.

Transformei meu dinheiro todo em dólares, mas nunca comprando no mesmo lugar, me davam inclusive o bilhete de avião.   Não disse nada a ninguém, nesses dias dormi com meus dois amantes, um dia com os dois ao mesmo tempo, foi uma festa.  Deixei uma carta na porta do Duarte, dizendo que por motivos pessoais tinha que ir embora, para o Rio Grande do Sul, o mesmo falei com o porteiro.    Fui para o aeroporto com meu passaporte, bilhete de avião, uma maleta pequena, um casaco de inverno nos braços, o fundo da maleta cheio de dólares.

Dias depois respirei relaxado.

No curriculum descobri, um dos professores tinha sido um físico nazista, mas todo mundo parecia encarar como uma coisa normal.  Melhor estar perto do bandido que longe.  Nunca falei com ele em Alemão, como todos falavam com ele em inglês, resolvi fazer o mesmo.

Três anos depois já fazendo especialização, me decantei por engenharia nuclear, foi um achado, tinha professores de todas as raças.   Levava minha vida sexual, totalmente separada de tudo.  Com uma nova bolsa de estudos, podia me dar o luxo de viver fora da Universidade, mas era discreto, pois sabia que ali todos prestavam atenção em tudo.

Gostava de gente simples, a maioria nem entendia o que eu estudava.  Não gostava de outros estudantes, pois esses falavam demais, bebiam demais, teorizavam muito.

Um dos meus professores, um japonês, me disse que eu tinha uma vantagem além dos outros, era aplicado, não ficava discutindo teorias, trabalhava.

Quando acabei tudo, podia escolher o que queria fazer, não havia no front, nenhum impedimento para fazer o que eu quisesse.  Os convites eram muitos, mas me interessei pela construção de uma usina Nuclear, na Inglaterra.  Pagavam bem, eu tinha um apartamento na cidade mais próxima, além de alojamento na obra.

Os finais de semana passava no meu pequeno apartamento, fiz amizade com um dos trabalhadores, que viria ser meu ajudante, ele era judeu.   Pensava sempre, ah se ele soubesse.

Um dia aconteceu de sairmos pela cidade, ele tinha bebeu muito, eu sempre era comedido nisso.  Não tinha como voltar ao alojamento, lhe ofereci minha casa, quando tirou a roupa, era musculoso, um pouco peludo sim, mas um corpo de fazer inveja a muita gente, ficou de cuecas, o coloquei no sofá cama, me puxou para ele, sempre quis te beijar.

No dia seguinte estava cheio de vergonha, lhe perguntei por quê?

O que eu ia pensar dele?

Nada, um homem com quem fiz sexo, nada mais, foi bom.

Não me lembro direito.

Rindo disse, deixa de ser sem vergonha, queres é mais, fizemos um sexo delicioso, agora ficava todos os finais de semana comigo.  Nunca tocávamos nos assuntos sobre Israel, que no momento sempre era complicado.  Me disse um dia que estavam procurando gente para ir construir uma usina em Israel. 

Vieram me entrevistar, pedi desculpas, mas queria ver o projeto terminado, faltavam vários meses.    Me esperariam.

Sabia que investigavam a fundo as famílias do entrevistado, fiquei esperando para saber o que iam descobrir.

Foi quando vieram falar, que meu pai, o Jarbas Jaguaribe tinha morrido numas circunstâncias estranhas.  Fui honesto, quando nasci, ele só me deu o nome, pois era casado, só estive com ele, antes de ir para a Universidade, depois nunca mais.

Me perguntaram pela minha mãe, lhes contei que era filha de um alemão, com uma mulata, mas que nunca tinha sabido nada da família dela.   Quando nasci, já tinham morrido seus pais.

Ficou por isso mesmo.   Talvez por terem ido investigar, parece que cutucaram um vespeiro, logo notei que estava sendo seguido na rua, não se aproximava, creio que ficaram esperando se eu falasse alemão.  Um dia um sujeito me provocou em alemão, lhe respondi o que queria em inglês.  Que não o entendia.   Me perguntou olhando bem na cara, não falas alemão?

Lhe disse que não, que nem tinha ideia, falava um pouco de Ídiche, por ter antepassado judio, nada mais, claro tinha aprendido alguma palavras com Samuel, meu namorado.

Não os vi mais por algum tempo.  O homem da entrevista, me disse que tinha visto alguns alemães me cercando?

Lhe disse que o cara tinha provocado uma briga comigo, como se estivesse bêbado, falava alemão, quando lhe respondi em inglês, me perguntou se falava alemão, lhe respondi em Ídiche, desapareceu.

Acabei aceitado o emprego, porque concordaram em contratar o Samuel, gostava da companhia dele.

Aprendi a língua, pois iria conviver diariamente com os operários, todos falavam a língua oficial.   Com Samuel, comecei ir a sinagoga de vez em quando, mas nunca me transformei num judeu.

Com os anos, passei a ter nacionalidade do pais, pois desenvolvia todo meu trabalho lá, passei ao mesmo tempo dar aulas de engenharia mecânica, ligada a física nuclear na universidade, a maior parte das aulas, por causa dos termos técnicos, falava em inglês.

Para todos os efeitos dividia apartamento com Samuel, nos completávamos, depois que ele viu que eu não ia me converter, deixou de me convidar, mas ele recuperou a religião de seus pais que não frequentava na Inglaterra.

Depois de 15 anos trabalhando lá, um dia um agente chegou perto de mim, perguntou se podia falar comigo.

Me falou outra vez do Jarbas Jaguaribe, tinha localizado um filho de seu primeiro matrimônio, este falou de minha mãe, que vivia com ele.  A entrevistamos, quando mataram o teu pai, o filho dele a acolheu no Rio de Janeiro, vive agora numa residência de pessoas de idade, em Jacarepaguá.

Agradeci a informação, entrei em contato com o meu irmão que não conhecia, se queres vir tudo bem, mas não vou falar, enquanto não chegares aqui, pois tem uma saúde um pouco delicada.

Me perguntou o que eu fazia?

Quando lhe contei, se interessou, era professor na UFRJ, perguntou se eu podia dar algumas palestras.  Ele percebeu que para mim falar português era complicado, pois tinha perdido muito do vocabulário, me disse que podia ser em inglês.

Embarquei, num voo da Air France, meu dinheiro seguia rendendo, pois levava uma vida modesta.  Quando começou a sobrevoar o Rio de Janeiro, eu parecia um turista que vem a primeira vez, queria ver as coisas que nem me lembrava mais.

Ele estava no aeroporto, éramos bem parecidos um com o outro, meus cabelos brancos agora se misturavam com os loiros, tinha uma juba, como de um cientista louco, mas o corpo forte, pois Samuel me obrigava a fazer exercícios.

Só me disse antes de partir, não arrume um namorado por lá, pois ficarei com ciúmes.

Eu ao contrário achava importante esse afastamento, pois depois de tantos anos juntos, o sexo era praticamente igual.

Meu irmão me abraçou, me levou para sua casa, vivia perto de aonde eu tinha vivido.

Respirar a maresia de um dia de neblina, para mim era fantástico.  Lhe expliquei que passava muito tempo no deserto, quando estava dando aulas, as vezes passava o dia inteiro fechado, mas que ia muito a praia em Tel Aviv, mas claro não tem esse cheiro.

Ele ao contrário detestava.  Vivia sozinho, me contou no caminho que tinha sido casado, mas foi um erro monumental.

Quando tua mãe veio viver comigo, me ajudou bastante, ela é uma pessoa fantástica para se conversar.   Mas agora com a idade, necessita de cuidados, ela mesma escolheu o lugar aonde queria viver.

Perguntei de seu outro irmão?

Bah esse vive pelo mundo, a última notícia dele, era que estava na Austrália, se casou por lá tem família, nunca pensa em voltar, já fui uma vez, fiquei tentado em dar aulas lá, mas gosto do Rio.

Quando minha mãe morreu, viemos os dois viver aqui, para fazer universidade, ele largou na metade, pois queria passar o dia inteiro fazendo surf.

Os dois tínhamos tido os mesmo professores, só que ele estava mais adiantado do que eu, quando lhe ofereceram a Bolsa para o MIT, ia se casar, por isso não foi.

Falamos muito, quando chegamos na sua casa, me apresentou o homem com quem vivia, me descobri muito tarde me disse ele.   Era um mulato alto, forte, também professor, dava aulas de arte na Escola de Belas Artes, viver de arte no Brasil é difícil.

Me perguntou como era em Israel, fui franco, não convivia muito com artistas, não sabia responder.

Depois do almoço fomos visitar minha mãe, era um pouco longe, ele avisou, ela tem princípio de Alzaimer, pode demorar para te reconhecer.

Quando me viu, ficou me examinando, de repente em sua cabeça deu um estalo, me chamou pelo meu nome verdadeiro, Franciskus, me apertou nos seus braços, lhe contei minha vida, mais ou menos, omitindo algumas coisas, quando disse que vivia em Israel, caiu na sua famosa gargalhada.  Todos vieram ver o que era, ela não parava de rir.

Seguiste meus conselhos, a vingança se cozinha devagar.

Voltava quase todos os dias para vê-la, agora já sabia como ir, pegava um taxi, dizia a direção, ficava a tarde inteira com ela, me segurando a mão, mas tinha dias que não me reconhecia em absoluto.  Um dia que estava com a cabeça bem, estávamos sentados no seu quarto, me disse, pegue a maleta em cima do armário, me mostrou recortes de jornais, ela tinha denunciado o velho depois que viu que ele não tinha morrido, vieram por ele, recebeu todo mundo a tiros, teu pai foi ferido, ele como para apagar um arquivo lhe deu um tiro na cabeça, mas um agente da Mossad o acertou.

Se quiseres podes recuperar a fazenda, a mantenho alugada, dou dinheiro para o filho do Jarbas, a irmã dele morreu, porque estava atrás de ti, por ordem do velho.

Lhe contei que antes de ir para Israel, tinham feito contato comigo, me disse que era impossível, pois todas as células daqui, terminaram, me foi mostrando como.

Então tinha sido um jogo da Mossad para que eu aceitasse o trabalho.

Agora ia a praia todos os dias, um dia domingo fui até aonde conhecia o Duarte, ao passar por um bar, escutei sua voz, falando com outra pessoa.

Estava sentado num bar, tinha os cabelos brancos, mas o corpo continuava o mesmo, falava com o garçon do bar, que brincava com ele, como era possível que ainda estivesse sozinho na vida, com a boa pinta que tinha.

Dei a volta, me sentei na frente dele.  As lagrimas corriam pela sua cara, filho da puta me disse, me largaste para trás.   Mas colocou a mão em cima da minha.  Contei tudo o que tinha feito na vida, aonde estava agora.   Sem querer lhe contei a verdade porque tinha ido embora, por medo de causar algum problema para os dois.

Me disse que o Ribeiro tinha morrido a muitos anos atrás de Aids, era um louco, queria estar sempre fazendo sexo, acabou mal.

Eu, como um idiota fiquei esperando, pois no teu bilhete, dizia que voltarias.

Tentei com outras pessoas, é verdade, mas ninguém era como tu.

Almoçamos juntos, lhe contei que tinha um companheiro, mas que com os anos, tinha ficado tudo igual, na verdade tinha um relacionamento com ele para não complicar minha vida.

Nessa noite dormimos juntos, ele agora, aposentado, vivia num apartamento melhor, foi uma coisa fantástica, como eu gostava de fazer sexo com ele, na verdade, sempre me lembrava dele, muitas vezes me masturbando.

Quando acabaram minhas férias tinha pensado muito, o projeto tinha terminado, eu só tinha as aulas na universidade, me faltavam só dois anos para me aposentar.

Fui ao consulado me identifiquei, perguntei se podiam fazer contato com um agente da Mossad, lhe dei seu nome, ficaram consultando vários canais.

Quando consegui falar com o homem que me tinha chamado para trabalhar em Israel, disse que tinha descoberto o que ele tinha feito para me convencer.

Ele riu a bessa, pensava que nunca ias aceitar.

Pois agora terás um trabalho maior, estou no Brasil, acabo de aceitar, trabalhar na Usina de Angra dos Reis, não voltarei, vou dar entrada aqui no consulado, para pedir minha aposentadoria de Israel.   Adeus, passei o telefone para o que me atendia, ele só balançava a cabeça.

Me disse, se eu não te convenço, ele aceita teu pedido.

Então por favor, vamos a papelada.

Escrevi uma carta ao Samuel, creio que a que mandei, cruzou com a que ele me mandava, dizendo que tinha conhecido alguém, que tinha se mudado de casa, para viver com essa pessoa.  Falava da acomodação dos dois, pedia perdão.

Fiquei rindo, comentei com o Duarte, não lhe tinha falado que ficava.

Fomos os dois viver depois de tudo resolvido, na Barra da Tijuca, levei minha mãe para viver seus últimos anos comigo, foi difícil, porque ela foi se apagando, as vezes pensava que Duarte que era seu filho, ele até gostava.

Os dois fazemos largas caminhadas pela praia, vivemos bem desfrutando do dinheiro que tinha aplicado por lá, além da minha aposentadoria.   Às vezes me convidavam para alguma conferência, mas dizia que não podia que tinha um compromisso importante.

Ele me perguntou que compromisso importante era esse?

Tu, não quero me afastar outra vez de ti.  Erámos dois coroas gostosos, conforme diziam quando nos davam uma cantada, mas tirávamos de letra.

Ficávamos rindo, mas não queria ninguém entre a gente.

Agora estamos à beira dos 70 anos, aprendemos inclusive a surfar, para nos ocuparmos, amamos o mar, continuo gostando dos dias de nevoeiro, para sentir o cheiro de maresia.

 

    

 

 

 

 

 

 

   

 

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