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SAMI
- SAMUEL
BENKUNDA
Era hora de agradecer o prêmio que ganhava
no Festival de Cannes, por sua obra prima, um filme animado, uma história que
seu avô lhe contava desde que era pequeno.
Nesse momento o agradecia, com lágrimas,
nos olhos tinha falecido meses antes, durante um ataque terrorista contra o
governo, ele estava no lugar errado, tinha ido reclamar um erro no cálculo de
sua pensão. Tinha sido funcionário
publico toda vida, mas com a última mudança de governo, tinha se perdido os
papeis.
Quando ia reclamar, a bomba estourou
levando tudo por diante, só sobrou dele, pelo que se falava, meio tronco.
Tinha chorado abraçado ao seu tio Melchior,
sua tia Sara, todos tinham nome bíblicos na família, era como filho para seus
tios que não tinham tido oportunidade de terem os seus.
Seu pai, que era o mais velho dos dois
irmãos, era um bala perdida, não parava em emprego nenhum que o pai,
posteriormente o irmão lhe arranjavam.
Um dia apareceu com uma mulher de outra etnia, que resultou ser sua
mãe. Os dois brigavam por tudo, por nada,
era sempre um bate boca idiota, despois se reconciliavam na cama. Meu avô dizia que graças a deus, desses
rompantes não saísse mais nenhuma criança.
Um belo dia ela desapareceu, saiu para trabalhar, nunca chegou ao
mesmo. A polícia não sabia, nada, tudo o
que se sabia era que tinha subido no ônibus para ir ao trabalho, que levava uma
maleta, coisa rara nela. Todo mundo
reparou nessa maleta, daquelas duras antigas, recoberta por um tecido desses
que chamam atenção produzidos na Africa.
Meu pai ficou furioso, a foi procurar aonde
vivia sua família, lhe deram uma surra de fazer gosto, o jeito foi ir para
Paris, passar uns tempos com o irmão mais jovem que tinha conseguido um emprego
na Prefeitura da cidade Luz. Mas foi a
mesma coisa, um belo dia desapareceu, abandonando suas roupas, Melchior
descobriu que não ia trabalhar a mais de dois meses.
Procurou ter tato, ao falar com seu pai, Benjor
Benkunda, tinham pena de como ele dar a notícia para mim, dizem que eu levantei
a cabeça sacudi os ombros, segui desenhando.
Na verdade ele me criava desde que era
bebê, pela manhã até metade da tarde me cuidava uma vizinha, depois estava com
ele, era um Babalorixá, escondido, pois os mulçumanos Suni dominavam o pais,
qualquer coisa era motivo para uma pessoa sumir, então tudo era por baixo dos
panos.
Mas como funcionário público, me conseguiu
a melhor escola de Banjul, Gambia, me levava de manhã, ia buscar na hora que
saia, voltava com ele para casa me contando como os funcionários trabalhavam
mal. Eu adorava quando contava alguma
história divertida, pois ao final soltava uma grandes gargalhadas, balançando
os ombros. Meu pai, nem meu tio,
tinha a altura dele, eu sim, era franzino quando criança, mas um belo dia
espichei, ganhei corpo, porque de tarde trabalhava num armazém descarregando
caminhão. Meu sonho era ir à
universidade, se fosse em Paris melhor, portanto tinha que juntar
dinheiro. Ele nunca permitiu que eu
gastasse um tostão na casa, logo me fez abrir uma conta num Banco Francês que
existia ali na capital. Assim não vais
cair em na tentação de usar antes do tempo.
Eu ficava era louco quando meus tios vinha
passar as férias, infelizmente eles não tinham filhos, mas acho que até
gostavam, tinham uma vida complicada.
Eles saiam cedo de casa, voltavam de noite mortos de cansados. Ela trabalhava numa agência de publicidade,
ele na prefeitura, num cargo qualquer, desses que dão aos negros, para dizer
que ali trabalha gente de todas as raças.
Quando tinha uns 15 anos lhe pedi, para ver
se conseguia um computador de segunda mão, que pudesse ter alguma coisa de desenho,
construção de vídeos. Ela conseguiu
um na agência, eu fiquei como louco, pois tinha conseguido que um dos
companheiros deixasse os programas de desenho, produção, vídeos. A levantei do chão, pois era baixinha, a
beijei com um louco, acho que ela tinha medo de gostar de mim. Uma noite que me viu esforçando para aprender
sozinho como trabalhar, me disse que deveria ir para Paris.
Eu tinha um dilema, tinha que terminar o
curso que fazia, para ter um diploma pelo menos, outro era meu avô, ele se
negava a sair de sua casa, por mais que os dois insistissem que devia ir com
eles, que teria uma vida melhor.
Não posso, tenho que cuidar da minha gente,
a partir daí não adiantava insistir pois ele não cedia, quando acabei o curso, as
possibilidades de universidade ali, não tinha nada do que eu queria fazer, eram
cursos para acabar em funcionário público.
Um dia o vi falando com meu tio, que esse
ano não vinha porque as férias dos dois não coincidiam, ele não dava um passo
sem ela junto. Escutei de longe a voz
dela alta, manda logo esse garoto para cá.
Dias depois chegou o bilhete de avião,
fomos ao banco, para transferir o dinheiro, tirar algum para a viagem. Não tire nada, foi até o caixa levando uma
caixa de sapato velho, embrulhada em um papel de jornal velho, abriu, pediu que
ingressassem isso na minha conta, eram todas suas economias. Seu argumento era que eu ia precisar de
dinheiro para comprar material para a escola de Belas Artes, quando olho o
preço do que traz teu tio, fico com a boca aberta, lá para o dinheiro deles,
deve ser barato, mas para ti será caro.
Me levou ao aeroporto, com meu passaporte
novinho, num taxi de um de seus amigos e clientes. Queria que eu levasse sanduiches, mas a
senhora que tinha me cuidado desde pequeno, queres fazer o garoto passar
vergonha, no avião dão comida.
Fui em um voo da Air Maroc, via Casablanca,
só não tinham dito, que eu ficaria a noite inteira no aeroporto esperando o
outro voo, agora entendia por que quando vinham chegavam cansados.
Mas não me importou, quando cheguei a
Paris, fiquei deslumbrado, tudo era imenso para mim, aquelas casas que pareciam
palacios, mas meus tios viviam num bairro que era quase um gueto, ali viviam os
marroquinos, os negros, argelinos, tudo gente que tinha que se levantar muito
cedo para ir trabalhar. Tinham arrumado um quarto que usavam para
guardar coisas, para mim, segundo uma vizinha, minha tia guardava coisas, pois
se um dia teriam um filho. Ria dizendo já tenho, vem inclusive com diploma.
Foi comigo a escola de Belas Artes, o que
me salvou foi que levei todos meus desenhos, os professores gostaram. Eu estava interessado nos curso mais
modernos, de vídeo, de desenho gráfico etc.
Depois de um ano, disse a ela, creio que estou perdendo tempo, eu
controlo os programas melhor que o professor.
Um dia me perguntou se eu tinha desenhos
étnicos, me explicou o que precisava, separei todos que imaginei que serviam, ela
levou. Eu tinha um velho celular que
tinha sido do meu tio, estava em plena aula, quando ela me chamou, tens aí o
vídeo que estas fazendo.
Sim tenho, me deu a direção, era de La
Defense, foi aí que me dei conta do trajeto que tinha que fazer todos os dias
para ir trabalhar, o do meu tio era mais fácil, trabalhava no centro no Palais
de Ville. Fui muito acanhado, pois
minhas calças eram as que meu pai tinha abandonado para trás, ela tinha
emendado uma barra, que eu tinha pintado para disfarçar que as calças ficavam
curtas para mim. Tinha os cabelos
curtos, raspado totalmente nas laterais, mas afro em cima, faziam que eu
parecesse mais alto do que era.
Quando cheguei, ela, saiu, me disse,
estamos no meio de uma reunião, sente-se escute a proposta.
Foi o que fiz, tirei um bloco de desenho,
tinha um homem que parecia um leão, com uns cabelos brancos imenso, só faltava
rugir. Ia explicando qual era a
proposta, fui desenhando tudo, nem percebi que um sujeito que estava justo na
mesa na minha frente olhava para trás talvez por causa do ruído do meu lápis em
cima do papel, primeiro olhou incomodado, depois virou a sua cadeira, para
prestar a atenção.
Quando o homem acabou de falar, descobriria
depois que era o dono da agência, soltou, nem precisa pedir para alguém fazer,
o rapaz aqui já fez todo o trabalho, tirou sem cerimônia nenhuma o caderno das
minhas mãos, voltou a paginas anteriores, colocou em cima da mesa, foi passando
para o homem.
Como te chamas filho?
Sami, ou melhor Samuel Benkunda, ele se
virou para minha tia, esse é o teu sobrinho, Sara?
Ela só balançou a cabeça, tua tia me
mostrou uma cópia do vídeo que estas fazendo, achei interessante, um trabalho
forte.
Eu agradeci com um sorriso.
Ele continuou, ela me disse que procuras um
trabalho de estagiário, vejo que Nakano gostou do teu trabalho. Soltou uma gargalhada, te toca engolir esse
gigante, virou-se para mim dizendo, cuidado ele é da Yakuza.
Sorri, pois não sabia ainda o que ele estava
dizendo.
Empurrou o caderno para o Nakano, te
apanhas a ensinar ao rapaz como trabalhamos.
No primeiro momento, senti que ele não
tinha gostado muito. Argumentou que ele
sempre trabalhava melhor sozinho.
Se queres essa conta, terás que engolir o
novato.
Se levantou, eu olhei em direção a minha
tia, que fez um sinal de que eu o seguisse.
Foi resmungando na minha frente balançando
o desenho, o mais interessante, depois descobri, que todos faziam gozação do
que tinha acontecido. Ele tinha 1,65 ou 1,70 como costumava dizer, mas perto do
meu 1,95 parecia um anão.
Me levou a uma sala, que tinha duas mesas,
uma estava cheia de papeis, limpe a mesa, para mandar colocar um computador
para ti. De repente, quando comecei a
tirar com cuidado tudo que estava ali, me olhou nos olhos, diria depois que
tinha se lembrado que ele também tinha passado o mesmo que eu, mas com um
sujeito muito filho da puta.
Me ajudou, eu sou um desastre, vou
acumulando tudo, nenhuma secretária aguenta trabalhar para mim, dizem que tenho
mal humor congênito, mas não é verdade, gosto de ter tudo isso a mão para
consultas, havia uma grande bancada que ia de um lado a outro da parente, que
tinha duas janelas imensas.
Fomos colocando os dois por ordem como ele
gostava, está tudo por tipo de assuntos, estampas, fotos etc. Alguns livros ou revistas de arte me atraiam,
ele percebeu, depois vou te emprestando, mas tem que trazer de volta.
Arrumamos as mesas para ficarem uma ao lado
da outra, nisso trouxeram o meu computador, bem como uma cadeira nova. Ele reclamou com o encarregado, estou
esperando uma desta a muito tempo, a minha esta uma merda. Lhe disse ao homem fico com a velha,
experimentei, perguntei se ele tinha uma chave, em seguida arrumei a cadeira.
Estava perfeita.
Dias depois, cheguei ele estava sentado na
velha, estou mais acostumado a essa.
Conversávamos discutindo o projeto, até que
ficou como ele achava que tinha que estar, escutou minhas sugestões, algumas
aceitou, as outras dialogou comigo para melhorar, de vez em quando o chefe
passava, ficava olhando os dois trabalharem.
Um dia minha tia, soltou no jantar, fizeste
um milagre, ninguém aguenta trabalhar com o Nakano, é uma pessoa difícil.
Sem querer o defendi, não vejo assim, creio
que é questão de educação, ele é educado comigo, eu sou com ele, me da uma
sugestão, eu aceito, experimento, se não fica bem, educamente comento com ele,
apresento as opções, decidimos juntos a que achamos que melhor encaixa no
projeto. Quinze dias depois
apresentamos o projeto.
O chefe escutou toda a apresentação, tinha
momentos que Nakano vira-se para mim, explique tu essa parte, os outros estavam
de boca aberta. No final aplaudiram,
agora o negócio era vender a ideia para o cliente. Depois o coitado sofreu uma imensa gozação,
encontraste tua meia laranja finalmente, estávamos cansado de ver os ajudantes
saírem chorando de tua sala.
Eu ia defende-lo, mas me fez um gesto, eu
nesses quinze dias tinha aprendido a entender seus menores gestos. Soltou, finalmente realmente encontrei minha
meia laranja, uma pessoa observadora, que é capaz de dialogar, não esses
garotos que são filhinhos de papai, que a qualquer comentário choram pois tem
suas ideias rechaçadas.
Depois que ficamos só nós com o chefe, ele
perguntou e agora, se preparem para montar a apresentação.
Nakano soltou, o rapaz não necessita dos 3
meses de práticas, eu o quero como meu assistente.
Foi assim que fui contratado. Nessa noite em casa comemoramos, no final de
semana minha tia convidou o Nakano para comer em casa. Ele chegou encabulado, vivia do outro lado
da cidade, quando o fui levar para pegar o trem outra vez, me disse que tinha
vivido com uns parentes japoneses, fizeram da minha vida um inferno. Quando encontrei esse apartamento em Marais,
o aluguei sem pensar. Eu lhe disse que
ainda não conhecia, meu roteiro desde que estou aqui, é ir à escola de Belas
Artes, volto para casa, que está em silencio para trabalhar.
Isso eu gosto de trabalhar contigo, os
outros todos tinham em sua sala, som, as vezes alto, nos dois trabalhávamos em
silencio, algumas vezes fazíamos um comentário, ou parávamos para discutir uma
ideia.
Ficou me olhando nos olhos, gosto de ti
Sami, sempre me chamava de Samuel, na hora não entendi. Só respondi, eu também adoro trabalhar
contigo. O trem parou ele entrou,
abanou a mão, nos vemos amanhã.
Logo de manhã, o chefe nos chamou, queriam
que preparássemos uma capa de disco, bem como um livreto para um cantor do
Mali. Eu já o tinha escutado na rádio.
Minha tia desde que entrava em casa,
colocava música, numa rádio que só tocava música africana. Em seguida pude enumerar os cds todos
editados para ele, buscando o trabalho que tinha feito. Para o livreto, me lembrei da musica que
tinha escutado, que falava do povo Dogon, falei com Nakano, se o entrevistamos,
essa musica foi composta por ele, é interessante tem uma larga duração, o tempo
da música é maior do que o resto, conta uma história, seria interessante que
ele contasse isso, podemos colocar o texto, bem como a história que ele conta.
Falamos com o diretor, este fez contacto
com a discográfica, nos convidaram para ir assistir o show, bem como conhecer o
artista. Avisei minha tia, não sabia a
hora que acabava, talvez tivesse que dormir na cidade. Fomos os dois comer alguma coisa, me levou a
um restaurante japonês, depois ao show.
Todos nos olhavam, entendi por que, fazíamos como um casal que era
diferente, um japonês com um negro altíssimo.
Ele gostou mais do que eu do show, pois o cantor não cantava a música
que eu esperava. Quando falamos com ele,
disse que a tinha feito somente para o CD, pois acreditava como o som se
repetia demasiado, que a plateia se dispersaria.
Falamos da ideia, o queríamos entrevistar,
que ele contasse a história e a ideia que tínhamos, contar isso graficamente,
para que as pessoas entendessem o que ele queria transmitir, combinamos de nos
ver no dia seguinte.
A essas alturas já não tinham trens para
voltar para casa, ônibus, menos ainda, taxi ia custar uma fortuna, com certeza
não iriam querer me levar.
Nakano me disse em vez de ficares num
hotel, ficas na minha casa.
Lhe perguntei se não ia incomodar, a
resposta foi imagine.
Adorei o pequeno apartamento, lhe disse que
sonhava muito ter o meu, daqui algum tempo com certeza poderei ter um. Uma parte da sala, tinha tatames, eu durmo a
maneira japonesa, em cima dos tatames, com futon, me explicou como era. Em seguida essa parte estava despejada, lhe
perguntei se podia tomar um banho, pois tinha suado muito no show. Me deu uma toalha, iria dormir de cuecas, sai
do banheiro, enrolado numa toalha, ele fez o mesmo. Me deitei aonde ele tinha
falado, quando voltou, sem roupa nenhuma, fiquei impressionado como seu corpo
bem definido, sem um pelo, a não ser na área do sexo. Ele deve ter visto minha cara, se sentou ao
meu lado, quando percebi, estávamos nos beijando, fizemos sexo de uma maneira
toda especial, pois tinha lhe contado que não tinha experiência, que era
virgem.
Não tinha acreditado, foi me guiando como
devia fazer. Eu estava ofegante de
prazer, nunca tinha imaginado algo assim.
Dormimos agarrados um no outro, ou melhor, ele encaixado em mim, a
sensação me agradava. Despertei com ele
me olhando.
Estas chateado comigo, me perguntou?
Imagina, se gostei disso tudo que fizemos,
mas não sei definir meus sentimentos ainda, terás que ter paciência.
Fomos trabalhar, eu ainda fui pelo menos
comprar uma camiseta, pois rimos muito quando ele quis me emprestar uma dele,
eu precisava de pelo menos três das suas para fazer uma para mim.
Ele tinha chegado antes, mas estava me
esperando para falar com o chefe. Quando
contamos o que tínhamos falado com o cantor, ele gostou, mas claro precisávamos
do ok da gravadora, bem como a entrevista com ele.
A gravadora não gostou muito da ideia,
nisso chegou o cantor, que disse, gostei demais da ideia dos rapazes, porque é
a única maneira da maioria entender a música.
Gravamos sua entrevista, explicando a história. Era parecida com a minha em algumas coisas,
seu pai era do povo Dogon, tinha lhe contado mil e uma histórias, mas essa em
particular falando dos homens do planeta Sirius, era a que tinha ficado na sua
memória.
A resolvi musicar, pois talvez seja o
último disco que faça, tenho um câncer terminal, queria deixar isso para a
posteridade.
Começamos a trabalhar, eu ia criando os
desenhos, ao mesmo tempo que escutava a música, conjugando com a história. Quando terminei, bolamos um pequeno vídeo
contando a mesma, quem fez essa parte foi Nakano, criando em cima dos meus
desenhos. De qualquer maneira era um
trabalho conjunto, lhe fui explicando o que era toda essa mitologia.
Quando apresentamos o trabalho, o cantor,
chorava. É uma realidade.
A gravadora não estava muito para esse
labor. Ele investiu de seu próprio
dinheiro para bancar o CD. Quando saiu
foi um sucesso. Numa entrevista falou de
nós dois, que tínhamos entendido o que ele queria. Logo nos chamaram para uma entrevista para um
canal cultural, o diretor deu visto bom.
Explicamos como tínhamos criado através da história, da mitologia de
Sirius, da música, dois dias depois da apresentação ele morreu.
O CD, por isso virou antológico, os
artistas sempre dizem que ficam famosos depois que morrem, é o momento que
todos se lembram dele. Continua sendo
vendido até hoje.
Agora vinha passar os finais de semana com
o Nakano, adorava o contato de sua pele, de estar dentro dele. Comecei a nutrir um sentimento por ele. Tudo que ele queria era que de alguma maneira
mantivéssemos as duas coisas separadas.
Segundo ele seus relacionamentos nunca
tinha dado certo, porque não entendiam sua dedicação ao trabalho, nisso eu era
igual a ele. Em sua casa, começamos um
trabalho conjunto, eu ia desenhando, ele montando um vídeo, sobre uma historia japonesa. O mais interessante que quando vimos
tínhamos um filme de animação.
Minha tia um dia me perguntou se tínhamos
alguma coisa mais que esse trabalho.
Na hora não entendi, até que ela explicou
que o pessoal da agência estava comentado, a respeito, pois ele estava sempre
me valorizando para o diretor.
Mostramos primeiro a ele, o filme que
tínhamos feito juntos. Ele classificou
meu desenho de diferente, "exquis” usou essa palavra para dizer que era
diferente, perfeito. Acho que deviam
mandar para algum concurso ou mesmo mostrar em algum festival. Perguntou se confiávamos nele, mexeu todos
seus conhecimentos para conseguir que fosse apresentado num festival de cinema.
Um dia que fomos almoçar juntos, nos
perguntou se tínhamos alguma coisa intima, todo mundo fala, embora eu ache que
é um direito de vocês, espero que isso nunca interfira no trabalho.
Nakano ficou vermelho, eu também, mas
riamos depois pois ele dizia na tua pele não aparecia, na minha sim. Resolveu contar a verdade, que tínhamos uma
relação, que nunca ia permitir que interferisse no nosso trabalho. Ao contrário a prova estava no filme,
tínhamos feito em parceria, sem alterar nosso trabalho na agência.
Espero que seja assim, adoro o trabalho dos
dois, para pensar que um dos dois tenha que ir embora.
Acabei contando para minha tia, que adorava
o Nakano, agora vinha sempre comer em casa, pelo menos uma vez por mês. Ficava mais tempo com ele também no seu
apartamento, era como nosso ninho.
Comecei a escrever a historia do meu avô,
primeira parte era isso, escrevi a história, depois comecei a imaginar. Mandei para ele o texto para que me
corrigisse se tinha errado alguma coisa, me devolveu com as correções. Agora tentava de uma certa maneira criar os
personagens, Nakano me ajudava.
Uma noite estávamos discutindo isso,
sentados num restaurante em Marais, quando dois jovens se aproximaram, tinham
visto nossa entrevista na televisão. Gostamos
de ver como vocês desenvolvem o trabalho, estamos aqui sentado ao lado de
vocês, sem querer escutamos o que dizem.
Um deles começou a olhar muito para mim.
Vi que Nakano, ia ficando nervoso, mal acabamos de comer, ele
grosseiramente disse, vamos embora.
Quando nos afastamos dali, me disse o
porquê, nunca imaginei que fosse capaz de ter ciúmes, mas ver esse rapaz te
olhando, me provocou um desejo imenso de explodir, bater nele, sei lá o que,
tive que me controlar. Não quero de
maneira nenhuma pensar que eres minha propriedade, talvez seja melhor nos
afastarmos um tempo. Algo se
descontrolou dentro dele, alguma coisa guardada muito no fundo. Voltei a viver na casa dos meus tios. Seguíamos trabalhando juntos, mas só eu
percebi o enorme esforço que fazia para se controlar.
Um dia me disse, já falei com o chefe, irei
ao Japão resolver problemas de família, algo se rompeu dentro de mim, tenho que
descobrir por que meus sentimentos se trucaram.
Uns 15 dias depois, voltou, foi direto
falar com o chefe, tinha arrumado um emprego numa agência em Tokyo, claro
conheciam seu trabalho, nosso filme, queria que ele fosse trabalhar lá pois
lhes daria prestígio.
Nessa noite fui a sua casa, foi uma coisa
horrível, sequer me permitiu me aproximar dele, descobri que tinha uma parte de
dele, que não conhecia. Os outros
relacionamentos que tive, nunca passavam de uma noite, mas ao sentir essa coisa
da posse que tenho contigo, me deixa louco.
Me pergunto a cada instante, bem como imagino, você com outras pessoas,
na cama, conversando, fazendo coisas juntos, me da vontade de matar o que
imagino.
Isso não é bom, é um sentimento que não
domino, por isso não posso encostar em ti, pois se isso acontece, perderei meu
controle.
Fiquei literalmente chocado. Na segunda-feira o chefe me chamou, me disse
que estava conseguindo dirigir o trabalho sozinho, se eu queria alguém que
pudesse compartir o mesmo comigo. Lhe
disse que senão pudesse me virar sozinho lhe avisaria, pediria socorro.
Isso me obrigou a fazer tudo sozinho,
passei claro a ganhar muito mais, consegui um apartamento, mas sentia uma falta
imensa dele, escrevi várias vezes, mas nunca me respondeu.
Sabia que tinha alguma coisa a ver com seu
passado, mas como ele nunca falava nisso, achava indelicado perguntar,
principalmente sabendo como ele era fechado.
Tínhamos o hábito de ir comer num
restaurante japonês, que ele tinha me levado, continuei a ir, um dia se
aproximou um homem de uns 35 anos, me perguntou por ele. Lhe disse que estava trabalhando no Japão.
Eu os vi aqui a algum tempo atrás, ele não
me viu, mas o reconheci, fiz uma maldade com ele, erámos amantes no Japão,
quando vim para cá, fiz sucesso rápido, ele não, sem querer o deixei para trás,
me deslumbrei com que as pessoas amassem meu trabalho, que devia em parte a
ele, mas meu ego não reconhecia. Um
dia me encontrou com outro homem, um francês na cama, teve um ataque de ira,
pois tinha se sacrificado para vir comigo para cá. Eu como um idiota, me achando superior lhe
mostrei o caminho da rua. Ele teve que
pedir ajuda a pessoas da sua família que viviam aqui, essa o desprezavam porque
ele era gay. Até que conseguiu esse
emprego. Nunca mais me deixou se
aproximar dele.
Escutei tudo, em silêncio, isso me fazia
compreender o que ele sentia. Um dia me
mandou um vídeo, agora tinha um studio, tinha voltado atrás em tudo, estava
pintando, fazia sucesso, pois pintava suas memorias. Me mandou uma foto de um quadro, em que eu
estava nu. Não posso parar de pensar em
ti. Quero voltar, mas minhas dúvidas não
me deixam.
Lhe disse que nunca mais tinha tocado em
ninguém, mas que entendia seus sentimentos, tinha conhecido o namorado dele que
tinha me abordado, me contando a história deles. Que o homem não me inspirava a mínima
confiança, o que era verdade, pois no final de tudo, me convidou para dormir
com ele, me neguei. Lhe disse que meu
coração tinha dono.
Ele veio passar as férias adorou meu
apartamento, no quarto, eu tinha colocado tatame, dormia como tinha aprendido
com ele. Foi algo explosivo, porque eu
estava morto de saudade dele, meus sentimentos explodiram, me declarei para
ele, falamos de coisas que nunca tínhamos falado, me contou todo seu passado, o
que tinha lhe acontecido. Eu entendi.
Conseguiu um lugar para pintar, logo fazia
sucesso, pelo seu estilo. Vivia lá em
casa, nunca quis ir à agência. O
diretor, comprou um dos quadros, para colocar na sua sala. Quando ele foi convidado para expor nos
Estados Unidos, foi como se seu globo inflasse. Agora entendo o que o outro sentiu, me pediu
para ir com ele.
Fiquei completamente confuso, fui falar com
meus tios, não sabia o que fazer, sentamos mil vezes para falar do assunto, não
queria me separar, mas não tinha ideia de como fazer.
Falei como diretor, me disse que nos tempos
atuais eu poderia seguir trabalhando para a agência a distância, através da
internet.
Acabei indo, alugamos um apartamento em
NYC, lhe conseguiram um local para pintar, de lá fomos para Los Angeles, para
expor uma nova coleção de pinturas. Um
dia cheguei sem avisar no seu studio, estava fazendo sexo, totalmente drogado
com um tipo estranho.
Fiquei puto da vida. Coloquei o rapaz para fora, estas fazendo
exatamente o que fizeram contigo, mas eu não tenho nada a ver com isso. No dia seguinte decidi, fui fazer um curso na
escola de cinema, logo me chamaram para trabalhar numa companhia.
Não gostei muito, já sabia o que queria,
voltei para Paris sozinho, nunca mais tinha falado com ele, estava tão magoado,
pois a princípio não entendia nada, porque me fazia isso, se eu o tinha amado
incondicionalmente.
Nesse tempo todo, principalmente em Los
Angeles tinha ganhado uma certa fama, a agência, me recontratou de imediato,
pois agora eu tinha uma coisa importante, sabia atender clientes
americanos. Assumi na agência o papel de
criativo principal.
No meu apartamento, agora podia pagar um
grande, vivia na Rue des Abbesses, agora eram meus tios que vinham me
visitar. Mas tinha me fechado para os
relacionamentos. Só de me lembrar do Nakano,
me doía o peito. Não podia o perdoar.
Um dia, antes que alguém falasse o diretor
da agência, me mostrou uma notícia de jornal, ele tinha matado seu amante do
momento num ataque de loucura, de drogas até a alma. Alegava não se lembrar de
nada. Depois foi condenado a 20 anos de
prisão, morreu dois anos depois de Aids lá dentro.
Falavam de uma pessoa, que não era o homem
a quem eu tinha amado, que tinha me dado a chance de minha vida, pois tinha se
apaixonado por mim. Aonde estava aquele
homem tímido que me conquistou. Me
fechei mais ainda. Algumas vezes ia para
cama com alguém, mas preferia que não fosse na minha casa. Fazia sexo que não me satisfazia, depois ia
embora para minha casa. Um dia vinha
chorando no metro, quando um rapaz da minha idade se aproximou para me
perguntar se estava passando mal. Nunca
o tinha visto antes, lhe contei tudo de repente, ficamos amigos, começamos a
nos encontrar para jantar. Ele era
descendente de marroquinos, trabalhava no cinema, fazendo o que lhe aparecia,
ora em produção, ou montagem de um filme, começamos a nos entender. Um dia fui ver um projeto que estava fazendo
para um filme, acabamos na cama. Nem eu
tinha imaginado isso, ele tampouco, fomos nos conhecendo melhor, foi quando meu
avô morreu, ele esteve todo o tempo ao meu lado, falávamos muito. Ele tinha saído de casa em Casablanca, pois
não tinha aceitado que era gay.
Acabou me ajudando a fazer o filme sobre
meu avô.
Por isso nos agradecimentos o deixei por
último, sabia que ele estava sentado com meus tios, eles estavam orgulhosos de
mim. Logo o filme foi indicado para
competir nos Oscar, fomos os dois, na apresentação, recebi um convite para
trabalhar num dos maiores studios de lá, mas olhamos um para o outro,
gostávamos do nosso canto em Paris. Não
queríamos que o sucesso, nos atrapalhassem.
Estamos agora montando um filme os dois
juntos, sobre a minha história, será o primeiro desenho em longa dirigido a
gente jovem, que sonha em ter um romance, fala do Nakano, de tudo que
aconteceu, foi como purgar o meu passado.
As vezes tenho dúvidas, mas Mansur, não
permite que eu mergulhe em depressão, logo me chama para uma viagem, ou somos
convidados para falar em algum evento gay.
O amo com paixão, somos diferente um do
outro, ao mesmo tempo nos completamos. Já levamos juntos mais de 15 anos. Um amigo dele, diz que quando nos vê,
parece que estamos nos conhecendo, pois sempre estamos conversando um com o
outro. Ele sabe o que eu gosto, como eu
presto muita atenção em tudo que ele gosta ou quer. Entendo sua cabeça, o surpreendo no nosso
trabalho, incluindo o que ele sugere para ver se ficou bom. Não ganhamos o Oscar, mas o filme que fizemos
juntos, não para de dar voltas ao mundo, agora estamos em produção de um sobre a
vida de uma cigarra, que gosta de cantar, mas descobre que é gay, fala
justamente da adolescência, a vivência é mais dele que minha, pois até ir para
cama com Nakano, nunca tinha pensado em fazer sexo com homens.
Quando apresentamos no cinema, muita gente
estranhou, mas era dirigida aos jovens, mas fez mais sucesso entre os adultos,
que tinham passado por isso.
Ganhamos um premio na Inglaterra outro na
Alemanha, de novo selecionados para o Oscar, mas nem fomos, pois estamos no
meio de um novo trabalho, sigo trabalhando para a agência, mas como free Lancer
em algum projeto especial.
Meus tios se aposentaram, tentaram voltar a
viver em Gambia, foram e voltaram rapidamente, segundo ele, faltava meu avô
lá. Eu e Mansur erámos sua família.
Ele estava escrevendo um livro, eu lia cada
página do mesmo, depois me sentava no computador, montando o personagem. O filme saiu quase ao mesmo tempo que o
livro.
Tínhamos medo de um dia essa felicidade
acabar, mas vamos lutando para sempre manter essa amizade, o amor, respeito que
temos um pelo outro. Eu continuo sendo
segundo minha tia, o mesmo garoto que veio de Gambia, quando duvidei disso me
mostrou um vídeo que tinha feito quando cheguei, comparou com outro de uma entrevista
na televisão. Olha como te comportas, contínuas
sendo o sobrinho, que é meu filho ao mesmo tempo.
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