miércoles, 24 de febrero de 2021

OTTO BRAUSTICK

 

                                                     OTTO BRAUNSTICK

 

Tinha o mesmo nome do pai, um emigrante da Alemanha de Leste, tinha mudado o seu sobrenome, assumindo o da mulher, Elizabeth Braunstick, toda uma história por detrás disso tudo.  Tinha escolhido Frederichsburg, por imaginar que ali haveria uma colônia alemã grande, isso tinha sido no passado.

Segundo contou sua mãe no leito de morte, ele tinha sido polícia na cidade que viviam, informante da KGB, tinha denunciado, roubado, até assassinado pessoas em nome da Rússia, quando soube que o muro ia cair, tratou de fugir na calada da noite.

Tinha dinheiro, documentos falsos, passaporte incluído, em nome dele, sua mulher além do meu antecessor, um irmão que morreu nessa fuga.

Foram a pé a maior parte do tempo, embaixo de chuva, neve, o garoto não resistiu, segundo minha mãe, era uma cópia dele.   Ela trabalhava como química numa fábrica de cerveja da localidade.  Só pararam quando chegaram a um porto na Itália, o muro tinha caído, ninguém prestou muita atenção nele até o felicitaram pela caída do muro.  O primeiro navio que saia era para os Estados Unidos.   Tinha pensado no Brasil, mas o medo foi maior, o jeito foi embarcar nesse barco para NYC.   No caminho pesquisou, viu o nome de Frederichsburg, imaginou que tinha sido fundada por alemães, que lá estaria a salvo.

Com todo dinheiro que tinha roubado, joias, tudo isso, comprou um bom pedaço de terra, mas se negava a falar inglês, quem falava era minha mãe.   As terras que comprou, era decadentes, mas as revitalizou, plantando, milho/aveia/centeio/cevada, tudo que se precisava no processo de fabricar cerveja.   Vendia a maior parte do produto colhido, para uma fábrica, mas o resto era para consumo próprio.   Atrás da casa, existia uma quantidade enorme de terras, que eram floresta virgem, no meio dela, montou uma destilaria, minha mãe, produzia cerveja, que se vendia clandestinamente.

Mas vivíamos na beira da miséria, ele tinha na sua neurose, com medo de que o descobrissem, impôs que vivêssemos com o básico, comida pela manhã, um mingau de aveia com um pouco de leite, algumas vezes colocava cevada.  Roupas só quando a que tínhamos no corpo acabasse.

Só minha mãe, que tinha uma roupa melhor, que ficava sozinha no amplo armário de seu quarto, era para quando tinha que negociar a venda dos produtos.

Em casa só falávamos alemão, nada de rádio, televisão, tudo era terrivelmente simples.  Não permitia que eu fosse a escola.  Minha mãe, quando ia negociar, aproveitava para fazer compras em algum grande supermercado, vinha com a caminhonete carregada, para meses. Mas tudo era usado com parcimônia.   Um dia uma mulher alemã a viu discutindo com o xerife, que reclamava que o menino devia estar na escola.  Essa mulher foi meu anjo da guarda, pois a convenceu que eu devia ir, senão não teria futuro.  Quando ela disse que meu pai não ia permitir, foi com o xerife até lá o ameaçando.    Por causa disso minha mãe levou uma surra.

Mas acabou concordando, dizia que na verdade eu não devia ser filho dele, pois apesar dos olhos azuis, eu tinha cabelos escuros como os dela, era mirrado, se descobriu depois que por culpa da subnutrição que vivia.

Não me estava permitido ficar jogando com meus companheiros, tampouco, ficar depois das aulas, tinha que trabalhar no campo.    Me comprou uma bicicleta de segunda mão, que eu cuidava com todo amor, era meu bibelô predileto.

Essa mulher apesar de ter reconhecido meu pai, por um cartaz de procura-se que circulava nas cidades que tinham cidadãos alemães, não o denunciou, me dava roupas de seus filhos mais velhos para usar, tênis de segunda mão, quando me sentava na minha carteira sempre tinha um sanduiche embaixo, para o lanche, fazia para seus filhos e para mim.   Esses me detestavam, pois era como se eu estivesse roubando o carinho de sua mãe.  Volta e meia me pegavam, mas eu não reclamava, estava acostumado por qualquer motivo a levar uma bela surra, tinha que faltar as aulas uns dois dias.    Apesar de tudo isso, eu era o aluno com as nota mais altas, devorava tudo, inglês, matemática, ciências, literatura, os meus livros era de seus filhos que estavam duas turmas na minha frente.   Em breve os alcancei, pois evoluía mais do que eles nos estudos.  Tinha recuperado o tempo que não tinha estado na escola.

Apesar de extremamente magro, tinha uma força incrível para minha idade, talvez devido ao trabalho no campo.  Quando chegava em casa, guardava a roupa da escola com muito carinho, vestia uma roupa velha, comia alguma coisa que minha mãe tinha deixado sobre a mesa, verduras, um ovo, ou um tomate, ia para o campo trabalhar.  Ali a regra básica era, trabalhe, não fale.

Era uma ditadura, me largava nas costas os trabalhos duros, se reclamava, levava um bofetada na cara, tinha que engolir em seco, tentar fazer o melhor possível.  Ou estaria fadado a levar uma bela surra.   Tinha já nessa época, duas marcas profundas da fivela do cinturão dele.

Nunca se aproximava de mim, nenhum afago.  Qualquer coisa dizia que meu irmão teria feito melhor.   Usava o nome dele, por causa dos documentos que tinham guardado.

Quando tinha 16 anos, acabava a escola, poderia ir a Universidade antes do tempo. Quando a senhora Marie, apareceu, dizendo que eu tinha possibilidades de ir à universidade, com uma bolsa de estudos, ele ficou uma fera.  Estive dois dias trancado no meu quarto, escapava por uma janela no teto do mesmo, descia por uma árvore, me escondia na floresta, tinha meu lugar preferido.     Mais acima, no meio da floresta tinha um lago, nem ele sabia que existia, tinha descoberto com minha mãe, era nosso segredo.

Quando ele tinha pesadelos, com as pessoas que tinha matado, era o momento de desaparecer, escapávamos os dois para lá.

Eu adorava o meu lugar predileto, uma pedra que ficava a uma certa distância da praia, tinha aprendido a nadar sozinho, subia na pedra, ficava sentado, imaginando como seria a vida em outro lugar.  Me evadia totalmente, sonhava em colocar distância dele, normalmente tinha as costas lanhadas pelo seu cinturão, mesmo que estivesse em carne viva, ficava deitado na pedra ao sol, como se este me cura-se.

Passava fome, mas me sentia protegido por lá.   De noite minha mãe, abria a porta de mansinho, colocando um pouco de mingau de aveia, com um ovo em cima para mim.   Sabia que a estas alturas ele estaria dormindo.

Para a festa de formatura, a senhora Marie, me deu de presente um terno que seu filho tinha usado, ficava imenso em min.   Fui escondido, queria sentir o sabor de ter terminado alguma coisa.   Foi meu erro, pois, quando terminou a entrega de diploma, riam de mim, principalmente seus filhos que tinha contado que o terno era de seu irmão mais velho, quando peguei a bicicleta para voltar para casa, me deram uma surra, eram muitos, tinha raiva porque minhas notas eram as melhores, tinha direito a bolsa de estudos, eles não.

Me arrebentaram a bicicleta toda, rasgaram minha roupa, abusaram sexualmente de mim, não tinha como me defender.   Cheguei em casa chorando, cheio de sangue nas pernas, mas ele do campo me viu chegando, ficou furioso, me deu uma surra de fazer gosto, até que cai desmaiado.

Me disse que deixava de ser seu filho, que devia ir embora no dia seguinte. Nem sei como consegui chegar no meu lugar preferido, sangrando por todos os lados, cheguei a minha pedra, lá estava a salvo, ele não sabia nadar, ela tampouco.

Passei a noite chorando, me sentia humilhado, o pior não tinha sido os garotos, tinha sido ele, que ao final, me cuspiu na cara, dizendo que eu era a partir de agora um marica.

Não sei quantos dias fiquei lá em cima. Tudo se apagou, tudo que escutava era o ruído de aves, nada mais.   Mais uma vez que me salvou foi ela, Marie.  Quando soube o que os garotos tinham feito foi a fazenda, meu pai a ameaçou, mas ela voltou com o xerife, inclusive na frente dele o ameaço de denunciar, usou seu verdadeiro nome, ele foi para sua destilaria.  Minha mãe o levou até o lago, mas não me via.  O xerife pediu auxílio, um helicóptero sobrevoou a zona, me localizaram, desceram espantando as aves, que comiam minha pele.   Fui resgatado levado para um hospital.    O médico disse que eu estava catatônico, que depois de curado, devia ir para um outro tipo de hospital. 

Fiquei dois anos internado, nesse tempo, minha mãe só veio uma vez, isso porque Marie a encontrou na cidade, a obrigou a entrar no carro com a mesma ameaça, que ia denunciá-los.

Mas ela vinha me ver todas as semanas. Ficava sentada numa cadeira ao meu lado, falando comigo. Quando comecei a melhorar, trazia comida feita em casa, dizia que estava muito magro, subornava o encarregado de comida, para que me desse carne.  No dia que me resgataram, tinha visto todas as marcas que tinha nas costas, ficou tão furiosa, que a primeira coisa que pensou foi denunciá-lo realmente.  Mas isso implicaria que me deportariam junto.

Sabe-se lá o que ele poderia fazer contigo, me contaria anos mais tarde.

Quando fiz 18 anos, estava bem já para sair, ia todos os dias falar com um psicólogo, contei tudo que sentia todos esses anos. O medo que sentia dele, dos dias que tinha pesadelo, em que havia que desaparecer de sua vista, para não levar uma surra por nada.

Estava para sair, quando Marie apareceu com o xerife, um bom homem por sinal.  O psicólogo estava junto, o xerife contou que tinha havido uma explosão nos alambiques que tinham escondido na montanha, que a cidade toda escutou, quando chegamos, ele já estava morto, cortado pela metade, sua mãe está muito mal no hospital.  Viemos te buscar, pois ela quer falar contigo.

Marie trazia como sempre uma roupa para que eu vestisse, mas dessa vez, era tudo novo, cuecas incluídas, pois a gozação dos garotos era que eu nunca tinha cuecas.

Me deu lastima de ver minha mãe em cima da cama, toda queimada, ainda resistiu dois dias, teve tempo de passar tudo para meu nome, inclusive da conta do banco.   Me contou toda a história deles, que eu tinha nascido nada mais ao chegar aos Estados Unidos, mas que tinha saído a família dela.  Contou todas as maldades que ele tinha feito durante o regime comunista no Leste, como ameaçava as famílias que não lhe davam dinheiro, os denunciava, roubava, até mesmo matava.

Por isso tínhamos dinheiro quando chegamos aqui.  A tua vida agora é só tua, faça uma universidade, estude, eres inteligente, podes ser uma pessoa diferente.

Quando morreu a enterramos no cemitério, mas fiz uma maldade, a enterrei o mais longe dele possível.  Ele que ficasse sozinho lá no fundo do cemitério.

A fazenda agora era minha, poderia fazer o que quisesse com ela, fui ao banco com um advogado, fiquei de boca aberta com o valor que havia em deposito, tínhamos passado miséria a vida inteira, fome, mas a conta tinha um valor incrível.   Teríamos podido viver bem a não ser pela neurose dele.   Fiquei uns dois dias bloqueado, preocupado comigo mesmo.   De novo ela me ajudou, sentou-se comigo, conversamos longamente sobre o que eu gostaria de estudar.

Sempre tinha gostado de escrever, de ler os livros que em casa não existiam.  Apesar de me sair bem em matemática, física, química, não era o que eu gostava. 

Me recomendou que eu fosse para San Francisco, ou Dallas para estudar.   Eu preferia estar o mais longe possível.   O xerife me falou de uma família que gostaria de explorar as terras, o advogado que Marie tinha conseguido, negociou os termos, o aluguel da mesma, a porcentagem dos lucros da exploração.

Agora já não precisava da bolsa de estudo, podia eu mesmo bancar minha universidade, ela contatou uma família que era conhecida, para me hospedar nos primeiros tempos, até eu conseguir um lugar para viver.

Antes de ir embora, fui falar com o psicólogo que me acompanhava, ele me sugeriu que eu continuasse a frequentar um.   Me falou de um amigo de universidade, me deu seu cartão, para procurar por ele.

Comprei roupas pela primeira vez na minha vida, duas mudas de roupas, uma calça jeans normal, outra negra, camisetas, cinzentas, negras, roupa interior, dois tênis, cabiam tudo numa maleta pequena.   Essa seria minha bagagem para o resto da minha vida.

Consegui me matricular, em filosofia, literatura, nesse tempo tinha conseguido um pequeno apartamento em Ashbury Heights, uma casa antiga, reformada, em que a parte de cima tinham transformado em apartamento.  Tinha um pequeno hall embaixo, depois a escadaria, tinha dois quartos, uma sala, banheiro, pequena cozinha.   Estava mobiliado, só pedi que tirassem tudo do quarto menor que seria meu escritório, gostei tanto do lugar que paguei o aluguel de seis meses.  Perto tinha de tudo, inclusive restaurantes.   Me deliciava comendo hamburguesas, coisas que nunca tinha comido quando criança, nem em minha juventude.

Descobri escutando alguns alunos na biblioteca da universidade, falando de um local que vendia roupa de segunda mão, falava em roupas do exército, da marinha, roupas para o inverno que ia chegando.   Pedi licença, perguntei aonde era, uns dois rapazes ia até lá fui com eles, descobri que seriamos companheiros na faculdade.

Comprei um casaco da marinha de lã, negro, bem como uma parka do exército, inclusive impermeável.   Retirei qualquer vestígio que fossem militar, além disso comprei botas para chuva.  Estava preparado para o inverno.

Pela primeira vez pude comprar livros.  Os lia como se estivesse bebendo água para matar minha sede de saber das coisas, nos primeiros dias de aula vi que todos tinham um laptop, enquanto eu anotava tudo com lápis numa agenda.

O professor riu, dizendo que eu era o único aluno que prestava atenção, anotando o que realmente ele destacava.   mas me aconselhou a comprar um laptop, para escrever os trabalhos que pedia.

Quando pediu que baseado num livro, escrevêssemos uma história a partir de uma frase que nos deu.   Leiam o livro, quero ver quem não se deixa influenciar por ele.  A partir dessa frase, escrevam uma história.  Li o livro de cabo a rabo, a frase ficou martelando na minha cabeça, era um final de semana, fiquei sentado numa varanda em Castro, escutando as pessoas falando em volta, ou passando na rua, construí a história em cima de dois rapazes que comparavam suas experiencias sexuais, esse era o ponto de partida, depois analisei cada personagem individualmente como duas pessoas buscando desesperadamente uma relação verdadeira, o que falavam era puro esnobismo, tipo eu faço mais que tu, mas quanto disso tinha um fundo de verdade.   Inventei a verdade de cada um, a solidão de viver, sem conseguir realmente ter um relacionamento verdadeiro.

O professor ficou impressionado, não tinha impressora, tive que imprimir na biblioteca.  Veio me perguntar se me baseava em mim alguma das histórias.

Fui honesto com ele, que tudo era imaginação minha, pois minha experiencias sexuais não passavam do que lia nos livros.  Que eu mesmo além do abuso que tinha sofrido, nunca tinha feito sexo com ninguém, tampouco amado para saber como era.

Sorriu dizendo se já escreves assim, imagino como será quando realmente tenhas experiencias.

A maioria tinha aproveitado um dos personagens do livro para escrever uma história, ele sorriu, de todos vocês o único que realmente criou personagens diferente foi o Otto.

Teríamos que escrever agora um conto policial para um concurso que uma editora fazia para toda a universidade.   Baseado no que sabia, escrevi sobre meu pai, com seu nome verdadeiro, Otto Branswaden, procurado pela polícia internacional, pelos crimes que tinha cometido na Europa de Leste, como tinha fugido, vivendo nos Estados Unidos.

Quando leu, me perguntou como tinha imaginado isso, lhe respondi sinceramente que era a história de meu pai, um sujeito muito retorcido.  Com essa história ganhei o concurso, que ia além de sua publicação, a um valor em dinheiro.

Mandei uma cópia para Marie. 

Ela me escreveu dizendo que se queria a história inteira, deveria ir a cidade de aonde ele tinha saído, mas que tomasse cuidado.

Com os documentos que tinha estado escondidos pela minha mãe, sabia que era algum lugar perto de Chemnitz, cerca de Dresde, mas estudando direito, fiquei tentando por Freiberg, pois isso o teria levado a escolher nossa cidade pois começava por “FRE”, busquei informações sobre ele, porque era procurado.

Cheguei incógnito a cidade de Dresde, a estavam reconstruindo totalmente, vi uma exposição como era na época comunista, foi depois para Chemnitz, ali sim falando com os velhos, pude conhecer um pouco a história, fui a universidade falar com um professor, este sabia tudo sobre os informantes da KGB, sobre meu pai, falou horrores sem que eu tivesse perguntado nada, lhe contei que estava escrevendo um livro, baseado que muitos tinha escapado para os Estados Unidos, para o Brasil.  Me falou demoradamente sobre cada um.  Vivemos nosso inferno aqui, esse homem era retorcido.  Perguntei sobre sua mulher.

Dela pouco se sabe, a escondia de todos, talvez por medo a uma represália, sabemos que era aqui da universidade, mas quem não sabemos, muitas professoras, desapareceram depois, eu mesmo já baralhei muitas, me deu um dossier com o nome da várias delas.

Depois fiz o caminho que minha mãe tinha descrito de fuga, aluguei um furgão, pedi para tirarem os bancos detrás, comprei um colchão, um edredom, fui seguindo o caminho, conforme ela tinha escrito, inclusive aonde tinha morrido meu irmão.    Perguntei sobre o assunto, me mostraram um jornal da época, que falava de um garoto encontrado depois do degelo da neve, sem documentos, me mostraram a foto.  Tirei cópia de tudo, na minha cabeça, como estava morto para ele, deixava de existir, porque sequer fez uma sepultura para o filho.

Quando cheguei a Itália fiz o mesmo caminho deles, a maior parte do tempo caminhavam de noite, a não ser quando chegaram a Milão aonde roubou o carro velho para fazer o resto do caminho.

Parei em Florença, fiquei num pequeno hotel, fiquei pensando muito no que tinha descoberto, como um pai faz isso, se descarta de seu filho, como se fosse um saco de lixo, me veio na cabeça o que tinha feito comigo.  Mas não deixei a depressão tomar conta da minha cabeça.

Já sabia tanto sobre ele, de aonde tinha saído, como tinha chegado a polícia, depois da guerra, já colaborava com os comunistas, desde que se separou por zonas.  Ele tinha sido um dos jovens da SS, estava acostumado as barbáries, era fácil então não ter escrúpulos.  Talvez minha mãe tenha escondido que era sua informante na universidade.  Mas dizia que o tinha conhecido através de uma amiga.

Voltei agora, pelas estradas oficiais, fui a cidade de novo, caia uma nevasca de fazer gosto, procurei sobre o endereço que ela tinha.   Encontrei uma família, o chefe da casa, disse que era seu irmão, perguntei sobre sua fuga.   Eles tinham se surpreendido, a partir da Universidade, desapareceu.   Vivia escondida em algum lugar, quando teve o filho, nunca o vimos, se falava muito com quem andava, mas tínhamos medo, qualquer coisa aqui, servia para uma denúncia, talvez fosse a maneira dela nos proteger.  Todos desde jovem trabalhamos numa fábrica de cerveja, ela era a mais inteligente, conseguiu que lhe pagasse para estudar química, dizia que assim poderia ser uma boa maestra cervejeira.

Quando tanta gente desapareceu, imaginamos que tivesse ido com as pessoas que denunciavam os outros para a KGB, mas no fundo, imagino que quis nos proteger.   Perguntou por que queria saber tudo isso.   A ele em particular lhe contei quem era, com quem ela tinha fugido, que meu irmão tinha morrido no caminho, que nasci logo que chegaram aos Estados Unidos.

De meu pai ele falou horrores.   Era de uma família, que aderiu ao Nazismo imediatamente, perseguiram os judeus, a toda custa, ganhavam dinheiro fazendo isso, quando chegou ao seu auge era a única família que tinha privilégios por aqui.  Mas no final da guerra, sobrava poucos, ele passou logo para o lado dos vencedores.   Seguiu com o que tinha aprendido com a família.

Voltei para casa, no dia seguinte fui ao psicólogo, tinha que analisar com alguém tudo que tinha descoberto.     Uma das coisas que me disse, era que talvez muitos emigrantes, borravam seu passado, justamente por isso, para esconder o que tinha feito em outro lugar.  Assumem a nova vida de maneira extremamente complexa, como teu pai fez.  Vivendo quase na pobreza, para compensar o que tinha feito, os pesadelos, sua agressividade, como querendo que vocês pagassem com ele todo o mal que tinha feito.

Sem querer comecei a me lembrar de palavras que dizia quando me dava uma surra, sempre em alemão, fui anotando todas, para estudar realmente o que queriam dizer.

Me dei conta, que me acusava justamente disso, dos seus erros, quando na noite anterior tinha seus pesadelos, tudo isso era pior.

Passei a sonhar com isso, me despertava, me sentava na cama, escrevia tudo numa caderneta, tudo o que me dizia.  Agora me dava conta, me confundia com os que tinha matado, mas sempre eles eram os culpados, ele nunca.

Conversei com meu professor, mostrei os vários caminhos que poderia tomar.

Foi franco, qual seja o caminho, se consegues publicar, vão te perguntar sobre isso, o melhor é falar a verdade.  Talvez seja melhor uma versão catártico em que contas como era sua cabeça, o que fez contigo.

Falei com Marie por telefone, queria saber se poderia ler o que eu tinha escrito, para saber o que pensava do assunto.   Me disse não venha, eu vou me encontrar contigo.

Quando chegou, entendi por que, disse que seu filho mais velho tinha encontrado o seu diário que falava de tudo sobre mim, que tinha ficado furioso, por ter-me me ajudado, quando podia ter denunciado meu pai.   Mas como ela dizia, nunca tinha feito por eles, mas sim por mim.

Leu tudo o que eu tinha escrito, lhe deixei usar meu dormitório, dormia num colchão no meu studio.  Leu mil vezes, fazendo anotações ao lado num papel.  Me mostrou depois, ajustava coisas.  A sua família ele tinha perseguido, porque tinham escondidos judeus, ajudavam muitos a escapar.  Antes de vir para cá, o que sobrou da minha família teve que ir para Israel, embora não fossemos judeus.    Eu trouxe meu diário, quero que leias, para entender.   Te abrira uma outra visão disso tudo.

Quando foi embora, agradeci tudo o que tinha feito por mim. Nunca poderei esquecer, que sem a senhora, eu não estaria vivo.   Escrevi uma carta ao filho dela, pedindo perdão, por em termos ter roubado sua mãe.

Comecei o livro com ela descobrindo meus pais, mas que quando me viu ali naquela miséria, disse que meus olhos pediam socorro.  Resolveu que tinha que me ajudar, passando por cima de todo o ódio que tinha a ele.   Como tinha forçado, ameaçado, falei tudo que tinha feito, depois coloquei a visão minha de garoto que não entendia a razão de tanta brutalidade, das surras que levava depois dos pesadelos dele, transcrevi tudo que tinha recuperado da minha memória, o que ele dizia enquanto me dava uma surra, por ser moreno como o resto da população, que eu não tinha sangue ario como ele, que a culpa era da minha mãe que era impura, ele nunca tinha culpa de nada.

Depois tive que falar o que tinha acontecido no final, como o tinha deixado enterrado sozinho no fundo do cemitério, para que estivesse relegado a segundo plano.

Por último falava da minha busca da verdade, indo a Alemanha, da busca da história toda.

Um dia me chamaram a porta, quando abri era o filho da Marie.  Ficou parado na minha frente, viu a cara de horror que coloquei, pois o reconheci imediatamente, como um dos que tinham abusado de mim naquela noite, fiquei estático com a lagrimas escorrendo pela cara.  Nunca tinha podido me aprofundar nessa parte de minha história, primeiro porque não sabia quem tinha feito isso.  Só tinha gravado a cara dele.

Estava ali de braços caído, meu impulso era de fechar a porta, outro de soltar todos os palavrões possíveis.  Mas ele educadamente me pediu se podia falar comigo.

Conversei com minha mãe sobre aquela noite, o ódio que alimentava com relação a ti, quando te via vestido com uma roupa que era minha, ou uma camiseta do meu irmão, sabia do sanduiche que ela deixava na tua carteira.   Não entendia por quê?    Quando lhe perguntava, dizia que nossa obrigação era ajudar os menos favorecidos, mas na escola tinham outros como tu.    Vi todos os escândalos que fazia com teu pai, tua mãe, como em casa não falávamos alemão, não sabia do que falava.   Fantasiava que teu pai era um oficial nazista escondido, que tinha alguma coisa a ver com o passado da família, que meus avôs escondiam de todas as maneiras, que não entendia por quê.

Agora entendo, me explicou tudo.  Venho te pedir perdão pelo que fiz.

Na minha cabeça, lhe respondi, tudo isso virou uma grande barafunda, pois misturei isso, com a surra que levei em seguida, dos dias que fiquei em cima da pedra, queria que os pássaros me comessem lentamente, para acabar com toda essa história.   Mas foi tua mãe, que mais uma vez foi em meu socorro, quem movimentou a polícia, quem me visitava no hospital, minha mãe só foi uma vez, porque ela obrigou, tinha medo do meu pai.

Tua mãe, foi mais minha mãe, que a minha própria.   A tenho num pedestal.  Aproveite, já que estas aqui, leia tudo que estou escrevendo sobre o assunto.

Ele ficou lendo, fomos comer num restaurante que ia sempre, os dois não dizíamos nenhuma palavra, era que como se ele estivesse ruminando o que tinha lido até agora.

Voltamos, lhe disse para dormir em meu quarto, mas ele disse que dormiria no colchão no studio.   De noite despertei no meio de um pesadelo, com ele segurando a minha mão, escutei o ruído que fazias com teu pesadelo.  Me levantou, ficou me abraçando, me dizendo que tivesse calma que ele ia me proteger.

No dia seguinte quando me levantei, tinha ido buscar café, croissants.  Ficamos os dois conversando, levamos dias fazendo isso.  Só quando colocamos tudo para fora, foi que paramos de falar.    Algumas vezes fazia como sua mãe, me segurava a mão, principalmente quando a lembrança era dolorosa.

No final disse que o que sentia por mim nessa época se dividia em duas coisas, de um lado não entender por que sua mãe me ajudava, ela tinha reconhecido para ele que pensava que assim os protegia.   De outro lado a inveja, ao mesmo tempo admiração pela minha inteligência, com eu absorvia tudo, a ele custava muito a entender tudo que nos ensinavam.  O fato que no final ganhei a bolsa de estudos, frustravam os sonhos dele, de conseguir uma para estudar fora, tinha conseguido pelo esporte.  Mas nunca pude esquecer quando estive fazendo sexo contigo, creio que meus sentimentos eram uma loucura, ódio, se não fossem os outro juntos eu te abraçaria, te chamaria de amor.  Mas fui só eu que consumou o ato, não permiti que ninguém mais tocasse em ti.  Eras meu de qualquer maneira, tudo que tinha ansiado durante muito tempo.

Arruinei minha vida, fui embora, fiz a universidade, mas sempre que ia fazer sexo, pensava em ti, não me livrava da tua imagem, começava a chorar, riam de mim.

Agora era eu que o consolava.  Me contou que de todos os filhos dela, era o único que não tinha casado, nem tinha filhos.   Não posso me esquecer de ti.

Nessa noite ficamos abraçados na cama, conversando, nem tentamos fazer sexo, lhe expliquei que ele tinha sido o único.  Que levaria tempo para conseguir algo, que ainda falava com meu psicólogo sobre o assunto.

Escutei pela manhã que conversava com sua mãe, que chorava muito, mas lhe permiti, esse momento somente dos dois.

Foi embora me dando um beijo na boca, que ficou ali, guardado.

Nós falávamos sempre.   Terminei a universidade, apresentei o livro, meu professor que o tinha lido, dizia que eu tinha tido muita coragem, mas sua preocupação, era o que iria escrever em seguida.   Lhe mostrei outra historia que estava escrevendo, que não tinha nada a ver com a minha.  Gostou muito.   Não se preocupe.  Fui em busca da verdade, tinha que colocá-la para fora.   Queriam publicar meu livro, falei com Marie, ela já o tinha lido, bem como o Georg seu filho, me disse que sim que devia publicar.

Aceitei, mas falei com meu advogado, inclui cláusula que nunca poderia ser vendido como roteiro de cinema, nem para a televisão.   Tampouco daria entrevistas sobre o livro. Quem quisesse publicar teria que aceitar isso.   Não estava disposto que minha vida virasse um circo mediático.   Inclusive na história, falava de outra cidade.

Foi publicado, era um sucesso, quase todos os dias a editora me chamava, para tentar me convencer a dar uma entrevista, me neguei sempre, quando foi para a terceira edição, finalmente concordei, eu agora era professor estagiário na universidade.

Com uma condição, que podia me recusar a responder a perguntas capciosas.  Foi o que fizemos.   Quando levavam a pergunta para meu âmbito particular, eu não respondia, uma das pessoas me perguntou se realmente meu pai me pegava.   Lentamente tirei o meu casaco, com se estivesse fazendo um strip-tease, tirei a camiseta, me virei de costa para a plateia.  Foi um OH, generalizado, as marcas continuavam ali.

O livro chegou a quinta edição, o editor queria colocar na capa uma foto publicada no jornal das minhas costas, me neguei terminantemente, com o risco de romper o contrato com a editora.

Meu segundo livro saiu, fez mais sucesso que o anterior, a historia não tinha nada a ver com minha vida.  O terceiro foi igual.

Mas se nas entrevistas me faziam perguntas da minha vida pessoal, me negava a responder.

Fui ao enterro da Marie, me reencontrei com o Georg, falamos, me disse que estava vivendo em San Francisco, já a seis meses.  Concordei em voltar com ele no carro.

Estávamos os dois na casa dos 30, como dizia um de seus irmão, solteiros e invictos, quem vai querer casar com vocês dois.

Fui dar uma olhada com ele na fazenda, continuavam cultivando o campo, agora com máquinas, a casa nunca tinha sido usada, caia aos pedaços, mandei arrasá-la.

Viemos conversando o tempo todo da viagem, descobri que agora ele pintava, seu sonho de juventude.   Fui conhecer seu studio.  Era pequeno, apertado, mas na sala de sua casa, tinha um retrato meu, feito de memória.   O beijei.  Começamos um relacionamento, mas cada um na sua casa, algumas vezes ele dormia na minha, outras eu na dele.

Descobri que gostava de escrever, mas não de dar aulas.  Falei com ele, creio que tenho que mudar minha vida.  Preciso de um lugar tranquilo para escrever.   Voltamos juntos a cidade, resolvi construir, uma casa moderna, já não sobrava nada daquela anterior, tinham inclusive plantado em cima da mesma, num dos claros, no caminho para o lago, na parte alta, dava para ver o mesmo, construí nossa casa, fizemos um caminho até lá.  Tinha uma lateral que era seu studio de pintura, no extremo oposto, aonde eu trabalhava, olhando a minha torre a pedra aonde costumava sentar.

A primeira vez que o levei até lá os dois suamos para subir, reclamava que já não éramos crianças para subir por ali, o jeito seria mandar construir uma escada.  Me neguei, aquele lugar era só meu, a partir de agora estas proibido de subir.

As vezes seus irmãos apareciam.  Um deles tinha um filho, que era a cara da Marie, vinha passar férias conosco.   Tanto gostava de pintura como de escrever.

Esse seu irmão, trabalhava para a fábrica de cerveja que comprava toda a produção da fazenda, o mais interessante era que tanto eu como o Georg não bebíamos.  Seu irmão por causa disso, voltou a viver na casa que tinha sido de sua mãe, seu filho subia sempre de bicicleta para estar conosco.

Era desse irmão que normalmente eu herdava todas as roupas, agora ele era gordo, riamos disso, dizia que lhe fazia graça naquela época, me ver vestido com suas roupas, que ele já tinha herdado dos outros irmãos, que em mim ficavam imensas.

A pintura do Georg fazia sucesso, mas ele se negava a sair dali, íamos para as vernissage, mas voltávamos para nossa casa.  As vezes íamos de viagem pela Europa, loucos para voltar para casa.

Para criançada, era um tio a mais, quando nos casamos, fizeram uma festa imensa, seus irmãos achavam natural, diziam que o Georg sempre tinha sido o queridinho da mamãe, que gostava de desenhar, que não tinha amigos, que estava sempre me seguindo no recreio, que ficava de longe me olhando.  

Eu não sabia, ele rindo me dizia que já me amava, sem saber.

Se por acaso falávamos de meus pais, ele dizia em seguida que eu não tinha culpa nenhuma do passado deles.

Um dia apareceu um alemão, querendo falar comigo.  Já o conhecia de nome, queria fazer um filme sobre a família do meu pai, relatando o acontecido daquela época.  Me perguntou se queria escrever o roteiro.

Lhe disse que poderia lhe dar meus apontamentos, mas escrever sobre isso nem pensar, tinha ficado no passado, insistiu muito, mas me neguei.

Já purguei minha vida anterior, estava escrevendo um roteiro de cinema para meu terceiro livro, isso sim me interessava, meu agora sobrinho Carl era meu auxiliar, eu escrevia, ele fazia a primeira leitura, me criticava com um olhar totalmente diferente do meu.  Se vamos ver essa imagem na televisão ou no cinema, as pessoas vão pensar em outra coisa.  As vezes podíamos discutir horas, até que Georg vinha se meter no assunto rindo.

Os dois mais parecem pai e filho discutindo algum assunto.

A empresa de seu irmão foi comprada por uma fábrica alemã de cerveja, veio perguntar se Carl podia ficar conosco durante a ausência deles, iam os dois.

Dias depois o novo xerife subiu para avisar que tinha existido um atentado no complexo turístico aonde faziam a convenção da empresa, não se sabia exato o número de mortos, eu falei com o Carl o que acontecia.  Me abraçou pela cintura, ficamos ali parados olhando a pedra no lago, tinha lhe contado que a subia, para ficar pensando.

Quando nos informaram que os dois tinham falecidos, pedimos imediatamente a guarda do Carl, afinal ele era como nosso filho.   Um dia de manhã o vi na pedra, desci até o lago, fui nadando até ele, me jogou uma escada de cordas que eu escondia tinha colocado lá para me facilitar.   Agora compartia com ele horas de silêncio pensando nas coisas da vida.

Se alguém falasse alguma coisa, estando os dois juntos, erámos como pai e filho de tanto que nos entendíamos.   Enterramos seus pais, no outro lado da montanha, aonde anteriormente existia o alambique de meu pai. Amava aquela pequena floresta, a paz que existia ali, era impressionante.

Eu as vezes ia com ele, ver o tumulo dos seus pais, ficávamos ali conversando, como se eles estivessem presente.   Carl era o melhor aluno da escola, como eu tinha sido, sua inteligência era impressionante.  Descobrimos na pedra um jogo, eu começava a contar uma história, ele tinha que seguir com os personagens, desenvolvendo a mesma, até que me passava a bola outra vez para continuar.

Montamos os dois um livro, chamado jogo de bola, muita gente pensava que era sobre futebol, era as historias mais loucas que duas pessoas podiam inventar, começavam sem pé nem cabeça, iam tomando forma, acabava de uma maneira totalmente diferente.  Tínhamos passado a gravar essas histórias para depois passar para o papel.

Georg ria muito dessas histórias, foi editada como livro de contos para jovens, com o nome dos dois.   Na primeira entrevista ele estava eufórico, tinha algo para mostrar para o mundo.

Quando chegou a época de ir a Universidade, tinha em sua cabeça totalmente definido o que queria fazer.   Foi estudar historia da arte e literatura. Queria vir todos os fins de semana, combinamos que um final de semana iriamos nós para curtir San Francisco.  Teatro, museus, livrarias.

Quando a quantidade de livros espalhados pelo chão era imensa, conversando com ele, pensamos, ao lado da escola tinha uma casa abandonada, que a os mais velhos usavam para ir fumar.  Comprei o local, mandando construir uma biblioteca moderna, que demos de presente para a cidade.  Ele inventou uma coisa, pediu um lápis para os arquitetos, desenhou um local para que os maiores pudessem ir fumar, havia uma espécie de parede, aonde podiam fazer grafites, se fotografava, depois se borrava para começarem tudo de novo.

Quando terminou o curso, quis voltar para ser diretor da escola.  Inventou, me convenceu de construir um pavilhão, aonde os jovens pudesse estudar artes, inclusive cinema, conseguiu professores para isso. Assim os mais jovens, já que a cidade crescia, podiam sair dali, já com carreiras dedicada a artes mais definidas.

Quando Georg morreu, as obras de artes que ele tinha em casa, foram para um pequeno museu que construímos em sua memória, todo seu dinheiro foi dividido entre os outros sobrinhos, ele sabia que Carl era meu herdeiro.    Me preparei a consciência para isso fizemos minha última ida a pedra, falei tudo o que queria que ele fizesse, gravamos e claro, para valer diante de um juiz.  Eu seria enterrado ao lado do Carl, junto aos pais dele, mas tudo que era meu iria para ele, bem como uma parte iria para a escola, que tinha sido minha tabua de salvação.

Tinha sido ampliada com as doações que conseguimos da fábrica, já que a maioria dos empregados viviam lá.  As doações dois anos depois foram para uma quadra de basquete, piscina fechada para o inverno, tudo para o esporte dos jovens.

Como lutávamos tanto pela cidade, queriam que ele fosse político, mas se negou, nessa época conheceu a que seria sua esposa, seu primeiro filho se chamou Georg.   Quando estava gravida do segundo, num inverno impressionante.   Resolvi que não podia mais viver sem o Georg, estava velho demais, fui de barco até a pedra, o lago estava começando a se congelar, subi, fiquei deitado ali, como no dia que quase morri, mas desta vez, ninguém iria me salvar.

Acredito que ele tenha sido como sua avô o primeiro a imaginar quando não me encontraram aonde eu devia estar.   Uma parte das minhas cinzas deveriam ficar lá escondida entre as pedras.   Sabia que estava já como Georg.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  

 

 

 

 

 

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