lunes, 3 de abril de 2023

UN VOL DE GRUES

 

                                              UN VOL DE GRUES

                                        CABARET  VOL….TAIRE

 

O show tinha terminado, estava ali sem sono, fechando o caixa da noite, ainda lhe restava um pouco de maquilagem na cara.

Sentiu a presença de outra pessoa, quando levantou a cabeça, sorriu, quem te viu, quem te vê, falou com o homem que estava ali, em pé, com uma gabardina aberta, mostrando seu traje impecável.

Pois é nunca me chamas, sempre sou eu que vem atrás de ti, com boas ou más notícias.

Qual é a desta vez?

Acaba de morrer num hospital em Nimes, um velho conhecido nosso.

Pelo nome do lugar, já sabia quem era, August Castanho, soltou.

Sim o mesmo, finalmente descansou, foi encontrado morto em sua casa, sozinho, isso que sabes o quanto ele odiava estar só.  Necessitava sempre de plateia, para viver.

Em sua cabeça, era como se todas as caixas de sua memoria se destapassem ao momento, abriu a boca, não conseguia fechar.

Era como se estivesse sendo sugado no tempo.  August tinha sido um amigo querido, experimentaram fazer sexo, mas ele viu que o outro precisava na verdade de um pai, isso ele não era para ninguém.   Nesta época tinha já seus trinta anos, um homem de sucesso em seu trabalho, mas insatisfeito com tudo, justamente quando deu a volta a torta como ele chamava.

Agradeceu por vir dar pessoalmente a notícia.

Isso não se pode falar por telefone, aliás o teu celular, sempre está desligado.

É verdade Paul, já nos resta poucos amigos, para conversar, quando os escutamos, na verdade são só reclamações, comigo acham que estou louco por ter a essa idade um show de Drags, em vez de estar em casa, me lamuriando.

Me nego redondamente a isso, tenho uma proposta de compra do prédio, mas de qualquer maneira não penso em vender, pois afinal a propriedade é minha, minha casa está aí em cima, vou para aonde, fazer o que?

Paul rindo disse, para uma residência de pessoas de idade, para fazer crochê, ensinar o pessoal a dançar tango, rumbas, em que eres um mestre.

Ficaram rindo, sente, te sirvo um Cointreau, assim falamos um pouco do pobre August.

Paul se sentou, antes tirou sua gabardine.

Tu como sempre como um dândi, segues te vestindo como se fosse trabalhar?

Sim essa é uma verdade, foram tantos anos usando esse tipo de roupa, que é como minha mortalha, August dizia que era meu disfarce de homem sério, mas que quando ficava nu, se via realmente quem eu era.

Sim, ele sempre nos falava dessa maneira, um dia soltou na minha cara, que o meu seria ser dono de um cabaret, que usasse uma roupa decotada, vermelha com bolas brancas, um colar de bolas imensas vermelhas, além de um salto agulha.

Até hoje faço um número assim, talvez amanhã repita, em homenagem a ele.

Serviu ao dois em pequenos copos, uma dose do licor, que no mesmo momento fez entrar calor nos ossos como diziam.

Quanto a ele, sinto sempre, que nunca foi feliz, trazia uma bagagem com ele, de ser uma pessoa que não era o que queria ser. Queria de qualquer maneira subir na vida, gostava de homens que inspirassem poder, para se sentir no alto.   Uma vez discuti com ele, se realmente tinha amado alguém, me devolveu a mesma pergunta.

Eu pelo menos fui honesto, nunca tinha amado ninguém, nem mesmo nos meus relacionamentos mais largos.

O duro dessa época, era que todos estavam dentro do armário, eu não, sempre fui eu mesmo, não era afetado ou coisa assim, mas tinha lutado todo o tempo com minha família, para ser eu mesmo, respeitado pelo que era.

Nessa época estava no mais alto de uma hierarquia, que tinha subido com dificuldade, mas tinha chegado lá em cima, foi quando mandei tudo a merda.

Herdei esse edifício dos meus pais, meus irmãos, ficaram com os de luxo, menosprezavam que só me tocasse esse lugar, eu ao contrário, adorei.

É como tu, ficaste até o final nesse emprego no Quai D’Orsay, sendo sempre de confiança dos primeiros-ministros, entrava um, saia, seguiste ao pé do canhão.

É verdade Louis, nunca me meti na parte política, assim quando pediam minha opinião, tinha a verdadeira.  Agora mesmo o novo primeiro-ministro, me chamou para voltar, o mandei tomar no cu, minha aposentadoria, nem se esfriou ainda, já me querem no matadouro.

Como vai ser o enterro do August?

Falei com seus amigos de lá, vão fazer uma coleta para pagar o enterro, neste momento devem estar esperando a autopsia, para saber a que se deve essa morte.

A dele foi uma morte lenta, desde o momento que descobriu que tinha Aids, foi duro, ele amava a vida, queria estar sempre apaixonado.  Aliás, cada vez que vinha a minha casa, era para me contar de alguma nova paixão.  As vezes eu lhe dizia que tomasse cuidado, mas ele nunca escutava.  Se metia sempre em confusões, da mesma maneira que se apaixonava, no instante seguinte, conhecia outra pessoa, esquecia o problema anterior.

Acabou pegando Aids justamente de uma pessoa que lhe avisei que tomasse cuidado, um sujeito inclusive casado, com filhos, acabou se suicidando, quando soube que estava doente.

August ficou para trás.   O escutei dias e dias, reclamando como ia fazer.

Mas o pressionei, para saber se não estava com mais alguém, pois ele fazia isso, as vezes estava com mais de uma pessoa ao mesmo tempo.  Quando comunicou a estas, apareceu aqui em casa, com um olho negro.

Ficou meses aqui.   As vezes de madrugada, vinha para minha cama, queria ser abraçado, ter afeto.

Eu quando lhe dizia que ele sempre tinha feito confusão, entre afeto e sexo, ria na minha cara, mas depois sério me perguntava como tinha conseguido isso.

Lhe expliquei que como ele, levando pauladas na cabeça.   Quando era jovem, achava que estava amando, quando não passava de sexo de dois ou três dias.

Tu sabes que levei anos com Maurice, que em paz descanse.  Claro ele era também casado, mas nunca, desde o primeiro momento me escondeu isso.  Aparecia quando podia escapar das reuniões sociais que era obrigado pela família a participar.   Mas nos momentos que estávamos juntos, era meu companheiro ideal.  Me dizia que eu era livre para fazer sexo com quem quisesse, mas eu me negava.   Pois a Maldita já estava em campo.

Me ajudou a assumir este lugar, me orientou como devia gerir tudo o que tinha.  Nesse ponto foi espetacular comigo.  Até se atreveu a vir um dia com sua mulher, seus amigos, como se fosse um lugar novo para ver um show fantástico.

Creio que foi quando sua mulher desconfiou de tudo, se aposentou, veio viver comigo, só saiu daqui, porque os filhos quando os avisei vieram buscar seu corpo, me pedir para não ir ao enterro. 

Eu não me importei, embora muita gente tenha me criticado, ele já não estava, essa era a verdade, fui feliz com ele, se eu o amei, nunca saberei, mas que ele a mim sim, tenho certeza, para fazer o que fez, era necessário muito amor.  Não sei se teria a coragem que ele teve, enfrentar aos seus para vir viver aqui, em cima de um cabaret com outro homem.

Nunca mais quis ninguém, por isso agora tenho duvidas se sigo com isso, ou vou curtir a vida no sul, como ele gostava.

August o respeitava horrores, tinham conversas homéricas, na verdade dos poucos amigos que sabiam da época que ele ainda estava casado, ele era um.

Me dizia, que se não fosse meu amigo, me roubaria o Maurice.

Este ria com está história, nas épocas que esteve muito mal, nos revezávamos em cuidar dele, eu ia durante o dia ao hospital, Maurice, passava algumas noites lá.

Foi um período difícil, perdemos muitos amigos essa era a verdade, havia finais de semana, que quando olhava a plateia, só via caras novas, me perguntava aonde estão os velhos clientes, que riam das minha piadas.

Dos novos alguns me criticavam, por me vestir de mulher, usar essa barba imensa, não usar perucas, mas sim meu cabelo naturalmente brancos, como hoje, só apresento os números nada mais.   Nada é igual, querem uma coisa mastigada, se faço uma piada política, não riem, talvez porque não saibam do que escaparam.

Acho que a maioria segue sem tomar cuidados como os que passamos a tomar.

August ria, dizia que eu não arriscava, com toda a liberdade que me dava o Maurice.

Como tu, tinhas a mesma liberdade, mas tomavas cuidado, nunca fomos desses de saunas, de trios, ou coisa parecida, drogas tudo o mais.

Ele dizia as vezes que erámos da velha guarda, mas a maioria dos jovens daquele tempo, se foram para o outro lado.

Os que se politizaram, fundaram ONGs, para defender seus direitos a medicina, ajudei a todos que me pediram ajuda, inclusive de usar o local para assembleias, hoje me olham de esquerda, porque nunca me politizei.   Não me interessava.

De uma certa maneira amigo Paul, essa notícia, me abriu minha cabeça, como uma caixa de pandora.

Em breves minutos, consegui ver todos os namorados que August me apresentou, uns dizia que fazia isso para sentir ciúmes, lhe respondia, que ele era meu amigo.

Mas ele sim tinha ciúmes, inclusive de ti, pois nessa época os dois saímos muito por aí, para dançar, relaxar do stress de trabalhar para o governo.

Se estávamos em alguma discoteca, alguém se aproximava de mim, ele se colocava ao meu lado, como dizendo é meu.

Eu deixava porque assim me poupava o trabalho de dizer não a alguma pessoa.

Depois quando já estava com Maurice, ele dizia, ele pode sair comigo, nunca deixarei que alguém se aproxime dele, podem querer te roubar esse homem imenso.

Contigo, conosco, ele virou realmente o amigo, pois fomos os únicos que o socorremos nos momentos difíceis.  Sua família que nem sei como ele fazia, ajudava, colocou sua irmã para frente, isso que era mais velha do que ele, a obrigou a fazer universidade.

Nada apareceu quando ele precisava.

Mas claro não suportou o rechaço que aconteceu depois, perdeu sua beleza, era um homem triste, se via que tinha a maldita, então ninguém queria nada com ele.   Isso para um homem que conseguia o que queria, foi como se sentir derrotado.

Eu lhe dizia que finalmente via a realidade, que tudo era efêmero, nunca nada é para sempre.

Quando estourou o escândalo do Maurice, imagine um alto funcionário da república, abandonar sua família para viver com um louco, que se vestia de mulher, para trabalhar num cabaret.

Ele ficou ao lado do Maurice, foi o filho que o entendeu, porque os seus realmente ficaram horrorizados. 

August o entendia por que tinha sentido na própria pele, o de sua família, se tornou o filho querido do Maurice.  Quando ele morreu, queria ir ao enterro, eu não, me obrigou a ir com ele, ninguém sabe disso, nem tu.  Fomos os dois, bem-vestidos, quando uma pessoa perguntou quem ele era, respondeu, sou o filho maldito do Maurice, por quê?

Eu tive que rir, pois imaginei o Maurice inchando o peito como um pombo, de orgulho.

Mas para todos os efeitos não fui.  Primeiro me imaginei indo vestido de mulher, com essa barba que tenho, ia ser um escândalo.

Depois que Maurice veio com os amigos, sua mulher, está lhe perguntou qual a graça de um homem vestido de mulher, com aquela barba imensa.  Que não entendia meu texto, que lhe parecia mais uma besteira, se queria falar mal do governo que fosse ser político.

Maurice a principio não lhe fazia graça me ver vestido assim, me dizia que gostava de me ver nu.  Dizia que a primeira vez que me viu, foi numa festa na casa de algum amigo, que eu estava na piscina conversando contigo, ficou deslumbrado, pois nos víamos sempre em reuniões de trabalho, queria tirar o resto de roupa que eu tinha, para ver como era o resto.

Ele tinha um corpo para sua idade impressionante, quando nos vimos a primeira vez fora do trabalho, foi ótimo, nos encontramos numa reunião, começamos a conversar, ele sabia da morte de meus pais, o convidei para tomar alguma coisa, conversar fora dali, pois gostava disso dele, poder falar sobre qualquer coisa.

Quando estávamos num bar, os dois ao fundo, virou-se para mim, colocou a mão no meu joelho, soltou tudo de repente, depois dizia que o tinha feito assim, por medo que eu saísse correndo.

Mas fiquei, olhando para ele, com aqueles olhos negros que tinha, pensando, deve ser brincadeira desse sujeito.   Eu o achava sempre muito interessante, gostava de o ver falar, explicar alguma situação.

Era verão, a família dele estava na praia, me perguntou que tal minha casa nova.

Estou terminando a reforma, era a velha casa da família, ainda no lugar do Cabaret, tinha a loja de meu pai, que estava alugada, veio comigo, passamos o final de semana inteiro na cama.

Telefonou para sua mulher dizendo que tinham surgido problemas.

Eu aceitei imediatamente que o teria por momentos, ou algumas horas, ou quando ele inventava uma viagem, que nunca poderíamos sair juntos para um cinema.   Mas o tempo que podíamos aproveitar era o máximo.

August, dizia que eu o devia roubar da família.  Como ele tinha feito com alguns casados do rol de relacionamento que tinha, mas o sem vergonha, quando o sujeito dava esse passo, perdia o interesse.

Quero que não seja meu, para poder conquista-lo.   Porque ele o que gostava era isso a conquista, depois perdia o interesse.

Te lembras daquele arquiteto, o sujeito tinha um relacionamento de anos, ele foi se intrometendo entre os dois, fizeram sexo a três, quando o arquiteto abandonou o namorado por ele, perdeu o interesse.   Ficou furioso, queria dar uma surra nele, claro se escondeu lá em casa.

Se matava de rir, eu lhe dizia que isso não se fazia.   Mas no fundo ele era como o Maurice dizia o filho que eu nunca tive, pois tinha idade realmente para ser meu filho.

Avise aos amigos dele lá da cidade aonde vivia, que iremos, que ajudaremos em tudo que for possível, quero que tenha um enterro digno.

Te venho buscar amanhã por volta das dez para irmos.

Me despedi do Paul, sabia que ele era pontual, por isso fui para cama, limpei bem a cara como fazia sempre.

Mas foi uma noite infernal, pois em minha cabeça, me veio tudo, desde o momento que o conheci, todas muitas conversas que tínhamos, das tentativas dele de seguir fazendo sexo comigo quando lhe desse a louca.   As largas noites quando ele não tinha com quem se desabafar das verdades de sua vida.  Talvez tenha sido o único amigo que sabia de tudo, vamos dizer assim, do buraco de aonde tinha saído, até aonde tinha chegado.

Uns pais, amorfos como ele dizia, sem ambição nenhuma na vida, que por eles, ele nunca teria ido à universidade, teria ficado trabalhando ali no negócio que tinham.  Que aprender línguas, o que ele tinha uma facilidade imensa, lhes parecia uma besteira, como dizendo para que.

Mas isso o fez subir na vida, realizar seus sonhos, conhecer países, tudo bem sempre se metia em confusão, mas fez amizades em todos os lugares.   Era uma pessoa que queria ser querida, as mulheres, o adotavam mal o viam, tinha esse jeito de rapaz desamparado.  O que não deixava de ser verdade.

Acredito que no fundo, como lhe dizia, a maioria das vezes ele não queria sexo, sim carinho, como o que eu lhe dava.

As vezes aparecia no meu antigo apartamento, me dizia na cara, venho dormir aqui, porque sei que vais me abraçar, cuidar de mim.   Não acontecia nada de sexo.

Muita vezes chorou nos meus braços, por não entender, não conseguir analisar o que sentia realmente por uma pessoa.   Pois da mesma maneira que se apaixonava, no dia seguinte já não falava da pessoa.

Quando resolveu voltar para o lugar de aonde tinha saído, perto de Nimes, lhe disse que estaria só, mas conseguiu fazer amigos, os tempos tinham mudado.   Ele tinha perdido toda a beleza que tinha.   Seu rosto estava marcado pela doença, a eterna barriga inchada o delatavam, até isso, o corpo de garoto que tinha, desapareceu.

Rolei na cama a noite inteira, me lembrando dessas conversas.

Acabei me levantando cedo, pois me era impossível dormir. Também tinha tomado uma decisão, ir viver na casa que Maurice me deixou de herança, em Aix en Provence, aonde passamos dias fantásticos.   Chega de tanta papagaiada como August dizia.

Quando desci, com uma pequena maleta, não sabia se íamos conseguir voltar no mesmo dia ou não, em último caso, iriamos depois para Aix.  Avisei o meu gerente que a vida seguia no cabaret, mas tinha surgido um imprevisto.

No carro, Paul me disse que tampouco tinha dormido muito, fiquei pensando a noite inteira, agora somos só nos dois desse grupo de amigos, era uma verdade.

Me deu uma noticia que caiu como um mal trago, mas engoli em seco para digerir, que ele na verdade tinha se suicidado, tinha tido uma recaída, estava como corpo cheio de feridas, que seu rosto estava destroçado.  Os seus amigos queriam saber se o caixão devia ser fechado.

Lhes disse que sim, para que ficar olhando os destroços de alguém, que colocássemos uma fotografia dele bonito quando era jovem.   Um deles, que foi seu namorado na sua juventude, disse que tinha uma.  Isso bastava.

Chegamos, era um enterro diferente, só havia homens, a uma presença feminina era sua irmã que tinha vindo de Marseille, sozinha.  Não trouxe os filhos, nem o marido.

Fiquei conversando um tempo com ela, me contou que ele estava na miséria, melhor era não ver como vivia na velha casa de nossos pais.

Seu dinheiro mal dava para pagar as medicinas que tinha que tomar.

Mas disse que sempre chegava o dinheiro que mandavas para ele.  Com isso ele se apanhava, porque o que recebia dava para as medicinas.  O resto, vinha de ti.

Quase soltei, que da parte dela, que ele tinha pagado a universidade, nada.  Mas para que levantar brigas nesse momento.

Maurice não gostava dela, dizia sempre ao August, a ajudas tanto, mas ela nunca estará por ti, pois tem vergonha que sejas gay.

Quando se casou com um companheiro, professor na universidade, não o convidou, ele tinha acabado de sair do hospital, estava lá em casa.  Ficou primeiro ofendido, depois machucado, pelo que tinha feito por ela.

Quando voltou para Nimes, creio que foi mais para sacanear, ela queria vender a propriedade, não podia pois ele estava lá.

Quase perguntei se era isso que tinha vindo fazer.

Os seus amigos eram uma confusão de homens de todas as idades, todos vinham falar comigo, me conheciam de nome, que ele sempre estava falando do melhor amigo que ele tinha.

Lhes gostaria de dizer, que não fui nem de longe o amigo que ele foi para mim, inclusive o filho que não tive.

Pois quem me aguentou quando Maurice morreu foi só ele.  Paul estava fora do pais, em uma missão diplomática.

Ele me aguentou semanas, sem animo de me levantar da cama, me ajudou em tudo que foi necessário.  Quando fui chamado para a leitura de testamento, achei que era uma loucura, pois achava que a família estava lá.

Por sorte, erámos só os dois.  Sua família, ele já tinha dado sua parte, quando se divorciou, me deixava a casa de Aix, além de dinheiro, para o August, dinheiro para seu tratamento.

Ele chorava como uma criança, aí tive que me fazer de forte. 

Realmente o filho da puta do governo não ajudava, o preço das medicinas era terrivelmente caro.    Muitos morriam por não poder pagar o tratamento.

Um dos amigos dele, era o padre da igreja, seu confessor, contou durante a cerimônia, que ele não se confessava, pois dizia que fosse tirar a lista de pecados que tinha feito na vida, seria uma verdadeira confusão lá em cima.

Que o convidava para tomar um café, acabava eu contando meus problemas, de fé, de segurança, me incentivou a seguir em frente.

Foi uma missa muito bonita, depois veio falar comigo, me entregou uma carta, enfiei no bolso, pois sabia se lesse alguma coisa agora que estava muito emocionado, era capaz de ter um enfarte.

No carro em direção a Aix, contei ao Paul o que ia fazer, vender tudo em Paris, vir viver ali, arrumaria alguma coisa que fazer, já que não podia ficar quieto.

Caralho, vou ter que vir contigo, ontem a única boa noticia que tinha era para te dizer que me aposentei.  Não tenho por que ficar em Paris.  Com seu natural sorriso sardônico, perguntou se aceitava hospedes.   Ele tinha sido meu hospede em Aix mil vezes.

Claro que sim amigo, afinal estamos sozinho no mundo, ri lhe dizendo, pois sabia que ele gostava de jovens, depois tem a universidade da cidade, cheia de jovens querendo explorar e corromper uns senhores velhos.   Foi a primeira risada do dia.

Esqueci completamente a carta, passamos dois dias na casa, fui falando dos planos que teria para ela.   Ele escolheu viver na parte de cima, como se fosse um apartamento a parte, compartiríamos cozinha.

Voltei para Paris, fechei o cabaret, tinha dinheiro para indenizar o pessoal que trabalhava comigo, tinha aprendido com Maurice administrar bem o que ganhava ali.

Falei com a construtora que queria o local, que falassem com meu advogado, ele negociaria o preço, lhe disse quanto queria, mas que não moveria nem um pé desse valor.

Ele foi esperto, pediu muito mais alto, assim acabei no lucro.  Tinha uma boa aposentadoria dos meus anos no governo, depois de muita luta para conseguir.

Paul no último instante, decidiu ir fazer uma viagem volta ao mundo, um cruzeiro como ele gostava, eu ao contrário odiava, ficava imaginando fechado num barco, que tinha limites, nem pensar.

Chamei uma ONG, dei tudo que não queria da casa, as roupas de show, para as meninas como eu chamava aquele bando de marmanjos, ficou como resto.   Levei alguns livros, roupas que gostava, minha foto de cabeceira, do Maurice me sorrindo, uma do August, o resto queimei no banheiro da casa.

Quando cheguei a Aix, levei uns dias para me acostumar, que agora viveria sempre ali.  Comecei a fazer largos passeios pela cidade, explorando como dizia o Maurice.

Num dos meus largos passeios, reencontrei um lugar que íamos sempre fazer compras juntos.

O dono fez uma festa imensa, a quanto anos não o vejo por aqui?

Sim desde que Maurice morreu, perdeu a graça, agora vim para ficar.

Ficou me olhando sério, me soltou em plena cara.  Eu tinha inveja dos dois, somos da mesma idade, quando os via juntos, pensava quero um relacionamento assim para mim.

Não sabia que Maurice tinha morrido.

Me deu seu telefone, quando quiser alguma coisa, é só pedir, terei o maior prazer em entregar.

Fiz uma das minhas brincadeiras preferidas, que tudo com prazer custava mais caro.

Riu, para ti eu faço tudo grátis.

Quando pedi pela primeira vez num dia de chuva no final da tarde, me disse que levava na hora que fechasse se tinha problema.

Chegou meio molhado, lhe ofereci um café, esse homem entrou na casa como um sol, foi ficando, estamos juntos até hoje, nos dias complicados, vou lhe ajudar na sua loja.

As vezes imagino o que diria o August, soltaria, eres um sem-vergonha, esse tipo é meu ideal, mas avançaste antes.

Tínhamos os dois por volta dos 65 anos, nem por isso menos vigor. Maurice tinha vinte mais do que eu, estaria agora com 80 e qualquer coisa, ou noventa, que importa isso.

Jean-Marie, ri quando falo nisso.   Me diz que mantem o local, para se ocupar, que andou muito pelo mundo, procurando uma pessoa especial, que sempre tinha se interessado por mim, mas estava o Maurice.

Agora é o momento que me abraça, diz, agora eres meu.   Talvez pela primeira vez, pode ser por causa da madures posso dizer que amo alguém.  É uma relação completa, sexo, carinho, companheirismo, tudo que alguém podia dizer perfeito.

Mas não comemos perdizes, porque algumas vezes discordamos completamente das coisas.

Paul, ah esse, conheceu no puto cruzeiro, um milionário português, vive agora numa bela mansão em Sintra.   As vezes os dois aparecem.

Paul a primeira vez que viu Jean-Marie, me disse que era um homem bruto, ri dizendo para ele, te enganas, é o carinho personificado, gosto dessas mãos duras percorrendo meu corpo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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