lunes, 27 de marzo de 2023

FATHER/ SAD SMILE

 

                                                     FATHER

 

 

Seu nome era Trevor Fustemberg, embora sempre tivesse pensado que isso era um nome que seu pai tinha inventado ao entrar nos Estados Unidos, pois lhe dava importância, anos depois descobriu que era seu nome verdadeiro, de um judeu, que nunca ia a nenhuma sinagoga, pois se sentia frustrado com a religião.  Embora seguisse todos os preceitos da mesma.

Um dia contou a ele, bem com a Helene sua irmã pequena, que seu pai era muito rico na França, mas tinha muitos filhos, com a chegada de Hitler ao poder, mandou os filhos para os quatro cantos do mundo, colocou à disposição de cada um, dinheiro para começarem a vida.  Mas ficou em Paris, com sua mulher, pois essa se negava a sair dali, estavam velhos, porque iam atrapalhar a vida dos filhos.  Claro morreram num campo de concentração nada mais ao chegar.

Seu pai o obrigou a casar-se num desses casamentos arrumados, sua mulher também era de família rica, recebeu um bom dote pelo casamento, ou seja começariam a vida em NYC, sem problemas.

Um irmão foi para a Argentina, outro para Australia, outro para Africa do Sul, mas com os anos perderam contato entre si.

Ele mesmo tinha tido seis filhos, mas seus preferidos eram Trevor e Helene, esta nasceu ao mesmo tempo que morria sua mulher, um problema derivado de uma gestação complicada, pois ela já não queria ter filhos.

Viviam num apartamento imenso, com uma governanta, bem como empregados suficientes para cuidarem deles.

Os dois cresceram a parte dos irmãos, Helene era a filha que nasceu muito mais tarde, com uma diferença dele de quase oito anos, era como seu brinquedo.  A adorava, os dois estudaram em casa com professores particulares, aprenderam a falar outras línguas antes de mais nada.

Os outros filhos, seu pai tinha suportado, nenhum era brilhante como eles, maus estudantes, o primeiro ia a universidade porque seu pai pagava.

Todos iam se casando com casamentos combinados, com outras famílias ricas, o que se casava recebia do pai um apartamento bom, de certo luxo.  Um dinheiro para começar alguma coisa, mas claro era mais fácil viver na sombra dele.

Já Trevor que tinha o mesmo nome do velho, era ao contrário, era um excelente aluno, gostava de estudar, mas ao contrário dos outros, quando descobriu que era judeu, passou a ir a sinagoga escondido, as vezes levava Helene com ele.

O pai quando descobriu não disse nada.

Trevor sempre tinha gostado da música, usava os cabelos compridos, como todos os jovens de sua geração, gostava do rock, de dançar, de fumar seus porros, ia aos concertos de rock, escondido de seu pai.

Quando esse lhe avisou que tinha que parar com isso, pois teria que ir à universidade, ao mesmo tempo se casar, lhe falou que tinha combinado seu casamento com uma rica herdeira judia.   Ele quando viu uma foto dela, a detestou ao momento, já a conhecia.  Era uma idiota segundo ele, filhinha de papai, que fazia todas suas vontades.

O pai insistia, pois era um grande negócio.  Ele fez uma coisa que ninguém imaginou, foi de visita a casa de cada irmão, para ver como viviam se eram felizes.  Sentiu como se abrisse uma geladeira, era pessoas frias, fúteis.    Pensou não quero nada disso para mim.

O velho insistia, dizia que ele tinha que se preparar para um dia assumir seu lugar, lidar com os irmãos mais velhos.

Não havia muita escapatória, já estavam quase no final da guerra do Vietnam, não teve conversa, foi a um concerto de um pré grupo que depois fariam sucesso nos anos 70, Aerosmith, no dia que se inscreveu usou esse nome, Trevor Aerosmith, em seguida sem muita preparação, embarcou, nunca deu noticia a família, era como se tivesse desaparecido da face da terra.

Voltou com a última leva de soldados, feridos, tinha perdido basicamente seu batalhão inteiro, numa guerra que já estava na final, tinha defendido já os ataques a Saigon, voltou com um ferimento na cabeça, além de um braço meio inútil.

Quando apareceu na casa de seus pais, foi um verdadeiro horror o encontro com a família, no primeiro almoço saiu da mesa, tudo o confundia.

Dois dias depois desapareceu. Ninguém sabia aonde estava.

Foi viver num acampamento de homeless que ainda não tinha esse nome, embaixo de um viaduto, conheceu uma garota que vivia ali, com seus pais, se enamorou dela, foram viver de okupas numa velha fabrica.  Quando ela ficou gravida, ele ainda pensou voltar com a família, mas sabia que seu pai jamais aceitaria isso, uma garota que basicamente tinha crescido pelas ruas, uma família que vivia nas drogas.

Seus pesadelos tinham fase, quando estava bom, trabalhava, trazia alguma coisa de dinheiro para viverem.  Deu o nome do filho de Trevor Aerosmith, que era grupo que agora fazia sucesso.  Seus pesadelos foram piorando, pois nunca tinha tratado do mesmo, com o menino nas costas, iam mudando de lugar em lugar, breve estavam nas drogas, pois era a única coisa que o fazia suportar os pesadelos.  Viviam numa barraca dentro de uma velha fabrica.

O menino crescia parecido com ele, mais moreno como sua mãe, mas o olhava, pensava, é uma cópia de mim.   Sempre dizia ao mesmo tens que ser tu mesmo sempre, defenda teus valores, o garoto o olhava como se não entendesse.   Ele achava que o menino aceitasse a vida que tinham, passaram uma larga temporada num acampamento no meio do nada, só com ex-combatentes, quando chegou o verão voltaram para NYC, pois o governador mandou destruir o acampamento.   Sempre existiria o medo dos radicais.

Sua companheira nunca entenderia, porque passava horas contando ao seu filho, tudo o que tinha sentido, lutado, para sobreviver.

As vezes repetia uma mil vezes essa palavra sobreviver. Ele tinha uns 10 anos quando drogado falou com o filho sobre essa palavra, sobreviver, os sentidos que tinha para ele, mas sabia que ia gravar isso na cabeça do seu filho, criando nele um instinto para sempre.

Sua companheira era como uma criança, apesar de viver na rua não estava preparada para isso, ele não entendia se sempre tinha vivido na rua, como buscava outra coisa.

Ali pelo menos ele se sentia livre, ficava imaginando se descobrissem que ele era na verdade o que aconteceria.

Um dia chegava a uma praça, viu de longe Helene com uma foto, mostrando para as pessoas, entendeu que ela o procurava, talvez fosse a necessidade que tinha de ir em frente, se escondeu, a escutou falando com as pessoas.  Tinha amadurecido rápido demais, mas ainda era a garota de quem ele sem lembrava nas horas baixas, gostaria de lhe dizer, livre-se do velho, faça algo, mas não podia.

Mal desconfiava que era ela que sustentava tudo, tinha estudado para levar os negócios, mas se negava a se casar como queria o velho, quando ele insistiu muito soltou na cara dele, que não podia porque era lesbiana.  Soletrou essa palavra na cara dele.

Ele achava que se casando resolveria isso, quando lhe apresentou um pretendente, um homem imensamente rico, se enfrentou ao pai, dizendo ao homem que agradecia o interesse, mas lhe perguntou se queria casar com uma mulher que gostava só de sexo com outra mulher.

Diante do escândalo, da fama que conseguiu com isso, seguiu solteira.

Nunca cessou de procurar o irmão, o único que tinha certeza de que a entenderia.

Como os outros irmãos, o pai lhe deu um apartamento, mas ela ao contrário dos outros, escolheu um mais longe possível daquele lugar, se perguntou mentalmente aonde poderia estar seu irmão, se resolvesse se esconder. Foi morar no Brooklyn.

Um dia a viu falando com sua companheira, acariciando a cabeça do seu filho.  Talvez por sorte não mostrou a sua fotografia para ela.

Em vista disso, foram morar em outro lugar, para os lados do Bronx, no meio de drogados, de pessoas complicadas.  Seus companheiros militares, que tinham caído no mais baixo da degradação humana.   Mas talvez por amar o filho, o levava para tomar banho no verão, nas fontes das praças, lavava seus cabelos compridos, com carinho, não queria que ele tivesse piolhos, como as outras crianças, roubava nas lojas, sabonete, para que tivesse um banho agradável, o acostumou, ensinou a se defender.   Não podia imaginar que seus ensinamentos o fariam ir em frente.

Agora tinha um problema derivado de sua ferida, os ruídos lhe pareciam mais fortes, uma brecada, ou um estouro, lhe faziam retornar a guerra.

Colocava seu filho para dormir o mais longe dele, pois tinha a visão muitas vezes de uma luta que tinha tido com um vietcong, que acabou matando, mas descobriu que no fundo era um garoto, isso o destroçou por dentro, pensava ele devia ter me matado, não ao contrário, não podia se perdoar por isso.  Quando tinha esse pesadelo, tinha medo de matar seu filho.

Cada vez estava mais tempo em silêncio, sua companheira estranhava, só quando estava perto do filho falava, era como se estivesse dando diretrizes para sobreviver.

As vezes drogado, repetia outra mil vezes tudo relativo a essa palavra, seus significados, seu filho lhe prestava atenção.  Se fosse outra criança, se afastaria, mas ele não ficava ali sentando segurando a mão do pai como se temesse perde-lo.

No dia que desapareceram, o deixou como sempre no acampamento tendo aula com o professor.    Estava se sentindo muito mal, foram atrás de dinheiro, drogas, o ruido da cidade o atordoavam atrás da orelha tinha um tumor, não sabia, isso diriam posteriormente os que fizeram sua autopsia, um tumor imenso no crâneo que lhe devia provocar muitos problemas.

Ninguém tinha entendido como se tinha metido no meio do tiroteio entre a polícia com os traficantes de drogas, sua companheira foi quem primeiro levou um tiro na cabeça, se sentiu outra vez em plena batalha, viu um traficante jogado no chão com uma metralhadora, se apossou dela, saiu atirando para ambos os lados, até que caiu varado por balas.

Foi enterrado como Trevor Aerosmith, porque levava presa no pescoço uma placa do exército com esse nome, número, mas não se encontrou nenhuma família com esse sobrenome. Tampouco na ficha militar constava, quando a preencheu, não colocou parentesco nenhum, como se tivesse saído de um orfanato.

Mal sabia que seu filho, seguiria seus mandamentos, sobreviver de todas as maneiras, que teria um caminho largo pela frente.

 

                                           SAD SMILE

 

Seu nome era inventado, ou melhor roubado, vivia desde criança indo de uma acampamento a outro de homeless, as vezes conseguiam ocupar algum edifício abandonado.

Tinha aprendido a ler, escrever o básico, com um professor que vivia por ali, se ocupava das crianças enquanto os pais iam conseguir algo de comer, que compartiam com ele.  Tinha tuberculose, mas não queria tratar, as vezes quando alguém argumentava com ele, dizia, que adiantava, se não tinha sonhos, nem futuro.

Mas o interessante que insuflava nas crianças a ideia de sonhos a serem realizados.

Um dia seus pais não voltaram, ficou vivendo no mesmo edifício abandonado, agora ele ia pelas ruas pedindo dinheiro, ou mesmo como lhe dava vergonha, recolhia comida jogada em algum restaurante, tinha já uns 12 anos, apesar de tudo era alto, magro, aparentava mais.

Viu um cartaz procurando um ajudante de cozinha, perguntou ao homem que estava ali fumando se ele podia se candidatar.

Procurava andar o mais limpo possível, ali tinha uma garagem, o levou até ali, com uma máquina raspou sua cabeça, embora ele explicasse que lavava a mesma, mesmo que fosse num parque.  O mandou tomar banho, lhe deu uma toalha pequena, uma muda de roupa branca, lhe explicou como amarrar um lenço na cabeça, assim começou a trabalhar para ele, era um restaurante de comida para levar, havia que estar cedo, preparar sanduiches para os que iam trabalhar, depois ajudava a fazer o café, tudo era colocado num saco para a pessoa, o chefe ficava no caixa enquanto isso.  Foi aprendendo em breve manejava muitas coisas sozinho.

Tempos depois, consegui alugar um pequeno apartamento, velho, caindo aos pedaços, mas era jovem para subir os cinco andares sem elevador.

Aprendeu uma coisa, dizer sempre bom dia, para todo mundo, mesmo que seu sorriso fosse triste, sorrir, desejar aos outros o que ele não tinha, no fundo não tinha importância, sabia que dependia dele sobreviver.

Agora afastado dos homeless, ficava com pena do pessoal que tinha desistido de lutar, mas pensava, quem sou eu para julgar, cada um escolhe o seu caminho, não sei de aonde saiu a maioria, que sonhos tinham.

Ele queria sim ter um teto seguro para viver, aonde vivia tinha o mínimo, como comia, no restaurante, trazia para casa o que sobrava, para aquele dia, pois não tinha geladeira, se deu ao luxo de comprar um edredom barato, trouxe do acampamento, um saco de dormir, que lavou, desinfetou, era nele que dormia no chão, mas tinha uma coisa, limpava o lugar muito bem, não era porque era pobre que ia viver sujo.

O patrão tinha o mesmo tamanho que ele, lhe deu uma porção de roupas que não usava mais, ele não se incomodava, estavam sempre limpa, lavava tudo na pia do pequeno banheiro, deixava secando no verão com a janela aberta, no Inverno era um problema mas se apanhava.

Não era registrado, ganhava por fora, guardava cada gorjeta que lhe davam, o dinheiro que o homem lhe pagava, escondia, num velho armário do banheiro, por detrás, num saco plástico, gastava o mínimo possível.   Quando acreditou que fazia 17 anos, procurou ajuda de uma ONG para tirar seus documentos, a muito custo, conseguiu que colocasse que tinha 18 anos.   O patrão era malandro, achava que o tinha ajudado, mas ele de tonto não tinha nem um pelo, procurou nas horas vagas algum lugar, quando conseguiu, com um salário melhor, ser registrado, foi franco com o homem, agradeceu muito a ajuda dele, não ia fechar a porta nunca se sabia do futuro.  O homem se surpreendeu, pois soltou que normalmente as pessoas nem apareciam para acertar o resto do salário.   Por isso lhe pagou o mês completo.

Agora aprendia cozinhar outro tipo de comida, era honesto no que fazia.   Aprendia corretamente, nesse trabalhou durante quase dois anos, seguiu assim, quando saiu, procurou outro diferente.

Quando avisaram que tinham que sair do edifício, pois ia ser demolido, recolheu suas poucas coisas, enfiou num saco, escondeu bem o dinheiro, arrumou outro lugar similar, um pouco melhor, pois tinha agua quente, para o inverno, além de calafetação, o caseiro lhe arrumou alguns moveis, que algum antigo morador tinha deixado, uma velha poltrona, um estrado para colocar um colchão, pelo menos tinha um elevador velho, mas que funcionava.

No verão subia para dormir na varanda que tinha em cima. Gostava de dormir olhando as estrelas pensando no que poderia fazer com seu futuro.

Seguia guardando todo o dinheiro que podia.

Escutou um dia, um dos cozinheiros falando de um curso de cozinha francesa, reclamava que era caro o curso, mas foi se informar.  Lhe atenderam bem, explicou sua situação, sobrava uma vaga, como se fosse uma bolsa de estudos.

O francês se interessou por ele, tinha um restaurante em Toronto, viu que ele se esforçava para aprender.  Um dia se insinuou para ele, demorou para entender, não tinha traquejo sexual, nem vivência no assunto, estava sempre preocupado em sobreviver, para pensar nisso.

Foi honesto com o homem, me desculpa, devo estar entendendo mal, sou honesto, não tenho nenhuma prática sexual, em nenhum âmbito, estou mais preocupado em sobreviver.

O professor ficou de boca aberta, pois viu que ele estava sendo honesto.

Perguntou se ele tinha algum dia livre, vou cozinhar no restaurante de um amigo, vejo que me entendes, se eles te veem trabalhar, pode ser que te contratem.

Pediu um dia de licença aonde trabalhava, foi com o professor.  Ele tinha razão o chefe, disse que era raro um americano se esforçar tanto.  O contratou, ganhava mais, mas nem por isso mudou de casa, seguia economizando.  Como ele dizia, não queria que o mundo o pegasse de calças curtas.

Fez tudo para seguir em frente, mesmo nesse lugar.   Agora já comprava roupas simples para ele, mas descobria aonde comprar mais barato, nada de roupas de marcas como via os outros fazendo.   Para ele o mais importante era andar limpo, por sorte a roupa que usava na cozinha, era lavada no próprio restaurante, por isso estava sempre limpo, ao começar o dia trabalhando.

Aprendeu nova maneiras de cozinhar, agora mais refinada, era intuitivo.

Um dia lhe perguntaram se cozinhava em casa, riu, disse que tudo que tinha na cozinha era uma cafeteira para o café, duas taças, um prato, que nunca cozinhava em casa.

Mantinha como desde o primeiro dia seu cabelo rasurado, pois assim não ficava com o cheiro da cozinha. O mesmo fazia com sua roupa, as colocava dentro de um saco de plástico hermético, assim não ficavam com o cheiro da cozinha.   Este lugar tinha um banheiro para tomarem banho depois de sair.

Deste foi convidado, o que para ele era como se sentir subindo na vida, num outro restaurante que só abria de noite, mas tinha que deixar a maior parte da comida elaborada, então trabalhava da tarde até as duas da manhã, quando saia deixando sua parte da cozinha limpa, brilhando, ninguém precisava dizer que o fizesse, entendia que era parte do seu trabalho.

O proprietário o observava.

Finalmente como lhe pagava o salário num banco, colocou todo seu dinheiro lá, mas quando lhe ofereceram um cartão de credito, não se interessou, fazia uma coisa, sabia mais ou menos quanto gastava por mês, isso ele tinha seu esconderijo, para o dia a dia.

Um dia que foi ao banco, um gerente lhe sugeriu que aplicasse seu dinheiro para ir rendendo, tinha já escutado muitas conversas, sobre aplicações, gente que comprava ações, que se podiam perder, aceitou um sistema, que ele nunca perderia o dinheiro que tinha.

Na parte da manhã, fazia todos os cursos possíveis, aprimorava tudo que sabia, no momento fazia um de doces, coisas delicadas francesas.

Quando o que fazia isso no restaurante saiu, ele imediatamente se ofereceu para o lugar, lhe fizeram o teste, de fazer tudo que estava na carta.  O fez, mas perguntou se podia sugerir fazer algumas mudanças, disse que analisaria no mês o que saia mais, o que saísse menos, colocariam receitas novas.

O chefe estava encantado com ele, pois chegava mais cedo, preparava tudo, depois ia fazer seu trabalho normal, não precisou pedir, nem que o próprio chefe da cozinha o fizesse, recebeu um aumento.

Os anos foram passando, ele achava engraçado em notar, que as pessoas o olhavam, mas ele nunca estava interessado nelas, seguia sendo virgem, não tinha pensado nisso ainda, nem se interessado por ninguém.

Na cozinha gozavam dele, mas não era com ele.   Escutava sim os outros falando das decepções, os romances de uma noite, o frustrados que ficavam.  Alguns reclamavam que buscavam um amor, ou alguém com quem pudessem compartir uma vida.

Um dia lhe perguntaram a respeito, num respiro, antes de começarem o serviço noturno.

Não sabia se dizer a verdade ou mentir.  Por sorte foi salvo pelo gongo, pois o chefe lhe chamou para uma reunião, o restaurante no final de semana, teria uma parte fechada para uma festa, queriam saber o que ele poderia sugerir de doces para o final.

Perguntou se era um aniversário, embora ele nunca tivesse tido nenhum, sabia como preparar.

Sim comemoram o aniversário do patriarca de uma família.

Deu uma série de sugestões de pratos, viria uma senhora experimentar tudo.

Achou estranho, que ela o olhasse muito, mas estava atendo em saber se ela gostava ou não.

Preparou tudo como ela pediu, algumas coisas com um dia de antecipação, no dia da festa, preparou o resto logo cedo.   Depois passou a ajudar o chefe da cozinha a preparar o resto, sem reclamar como alguns estava fazendo.

Se escutava claro que eram muitas pessoas.

Quando acabaram o serviço, o patriarca, pediu ao dono do restaurante, que chamassem os cozinheiros, para elogiar o trabalho.

Quando o viu ficou de boca aberta, perguntou seu nome?

Meu pai sempre me chamou de Trevor Aerosmith, mas descobri depois que esse não era seu sobrenome, que nunca soube qual era, mas mantive esse quando tirei os documentos.

Aonde anda seu pai?

Não tenho a menor ideia senhor, os dois um dia desapareceram, nunca mais os vi. Não sei portanto se morreram ou não.

O dono do restaurante não entendia, então fez um sinal de que podiam ir para a cozinha.

Nesse dia todos receberam uma boa gorjeta.  Que como sempre foi parar no banco.

Dias depois estava para entrar cedo para fazer as sobremesas, viu na porta um senhor bem-vestido.  Perguntou se ele era o Trevor Aerosmith?

Sim sou eu, algum problema?

Podemos tomar um café?

Sim, foi com o homem ao café em frente do restaurante.  Este lhe explicou que o senhor que tinha estado no restaurante, ao qual tinha sido oferecido a festa, disse que tu eres igual ao filho que desapareceu, depois de voltar da guerra.  Se podias fazer um teste de ADN.

Eu já disse ao senhor que não tenho ideia aonde estão meus pais, me deixaram num acampamento de Homeless, a partir desse momento, fui sobrevivendo, fui aprendendo a cozinhar, essas coisas.

Mas porque ele quer fazer isso, já procurou seu filho?

Nunca foi encontrado.

O homem insistiu muito, ele tem uma boa idade, gostaria como ele diz, de morrer tranquilo, sabendo ou não que eres seu descendente.

Combinou com o homem, no dia seguinte foi ao médico com ele logo de manhã.

Duas semanas depois apareceu, perguntou se ele tinha livre a manhã do dia seguinte.

Ele lhe explicou, que usava as manhãs para preparar os doces, assim ganhava um dinheiro extra.

Mas no domingo de manhã, como não abrimos, estou livre.

O advogado comentou, que outra pessoa estaria ansiosa.

Ele depois de tirarem seu sangue, seguiu como se nada tivesse acontecido, nunca tinha precisado de uma família, não ia ser agora que sairia procurando, afinal ele nem sabia o sobrenome de seu pai.

Mas no domingo, se arrumou como sempre, nenhuma roupa especial, fez a barba, rasurou a cabeça como sempre fazia, lavou sua roupa interior, depois foi até o restaurante, aonde o advogado lhe esperava.   Não tinha dado a ele o endereço da sua casa, isso era uma coisa que ele não fazia.

Foram para a parte mais fina da cidade, com edifícios residenciais de luxo.

Quando entrou, viu que a família toda estava ali.

Disse bom dia a todos, espero que todos estejam bem.

Foi levado a uma biblioteca, aonde estavam sentados o senhor, além da senhora que tinha conhecido no dia da prova do restaurante.

Ela se apresentou, bem como seu pai, lhe perguntou se o sobrenome lhe dizia alguma coisa?

Isso eu já respondi, não, se tem a ver como meu pai, eu só tinha meu nome anotado num pedaço de papel, pois o homem que nos ensinava a ler, escrever, no acampamento perguntou um dia, riu muito quando ele disse Trevor Aerosmith, só muito tempo depois fui descobrir que era o nome de um grupo musical, que aliás não gosto.

Gostas de música?

Ele ainda pensou por que tanta pergunta.   Mas respondeu nunca tive tempo para parar para ficar escutando nada.   Agarrei a primeira oportunidade que tive, aos doze anos, para aprender a cozinhar, para deixar de comer comida do lixo, me dava muita vergonha pedir dinheiro na rua para comprar comida, então comia do lixo dos restaurante.

A cara dela era impressionante.

Bom, fez um sinal ao seu pai.

Meu filho, o resultado dos teste deu positivo, fizemos em outro laboratório também, deu a mesma coisa.  Ao que parece você é filho do meu filho Trevor, que desapareceu, logo que voltou da guerra.

Ele ficou olhando serio o homem, não sabia o que dizer.

Sinto muito, eu não preciso de uma família a estas alturas da vida, vejo pelo lugar em que vivem que devem ter dinheiro, mas sou honesto de dizer que não me interessa nada de vocês.

Se levantou, disse bom dia, apertou a mão do homem que devia ser seu avô, desculpe decepciona-lo, mas meus pais, um belo dia saíram para comprar drogas, nunca voltaram, eu aprendi a viver, me defender sozinho, posso dizer que sobrevivi.

Virou as costas, saiu, atravessou o salão interior, até a porta de saída, com todo mundo olhando para ele, foi dizendo até logo, passem bem.

Desceu pelo elevador, nem sabia como ir embora dali, foi até uma entrada do metro, viu qual lhe serviria, foi embora.

Pela primeira vez, chegou em casa, se jogou na cama como estava, cruzou as mãos atrás da cabeça como sempre fazia, tinha pegado esse hábito, porque inicialmente não tinha travesseiro, depois por hábito para pensar.

Não tinha com quem falar sobre o assunto.  Mas claro era bom observador, viu a cara da família que o observava ao entrar, com certeza pensavam mais um para compartir a herança do velho.

Tomou uma decisão, tinha o telefone do dono do restaurante, sempre o tinha tratado bem, o chamou, perguntou se podia conversar com ele.

Foi até sua casa, contou o que tinha descoberto, não quero nada dessa gente, meu medo é que comecem a aparecer pelo restaurante, preferia me afastar daqui.

De uma certa maneira, lhe contou como tinha sido sua vida, não quero nada deles.

O que o senhor recomenda?

Eu não gostaria de perder meu melhor empregado, se eu fosse você enfrentaria a família, se começam a incomodar, peça uma ordem de afastamento, isso posso conseguir com o advogado da empresa.   Mas não fuja, não faça como teu pai, pois no momento que faças isso, nunca mais deixaras de fazer.

Agradeceu muito ao homem.

Esse disse que tinha uma curiosidade a respeito dele, nunca te vi perdendo tempo, falando em romances, ou discutindo futebol, ou mesmo parando o trabalho para sair para fumar um cigarro.

Nunca tive romances, o resto incluído, tinha que sobreviver, quando comecei a trabalhar no primeiro restaurante, foi porque o dono me pegou fuçando no lixo atrás de comida, tinha vergonha de pedir dinheiro, era alto, tinha 12 anos, me deu o meu primeiro trabalho, mas sem registro. Quando fiz 17 anos, ou acho que tinha essa idade, nunca soube quantos anos certos que tinha, procurei uma ONG, eles arrumaram minha documentação, foi então quando descobrir que o meu sobrenome era de uma banda de música, deixei igual, embora quando escutei os dito cujos, não gostei.  Nunca procurei pelos que seriam meus pais, pois imaginei já que andavam nas drogas, ou tinham morrido, ou desaparecido.   Eu não queria ir para um orfanato, primeiro vivi num edifício de okupas, depois quando já tinha dinheiro, fui mudando, agora vivo num lugar decente, simples mas decente.   Meu primeiro patrão me ensinou que eu devia andar sempre limpo, pois isso, coloquei na minha cabeça, que o meu espaço de casa, bem como aonde trabalho sempre devem estar limpos.

No dia seguinte quando chegou, o advogado estava lá com a senhora, que pelo que tinha entendido era sua tia.   Disse que se não o deixava em paz, pediria uma ordem de afastamento, não estou interessado no vosso dinheiro, quero somente seguir meu caminho, tinha pensado em fugir da cidade, mas meu chefe me disse que não devia fazer isso.

Não sabia, tampouco imaginei qual seria o nome do meu pai, ou da minha mãe, por isso, sempre manterei o de Aerosmith, não quero vosso sobrenome.  Financeiramente estou bem, não preciso de nada mais do que eu já tenho.

A cara da senhora era espetacular, sem saber ou não se acreditava nele.  Pediu desculpas, mas tinha que trabalhar, espero que disfrute de vir comer aqui, mas jamais me chamem. Por favor.

Entrou para trabalhar, tive que se concentrar, tinha medo de errar alguma receita.

Nunca mais os viu, tempos depois escutou o dono do restaurante falando de um curso em Paris, perguntou em particular a ele se podia fazer, tinha dinheiro guardado.

O homem lhe disse que lhe daria uma resposta no dia seguinte.

Se sentou com ele, perguntou se ele pensava em voltar?

Sim, só quero saber mais, veja as sobremesas, eu desfruto muito fazendo, mas acabam sendo repetitivas, eu gosto sempre de fazer coisas novas, descobrir como fazer.

Então tenho uma proposta, pago a metade do curso, bem como a viagem.

Agora quem tem que pensar sou eu.  Pois ficaria em divida com o senhor, nunca gostei disso, ter divida com ninguém, nunca comprei nada a prestação, ou como o senhor possa imaginar. Prefiro eu mesmo pagar tudo, tenho dinheiro economizado para isso, já olhei inclusive um voo que me saia barato, um pequeno hotel, afinal o curso são só vinte dias.  Deixarei a maioria dos doces congelados, assim cada dia, teria que retirar somente o que se fosse usar.

A cara do homem era fantástica, acabou contando que a família o tinha procurado para que ele intercedesse, mas rejeitei, depois se ofereceram para comprar o restaurante em teu nome, de novo rejeitei.

Por favor nunca ceda a eles, porque senão eu iria embora.

Preparou tudo, só comprou abrigos de segunda mão, porque seria inverno em Paris.

Conjugou fazer curso, com ir pelos lugares mencionados pelo professor que tinha tido, para comer, imaginar como se fazia isso ou aquilo.

Ao mesmo tempo conheceu os lugares emblemáticos, um belo lugar para acabar a velhice, ao mesmo tempo que pensava, que idiotice, tinha visto tanta gente morrer jovem no acampamento, nunca tinha tirado da memória, um jovem ao qual faltava uma perna, morto com a seringa ainda presa ao braço.   Por isso tinha horror a palavra drogas.

Quando voltou, os senhores do edifício, lhe fizeram uma festa imensa.  Achou estranho, mas acabou descobrindo, o caseiro lhe disse que tinham lhe oferecido dinheiro para entrar no teu apartamento, eu me neguei, nunca mencionaste essa senhora que chegou aqui com um carro com chofer.  Me soltou que queria melhorar teu apartamento.  Lhe disse que sem tua autorização nada feito.

No restaurante lhe fizeram uma festa, nesse mesmo dia, preparou uma receita nova, que o chefe da cozinha provou, bem como o dono do restaurante.  Uau disse ele.  Como pretendes fazer?

Bom aprendi muita coisa, bem como imaginei não gastar todas a ideias de uma vez.  Se mudamos radicalmente a carta, os clientes vão estranhar, então penso que o melhor seria, fazer de uma maneira simples, cada semana retiramos o menos vendido, incluímos uma coisa nova, se faz sucesso, continua na lista, senão cancelamos, incluímos outra.

Mas seguiu sua vida como se nada.

Um dia o proprietário o chamou ao escritório, lá estava a senhora, ela estendeu a mão, sou tua tia Helene, meu pai está muito mal, quer te ver antes de morrer, te peço por favor que vá visita-lo, arrumarei de uma maneira que toda a família não esteja lá para te incomodar.

Assim fez, ele ficou com pena do velho, deitado numa cama imensa, num quarto que era maior que seu apartamento.

Segurou a mão dele, ele pediu que ele se aproximasse para olhar bem seu rosto.

Pediu que abrisse a mesa de cabeceira, tens aí uma carta, minha para ti, mas só abra depois que eu morrer.   Peço desculpas por tudo.

O senhor não tem que me pedir desculpas, talvez eu tenha sido mal-educado, mas cresci me virando sozinho, uma ideia de família me aterra, não saberia como me comportar com uma família como tem o senhor.

Me fale de sua viagem a Paris?

Contou dos cursos que tinha feito, coisas que tinha aprendido.

Lhe perguntou se tinha aprendido a fazer um doce que quando ele ia, visitava esse restaurante para isso.

Ele riu pela primeira vez, meu professor daqui falava nesse doce, fui lá provar, depois aprendi a fazer no curso que fiz.

Como amanhã é domingo, mandarei alguém trazer para o senhor, ou sua filha pode ir buscar.

A filha que estava ali, sorriu, eu irei papai.

Ele segurou sua mão outra vez, disse nela podes confiar, sempre respeitara tua vontade, sua grande lastima, foi nunca ter conseguido encontrar teu pai.

Se despediu dos dois, ela queria mandar o motorista o levar, ele disse que não se incomodasse, pegaria o metro.   Só pediu que ela nunca voltasse aonde ele vivia, isso o incomodava.

Foi embora, no dia seguinte preparou o doce, pediu para o proprietário avisar sua tia.  Um carro veio buscar, no final do dia, lhe chamaram para atender um telefonema, era o velho para agradecer, foi o meu melhor presente em muitos anos, obrigado meu filho.

Ele agora uma vez por semana mandava para o seu avô o doce mas não ia até la, não tinha nada para falar com ele.

Sua tia Helene, lhe avisou da sua morte, pelo menos morreu em paz, em saber que tem um neto que é melhor que os filhos que ele criou.

Lhe avisou da cerimonia do enterro.  Foi com o proprietário do restaurante.  Assistiu a mesma, mas quando lhe convidaram para a recepção, pediu desculpas mas tinha que trabalhar.

Dois dias depois o proprietário lhe chamou, estava rindo, te livraste de uma boa.

Porque perguntou ele.

Teu avô deixou a empresa para tua tia, que não tem filho nenhum, além de deserdar todos os que nunca fizeram nada na vida, que sempre viveram pendurados nele.

Todo o dinheiro que tinha será repartido por ONGs, que cuidam dos homeless, em nome do teu pai Trevor Fustemberg.

Nem ele sabia que esse era o sobrenome de seu pai.  Ele tinha firmemente decidido que seguiria usando o seu Aerosmith.

Um dia foi ao banco para analisar suas finanças, quando lhe apresentaram, tinha um valor incrível, falou como gerente, não tenho todo esse dinheiro.

Ele foi depositado a mando do senhor Fustemberg, quando fizeram isso, disse que tinha deixado uma carta para ti.

Ele tinha se esquecido completamente da carta que tinha entregado em mãos, a tinha guardado.

Quando chegou em casa a localizou numa mesa que guardava suas coisas, tinha se esquecido completamente dela.

Apesar de ser tarde, estar cansado, leu.

Querido neto,

Me deste uma lição muito merecida, eu sempre comprei meus filhos com meu

Dinheiro, teu pai foi o único que sempre foi rebelde a isso.

Entrou para o exército, como uma maneira de fugir de meu controle.

Voltou destroçado, eu queria que fosse para um hospital particular, para que ele

Não tivesse que conviver com a gente que estava ali, que me horrorizava, mas ele

Escapou, indo viver nas ruas com os que tinha passado pelo mesmo que ele.

Nunca mais o encontrei, imagino que tenha adotado o sobrenome Aerosmith que

Era seu grupo de rock favorito.

Minha filha Helene, nunca me perdoou por isso, ela amava o irmão, o procurou como uma louca, por isso confie nela.

Os outros ao longo dos anos, desfrutaram de todo meu dinheiro, já lhes dei dinheiro suficiente a vida inteira.   No dia que apareceste aqui, me perturbaram, tinha medo de que te favorecesse.

Por isso no meu testamento, não consta para nada, mas não sou um velho tonto.  Sei que um dia iras querer realizar teu sonho, ter um belo restaurante francês, por isso te deixo um pouco de dinheiro para isso, não corresponde nem a um terço do que o resto já usufruiu.

Minha filha Helene, ira contribuir com ONGs em nome de teu pai, para ajudar aos incompreendidos que estão pelas ruas do pais inteiro.

Que eu mesmo nunca entendi.  Nem podia imaginar que meu filho vivesse assim.

Perdoe esse velho egoísta, que sempre pensou que sabia de tudo, acabou que descobri que não sei de nada.

Deus te abençoe

Trevor pai.

Ficou emocionado, a guardou bem guardada, a iria colocar num cofre do banco, bem como esse dinheiro, não queria que estivesse na sua conta.

Sem querer do envelope caiu uma corrente com um coração, ali estava uma foto de seu avô quando jovem, com sua avô,

No dia seguinte foi ao banco, alugou uma caixa forte, retirou o dinheiro da sua conta, bem com o envelope, guardou tudo ali.

Uma vez por mês sua tia Helene vinha jantar, depois esperava para comer com ele, alguma receita nova de doce.

Contava como ia as ajudadas, entendi que não posso modificar a vida de todos, mas sim colocar uma espécie de ambulatório por perto, que os ajude, bem como um albergue, para tomarem banho, cortarem cabelos, que tem um consultório médico, o primeiro a funcionar é aonde você me disse que vivia.  Já esta funcionando, ninguém reconhece o nome do teu pai, como apelido da família, por isso, optei a usar o de Trevor Aerosmith.  Que no fundo é bom, pois meus irmãos e sobrinhos não entendem.

Todos fizeram universidade, agora fora os benefícios que sempre tiveram do meu pai, cada um tem um bom apartamento, uma mesada, mas tem que trabalhar, estão tendo dificuldades, pois nunca fizeram isso.

Estou liquidando toda a empresa como ele me pediu, investindo o dinheiro nas ONGs por todo o pais, quando funcione sozinho, vou realizar o sonho de minha vida, viver um tempo em Paris, estudar história da arte que foi meu sonho.

Um detalhe, teu pai adorava ficar na cozinha vendo as senhoras que trabalhavam ali, fazerem comida, dizia que um dia seria um grande cozinheiro, achei essa foto no meio de suas coisas.

Se parecia a ele, na mesma idade, ele no meio das cozinheiras.

Agradeceu a foto, comprou um porta foto, a colocou na sua mesa que usava para estudar.

Agora fazia um curso de francês, queria saber falar direito para um próximo curso.

Tempo depois o proprietário, alegando que estava ficando velho, sem herdeiros, propôs a ele, bem como ao chefe da cozinha uma sociedade.

Foi ensinando aos dois como administrar o restaurante.

Primeiro pensou que estava apaixonado por ele, pois era a primeira pessoa que se preocupava por ele, era mais velho que ele vinte anos, um dia lhe disse isso, sei que o senhor é gay, esta sozinho, podia me ensinar a fazer sexo.

A cara dele foi ótima, Jean Paul Lausde, disse que a muito tempo se interessava por ele, mas tinha medo, pela diferença de idade.   Mas se completavam, só refutou muito ir viver com ele, mas acabou aceitando, ou melhor entraram num acordo, um outro apartamento, aonde passariam a viver, mais simplesmente.   Pela primeira vez, preparava um café da manhã para outra pessoa, Jean Paul dizia que estava vivendo uma segunda juventude.

Lhe ensinou muitas coisas, viveram juntos mais de 15 anos.   Quando ele morreu, deixou o restaurante para os dois sócios.  Mas seu chefe de cozinha, queria partir para outros voos, concordaram em vender o mesmo.

Ele iria passar uma temporada em Paris, tinha ido duas vezes com Jean Paul, nas férias quando fechavam o restaurante, tinha conhecido agora a cidade de outra maneira.  Com o patrimônio que tinha construído, nunca mexeu no dinheiro do avô poderia ter uma vida por um tempo por lá bem simples.

Procurou pela tia, para dizer o que tinha resolvido, soube que já fazia tempo que vivia em Paris, conseguiu seu endereço.

Arrumou uma bagagem, simples, alugou um apartamento, pequeno, mas como ele gostava, limpo.

Quando a procurou, deu que ela tinha uma loja de antiguidades, tinha até remoçado, pela primeira vez a deixou abraça-lo, tinha aprendido isso com Jean Paul.  Antes dele morrer tinham se casado, para ele não ter problemas com o apartamento que tinham juntos, bem como a parte do restaurante.

Agora uma vez por semana se encontravam para almoçar ou jantar.  Ele estava aproveitando para fazer pequenas viagens para conhecer melhor o pais.

Um dia sua tia lhe contou que eles eram judeus, que na verdade seu pai Trevor, tinha adotado esse nome ao entrar nos Estados Unidos.   Toda nossa cultura era de aqui.  Aqui voltei a frequentar a sinagoga, que ele odiava.

O foi apresentando para muita gente que ela tinha conhecido.  Foi quando teve uma paixão impressionante com um escritor, riu muito quando este lhe fez um comentário.

Ela lhe disse como podia ele ter impressionado a pessoa mais chata que ela conhecia, a Flaubert Jean, ele inclusive usa o nome invertido, loucura da cabeça dele.  Me pediu o número de celular.  Deve ter ficado mais surpresa ainda, quando ele disse que podia dar.

Começaram os dois a se encontrar para comer, um verdadeiro namoro.  A primeira vez que estiveram na cama, foi como uma explosão, Flaubert dizia que com ele podia falar, sem ter uma postura de intelectual, pois lhe entendia.  Agora iam a todos os lugares juntos, ele na cozinha da casa dele, preparava pratos para ele.  Ele que era muito magro dizia que ia engordar, não somos jovens assim para esse tipo de comida.

Demoraram a irem viver juntos.  Mas chegou o momento que um já não sabia viver sem o outro, os conhecidos estranhavam, estavam acostumados ao mal humor que sempre tinha, agora era agradável, sorria, quando não queria dizer nada.

Quando começavam alguma conversa sobre filosofia, ou outra coisa, ele voltava ao seu ataque de mal humor, se vocês nunca viveram, a maioria nunca trabalho, como podem querer consertar o mundo.

Trevor se matava de rir, pois ele pensava a mesma coisa.

Trouxe todas suas coisas que NYC, agora convivia mais com sua tia Helene, que sempre lhe contava alguma coisa de seu pai.  Ela não se perdoava, ter aceitado a vontade de seu pai, com relação ao irmão, ele antes de fugir para o exército, meu pai já tinha um casamento combinado para ele, bem como que assumisse suas empresas.

Quando ele desapareceu, fiquei desesperada, perdia o único irmão com quem podia falar, sonhar, compartir desejos, claro nenhum deles encaixava nos objetivos de teu avô.

Mas nunca descobri aonde poderia estar, pois usava esse novo sobrenome, aliás pelo que descobri, foi com ele ao exército.   Depois que te conheci, procurei descobrir quem era tua mãe, mas nada foi possível.  Nos acampamentos nunca estão interessados na vida das outras pessoas. Ninguém sabia nada.

Sabe as vezes penso, que com isso ele me ensinou a sobreviver, o pouco que me lembro, era que sempre dizia bom dia para todo mundo, estava sempre sorrindo, me dizia mesmo que teu sorriso seja triste, não importa, sorria.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  

 

 

lunes, 20 de marzo de 2023

SUBSIST

 

                                           

 

Subsistir, sobreviver a qualquer custo, não é fácil, mas isso pode fazer parte de tua vida, inclusive contar como medalhas para quando chega na parte que é só uma rampa de descida para o final da vida.  O bom é poder olhar para trás, pensar, confesso que vivi.

Nessa fase agora, que ia anotando num bloco, as coisas que ia se lembrando do passado, ria, porque sempre tinha lhe parecido interessante isso, que depois de uma certa idade, as pessoas não se lembravam do que tinham comido, mas coisas do passado sim.

Ele com uma idade precoce, sentia que não pertencia ao mundo de sua família, não encaixava ali.  Eram descendentes de poloneses, que tinham fugido antes da guerra, imagina, judeus, poloneses, não havia maneira que não fosse essa, seu avô era professor na universidade de Varsóvia, quando viu o andar da carruagem, como ele dizia, enfiou tudo no seu velho carro, sua mulher que não queria ir embora, seus dois filhos, no teto arrumou umas maletas daquelas antigas, de papelão duro, com um pouco de roupa para cada um, escondeu embaixo dos bancos, os livros que usava para rezar, nunca ia a sinagoga, rezava em casa.

Se atreveu a fazer uma coisa, atravessar a fronteira com Alemanha, justo na fronteira, ajudado pelo meu pai, roubou umas placas de um carro estacionado numa rua deserta, como falavam todos alemão foi fácil passar por eles, era loiros, altos, olhos azuis, todos muito brancos, atravessaram o pais inteiro, entraram na Holanda, pegaram um navio para os Estados Unidos.

Entraram legalmente no pais, como se viessem de férias, logo pediram asilo, quando Hitler invadiu a Polonia.  Nessas alturas tinham atravessado o pais inteiro, com um Ford de segunda mão que comprou em NYC, não estavam fazendo turismo, procuravam sim um cidade para viver.

Foram parar em Lancaster, porque minha avó disse que dali não se movia mais, estava farta de tanto olhar cidades, meu avô colocava defeito em todas, nenhuma era parecida a sua na Polonia.   Ele conseguiu uma escola para dar aulas, ela colocou os filhos para trabalharem.

O mais interessante era que meu avô sendo professor, os filhos não gostassem de estudar. Logo comprou umas terras fora da cidade, que ela escolheu, começaram a plantar batatas, outras coisas.  Ela aprendeu a dirigir uma caminhonete, ia pelos mercados vendendo o que plantava.

Meu pai foi trabalhar de mecânico, pois ao longo da viagem num carro de segunda mão, aprendeu a mexer nele, meu tio ao contrário, logo desapareceu em direção a Las Vegas, esse adorava a aventura, aparecia de quando em quando, ora rico, ora fudido totalmente, mas nunca saiu de lá.

Meu pai se casou por um acaso com uma polaca como ele, minha mãe era diferente, não era judia, mas sim filha de um pastor protestante.

Uma bela mistura, um judeu com um pastor protestante.  Mas meu avô nunca interferiu nisso, lhe dava igual, eles nunca tinham seguido a religião.  Meu avô dizia que era ateu.

Tive quatro irmãos, todos altos como eu, loucos todos por carros, eu nem sabia distinguir a diferença de um para o outro.  Por isso era a gozação, mas era louco por livros.  Aprendi o polonês primeiro que o Inglês, pois em casa se usava essa língua.  Talvez por isso, tive facilidade em aprender outras línguas.

Era considerado o melhor aluno da escola, por isso me tornei o querido do meu avô que tinha se frustrado com os filhos.   Em casa não existia luxos, meu pai considerava que todos tinham que trabalhar, não pedia a nenhum filho dinheiro, o que ganhavam era deles.

Meus irmãos esbanjavam o que ganhavam, roupas novas, eu me contentava a usar as roupas deles de segunda mão.  Pois com uns 13 anos, comecei a trabalhar na parte da tarde numa livraria da cidade, foi o que me ajudou a seguir em frente.

Guardava todo o dinheiro que ganhava, quando me perguntavam o que queria de presente no aniversário, natal, essas coisas, dizia que queria dinheiro, para ir à universidade.  Meu pai abriu uma conta no banco para mim, assim eu ia guardando.

Dos meus irmão herdava tudo, roupas, sapatos, só me comprava cuecas, meias, os resto eram deles, usavam uma temporada, em seguida não queriam mais.

Todos tínhamos a mesma altura, acima de 1,80 metros, loiros, olhos azuis, pele muito branca, mas meus pais cuidavam que fossemos ao dentista regularmente, afinal o mesmo era seu cliente.    O filho do dentista era meu companheiro na escola, capitão do time de basquete, um tipo complicado, vivia me provocando, pois eu não gostava de nenhum esporte, não me interessava.  Mas se dava mal comigo, imagina, com quatro irmãos maiores, tinha que saber me defender.  A primeira vez que tentou fazer bullying comigo se deu mal, lhe dei um murro em pleno nariz, que fomos parar os dois no gabinete do diretor.  Enquanto esperávamos para falar com ele, o James me olhava, entre surpreso, de uma maneira diferente.

Quando o diretor me perguntou por que lhe tinha dado um murro, lhe disse que não ia aturar que me enchessem o saco, que estava lendo tranquilamente um livro da biblioteca, que este o tinha arrancado da minha mão, destroçando o livro.  Isso não se faz, afinal o livro não era meu, agora terei que comprar com minhas economias, para entregar um novo no lugar.

Nada disso, me disse o diretor, se foi ele quem destroçou, quem tem que comprar será ele.

James me olhava quieto, quando o diretor disse isso, ia reclamar, mas o outro lhe disse que estava suspenso.  Na verdade não cumpriu nenhum dia, pois estava em pleno campeonato, o professor de educação física, conseguiu libera-lo.

A partir desse dia passava por mim, me dizia, bom dia Paul, eu lhe respondia.

As vezes ia caminhando para casa, ele me alcançava, para ir conversando.  Nos tornamos amigos, de uma certa maneira, foi meu primeiro namorado, na escola a única coisa que fazia de esporte, era nadar, mas não competia, adorava a água.   Ele tinha me visto nos banheiros, adorava segurar meu sexo, foi também o primeiro que colocou na boca.   Seus pais estavam sempre fora, então na volta da escola, ele me convidava.  Mas claro eu tinha que ir trabalhar, me desculpava sempre. Mas aconteceu.

Quando chegou a famosa época dos 16 anos, que eu estudava como um louco, para poder ir à universidade com bolsa de estudos, ele arrumou uma namorada, mas me procurava.

Fomos uma vez numa excursão da escola a Bervely Hills, eu me apaixonei, depois fomos ao Píer de Santa Monica, descemos para a praia, tomamos banho de mar.  Pensei, quero viver aqui, ia fazer tudo para isso.  Depois na volta, o professor com segunda intenções, passou pela University of California.  Foi outro amor à primeira vista, ele nos deu folhetos dos cursos, afinal tinha estudado lá.

Eu já tinha definido o que queria fazer, estudar literatura.

Faltava pouco para isso, mandei meu curriculum escolar para a Universidade, para saber se seria aceito.   Quando num almoço da família, verbalizei isso, só meu avô me deu força, ele tinha me introduzido no mundo do livro, era seu único neto que lia em Polonês, inglês, francês, também o que tirava as notas mais altas da escola.

Tinha uma boa economia.  A preocupação dos meus pais, era como ia me manter.

Escapei um dia, peguei um ônibus, fui andar por ali por perto da universidade, queria saber como era, apesar de ser um domingo, tinham muitos restaurantes abertos, eu queria ver se algum procurava gente para trabalhar.  Numa esquina vi do outro lado da rua, uma livraria, fui dar uma olhada, a primeira coisa que me chamou atenção, foi um cartaz, procurando alguém para trabalhar da parte da tarde para a noite.  Tinha um adendo, trabalhar dois domingos do mês, entrei, tinha uma senhora, com uma cara gentil, cabelos brancos, que me pareciam precoces pois não aparentava muita idade.   Lhe perguntei pelo emprego, disse que tinha sido aceito na universidade, que iria fazer literatura, que trabalhava numa livraria em Lancaster.

Lhe expliquei que meu único problema era alojamento, pois imaginava que ali por perto o aluguel seria caro.

Depende do que procuras.

Me estendeu a mão Marie Floret, pelo sotaque vi que era francesa, comecei a falar com ela nessa língua, adorou, ria muito.  Contei que falava polonês, francês, claro além do inglês, que me interessava por literatura, pois queria ser escritor.

Ela primeiro me disse das condições, que queria uma pessoa que começasse a trabalhar as duas da tarde até as oito da noite, dois domingos inteiros do mês, assim eu folgo dois a pessoa outros dois, o salário era quase o triplo do que eu ganhava, mas claro a vida em Los Angeles era mais cara.

Colocou um cartaz, que já voltava, disse venha comigo, tenho um amigo que tem uma oficina mecânica aqui atrás, era um beco.

Justo virando a esquina, se entrava num beco mais largo, ali só tinha uma oficina mecânica de dois andares, em cima um pequeno apartamento.  Fui apresentado para o senhor que me olhou de cima a baixo, mas não dei atenção, falou que tinha feito esse apartamento, por causa do seu filho.   Esse agora era ator de cinema, nunca aparecia.  Subi, com ele, enquanto ela voltava a livraria.

O apartamento, era pequeno, logo na entrada um banheiro, pequeno, mas com um bom chuveiro, depois uma pequena cozinha americana, depois o resto era aberto, só tinha uma cama grande, um armário, o resto teria que comprar.

O sacana do meu filho, levou todo o resto, para aonde esta vivendo hoje em dia, em Malibu.

O homem não parava de me olhar, só faltava pedir que eu tirasse a roupa.

Acertamos o aluguel, me disse como vinha recomendado, me cobraria menos.  Me perguntou se eu queria ser ator também.

Ri muito, nada disso, vou estudar na universidade aqui perto, vou trabalhar no horário tarde noite na livraria, quero ser escritor.

Ele disse que era cliente da livraria, posso colocar umas estantes para ti, se tens livros.

Apertamos as mãos, as suas eram calosas, imaginei as mesmas passando pelo meu corpo, fiquei excitado, ele percebeu.

Voltei a livraria, com o que ela ia me pagar, podia pagar tranquilamente o aluguel, pois ia estudar com bolsas de estudo.

Me perguntou quando podia começar, era uma sexta-feira, eu lhe disse que na segunda-feira, que no sábado ia trazer minhas coisas, se no domingo ela estava podia me ensinar como gostava as coisas.

Nessa noite, isso sentou como uma bomba em casa, todos falavam ao mesmo tempo, eu esperto, tinha convidado meu avô, só tinha que transferir a conta no banco.

No dia seguinte ele apareceu logo cedo com a caminhonete de minha avô para levar o que eu queria, me ofereceu uma poltrona que tinha comprado, que afinal não era o que queria, para que eu tivesse aonde sentar para ler.

Gostou do lugar, bem com fez amizade com a dona da livraria. O Gaspar tinha pintado de noite o apartamento todo de branco como eu disse que gostava, as duas janelas, que davam para o beco, estavam abertas, para entrar ar, para tirar o cheiro.  Ele olhou tudo, foi comigo comprar roupas de cama, tudo que eu ia precisar, disse que era o presente de aniversário antecipado.

Na segunda-feira iria ao banco aonde tinha conta, pediria para transferir meu dinheiro.

Nesse dia já fiquei.  Meu avô depois que comemos juntos, ainda comprou uma série de livros que queria, na despedida me disse segurando meus ombros, o mais importante na vida meu neto, é poder voar, tu começaste a mexer as asas, o mundo é todo teu.  Vou esperar ansioso teu primeiro livro.

Trabalhou todos os dias até começar a universidade, nos domingos livres ia a praia, primeiro a Santa Monica, depois conforme as pessoas foram falando, ia mais longe, aonde tivesse ônibus para ir.

Em casa só tinha coisas para um café da manhã, depois comia num dos muitos restaurantes ali perto, nunca tinha gostado muito da ideia de cozinhar.

Com os olhos muito aberto, começou a descobrir o mundo, todas semanas tirava um dia para falar com seu avô, que lhe contava rapidamente o que acontecia com a família, depois lhe perguntava sobre sua nova vida.

Foi conhecendo os clientes, alguns compravam livros, discutiam com ele, sobre o autor que gostavam, lhe davam o número de telefone, para lhe avisar se chegava algum novo.

Um dia um desses, ao lhe dar o cartão, a Marie ria, soltou na sua cara, não captaste a mensagem verdade?

Que mensagem?

Esta te convidando para o chamar para um café, ou algo mais.

Então entendeu, era como nos livros policiais, ele era carne fresca no pedaço.  Pelas tardes estava um bom tempo sozinho.  Marie, as duas da tarde saia para ir para casa almoçar, depois ia se encontrar com suas amigas para um café, voltava umas duas horas antes de fechar, para fazer o caixa com ele, aproveitavam a lista dos livros vendidos para ver se tinham que encomendar outros.   Ela gostava de analisar, quanto tempo o livro tinha estado ali esperando para venda.

Ele fez uma sugestão, em Lancaster a proprietária, os livros que ficavam muito tempo, colocava em promoção, mas claro ali havia que separar, não se ia colocar um autor famoso assim.

Ela comentou que em sua casa tinha muitos livros que tinha levado, que não pensava tornar a ler, podíamos engordar uma mesa com isso, livros parados, livros de segunda mão.

Ele organizava isso, tinha um caderno só para isso.  Esses livros parados, ele conversava com as pessoas, para saber por que não tinham saído antes.   Descobriu que a maioria não gostava de procurar nas estantes, pois tinham que inclinar a cabeça.   

Quando comentou com a Marie, ela concordava a mesa funcionava mais.  Decidiram deixar só nas estantes livros que eram mais para os estudantes da universidade.

Quando começaram as aulas, descobriu que muitos clientes eram professores lá, inclusive uns dois que lhe tinham dado o cartão eram seus professores.

Um deles dava um curso a parte de escritura, se tornou sua aula favorita, ele tinha uma série de pequenos relatos de sua época de estudante, com esses começou a fazer uma coisa, que faria o resto de sua vida.   Escrever, revisar, revisar, revisar, até ter certeza de que estavam relativamente bons para ensinar no curso.

Esse professor, Darius Walt, riu muito, quando ele entregou um texto assim.  Comentou com ele que queria ver um desses, se ele ainda tinha o original?

Sim conservo todos, usava uma velha Remington, presente de seu avô, como sempre de segunda mão, mas isso não lhe importava o mais mínimo.   Na livraria usava uma parecida, nos momentos que tinha livre, que não entrava nenhum cliente.  Quando estava fazendo algum exercício mental, fazia uma coisa, trocava os livros da mesa de lugar, muitos pensavam que eram novos.

Os romances que tinha, não passavam de uma noite.  Ficava frustrado, esperava se apaixonar, mas descobria que a maioria das pessoas queriam sexo, nada mais que isso.

Um dia conversou justamente com o professor Darius sobre isso.  Ele queria carinho, romance, mas se esbarrava que as pessoas queria sexo nada mais.

Se sentia incompleto.

Darius riu muito, isso é assim, te vem com toda essa estampa, pensam esse é forte, aguenta qualquer coisa, é duro, quer sexo nada mais.

Experimentou fazer carinho, em vez de sexo, a pessoa se levantou foi embora.  Descobriu que a maioria era casada.  Um domingo, estranhou ver a oficina mecânica aberta, se aproximou, viu o dono falando, com um homem de uma estampa incrível, deduziu que era o seu filho.

O apresentou, teve um rechaço imediato com o mesmo, lhe pareceu um sujeito fútil, tinha estampa, nada mais.  Sabia que ele fazia esse papel tão costumas nos filmes bobos, o macho alfa.

Quando voltou de noite o senhor seguia trabalhando, parecia chateado, começaram a conversar, imagina, apareceu porque precisa que eu arrume seu carro, não foi ver sua mãe, que o criou dessa maneira, agora reclama, se acha o umbigo do mundo. Estou aqui perdendo o domingo, quando poderia estar na praia, me distraindo com meus amigos.

Começara a falar das praias, domingo que vem se o tempo estiver bom, irei, como sempre, pego um ônibus aqui na avenida, passo o dia inteiro, fazendo uma coisa que amo, nadar.

Não sabes fazer surf lhe perguntou?

Nunca fiz, fico com inveja das pessoas que fazem, mas nunca fui fazer.

Eu normalmente vou a Venice Beach, lá tenho amigos, que me avisaram muito que não me casasse, nem tivesse filhos, mas o idiota não escutou.

Queres tomar uma cerveja, perguntou ao homem, viu que estava suado. Fechou a oficina, subiu com ele, acabaram na cama, foi a melhor foda que tinha tido em muito tempo, cheia de carinho, gostou, ria com isso.

Ao final lhe comentou das aventuras, que o frustravam.

Veja sou casado, um casamento de muitos anos, ela tem sua vida própria, eu ao contrário, me sobram os amigos, eu quero é isso, calor humano que não tenho em casa, embora me sinta fantástico contigo.

No domingo seguinte, o veio buscar, ele tinha um tipo rancheira, vinha com duas pranchas em cima, vou te ensinar a surfar.

No caminho foi comentando, todos esses meus amigos, os conheci no exército, o primeiro que vão dizer, é que poderias ser meu filho, espero que isso não te importe.

Segurou sua mão, lhe disse, esta semana me senti melhor, encontrei alguém que me entende, pois tinham falado muito, contou para ele, pois os únicos com que tinha falado a respeito, tinha sido a Marie além de seu avô.  A história que tinha apresentado ao Darius, ele tinha mandado para uma revista literária que o tinha publicado.

Quero ler lhe soltou Samuel.

Passou o dia lhe ensinado como surfar, apanhou mas aprendeu, mas o que mais gostou, comentava depois, era ter ficado além da ondas, esperando uma especial, se sentiu em paz, comentou isso com ele.

Também é o lugar que mais gosto.

Na volta, ficou para dormir com ele, disse a minha mulher que ficaria para dormir na casa de um amigo da praia.

Adorava isso, os dois se entendia, se exploravam, fazia carinho, adorava passar a mão pelos cabelos crespos, cheios de fios brancos do Samuel.  Ele dizia não sei o que vês em mim, não sou bonito como meu filho, nem tenho um físico de jovem cheio de músculos.

Samuel, isso não me interessa, apesar de ser jovem, quero poder conversar, trocar ideias, isso tenho contigo. 

Ele quando leu o texto, lhe disse que o entendia, tinha se casado por isso, pensava que ia ter uma família, carinho, tudo que não tinha tido antes.

Nos domingos quando chovia, lhe ensinou a conduzir, o animava a respeito.

Acabou de escrever seu primeiro livro, mandou uma cópia para seu avô por entrega rápida, outra deu ao Samuel, a Marie, além do Darius.

Tinha construído um personagem que não encaixava no mundo de agora, com os valores tão superficiais, incluía isso, de um amor de uma noite, de não conhecer as pessoas, por isso a princípio tinha estranhado, muita gente entrava na livraria, mas conversava sobre o autor, acabavam falando de suas vidas.

Samuel agora escapava algumas noites, disse que iria pedir o divórcio de sua mulher, tinha descoberto que ela tinha uma aventura.   Por isso não reclama os dias que estou fora.

No último domingo o viu com cara de cansado, lhe perguntou o que passava.  Ela assinou o divórcio, mas ficou com quase tudo o que eu tinha a casa, terei que sair de lá.  Só me restou a oficina, meu carro, dinheiro que guardo na conta do banco aqui perto.

Menos mal que não tenho que pagar nenhuma pensão.  Vai se casar com o sujeito com quem tem aventura.

Não seja por isso, venha ficar comigo.

Mas como sempre a felicidade nunca era uma coisa que durasse muito.  Apesar dele insistir Samuel não gostava de médicos.  O via cada vez mais cansado, só estava super bem quando estava na praia.
Marie um dia lhe perguntou se ele realmente gostava do Samuel?

Perguntas isso, por que tenho idade para ser seu filho?

Sim, ele me disse que nunca imaginou ser feliz com alguém, que contigo é.

Pois não sinto essa diferença, com ele posso conversar, o que sentia falta com os outros, tenho com ele, é carinhoso, se preocupa comigo, gostamos de muitas coisas iguais.

Sei que não é só por sexo, como acontece muito agora.

Agora quando ia para casa, se encontravam iam comer ali por perto, pareciam dois namorados, não lhe importava que falassem dele.

Seu livro finalmente foi editado, ele evitou que tivesse sua foto na contracapa, para não descobrirem que trabalhava ali na livraria.

Vendia bem, quando estava já na terceira edição acabou o seguinte.  Justamente nesse dia, voltava para casa, com o pacote de cópias que tinha mandado fazer, para mandar para seu avô, para os outros lerem, fazerem comentários com ele.

Estava louco para o Samuel ler, estranhou que a porta da oficina estivesse aberta, o encontrou no chão, chamou uma ambulância, mas era tarde, tinha tido um enfarte.

Sabia que tinha o telefone de seu filho, chamou a este, lhe disse que estava filmando em NYC, que infelizmente não podia ir.  Que falasse com o advogado de seu pai.

Foi o que ele fez.  Este sabia o que tinha que fazer. Uma cerimonia simples, tinha uma lista de amigos para avisar, que fosse cremado, que levassem para além das ondas, deixassem as cinzas ali.   Tenho uma carta para ti, que ele deixou.

Estava imaginando que o filho agora podia querer o local para vender.

Depois da cerimônia que foi uma surpresa, o local estava cheio, o filho, nem a mulher apareceram.   

O advogado disse que o filho não podia sair da filmagem, mas creio mesmo que não quer perder tempo, só perguntou se tinha algo no testamento para ele.   Lhe disse que ele tinha liquidado tudo, com a mãe dele, seguindo suas ordens disse que tinha vendido o local.

Para minha surpresa deixou sua berlinda, bem como o local com o apartamento para mim, pelos últimos e maravilhosos anos de sua vida.  Bem como um pouco de dinheiro que tinha no banco.

Eu agora, despertava de noite procurando por ele na cama, em breve faria 30 anos, tinha que redefinir minha vida.

Marie, estranhava, que já tendo um livro pelo qual tinha recebido um bom dinheiro, não deixasse de trabalhar na livraria.  Lhe expliquei que não podia, não tinha nada a ver com ela, sim pelo fato de ser meu meio de conviver com outras pessoas, além de compartir ideias, tivemos uma conversa interessante, ela pensava em vender o local que era seu, ir viver com umas amigas numa residência, perguntei quanto queria pelo local.

Me disse o valor, a livraria queria pouco, pois atualmente quem levava tudo era eu. Só vinha nos domingos que me tocava livre.

Aliás, eu nunca entendia o porquê dos domingos, eram dias de turistas, que compravam guias, mapas, livros de fotografia sobre artistas, mas isso só na parte da manhã, na parte da tarde todos iam comer por ali, o movimento era nulo.

Eu na parte de baixo que era oficina, agora só tinha o carro do Samuel, que continuava usando para ir à praia para surfar com os amigos que tinha feito a partir dele.

Dois deles que eram seus amigos de sempre, me perguntavam por que não tinha ninguém, lhes contei que Samuel tinha preenchido minha vida, era o que eu tinha sonhado.

Não estava para voltar outra vez as famosas fodas de uma noite.

Riam quando ele falava nisso, mostraram alguns dos que eu conhecia, esses são famosos por isso, não querem nada, eu sempre digo que é melhor uma punheta bem-feita que isso.

Concordo contigo, o pior é que ele foi durante esses anos o melhor da minha vida, então o patamar é alto.

Riam comigo, diziam que ao largo desses aos eu tinha mudado, agora usava cabelos compridos, com alguns fios brancos, mas minha pele era mais morena.

Quando ia visitar meu avô, ele ria, dizia que adorava minha aparência, já meu pai, meus irmãos, suas famílias criticavam.   Nenhum tinha se interessado pelos meus livros, me achavam um idiota por seguir na livraria.   Segundo meu avô, pensavam que escrever livros não devia dar muito dinheiro.

Um dia fui visitar meu avô, ele me entregou uma caixa, estava bem embrulhada, me disse na hora de me despedir, só abra depois que eu morrer.  Olhei para ele, o via bem fisicamente.

Mas morreu semanas depois, sentado embaixo de um pé de maça que era aonde ele gostava de se sentar para ler.   Segundo descobrimos mais tarde, tinha um câncer, tinha resolvido que já tinha vivido demais, tomou todos os comprimidos de uma medicina, morreu ali sentado com um livro nos joelhos.

Tinha pedido que o cremasse, que deixassem suas cinzas ali ao pé daquela árvore.

Minha avó comentou que tinha sido a primeira que ele tinha plantado, tinha trazido as sementes da Polônia, de um uma árvore que tinham nos fundos da casa.

Sempre que ia vê-los, ele me dava maças dali, ela compotas que tinha feito com as mesmas.

Ela me contou que com os anos, ele tinha vindo se afastando dos filhos, não tinham nada a ver com ele, tu foste o único que realizaste seus sonhos.

Seus filhos queriam vender o campo, mas a minha avó se negou.  Sabia que um ia gastar tudo nas mesas de jogo em Las Vegas, que o outro usaria em besteiras.

Ela tinha aprendido a se mover no meio que vivia, o comercio, fez uma coisa que ninguém esperava, vendeu para um homem que comprava o que ela produzia, dividiu o dinheiro para cada um dos netos, assim nenhum filho podia brigar.

Meus irmão usaram a cabeça, guardaram para seus filhos irem à universidade.  Embora eu olhasse aqueles garotos, não via futuro neles, estavam sempre metidos na oficina mecânica.

A mim não me deixou nada, pois sabia que eu não precisava.

Quando abri finalmente o pacote que ele tinha me dado, tive que rir.  Eram dois cadernos escrito a mão, com a letra maravilhosa que ele tinha, contando sua história, sua juventude, junto tinha um saquinho com três diamantes, que deviam valer uma fortuna.

Fui lendo nas minhas largas noite solitárias, o que ele escrevia.  Começava dizendo que tinha inveja de mim, por conseguir colocar para fora tudo, falando honestamente o que eu sentia, eu ao largo desses anos com o Samuel, ele tinha sido a única pessoa que eu tinha apresentado.  Os dois se deram bem, inclusive veio a cerimônia quando ele morreu.

No que estava escrito, me contava um romance que tinha tido antes de se casar, seu casamento como todos de muitos judeus, tinha sido combinado entre duas famílias.  Tive sorte dizia, tua avó foi uma grande companheira, mas o amor de minha juventude foi um homem que soube anos depois, foi um carrasco com os judeus.

Falava dessa época, de sua juventude, descrevendo conforme ia se lembrando, desse tempo, citava nome das pessoas, a maioria ele achava que estava morta. 

Podia descrever lugares que frequentava em Varsóvia com detalhes, praças aonde se sentava com esses amigos, falavam de seus sonhos, já nessa época ele pensava ir para os Estados Unidos, falava de sua experiencia sexual com esse seu amigo, que tinha medo de tudo, comentava que não entendia como depois tinha se transformado em carrasco.

Ele nunca mais tinha sequer tido vontade de voltar a Varsóvia, principalmente na etapa comunista.

De uma certa maneira, falava da solidão, pois era muito diferente de minha avô, dos seus filhos, apesar da grande aventura que tinham feito, atravessar quase que os Estados Unidos inteiro, os filhos nunca falavam nisso, ele ao contrário tinha realizado um sonho, falava de cada lugar o que tinha significado os dias que tinha estado em cada cidade, o que tinha observado, porque não a tinha escolhido.  Realmente nunca ouvi meu pai mencionar nada a respeito.

Da solidão, até que descobriu que tinha um neto que amava as mesmas coisas que ele, porque sempre tinha me ajudado, não desprezando os outros, serão meros reprodutores de crianças, se deles sair alguma que seja como tu, a ajude por favor.

Um dia estava na livraria, recebeu a visita de um advogado, representava uma grande empresa, estavam interessados no espaço da livraria, bem com aonde ele vivia, queria fazer uma grande construção, um edifício que metade seriam apartamento a parte de baixo um grande estacionamento.

Escutou a proposta, ficou de analisar. Conversou com os vizinhos, 80% já tinha concordado com a venda, só ele basicamente não tinha se resolvido.

Estava tão acomodado ali, que pensou, caralho, talvez seja a hora de mudar tudo, embora gostasse da ideia do trabalho que tinha.

Como demorou, acabou vendendo mais caro, mas pediu tempo, queria encontrar outro lugar para se mudar com sua livraria.

Conversando com esses dois amigos da praia, lhe perguntaram por que não abria ali em Venice, o levaram para ver um local, um deles lhe disse o sujeito está enforcado, cheio de dividas, porque se meteu com quem não devia.    Ficou com pena do homem, o lugar lhe interessava.   Podia se aproveitar da informação, mas pagou o preço justo. Com isso ganhou um novo amigo.

Reformou tudo, o andar de cima dava um apartamento como o que ele tinha, o problema seria o carro, mas acabou resolvendo alugando uma garagem.   Montou uma livraria com uma cara mais moderna, já não teria livros técnicos como os procurados pelo pessoal da universidade.

Separou tudo o que tinha, levou para a biblioteca da mesma.  Estes agradeceram.

Agora levava um outro tipo de vida, se levantava cedo, ia fazer surf, depois voltava, tomava um bom café, banho, descia para trabalhar, usava um balcão moderno aonde podia trabalhar, agora usava um laptop para isso, a velha maquina Remington, agora ficava na mesa grande que tinha em cima.

Convidou a família inteira para a inauguração, mas só apareceu o irmão que era um ano mais velho do que ele, tinha os cabelos todos brancos.   Tinha três filhos, uma mulher complicada, perguntou se podia vir falar com ele.

Ficava pasmo, por viverem tão perto do mar, nunca irem à praia.

Ele desceu no domingo, acompanhado de um de seus filhos, Saul, muito tímido, quase se escondia atrás do pai.  Este conversou com ele, sentados na praia, enquanto o filho estava sentado na beira do mar, olhando para a frente.

Ele está sempre assim, ou grudado com um livro, é o melhor aluno de sua escola, como você, outro dia tentei falar com ele, meu jeito de entrar em contato com ele, foi falar de ti, que era diferente de nós.   Pela primeira vez em alguns anos, vi meu filho sorrir, quando contei como aprendeste a te defender de nós, ele riu.

Minha mulher diz sempre com desprezo que ele saiu como tu, que é gay, que não quer um filho assim.   Pensei muito, desde garoto sempre foste agarrado ao nosso avô, que em paz descanse, mas não encaixava nem com seus filhos, as vezes no meio daquela bagunça do almoço, ele estava em outro lugar, quando te descobriu, parecia que tinha voltado a viver.

Queria que conversasses com meu filho, se queres cuidar dele, eu te dou a guarda dele, não quero que sofra por ser diferente.  Me lembro quando eras jovem, parecias andar com cuidado conosco, para não sabermos como pensava.    Outro dia encontrei o James, aquele teu amigo, um pobre infeliz, se casou, não deu certo, é alcoólatra hoje em dia.

Vou dar uma volta nesse paraíso aonde vives, se ele fica contigo, virei mais vezes desfrutar desse lugar.

Sentou-se com o Saul, começou a falar de um livro que estava escrevendo, sobre ser diferente do resto.    Este lhe contou que um dia tinha ido a casa do bisavô, viu dois livros dele, escondi, comecei a ler, fui anotado as palavras que não sabia o que queriam dizer.  Duas delas, não encontrei o significado, a professora me viu buscando num dicionário, mas mesmo assim eu não entendia, me perguntou aonde eu tinha visto essas palavras, reclamou com minha mãe, que eu estava lendo livros que ela não recomendava para jovens.    Esse escritor, fala muito diretamente as coisas, não respeita as convenções da sociedade.

Lhe perguntou quais eram as palavras, explicou o que as mesmas queria dizer, no conceito que ele tinha usado.   Falou justamente isso, quando eres diferente, as convenções da sociedade, são limitadas, as pessoas normalmente têm problemas a aceitarem isso.

Seus amigos se aproximaram, os apresentou ao seu sobrinho, me ensinaram a fazer surf, quando se afastaram, ele disse que adoraria, mas nem sabia nadar.  Eu te ensino, queres?

Eles tem uma amizade especial, verdade?

Sim estiveram juntos no exército, eram os melhores amigos do Samuel, com quem vivi muitos anos.

Que o senhor quer dizer com vivi?

Isso que estas imaginando, foi o homem que amei muito, demorei muito para descobrir o que significa essa palavra.  Veja hoje em dia, todo mundo diz “eu te amo”, em muitas conjecturas, mas realmente o uso tão grande dela a tornou uma coisa vulgar.  Uns usam a palavra para dizer que fizeram sexo.    Mas fazer sexo, não significa que amas.  Falou abertamente com ele do sexo de uma noite, no fundo são duas pessoas que necessitam de outra coisa, mas poucas tem coragem de enfrentarem, muitas confundem precisar de carinho, um simples gesto, como esse, mexeu nos cabelos crespos dele, isso é um carinho, um afago vamos dizer assim.

Não tem nada a ver com o sexo, algumas vezes na nossa solidão necessitamos disso, não fazer sexo.

Caramba, o senhor fala de uma maneira muito simples tudo.  Quando perguntei na escola sobre isso, sobre dois homens fazendo sexo, foi um escândalo, lá foi a professora chamar outra vez minha mãe, que ficou escandalizada.

Não me chame de senhor, para ti, sou Paul.

Quando seu irmão voltou, os levou até seu apartamento, na livraria estava o homem que tinha perdido o local para ele.  Contou ao irmão que tinha perdido tudo que tinha, pois sua mulher tinha câncer, perdeu o emprego, este local, ficou inclusive a princípio sem lugar para viver.  Agora vive com uns amigos, que o ajudaram, é muito boa gente, conseguiu pagar toda sua dívida, dá a vida para ter um tempo pela manhã, ou no final da tarde pegar umas ondas.

O irmão perguntou ao Saul, sei que já conversaste com teu tio, que em casas andas agoniado com tua mãe, minha pergunta como agora vais entrar em férias, gostaria de viver com ele?

Os olhos do garoto brilharam, claro que sim, me disse que ira me ensinar a nadar, bem como surfar.    Mas adoraria que o senhor viesse me ver sempre, num sinceridade absoluta, disse ao pai, agradeço o que o senhor está fazendo, mas saiba que o amo.

Seu pai foi até o carro, trouxe uma maleta, lhe deu dinheiro, entregou uma caixa com um celular, me chame sempre que queiras.   No domingo, desço com teus irmãos, eles nunca viram como tu o mar.

Tinha um sofá-cama, arrumou para ele dormir.   Aqui tudo é simples, não tenho empregadas, a única coisa que não faço é cozinhar, odeio.

Acho que minha mãe também, a comida dela é horrível, ficamos todos esperando o dia que vamos a casa dos avôs para comermos bem.

Como tinha algumas lojas abertas, foram comprar roupa de praia para ele, bem como umas sandálias, andar na praia de tênis, é um horror.  Comprou todas as camisetas que ele gostou, claro com estampas de surf.

Disse todas as manias que tinha, mas não se preocupe, eu normalmente não vou trazer nenhum homem para casa.

Brian o homem que o ajudava na livraria, ficou encantado com ele, sempre quis ter um filho, talvez por isso me casei, voltei da guerra meio perdido, não tinha madures quando fui, nem quando voltei, minha mulher me ajudou a colocar os pés no chão, mas entre nós as coisas nunca foram 100%, pois tínhamos sonhos diferentes, não queria filhos, embora fosse professora da escola aqui do bairro.  Nunca entendi isso, ela cuidava, educava os filhos dos outros, mas não queria ter os seus.   Um dia lhe perguntei por que, me respondeu furiosa, porque tinha insistido muito, me disse que sabia que eu era gay, não queria filhos assim, que talvez minha genética fosse a responsável.

Ele não sabia que Brian era gay, de uma certa maneira, faziam um grupo da praia, apesar de serem homens fortes, duros na queda vamos dizer assim, eram todos gays, tinha pensado que ele tinha ido a guerra juntos, embora nenhum deles falava no assunto.

Brian lhe contou que ela tinha descoberto sobre ele, porque em seus pesadelos, gritava o nome do homem que tinha amado, o vi morrer num ataque inimigo, fiquei ali sustentando sua cabeça meio destroçada, chorando.

As vezes quando estou nervoso, tenho esse pesadelo.

Soube que o vizinho, vendia o prédio ao lado, com um dos diamantes, comprou o mesmo, aumento seu apartamento, fazendo um quarto com banho para o Saul, outro para ele, assim tinha privacidade.  Muito lentamente, começou a namorar o Brian, sentiam-se atraído um pelo outro, não eram jovens, antes lhe perguntou se ele tinha pensado bem, poderia querer recuperar o tempo perdido.

O que está perdido, já está passado Paul, seria hoje uma besteira, essa garotada, faz sexo como se estivesse espirrando, não quero isso.  Podem até me atrair, mas não, prefiro passar meu tempo fazendo surf com os amigos, trocando ideias.

Seu irmão tinha cumprido com sua promessa, vinha agora aos domingos com seus outros filhos, além de algum outro sobrinho.  Saul agora era quem ensinava os irmãos a nadarem, a fazer surf.

Estava feliz, se abraçava ao pai, quando esse chegava, dizendo, agora sei quem sou.

Na primeira infância, Paul tinha esse seu irmão como ídolo, pois era mais velho do que ele, nunca tinha entendido por que não tinha estudado.

Este acabou um dia lhe confessando, que se sentia protegido pelos seus irmãos maiores, eu era como o cachorro deles, acabou que não fiz amizades na escola, meus amigos eram seus amigos, nunca fiz nada por mim.

Um dia lhe chamou, dizendo que queria falar com ele em particular, se podia?

Claro que sim, marcaram na praia, sabia que Saul estaria ajudando na livraria.  Deu uma desculpa qualquer, tipo tinha que ir ao Banco.

Seu irmão lhe disse que estava se divorciando, que viver com sua mulher, que o acusava todo o tempo de ter sido culpa dele, Saul sair dessa maneira, ela se tornou ultra ortodoxa, eu nem sabia que tinha alguma sinagoga assim.   Deixa os meninos jogados, não sei o que fazer, os conselhos dos nossos irmãos, são horríveis.

Converse com teus filhos, se for o caso, venha viver aqui, essa outra loja que está vazia é minha, porque não a usas fazendo alguma coisa que goste.

Eu adoro consertar motos, achas que poderia?

Claro que sim, eu te ajudo, mas antes fale com teus outros dois filhos, eles são mais velhos que o Saul, vamos ver se te entendem.

Eles adoraram estar aqui, se ela concordar, eles sei que não querem viver com ela.

Vive alardeando coisas, que ninguém a entende, mistura religião, com o fato de ser mãe, faz anos que não me deixa a tocar.  Na verdade nem a procuro, depois que Saul nasceu, ela ficou com problemas, odiou ser mãe outra vez.

Falou com o Brian, esse riu, tens certeza de que queres seguir com o nosso relacionamento.

Mais do que nunca, gostava de conversar com ele, na cama se entendiam bem.  

Na verdade, ele acabou se apaixonando pelo seu irmão, começou a trabalhar junto com ele na loja de motos, quando viram estavam apaixonados.  Ele entendeu, isso talvez era uma coisa que faltava entre eles, se davam bem, mas não eram apaixonados, talvez tivesse sido as circunstâncias, tinha ensinado Josias a surfar, bem como aos garotos.

Fez uma coisa, procurou, tinha dinheiro para isso, quase nunca tinha gastado dinheiro dos livros, estavam todos aplicados, encontrou uma casa no canal, foi olhar com o Saul, que lhe perguntou se podia seguir vivendo com ele.

Claro, eres o filho que eu não tive.

Não estás aborrecido com meu pai, por ter roubado teu namorado?

Imagina, explicou para ele o que tinha acontecido, uma coisa é você ter amizade com uma pessoa, mas é necessário a paixão, como tem os dois, ficaram tanto tempo fechados em si mesmo, que precisam disso.

Isso eu tinham com o Samuel, ele era mais velho do que eu, mas em compensação tinha um coração imenso, nos gostamos desde a primeira vez que nos vimos, mas levamos tempo para chegar a algo.

Encontram uma casa grande, mas ele vinha pensando muito tempo numa coisa, seus livros eram cada vez mais complicados dentro de seu processo de escrever, Saul daqui a algum tempo teria que se preparar para a universidade.

Tentava não influir em nada.

Seu irmão se preocupava que tinha invadido sua casa, ele disse que nem pensar, fez uma coisa que depois iria gerar uma briga com os outros, colocou os dois edifícios, no nome dos filhos do irmão, com usufruto do mesmo.  Liquidou a livraria, iria sentir falta, mas queria viver a vida, nunca tinha viajado.   Pela primeira vez aceitou fazer a divulgação do seu novo livro, foi a NYC com Saul num final de semana, depois viajou pelas principais cidades do pais para isso.

A coisa funcionava melhor.  Desta vez Saul ficou com o pai.

Ele e seus irmão iam a mesma escola, ali no bairro, mas o interessante ele algumas coisas ensinava aos irmãos.

Essas viagens fizeram bem a ele, contacto com outros escritores, sair pelo mundo. Nas férias antes da universidade, foi com Saul, embora tenha convidado seus outros dois sobrinhos, mas estes estavam trabalhando com o pai na oficina mecânica.  Tampouco interessavam-se por estes viagens.

Foram os dois a Paris, percorreu lugares que tinha lido em livros, tinha passado os mesmos para o Saul, os dois se divertiam imaginando como era na época.  Foi um mês superdivertido.

Seu editor lhe colocou em contacto com um editor interessado em publicar seus livros em francês, foi falar com o homem, este se surpreendeu que ele falasse sua língua.

Era sobre os dois primeiros, disse claramente que podia, mas que ele primeiro revisaria os mesmo ou melhor os atualizaria, pois seria interessante, falou do processo que usava de revisar muitas vezes, mas podemos fazer o seguinte, posso fazer isso em francês, assim vocês só teriam que revisar a ortografia.

Lhe ofereceram uma casa, mas ele apesar de gostar de Paris, preferia fazer isso no seu canto, voltaram para casa, de uma certa maneira, se abria em sua frente uma nova oportunidade.

Antes de voltarem, tiveram um jantar num desses restaurantes famosos da cidade, riram muito depois.

Na volta tio e sobrinho fizeram um desafio, tinha os dois feito anotações, iriam escrever um livro, mas sem um olhar o do outro, sobre o que tinham vivido.

Ele agora se dedicava parte do dia, em revisar, atualizar, traduzir para o francês.  Gostava desses desafios.

Quanto ao livro, os dois tinham lido basicamente tudo do Patrick Modiano, um escritor que descrevia Paris de várias épocas.  Quando terminaram, mandaram para a França primeiro, o editor se decantou por publicar os dois juntos, pois tinha feito uma coisa, conforme o capitulo, a visão dos dois do mesmo lugar era diferente.

Quando voltaram a Paris, levava seus dois livros revisados, traduzidos embaixo do braço, desta vez resolveram ficar um tempo, alugaram um apartamento, com dois quartos assim cada um tinha um lugar para escrever.

Quando os livros foram lançados, foram a uma feira de livros em Frankfurt, sabia que ali se negociavam os títulos.   Aproveitou para ir com o caderno do avô a Polônia que nesse momento começava a dar seus passos largos em direção a democracia.

Fez a mesma coisa, ia pelos lugares que seu avô descrevia, foi outra experiência diferente.

Quando voltaram a Paris, Saul, resolveu fazer um curso na Sorbonne, mantinham o contato com seu pai, além dos irmãos.

Ele era convidado para falar nas universidades, sobre essa sua maneira de escrever, foi um tempo novamente que as pessoas se aproximavam dele, para uma aventura de uma noite, mas ele se negava a isso.  Se sentia sozinho, porque lhe faltava uma pessoa de sua idade para conversar, a falta que isso lhe fazia as vezes lhe provocava mal humor.

Quando foi a Tel Aviv, fazer a mesma coisa, lançar seus livros em hebreu, bem como falar na universidade.   Muita gente não sabia que ele era descendente de judeus, quando isso saiu no jornal, o público pareceu aumentar, já não era só o americano.

Quando lhe perguntavam se frequentava a sinagoga, disse que nunca tinha ido, que seu avô tinha cortado esses laços, ao emigrar para os Estados Unidos.

Conheceu muita gente, um dia em Tel Aviv, jantando sozinho num restaurante, se aproximou um tipo, mais ou menos da sua idade, se apresentou como um professor, que tinha assistido sua conferência, o convidou para sentar, pois tinha se sentido atraído pelo outro.

Tiveram uma conversa interessante, quando lhe perguntou se era casado, esse riu.

Fui criado numa colônia ultra ortodoxa, quiseram me casar quando tinha 17 anos, mas eu não queria seguir a vida deles, me sentia diferente, não acreditava em nada daquilo.

Fugi, aqui, existia um grupos de conhecidos, que tinham passado pelo mesmo, o jeito foi cortar os laços de família, entrar para o exército, que eles não aceitam, assim fui literalmente banido, mas era o que eu queria.  Era uma família grande, mas fria, todos voltados sempre para essa coisa do pecado, nada estava permitido, tudo era restrito.

Começou a rir, soltando que ele adorava o pecado.  Acabaram no seu apartamento, dois dias depois se mudou com ele, tinha ao parecer encontrado sua meia laranja, falavam de tudo, contou tudo o que tinha vivido, as suas poucas paixões, quanto odiava esses encontros só para sexo.

Heron, ria muito, eu também, durante um tempo sim, mas depois me cansei, além de que aqui era proibido.  Tudo tinha que ser muito sutil, nada a ver com o que acontece hoje.

Ele estaria de férias durante uns dias, o convidou para ir com ele a Venice Beach, lhe contou o que tinha acontecido, com o seu romance, que agora era o do seu irmão, foi interessante, era um homem sofrido, os dois encaixam perfeitamente.  O resto da família não aceitou, mas ele é feliz, isso é o mais importante.

Heron que tinha um humor impressionante, lhe perguntou se tinha mais irmãos, assim quem sabe ele também amava mais alguém da família.

Passaram por Paris, Saul tinha um romance, com um professor da universidade, estava feliz, escrevendo um livro de como enfrentar uma outra ideia de escrever uma história.

Um dia de manhã, quando chegaram a Venice Beach, despertou sem encontrar o Heron, na cama, se assustou, quando se levantou, ele entrava pela porta, viu sua cara, riu dizendo que não tinha fugido, tinha ido comprar pão para o café.   Ele adorava isso, sentar-se a mesa para tomar o café da manhã, conversando.

O que sentiste quando não me viu?

Foi honesto em lhe dizer que tinha ficado chateado, que estava aprendendo a gostar dele.

Então volte comigo para Israel, eu adoro a praia tudo isso, mas também temos lá, tu estas livre, mas ainda tenho dois anos pela frente antes de me aposentar.  Depois podemos dividir temporadas lá e cá.

Ele se deu bem com seu irmão, com Brian, conversavam muito os quatro.

Um dos sobrinhos ia ficar tomando conta da sua casa.  Assim ele se despreocupava, Saul, voltaria quando acabasse o livro, com seu namorado.

Desta vez ele não tinha apoio de nenhum amigo, era como começar do zero, para se ocupar, aprendeu a escrever em hebreu, ao mesmo tempo que escrevia um novo livro, um personagem que começa uma nova vida, em um lugar totalmente diferente dele.

Conheceu vários amigos do Heron, que tinha passado o mesmo que ele, passou a observar os ultra ortodoxos, que em Los Angeles, basicamente não existiam.

Entrevistou vários deles, para entender o que passava.

Durante esses dois anos, escreveu dois livros, baseados nos sentimentos dos jovens que eram obrigado, ou doutrinados a viverem fora da possibilidade de construírem uma vida fora dessa sociedade, no fundo eram como um gueto dentro de Israel.

Saul pediu socorro pois estava passando uma fase difícil, justo quando Heron se aposentou, foram lhe dar uma força.  Mas ele se repunha sozinho, tinha se enganado com o rapaz que era seu namorado.

Depois foram para Venice Beach, mas tinha se acostumado a viver com Heron, quando esse disse que tinha problemas para se adaptar, resolveu voltar com ele.

Viveram juntos mais de 15 anos, quando ele morreu, Saul veio visita-lo, também foi ficando, arrumou sua vida por lá.

Fazia tempo que tinha vendido sua casa, comprado outra em Tel Aviv, não pensava em voltar.

Quando morreu, foi enterrado ao lado do Heron, que tinha sido o amor de sua vida madura.