lunes, 25 de julio de 2022

LIONEL

 

                                                   LIONEL

 

Me chamo Lionel Davis, minha infância acabou no dia que minha mãe morreu, ou foi assassinada, ou como acreditei durante todos esses anos, que tinha fugido com tio Bill.

Durante todos esses anos, estive com minha mente bloqueada por uma série de manobras do meu pai, afinal nem sei se é ou não, me fez acreditar que minha mãe tinha fugido com tio Bill, seu sócio no consultório de psiquiatria que os dois tinham.

Eu adorava o tio Bill, era como um companheiro para mim, ao contrário de meu pai, era uma pessoa divertida, já meu pai, uma pessoa que parecia todo o tempo que estivesse brigando com o mundo.   Não me lembro se alguma vez me abraçou ou fez um carinho.

Eu tinha uns 9 anos quando tudo aconteceu, até então, quando os dois começavam a discutir, ele me mandava para meu quarto, mas eu me sentava no alto da escada, ficava escutando, só ele falava.  Sempre reclamava de tudo, nunca nada estava bom.

Seu prazer era humilhar minha mãe, que ele não servia para nada, claro o único que salvava era que era imensamente rica, o que acabava atirando na cara dele, dizendo que se não fosse ela, ele estaria na merda.

Ao contrário do que muitos pensariam, era uma loira sim, mas de burra não tinha nada.  Foi o que salvou a mim bem como seu patrimônio.

Quando foi dada como desaparecida, ele se esbarrou que não podia tocar no dinheiro dela, bem como em suas propriedades.   Tinha também um testamento, que havia que esperar que eu tivesse 18 anos.

Nunca a encontraram, mas tampouco uso de cartões de créditos, dos dois.  Nunca houve rastros.

Na casa de Tio Bill, foi a mesma coisa, nada fora do lugar, só seu carro tinha desaparecido.

Quando soube disso, meu avô materno, conseguiu minha guarda, mas claro, era velho demais para criar um garoto.  Me meteu num colégio interno, meu pai nunca vinha me visitar, a única pessoa que aparecia no meu aniversário, natal, era uma irmã dele, com quem não se dava, quando ela morreu, deixou de aparecer qualquer pessoa.

Só sai desse internato, quando estive para ir a universidade, não sabia muito bem o que fazer com minha vida, era bom aluno em tudo, conversava com meu tutor, mas apesar de gostar de muitas coisas, não sabia bem o que queria.

Um dia tudo estourou, muito cerca de aonde vivíamos, existia um rio, tínhamos ido muitas vezes fazer pick nick numa lugar que tinha praia, logo em seguida, diziam que a profundidade do rio era espantosa.

Mas começaram a construir uma barragem elétrica, desviaram o curso do rio, quando as aguas abaixaram, encontraram o carro do tio Bill, com os dois dentro, só que cada um tinha uma bala na cabeça.   As balas pertenciam a uma arma de meu pai.  Ele fugiu assim que soube que tinham encontrado o carro, mas claro, foi com uma amante, ela o denunciou a polícia, porque em seguida se tornou violento com ela.

Me liberaram da escola, pois tinha terminado o curso antes do tempo.  O advogado que levava as coisas de minha mãe, me acolheu eu sua casa.  Fui com ele ao julgamento.

O homem que pensava que era meu pai, esta ali sentando, olhando para a superfície da mesa, sem levantar a cabeça.

Quando foi interrogado se veio abaixo.   Ele e tio Bill, tinham sido amigos desde criança, estudaram a vida inteira juntos, na faculdade os dois se apaixonaram pela minha mãe, ela era de família rica, meu pai, vinha de uma família de classe média, tio Bill era o único que tinha estudado sempre com bolsas de estudo, pois sua família tinha se arruinado a muito tempo. Do outro lado nas cadeiras, vi seus pais, nunca os tinha visto, não eram tão velhos como tinha pensado.

Dias antes, tinham me retirado sangue para fazer um exame de ADN, que usariam no julgamento.  No interrogatório, seu advogado o colocou como uma pessoa sofrida, enganado pela mulher, pelo seu melhor amigo, durante anos.

Quando o fiscal começou a interrogar antes deles, uma série de amantes que ele tinha tido, logo vimos que ele era propenso a violência, todas diziam que na cama era um banana.  O pior foi quando apareceram dois homens, com uma pinta horrorosa, se viam que tinham as sobrancelhas perfiladas, usavam unhas grandes, cabelos grandes, quando se identificaram, foram perguntados pelo fiscal, os dois eram travestis, tinham sido amantes dele.  Disseram que ele gostava que o pegassem pelos seus pecados, mas no final apareceu o pior, um que vinha vestido de mulher, pois andava assim, disse que ele tinha sido agressivo, quando ele resolveu se transformar em mulher, tinha um apartamento que tinha colocado em seu nome, que tinha vendido o mesmo, para fazer a operação, quase me matou de pancada, fiz uma denuncia é claro, mas ninguém me deu atenção.   Me dizia sempre que o filho não era dele.

Depois do primeiro dia, conversei com o advogado de minha mãe, que me fez me sentar com o fiscal, contei tudo que me lembrava, das eternas discussões dos dois, que ele tentava humilhar minha mãe, ela lhe jogando na cara que ele só a queria pelo seu dinheiro.

Inclusive era proprietária do prédio aonde tinham a consulta.  Que quem me tratava bem era o Tio Bill, era o único que demonstrava me querer.  Quando vinha jantar, me colocava na cama, me contava histórias, me dava um beijo na testa.

No dia que tudo aconteceu, vi que ele pegava minha mãe, depois saíram os dois, no dia seguinte me disse que os dois tinham fugido.

Nesses anos todos, nunca tinha me visitado, eu sentia falta sim do tio Bill, dele nenhuma, nunca tinha feito um carinho, nada.

Só te chamaremos para depor de for necessário, não tens que passar por isso.

Sabiam que ele estava sem dinheiro, que a casa estava empenhada, bem como o edifício do consultório, ninguém sabia como tinha conseguido o dinheiro.

Finalmente o fiscal o chamou para depor, foi um horror, depois das amantes, dos travestis, ele estava um frangalho de pessoa.  Primeiro contou uma porção de mentiras, que tinha me protegido desses dois, que eram amantes desde o tempo da universidade.

O fiscal lhe perguntou se tinha certeza de que era seu filho?

Disse que sim, que ia sempre me visitar no colégio, que nunca tinha me faltado nada.

O advogado teve que me segurar na cadeira, pois eu queria gritar que era mentira.

Quando o fiscal soltou, que pelas provas de ADN, eu não era filho dele, mas sim do Bill, ele ficou furioso, perdeu os papeis, como se dizia, até isso eles me roubaram.

Tinha se casado com minha mãe, durante um período que Bill estava no exército, tinha sido dado como desaparecido, ela estava grávida, isso atestava um documento que estava em poder do advogado.   Meu avô materno, era um judeu muito rico, a tinha obrigado a se casar com separações de bens, ou seja ele não tinha direito a nada.   Por isso nunca tinha podido aceder ao que ela tinha.

Uma miserável seguiu falando, uma loira puta como todas as outras putas que apareceram aqui.

Todas mereciam morrer, lástima que só matei essa puta que era minha mulher.

Não houve como o fazer parar, ele disse que a tinha feito ir a casa do Bill, que tinha feito os dois entraram no carro, tinha dado um tiro na cabeça de cada um, jogado o carro no rio na parte mais profunda.    Olhou em minha direção, nesse momento me livrei desse bastardo, apontou para mim.

O que ele não esperava era que eu ficasse em pé, lhe grita-se assassino, me roubaste o que mais gostava na vida, meu querido tio Bill, bem como minha mãe, que vá para o inferno.

Ele abaixou a cabeça, nesse momento se fez uma grande confusão.  O juiz interrompeu o julgamento, mandou que me levassem ao seu gabinete, fui como fiscal, com os dois advogados. Contei tudo que sabia, que era mentira, que ele nunca tinha ido me visitar, que tinha passado todos esses anos preso na escola, nunca saindo para nada.

Virei para o juiz, perguntei se podia me considerar como maior, para me livrar dele.

Isso será outro processo, mas não vejo por que não.  Terás que seguir em frente.

Eu confessei que tinha pensado que realmente tinham fugido, porque os dois sempre se mostraram carinhosos um com o outro na minha frente.   Bill sempre segurava sua mão na hora de ir embora, lhe dava um beijo.

Quando sai, me apresentaram os meus avôs, os pais do Bill, me abraçaram com lagrimas nos olhos.  Eram pessoas simples, se quiseres vir viver conosco, será um prazer.

Ele era a viva imagem do Bill, que agora sabia que era meu pai. Me agarrei a ele, chorei muito.

Depois nessa noite jantaram na casa do advogado, enquanto eu não fosse independente, não podiam fazer nada.   Contei como o Bill se comportava comigo, as histórias que me contava, como me colocava na cama, o beijo que me dava na testa, esse outro, nunca se aproximou de mim.

Como dizia o advogado, era tudo como se fosse uma novela de mau gosto, tudo porque ele queria se casar com ela, pensando que seria rico.

No último dia do julgamento, seu advogado nem sabia o que dizer, porque já tinha perdido a causa.  Ele foi condenado a cadeia perpétua, sem direito a pedir liberdade.

Não fez nenhum movimento, tinha envelhecido uns 20 anos de um dia para o outro, ombros curvados, seguia olhando o tampo da mesa, passou por mim na saída, eu lhe virei as costas.

Tinha matado meu pai, minha mãe.

Dois dias depois, o juiz assinou minha independência, o advogado com um tabelião levaram na frente dele, o testamento dela, havia uma carta para mim, que coloquei no bolso, existiam muitas propriedades, que vinham do meu avô, inclusive seu imenso apartamento em Chelsea em NYC, além de dinheiro no banco, do parte de meu avô havia uma caixa forte que também me pertencia, que eu só tinha direito a abrir quando fizesse 18 anos, eu calculava com o dinheiro que receberia, teria dinheiro por muitos anos.

Nos dias seguintes, tiramos documentos de identidade, eu assumiria o sobrenome de minha mãe, me passava a chamar Lionel Stainer, não queria levar o dele de maneira nenhuma.

Deixei passar pelo menos duas semanas, falava todos os dias com meus avôs, eles viviam em Filadélfia, eu lhes disse que logo iria visita-los.

Só então, tive coragem de ler a carta.  Quando fores maior de idade, saberás que foste fruto de um amor muito grande.   Eu me apaixonei pelo Bill, logo que o vi, mas claro incluía seu amigo que sempre estava junto.    Quando Bill foi chamado para ir para o Vietnam, não houve maneira de escapar, meu marido sim, conseguiu.  Mal Bill embarcou, descobri que estava gravida, fiquei quieta, mas ele descobriu.  Nem um mês depois Bill foi declarado desaparecido em combate, ele me convenceu a me casar com ele, para que tivesses um sobrenome, que não te chamassem de bastardo.   Ele sabia o que era isso, pois não era filho do homem do qual levava o nome, o que descobri depois que era uma maneira de me enganar, não era verdade.

Anos depois quando recuperaram o Bill, ele quando voltou era um trapo de homem, tinha sido prisioneiro durante anos, era um cadáver ambulante, mas quando te viu, sorriu, disse que tu eras igual a ele quando criança.  Começou então um largo tratamento, que nunca soube quando ia acabar.   Pois seus traumas eram muito grande, pensei em pedir divórcio para cuidar dele, me disse que infelizmente já não tinha capacidade de amar mais, tinha perdido tudo.  Que a única coisa boa era te ver.

Por isso quando vem aqui em casa, gosta de ficar brincando contigo, contar histórias, te colocar na cama.   Mas fora isso, sua casa, é pequena, vive num quarto, que mais parece uma cela de um monge, não suporta muita gente junta, lhe dá medo.

Me diz sempre que bem ou mal, ele tem um pai que o criou.  Por mais que lhe explique que ele nunca se aproxima de ti, que te engole, porque senão não tem a vida que pediu a deus, com nosso dinheiro.

Agora Bill, esta melhor, tomei coragem, vou pedir o divórcio, não quero mais viver essa mentira, quero ter uma família com o Bill, ele nos ameaça de acabar conosco, te deixar sem pais, já falei com o advogado, ele nunca poderá se nos acontece algo, tocar no dinheiro que será para o teu futuro.

Teu avô meu pai, leva muito mal esse assunto, pois nunca gostou dele, tampouco gosta do Bill, diz que tem problemas demais com o que lhe aconteceu na guerra.

É uma verdade, poderia ser um homem violento, mas se transformou num homem frágil, está dividido, tem medo de causar problemas para ti.   Te ama muito, mas seu medo de não controlar sua neurose é muito grande.

Não importa, eu te amo demais meu filho, foste filho desse amor imenso que sinto por ele.

Beijos, tua mãe.

Ela sempre me dizia como te pareces ao teu pai, eu olhava o outro, não consigo mencionar seu nome, nunca me pareci com ele.

Sou loiro como ela, como o Bill, tenho os olhos dos dois, azuis, sou tão alto como ele era.

Fui visitar meus avôs, agora podia me mover sozinho, já tinha posse de meu dinheiro, aluguei um pequeno apartamento, não queria viver no que tinha sido do meu avô, que era imenso, imagina tinha vivido sempre num quarto normal no colégio, os quartos ali eram imensos.

Agora entendia o Bill, ele devia viver numa cela, porque sabia que não precisava mais do que tinha.

A casa dos meus avôs era muito simples, no quarto dele, estava igual segundo ela, nunca mudei nada, ali estavam seus troféus, de estudante, a maioria não eram de esporte, mas sim de debates que participava, era muito inteligente.

O velho me disse, que quando voltou, era assustador, ela pele e osso, nem sabiam como podia se manter em pé.  Levou anos para poder comer direito, se comia demais vomitava.

Tinha pesadelos horrorosos, pois dizia que o acordavam de noite para tortura-lo, durante o tempo que este aqui, passou a dormir num quarto em cima da garagem, mas podíamos escutar seus gritos de madrugada, me levaram até lá. Era um quarto pequeno, com uma cama simples, alguns livros em cima da mesa de cabeceira, um livro grande em cima da mesa que usava para estudar, embaixo da janela, tinha um livro sobre como criar um filho.

Disse aos meus avôs que dormiria ali esses dias, queria estar perto dele, se podia sentir seu cheiro.   Ela chorou muito, me contou que quando me viu a primeira vez, chegou aqui chorando, que nunca tinha pensado em ter um filho tão bonito.   Lhe perguntei se te ia reclamar, ele disse não posso, como vou cuidar de um filho se não consigo cuidar de mim mesmo, dos meus pesadelos.

Me deixaram ali sozinho, abri o livro, era um desses que falam das crianças desde que nasce, a margem estava escrito, não estive presente quando tudo isso aconteceu, como posso recuperar.

Depois haviam folhas soltar, eram pensamentos dele, de como podia fazer que eu o amasse.

Será que um dia me aceitará como pai.

Em outras paginas soltas, estava o que eu tinha conversado com ele nesse dia, como era minha risada, como o tinha feito feliz, ao deixar que me colocasse na cama, que lhe tinha falado que gostava demais disso.

Nessa noite sonhei com ele, sorria para mim, estava feliz.

Passei muito tempo com os velhos, eram gente simples, se espantavam como eu podia gostar de estar ali, contei como era minha vida no colégio, como era meu quarto, que como Bill, eu gostava de ler, que basicamente tinha lido todos os livros da biblioteca.

Que me dava muito bem com o cozinheiro, bem como o que era meu orientador, para o resto eu era o aluno perfeito, que absorvia todas as matérias.

Poderia inclusive me candidatar a uma bolsa de estudos na universidade, estava adiantado.

Mas confessei que não sabia o que fazer ainda, precisava de tempo para pensar.

Quem me deu de uma certa maneira uma solução, foi meu avô, me contou que Bill, tinha um sonho desde jovem, de ir pelo mundo, aprender coisas, seu sonho na verdade era a arte, mostrou dois desenhos dele, tem uma caixa, cheia de desenhos de ti.

Quando abri a caixa, ali estavam um estojo de aquarela, bem como cadernos de pintura, todas as páginas, tinha meu rosto, rindo, chorando, pedindo alguma coisa, as vezes tinha uma anotação, perdi tudo isso.   Muitas fotos minhas.

Fiquei com os pequenos pinceis, bem como o estojo de aquarela, me deram os cadernos, que levei comigo.

Me despedi deles, disse que ia realizar o sonho do Bill, antes de ir à universidade, tiraria um ano sabático, para conhecer os lugares que ele gostaria de ter ido.

Falei com o advogado, fomos ao banco, me deram um cartão de credito de estudante, assim eu poderia ir me movendo.

Tinha encontrado nessa caixa, uma série de guias turísticos velhos, os ordenei por época que tinha comprado, quais eram os seus interesses, tinha inclusive pequenos papeis que dizia o que queria conhecer.

Comecei por Berlin, comprei um bilhete de avião, me informei bem numa agência, a vendedora que me atendeu, me falou do tipo de hotéis que os jovens como eu faziam, eram hotéis dedicados a estudantes, como eu poderia ir me movendo, viajando de trem, sem pressa.

Assim fiz, visitei os museus, as pessoas riam, pois os guias turísticos eram velhos, mas não me importei, segui o que estava ali, se descobria alguma coisa nova tudo bem.

Comecei a formar na minha cabeça, a ideia de arte, tinha estudado história da arte na escola, mas claro eram informações sem muita profundidade, o que fiz foi comprar umas cadernetas Moleskine, anotava tudo que via, analisava o mesmo, quando chegava no hotel, existiam habitações compartidas, mas sempre pedia uma para mim em solitário, gostava do meu espaço, não queria compartir, durante o café da manhã, escutava o que iriam fazer durante o dia, mas quando chegava a noite que começavam a beber, a pensar em festa, eu sequer tinha curiosidade, não queria me perder, antes de realizar meus sonhos.

Me sentava no silêncio do quarto, escrevia minhas impressões das coisas que tinha visto durante o dia, alguma coisa que gostaria de ter falado com o Bill. Comparava sua anotações com o que tinha visto.

De Berlin, fui a Praga, foi uma viagem de trem fantástica, de lá fui para a Itália, fui conhecendo todos os lugares que ele pensava.  Ria as vezes sozinho, pois me lembrava de suas anotações.

Via os outros da minha idade em grupo, mas não me interessava, falava com eles, mas o que queria era ir ao meu ritmo, alguns bebiam demais, depois vomitavam, eu pensava que absurdo, depois quando falavam criticavam a maneira das pessoas viverem, pois não tinha nada a ver com América, então achavam um absurdo.   Pensavam esses quando voltem, jamais se lembraram do que viram.

Tiravam sim muitas fotos, pensei em comprar uma câmera mas preferia, fazer pequenos desenhos nos meus cadernos Moleskine, escrevia todas as conversas idiotas que escutava, para depois pensar a respeito.

Quando cheguei a Roma, fui obrigado a ficar num hotel maior, mas nada de luxo, escutava os turistas falando, pensava, os da minha idade serão estes amanhã, que se fixam em detalhes idiotas, sem olhar como vivem, como pensam os daqui.   Eu preferia conversar com as pessoas nos bares, restaurantes, os que não eram turísticos, para entender como levavam a vida, como pensavam.

Fui até o sul, ao final da bota, como dizem que forma Itália, voltei pelo litoral, era pleno verão todos iam a praia, não era meu campo de batalha, gostava de praias vazias, aonde pudesse estar sozinho, acabei entrando na França pelo sul. Fui conhecendo tudo que Bill tinha sonhado, agora era meu sonho, me divertia, comecei a conhecer gente, falava bem o francês, pois meus professores tinham sido bons, bem como amava a maneira deles cozinharem.

Todas as semanas falava com meus avôs, queria saber como estavam, falava do que tinha visto, dos sonhos de meu pai, agora conseguia chamar Bill de meu pai.

Meu avô falou que o psicólogo com o qual fazia terapia, tinham um diário que ele tinha deixado para o outro ler, tinha demorado a encontra-los, mas estava lá para mim quando quisesse.

Quando cheguei a Paris, era aonde tinha mais anotações do Bill, estava ali tudo que ele tinha sonhado conhecer, fiz isso primeiro, depois fui visitando os museus, parei numa loja para comprar mais Moleskine, escutei a conversa de dois jovens, eram estudantes de belas artes, fiquei curioso, perguntei aonde era, foram me mostrar, se fizeram de guias pela escola, até que um professor perguntou o que eu fazia ali.   Lhe expliquei que era Americano, que ainda não tinha me decidido, mostrei o Moleskine, aonde tinha desenhado várias coisas que tinham me chamado a atenção durante a viagem, claro era tudo em tamanho pequeno, buscou na sua sala uma lupa, disse que era incrível o que eu fazia em tamanho pequeno, que eram excelentes meus esboços.  Podia me apresentar para o semestre seguinte.

Fiquei feliz, quando falei com meu avô, ele me disse que minha avô não estava bem a tempos, que estava num hospital, que o tratamento era caro.  Desliguei falei imediatamente com o advogado, iria para lá, mas que a transferissem para um bom hospital, que tivesse do melhor.

Minha bagagem era pequena, tinha sim muitos Moleskines, tinha sempre viajado com o justo.

Tomei o primeiro voo, pela primeira vez viajei em primeira classe, pois era aonde tinha lugar.

Cheguei de madrugada em NYC, fui direto para Filadélfia, ela agora estava no melhor hospital da cidade, num quarto particular, ele estava com ela, segurava sua mão amorosamente.

Me abracei a ele, que chorava, ela estava entubada, estava em coma.

Voltou a si dois dias depois, abriu os olhos, me viu, confundiu com meu pai Bill, sorriu, morreu.

Foi duro para ele, mas fiquei ali ao lado dele.  No enterro, não tinha muita gente, ele sorriu tristemente dizendo que a maioria dos amigos tinham morrido.

Depois perguntei o que ele queria fazer, ficar vivendo ali, ir viver comigo, o que pensava em fazer.   Quero ficar aqui, o médico me disse que ele estava muito fraco, fiquei ali com ele, arrumei um professor de desenho, mostrei meus pequenos esboços, o homem ficou impressionado, eu achava graça, pois os tinha feito sem pretensões nenhuma.

Arrumei uma senhora que vinha limpar a casa, fazia comida para os dois, nos acostumamos a ficar horas sentados lado a lado na pequena sala, fui contando minha viagem para ele, as vezes lia o que tinha escrito, comparando as anotações de meu pai Bill, com as minhas, ele se matava de rir, ele sempre teve muita imaginação.

O senhor imagina, num museu em Paris, me peguei falando com ele, pois mencionava um quadro que ele parecia gostar muito, quando vi as pessoas me olhava, pois eu ia comentando como via o que ele tinha mencionado, mas eu o via igual.  Acabei tendo uma gargalhada, pois iam pensar que estava louco.   Teria adorado fazer esse viagem com ele.  Mas sentia a presença dele sempre.

Estar com meu avô facilitava, pois Bill era realmente muito parecido com ele.   Me entregou o diário que o psicólogo tinha entregado.   Li somente duas páginas, há muito sofrimento nessa parte, não fui capaz de ler tudo.

Nessa noite li as primeiras páginas, ele descrevia a jaula que tinha vivido muito tempo, primeiro com outros homens, à medida que esse foram morrendo, ele foi ficando sozinho, ao final, dizia que tinha conversado muito com ele mesmo, que os guerrilheiros, pensavam que ele estava louco.   Um deles o tinha ensinado a falar a sua língua, conversava com esse.   Mas também era o mesmo que os superiores mandavam torturar, depois vinha até a jaula, pedia perdão.

Chorava segurando sua mão, mas quando se aproximava alguém, o maltratava, foi esse homem que o liberou, meu pai o tinha ensinado a falar inglês, atravessou a selva toda com ele, se escondendo, as vezes o tinha carregado.   Eu já não devia pesar nada, pois me carregava como quem carrega um boneco.  Quando chegaram perto de um acampamento o deixou, desapareceu, depois o procurei quando acabou a guerra, mas nunca o encontrei, dizia seu nome.  Talvez tivesse sido morto.

Contava da aldeia que vivia, como tinha sido recrutado para ser guerrilheiro, os americanos tinham matado toda sua família, sua mulher, seus filhos, mas ele achava que Bill era boa pessoa, pois quando ele chorava, este secava suas lagrimas com os dedos.

Não morri, só por causa desse homem, devo minha vida a ele.

Depois a volta, os pesadelos, as torturas, foi então que me lembrei que ele não tinha unhas, tinham arrancado todas, seus dedos eram diferentes, alguns completamente torcidos, mas me fazia bem seus carinhos.

Quando soube que eu era seu filho, chorei como um condenado, que vontade tinha de poder abraça-lo como fazia quando era garoto.

Meu avô escutou que eu chorava, veio ficar perto de mim.  Me abraçou, cantou uma canção que ele cantava quando me colocava na cama.

Pela primeira vez tinha ódio do homem que me tinha arrebatado tudo isso.

Mas o interessante que ele não o culpava, procurava entender.

O mais terrível, foi ler que quando minha mãe quis fazer sexo com ele, explicar que era impossível, tinham lhe arrancado o escroto, ainda deram o mesmo para um cachorro sarnento que estava por ali.  Contava o medo que passou a ter dos cachorros quando se aproximavam dele.  Não tinha ereção nenhuma, não era mais um homem, mas o outro não entendia isso, um dia lhe mostrei para que visse do que eu falava, que não devia ter receio de mim.

O que aconteceu o deixou chocado, que o outro tinha abaixado, colocado seu membro na cara, o beijado.  Foi quando me confessou que tinha me amado desde que me conhecia, que ansiava que eu fizesse sexo com ele.   Depois riu amargamente, agora nem fazes com ela, nem comigo.

A pergunta se ele sabia disso, porque o tinha matado, bem como a ela.

Pediu ao advogado, se podia conseguir que falasse com ele.

Ficou horrorizado quando o viu, era um caco de pessoa, segundo soube depois estava viciado em drogas, tinham abusado dele ao princípio, mas agora era tratado como um lixo.

Falou do diário do Bill, levou um susto, quando perguntou se falava bem dele.

O amei desde o primeiro dia que o vi, quando éramos jovens uma vez fizemos sexo, depois ele nunca mais quis, dizia que iria destruir nossa amizade.  Buscava todos os homens que se pareciam com ele, me humilhava para ele me querer, mas quando conheceu tua mãe, ficou loucamente apaixonado, vê-los juntos era uma tortura.   Quando desapareceu, fiquei como louco a princípio, nos apoiamos um no outro.   Mas quando nasceste, ela te olhava de uma maneira que eu não suportava, sabia que ela via o Bill em ti.

Depois comecei a chegar tarde em casa nos dias que ele ia te ver, imaginava os dois fazendo sexo, era uma tortura, até o dia que ele me mostrou seu corpo, todo marcado pelas torturas que tinha sofrido.  Queria beijar cada ferida, mas ele não deixou, me explicou que jamais poderia fazer sexo.

Mas ela queria ir embora com ele, contigo, me deixando para trás, dizia que não suportava mais estar comigo, sabia do que eu andava fazendo, andando com putas, com homens que se parecessem a ele.

No julgamento só apareceram os trasvestis, mas na verdade houve muitos homens na minha vida.   Te mandei para um colégio, ou melhor disse ao teu avô, que não suportava tua presença, pois eras parecido com Bill, tinha medo de abusar de ti.   Por isso nunca fui te ver, saber que tinha matado meu melhor amigo, mas não suportava a ideia de que eles quisessem viver sem mim.

Quando estava muito perdido, ia me sentar na beira do rio, ficava conversando com os dois, me escondia para me masturbar, me lembrando da única vez que fizemos sexo.

Me perdoe, embora não seja digno disso.  Tenho Aids, não vou viver muito mais.

Lhe disse que o perdoava, pois imaginava viver como ele tinha vivido.

Nesse época meus desenhos ficaram negros, tinha escutado muita miséria, muito ódio, todas as coisas más do mundo.  Talvez por isso nunca me aproximava de ninguém.

Meu avô me aconselhou a ir a um psicólogo, pois me escutava as vezes chorando de noite.

Aceitei seu conselho, comecei a conversar com um senhor, fui falando tudo que tinha vivido, a solidão que tinha vivido na época da escola, a dificuldade de me aproximar inclusive com os da minha idade.   Lhe disse que não tinha experiência sexual nenhuma, que não me sentia atraído por ninguém.

Com o tempo fui melhorando, segundo meu professor, meus desenhos foram ficando mais claros, fiz meu primeiro quadro, um retrato do meu avô, ele ficou emocionado.

Meu professor dizia que eu deveria ir fazer um curso numa escola de Belas Artes, mas não queria deixar meu avô sozinho.   Um dia ele não se despertou, fiquei ali parado, chorando, pois tinha perdido o último elo com o meu passado.

Chamei o meu advogado que veio imediatamente, o enterramos ao lado de minha avó, bem como aonde estavam as cinzas de minha mãe, do Bill.

Ele tinha vendido o apartamento do meu avô em NYC, dizia que alugar era jogar dinheiro fora, tinha o feito por um bom preço, colocamos isso numa conta, que eu pudesse usar mais fácil.

Embora a casa do meu avô paterno agora era minha, me deixou de herança, eu voltaria a viver lá um dia.

Fui passar uma larga temporada estudando na escola de Beaux Arts de Paris, aluguei um studio, aonde pudesse viver, fui conhecendo gente, me obrigando a sair, só não fazia uma coisa, não bebia, nem consumia drogas, quando me cobravam lhes explicava que não era a minha.

Nem sentia curiosidade.

Um dia estava trabalhando num quadro na escola, o professor me apresentou o dono de uma galeria, foram até meu studio, viram tudo que eu tinha, me ofereceu uma exposição, foi assim que comecei a ser conhecido, Lion Stainer.

Tinha transporto para a tela, todo os sofrimentos do meu pai, isso impressionou muita gente, quando me entrevistaram fizeram perguntas a respeito, respondi sinceramente, que tudo se baseava nos diários de meu pai, do seu sofrimento como prisioneiro vietcong.

Fiz mais duas exposições, sobre outros assuntos que gostava, foi quando me apaixonei pela primeira vez.

Um homem se aproximou, disse que tinha conhecido meu pai na universidade.  Disse que nunca tinha se aproximado, pois os três formavam um grupo fechado.

Começamos a conversar, fomos jantar, ele era muito mais velho do que eu, mas me apaixonei assim mesmo, ele a principio se assustou, mas não me importei, voltei para viver com ele nos Estados Unidos.  Vivemos juntos até ele morrer.

Mandei reformar a casa do meu avô em Filadélfia, de tanto tempo fechada as paredes estavam mal, na reforma, transformei o andar de cima num grande studio aberto, passei a viver lá. De vez em quando fazia alguma exposição.

Sentia falta do meu companheiro, pois se uma das coisas que fazíamos muito era conversar, ele tinha ficado muitos anos trabalhando para o governo americano, nas embaixadas, tinha um bom relacionamento, me apresentou muita gente do meio de arte, pois tinha sido adido cultural fora do pais.

Alguns me criticavam, pois pensavam que estava com ele por dinheiro, ele se matava de rir, dizia que eu era milionário, o que era pobre era ele.

Trabalhava nessa época como se tivesse febre, meu trabalho foi mudando, era uma maneira diferente de ver a vida. As cores de repente apareceram em meu trabalho, cada vez foram ocupando mais e mais espaço.

Ele adorava, eu dizia que ele era isso para mim, vida.

Quando ele morreu eu tinha 40 anos, pensei nunca mais vou amar assim.  Tinha vivido com ele desde meus 26 anos, era muito tempo.   Nunca tinha feito sexo com mais ninguém, tampouco sentia necessidade.

Alguns se aproximavam de mim por interesse, graças a deus eu percebia de imediato.

Tinha um amigo seu, que vinha sempre ao studio conversar comigo, dizia que admirava o amor que eu tinha por ele.

Um dia de surpresa me apresentou seu filho, ele era gay, mas tinha sido casado antes.  Começamos a sair, ele pensava muitas coisas como eu, sentia que sua mãe o tinha pressionado muito para odiar seu pai, que isso o tinha feito perder tempo de viver com um homem a quem amava. 

Um dia começamos a brincar, acabamos fazendo sexo.   Ele se achava heterossexual, nunca tinha imaginado nada disso, no dia seguinte disse que tinha que pensar, sumiu uma semana sem dar notícias.

Um dia voltou, disse que não tinha conseguido me tirar da sua cabeça, começamos a viver juntos, saímos com seu pai, este tinha uma agenda impressionante, pois adorava uma festa, ir dançar, a nós não, gostávamos de estar no nosso canto, lendo, escutando música, um agarrado ao outro.

Quando fui para Filadélfia, ele conseguiu ser transferido para lá.

A principio estranhou um pouco, mas estávamos perto de NYC, quando queríamos escapávamos um final de semana, mas avisava ao pai, queremos estar contigo, não com um bando de gente.

O pai me agradecia, fazer feliz ao seu filho.

Vivemos juntos até hoje, agora temos quatro filhos adotivos, tivemos que ampliar a casa, imaginava meus avôs como estariam contentes com isso, escutar ruídos de crianças pela casa.

A vida seguiu em frente como sempre, nada para nunca.

 

 

 

 

 

lunes, 18 de julio de 2022

WILDER

 

                                                       WILDER

 

Wilder Van Heldfer, tinha terminado o curso para ser policial, tinha estendido o maior tempo possível, pois já saia como inspetor.  Durante o curso tinha sido o alzaimer do grupo, pois era o mais velho de todos os candidatos.  Além de levar a sério tudo, tinha se destacado em mil coisas, lutas, inteligência, era o melhor aluno, questionava os professores para entender direito o que explicava, isso aborrecia os outros que na verdade queriam um emprego fixo, mas claro ele queria mais.

Tinha retirado o Van de seu nome, pois sempre causava problemas, ele se identificava como Wilder Heldfer, ficava mais fácil, não tinha que dar muitas explicações.

Era der Arnhem, mas tinha passado os últimos seis anos, viajando fora do pais.  Tudo tinha a ver com sua infância.  Sua mãe era a última de uma família, que tinha perdido quase tudo durante a guerra, era filha de um oficial alemão, que abusou de sua mãe, primeiro porque usavam a mansão familiar, como posto avançado da Gestapo.

Quando acabou a guerra, ela foi tratada como uma colaboradora, acabou sendo criada pelo seu avô.  Cresceu rodeada de problemas, ninguém queria nada do velho, que tinha um humor horrível.  Na mansão só viviam ele, uma mulher que cuidava de tudo, além da minha mãe, ela estudou um pouco para não ser analfabeta.   Mas já com 18 anos, era uma pessoa amargada, o jeito foi ir para a Alemanha, viveu anos em Berlin, um dia voltou gravida.  Não sabia quem era o pai da criança, tinha sido uma pessoa que fazia sexo com todos os homens que lhe interessavam.   Quando seu avô morreu antes de ele nascer, ela herdou tudo, terras, dinheiro, a mansão.   Anos mais tarde passou a viver com o homem que foi um pai para ele.  Um antigo marinheiro, que lhe contava história dos países por aonde tinha estado.  Esse homem ajudava a cultivar um pouco de terras, para sustento deles, quando ele foi a escola, quem o levava era o Hoof, viu que os garotos queriam abusar dele, o ensinou a se defender, boxe, karate, outros sistemas de defesa, com dez anos ele cresceu demais, as calças eram sempre curtas para ele.

Usavam uma pequena parte da mansão, tudo acontecia na grande cozinha, que era a parte mais quente da casa no inverno, a mais fresca no verão.  Ali só existia uma rádio, nada mais, televisão nem pensar.   Com os anos ajudou sua mãe, que quando não estava bêbada, cuidava do Hoof, ele se fez forte, pois agora cuidava sozinho do pouco de campo que exploravam, ficou grande musculoso, era o melhor aluno da escola, se saia bem em línguas, amava a geografia, bem como a história, ciências, tudo que podia aprender.  Não havia dinheiro para ir à universidade, se matriculou para estudar enfermaria, que era o que existia na cidade.  A prática era cuidar de sua mãe, quando esta morreu, ele tinha 20 anos.  Resolveu realizar seu sonho, a partir das histórias do Hoof.    Ele tinha falado de uma companhia de navegação, falava sempre do dono, procurou por este, queria trabalhar nos navios.  O homem disse que o contratava, a primeira pergunta que lhe fez, aonde anda esse maldito comandante Hoof, o melhor homem que eu tive.

Quando falou que tinha cuidado dele até morrer, que o tinha enterrado no pequeno cemitério da mansão, o homem o abraçou.

Fez uma coisa que tinha pensado muito, mesmo conversado com sua mãe antes dela morrer.

Havia gente interessada na mansão, bem como nas terras cultivadas, atrás de tudo tinha um bosque.

Falou com o advogado, vendia essa parte a mansão, as terras cultivadas, mas o bosque não, queria o manter intacto, pois ali estava o cemitério da família.

Pagaram todos os impostos atrasados, lhe sobrava muito dinheiro, colocou tudo num banco para render, em seguida embarcou em sua primeira viagem.  Um barco que estaria muito tempo fora, foram descendo, o primeiro porto foi na Irlanda, depois Portugal, vários lugares de Africa.  Ele era o enfermeiro de bordo, bem como ajudante do comandante, além de ajudar quando estava livre na cozinha.  Em cada porto, os homens desciam para ir de putas, tomar uma boa bebedeira, que ele cuidava depois.   Ele ao contrário, descia, ia conhecer a cidade, na Africa chamava muita atenção, muito branco, enorme, tinha 1,98 metros, com sapato dois, ombros largos, pernas imensas, uns braços que pareciam troncos, ninguém se metia com ele, não gostava de beber, pois tinha visto os estragos tanto no Hoof como em sua mãe, tinha provado todas as bebidas, para saber que não gostava.   

O comandante ria muito com ele, por isso, tinha conhecido o Hoof quando era jovem.   Imagino que ele te contou muitas histórias, ele viajou pelo vasto mundo depois da guerra, conhecia todas as rotas.  Quando tinha tempo livre, estudava com o comandante os mapas, adorava as noites de céu aberto, para estudar as estrelas como o homem gostava.

Os outros marinheiros tinham um certo ciúmes dele, pois achavam que ele tinha alguma coisa com o comandante.  Foram até a China, retornaram, ele agora tinha a pele mais escura dos dias de sol trabalhando com os outros marinheiros, aprendeu a jogar poker com eles.  Todos comentavam que ele era sério demais.  Mas o respeitavam, pois cuidava deles quando estavam de porre, ou quando tinham algum problema, aprenderam a contar seus problemas para ele, pois sabiam que ele nunca comentava nada.

A grande incógnita era o que ele fazia quando descia do navio, algumas vezes o seguiram, mas viram que ele apenas descobria as cidades, que ia anotando tudo que via num livrinho de notas.

Quando voltaram depositou na sua conta uma parte do dinheiro ganho durante todos esses meses. 

Conversou com o proprietário, a viagem seguinte seria diferente, atravessariam o canal de Panamá, para irem ao Japão, ele perguntou se podia ficar um tempo lá.  Iria num barco, ficaria seis meses, voltaria no seguinte, que faria um outro roteiro.   O homem conseguiu para ele, que no seu passaporte tivesse um visto para esse tempo.

No barco, tinha um japonês, velho, bem curtido, ele lhe foi ensinando um básico em japonês, se admirava da facilidade dele.   Era o cozinheiro, se chamava Saturo, lhe ensinou a fazer uma boa sopa japonesa, como gostava o comandante, estudou roteiros com ele, falava tanto dos lugares, que lhe bateu saudade, pode ser que desembarque contigo, não vou ao meu pais a anos.  Lhe deu endereço de sua família, bem como cartas, pequenos pacotes para entregar.

Desceu no porto de Yokohama, se despediu de seu amigo, foi primeiro conhecer a cidade, dali foi para Tokyo, passou seis meses viajando, acabou ficando mais tempo, agora tinha nas costas um imenso peixe Koi, uma tatuagem imensa, em cada lugar que ia, o primeiro lugar que procurava era um local de artes marciais.

Aprendeu mais sobre a língua, visitou o pais inteiro, tinha anotado todos os lugares que falava o Hoof, agora tinha sua própria ideia sobre o lugar, bem como o que era fantasia do outro.

A seguinte viagem que fez, desceu em San Francisco, atravessou até NYC, levou meses fazendo isso, comprou uma moto, fez todo o caminho assim.  Lá com outro barco voltou para casa, levando sua moto.  Foi quando entrou para a academia de polícia.  Quando o designaram para trabalhar em Amsterdam, conhecia bem a cidade.  Falando com a dona do pequeno hotel que ficava, lhe perguntou se tinha algum lugar para alugar ou para vender.  Ela lhe falou de um apartamento, é um primeiro andar, na parte baixa vive meu filho, não creio que lhe incomode que deixes a moto na entrada.

Foram até lá, a senhora lhe avisou, não se assuste com meu filho, não disse mais nada.

Era como se fosse uma loja no andar de baixo, com os vidros todos tapados de tinta branca, apertou a campainha, quem abriu a porta foi um homem tão alto como ele, barbudo, mas com os lábios pintados de vermelho, com as unhas pintadas de negro, o fez entrar, abraçou a mãe, lhe dando um beijo na cabeça.  Venha, ele vivia na parte de trás da loja, pelo visto era uma antiga alfaiataria, este estava costurando um vestido cheio de lantejoulas, mas ao mesmo tempo aquilo estava abarrotado de livros, ele disse minha perdição.

Disse a mãe, deixa que eu mostro o apartamento para o senhor.

Nada de senhor me chamo Wilder, ou Wil, simplesmente.  Meu único problema é minha moto.

Sem problemas, podes deixar na parte da frente, te darei uma chave.

A senhora foi embora, dizendo podes combinar tudo com Andrew, quando subiram a escada, viu que ele estava descalço, com um pé imenso.

Tenho dores no pé, pois estive a noite inteira de sapatos alto, tenho um bar gay, mas tenho que tomar conta todas as noites.

Quando perguntou o que ele iria fazer na cidade, riu quando ele disse que era policial.

Imagina um travesti vivendo lado a lado com um policial.

Não vejo problema, cada um tem, direito a viver como quer.

Desde o primeiro momento amou o lugar, estava em frente a um dos muitos canais, era um apartamento comprido, sem nenhuma divisória, como se fosse um loft, a única coisa fechada era um banheiro grande, como ele gostava, contou que tinha passado apertado em muitos navios pelo tamanho dos banheiros.

Navio, perguntou o Andrews.

Sim trabalhei muito tempo em navios, andando pelo mundo.

O outro disse que ia adorar, montar um puteiro num navio.

A única coisa que não gostou, foi a cor das paredes.  Posso pintar tudo de branco.

Claro que sim, disse o preço do aluguel, colado a parede do banheiro tinha uma pequena cozinha americana.

Terei que trazer uns moveis que tenho guardado num armazém a anos em Arnhem, aonde vivi toda minha vida.

Antes de começar a trabalhar, começou a pintar o apartamento, tinha pedido que lhe mandasse os moveis, a única coisa que comprou foi uma cama imensa, pois como era grande queria espaço.

Quando chegaram os moveis Andrew lhe ajudou a arrumar, ainda lhe conseguiu uma estante para livros, pois tinha comprado várias numa livraria que tinha sido reformada.

Riu muito quando viu a maioria dos livros, todos falavam de viagens.

Porque agora, resolveste ficar definitivamente em terra firme.

Vi o que queria ver.  Colocou nas estantes suas cadernetas todas, que anotava as coisas que via.

Quando Andrew o viu sem camisa, ficou de boca aberta, seu corpo era músculos puros, a tatuagem que tomava toda sua costas, o impressionaram, perguntou se podia passar a mão, quando viram se beijavam, fizeram sexo ali mesmo no chão.

Caralho, terei um amante no andar de cima.

Vá com calma, não gosto de estar preso a ninguém, gosto de mulheres também, portanto, vamos com calma.

Quando o apartamento ficou como ele queria, o Andrew lhe fez umas cortinas fantásticas para poder dormir de noite, pois havia um poste de luz justo na frente.

Quando viu suas roupas, amou um jaquetão de marinheiro americano, bem como as calças de lã a famosa de seis botões na frente.

Isso nem existe mais.

Sim comprei numa loja que vendiam coisas velhas, por um acaso, encontrei do meu tamanho, serviu para atravessar os estados unidos, bem como uma calça de couro.

Foi no primeiro dia com um traje que o Andrew lhe emprestou, mas quando viu que todo mundo trabalhava a paisana, no outro dia foi com uma calça de couro, bem como um casaco de couro também daqueles antigos de motociclista.

Quando parou sua moto na frente da delegacia, um policial lhe disse que não podia parar ali, mostrou sua placa o outro engoliu em seco.

Se apresentou ao que seria seu chefe, este tinha na sua frente todo seu curriculum.  Ou seja eras o mais velho de sua promoção, pelo que vejo aqui, andaste viajando uma bela parte do mundo.

Lhe contou do Hoof, ele tinha sido marinheiro, me falava tanto desses lugares exóticos, que tinha que ver por mim mesmo.

Lhe apresentou o homem que seria seu parceiro no trabalho, era muito mais velho do que ele, o homem o examinou de cima a baixo, riu do seu cabelo cortado curto, parecia que era calvo, pois seu cabelo loiro era tão claro que parecia branco.

Na primeira saída, o outro lhe explicou que estavam caçando, esse foi o termo, caçando um homem que vendia drogas a menores de idade.

Visitaram os pontos aonde se dizia que o mesmo atuava, o dito cujo era esperto, conhecia com detalhes as ruelas do centro da cidade.  Ao parecer ele atuava principalmente nas ruas conhecidas como vermelhas, por ser lugar de prostituição.

Essa noite ficaremos observando.   Nisso ele era bom, tinham sempre muitos jovens andando por ali, contando seu dinheiro para ir de putas.  Finalmente viu o homem, era magro, meio desdentado, parecia um mendigo, dava a sensação que pedia esmola, mas vendia drogas.

Ele com seu andar descuidado, foi se aproximando, quando esteve perto do homem, este lhe ofereceu drogas, fez que ia comprar, mas este quando viu, já estava com algemas no braço.

Nisso viu um outro, que era quem lhe dava a droga para vender, tentar escapar. Deixou seu companheiro com o homem, saiu atrás do outro, se o outro conhecia as ruelas, ele também conhecia, correr era com ele mesmo.  Quando o outro pensou que estava livre, olhando para trás não viu que aquele homem imenso estava na frente dele.

Levou um susto tremendo, primeiro quis suborna-lo, mas era tarde já estava algemado.

Puta merda falou seu companheiro, levou um mês atrás desse filho da puta, o consegues pegar no teu primeiro dia.

Seu companheiro se chamava Bonny, de Bonifácio, era descendente de portugueses.

Ficaram amigos, discutiam cada caso até a exaustão, no caso das drogas, o que entregava para o velho era apenas um intermediário, tinham que resolver como segui-lo.

Ele teve uma ideia, colocaram um sinalizador na barra das calças do outro, bem como no salto do sapato outra.

Alguém pagou sua fiança, como não tinha antecedentes, o liberaram.  O velho dava pena, era um sem-teto, era sua maneira de ganhar alguma coisa para comer.  Ninguém pagou sua fiança, iria para a prisão, como começava o inverno, soltou, pelo menos terei comida, um lugar para dormir.   Ele não sabia de aonde o outro tirava drogas.

Começaram a seguir o outro, precisavam pegar o cabeça do negócio.

No seu primeiro final de semana foi conhecer o lugar que era do Andrew, era uma pequena casa de show, ele disse que não atuava mais, mas montava os espetáculos.

Tinham feito sexo mais umas duas vezes, mas depois o Andrew descia para dormir na sua casa.

Um dia entrou o viu na cama com uma mulher, nunca mais subiu, disse depois que não sabia dividir as pessoas, por isso sempre estava sozinho.

Na verdade, ele sabia disso, era uma maneira de dizer ao outro que era livre.

Gostava mais de fazer sexo com homens pois para ele era como uma luta livre.

Dias depois, encontraram o traficante morto num beco, alguém tinha liquidado o cabo solto.

Seguiram trabalhando, observando, até que conseguiram chegar ao chefe, era um chines, que importava drogas da china, de outros países asiáticos.

Não gostava de conduzir carros em Amsterdam, quando seu companheiro foi ferido numa redada contra as drogas, ele perguntou ao chefe se não podia trabalhar sozinho, assim iria mais rápido na sua moto.   Esse perfil também lhe ajudava.

As vezes chegava em casa cansado, tomava um banho, se podia dormir a mais, fechava as cortinas deixando o apartamento as escuras, se jogava nu na cama, colocava antes o despertador, dormia a pernas soltas.

Andrew nunca mais subiu, mas ele seguia indo ao seu local nos dias que tinha livre, ficava observando as pessoas, nunca bebia, quando muito uma coca cola.

Um dia estava na barra, entrou um homem mulato, do seu tamanho, vestia uma roupa diferente, muito formal, de terno, gravata.

Se encostou na barra, ficou como ele observando. Sem querer começaram a conversar, pois estavam um observando o outro.

O outro se apresentou como Bill Bernstein, ficaram ali conversando, lhe contou que era editor de livros, que tinha se divorciado a pouco tempo.

Saíram para conversar fora porque o barulho era imenso.  No beco ao lado se beijaram, o outro era ardente. O levou para sua casa, os dois nus era impressionante.  Na cama era como uma batalha, tinham os mesmos gostos.  Dormiu pela primeira vez abraçado a outra pessoa.

Tomaram café da manhã juntos.  Cada um contando a sua vida.   Bill disse que tinha um filho adolescente, que vivia com a mãe, eu voltei a viver na casa da minha mãe, mas é um inferno, pois me acusa o tempo todo de não ser um bom pai.  O pior é que me compara com o meu, que era um bom filho da puta.

Mas não fui eu que pedi o divórcio, sim ela, pois conheceu outro homem, vai se casar com ele, tem muito dinheiro.

Bill foi ficando, se encontravam várias vezes durante a semana, o chamava pelo celular, para dizer quando estava livre, vinha dormir com ele.

Um dia se despertou pela manhã, ele estava lendo um dos seus cadernos de anotações sobre o Japão.  Impressionante, gosto como escrever, podias ampliar isso, escrever um livro sobre esses seus passeios, as observações que fazes.

Mesmo com os elogios, Wilder não gostou, era como tentar descobrir no fundo quem ele era, nunca fazia perguntas sobre a vida do Bill, tampouco tinha feito de outras pessoas que convivia, porque senão, teria que investigar, isso já bastava o trabalho que tinha.

Disse claramente ao Bill, isso, não gosto que mexam nas minhas coisas, por favor, deixe essa livreta no lugar que a encontrou.

Bill, não entendeu, mas estou elogiando tua maneira de escrever, as observações que fazes.

Por isso estou na polícia, pois sou bom em observar, perceber as coisas, mas na minha vida intima, não gosto que procurem saber quem eu sou.  Isso é um direito meu.  Virou as costas, foi tomar banho para ir trabalhar, passou o dia inteiro irritado.

Evitou o Bill durante uma semana, sempre tinha uma desculpas, embora tivessem se dado bem, não gostava de certos comportamentos.  

Comentou isso com o Andrew, seria o mesmo que eu estivesse buscando na tua vida, coisas intimas, quando fizemos sexo, em momento algum me preocupei sobre quem eras, queria sim disfrutar do momento, não gosto que queiram se apossar de minha vida.

Justo nesse dia, se falou do terremoto no Japão, que tinha arrasado várias cidades, principalmente Kyoto, uma cidade que tinha amado, que tinha conhecido sua parte antiga, cada rua, ruelas, os tipos de pessoas que ali viviam.

Soube que uma equipe de bombeiros iria até lá para prestar ajuda, se informou, se candidatou a ir junto, tinha a vantagem de falar a língua.  O aceitaram, deixou dinheiro com o Andrew, para o apartamento, arrumou um saco de viagem, se incorporou no grupo.

No avião, que ia via Paris, notou um japonês que estava muito aflito, sentava-se ao seu lado, começou a falar com o mesmo.  Este vivia em Paris, seus avôs, pelos quais tinha sido criado, viviam justo na parte antiga da cidade.    Lhe disse aonde estariam, se puder ser de ajuda, me avisa.

Mal chegaram se viram desbordados pelo caos, embora organizado, como eram os japoneses, sabia que isso era normal, se apresentaram as autoridades, ele informou que conhecia muito bem a parte antiga da cidade.  Com um mapa, guiou os bombeiros, começaram a ajudar as pessoas, se encontrou com o rapaz do avião, olhava desesperado, uma pequena casa num beco da qual não sobrava nada, o ajudou a começar a retirar as coisas, notou um homem que se aproximou, começando a ajudar sem falar uma palavra. Acabaram encontrando o casal, abraçados, na parte baixa da casa, mortos, tinha havido um escapamento de gás.

Só então entendeu que o homem era o pai do rapaz.   Tirou sua camisa, para tapar a cara dos velhos, viu que ele devia ser da Yakuza, pois tinha o corpo todo tatuado.  Encaminharam os velhos para um lugar, para lhe darem sepulturas.

O homem sem uma palavra não saia de seu lado. Viu que ele dava ordens em japonês, só então falou com ele, trabalhavam vários dias ali, lado a lado.

Entre pai e filho, não escutou nenhuma palavra.   Num momento de descanso, quando os voluntários trouxeram comida, se sentaram lado a lado, o rapaz o mais distante possível.

Meu filho nunca aceitou meu modo de vida, sou tatuador, além de ser gay, me casei por exigência de meus pais, depois que tive o neto que queriam fui viver minha vida, meu pai não aceitou isso, estava acostumado a que suas ordens fossem obedecidas, o resto dos meus irmãos emigraram para o Brasil, ou para Estados Unidos.   Meu filho estuda em Paris, mas se nega a falar comigo, diz que sou mau pai.   Mas sou eu que pago todas suas despesas.

Ele entendia, começaram a conversar, a cada tempo que tinham livres.

Comentou com ele que era policial, que vivia em Amsterdam.

Estive lá uma vez, num encontro de tatuadores.

Levantou sua camisa, mostrando o tatuagem que tinha nas costas.

Ele foi direto, disse quem tinha feito a mesma, tem um estilo próprio como eu.

Acabaram ficando amigos, Tanaka, vivia uma parte do tempo em Kumamoto, numa ponta do pais.   Demorei para decidir vir, pois meus pais não falavam comigo, embora eu os sustentasse.

Quando acabaram tudo, avisou a delegacia que ficaria mais um tempo, foi com Tanaka a Kumamoto, ficou maravilhado com sua casa, vivia no meio de uma bosque, em uma casa construída por ele mesmo, era pequena, mas totalmente original, como as casas antigas, com todas as tradições.    Quando fizeram sexo, foi como estar numa guerra, nenhum dos dois eram frágeis, mas se entendiam na cama.

O filho veio falar com o pai, quando deu de cara com o Holandês, não gostou muito, trazia as cinzas dos avôs para serem colocadas num altar, aonde já estava sua mãe, ali no meio do bosque.

Se despediu, agradeceu a ajuda, mais nada.

Entendo teu comportamento Wilder, não interfere nos problemas alheios, isso é bom, nunca devemos devastar a vida dos outros.  Ah partes que são intimas.

Os dois se entendiam sem falarem muito.   Inclusive, fez duas tatuagens lhe cobrindo os dois braços.   Como se ele soubesse de sua vida anterior, foi descrevendo nas tatuagens sua vida.

Wilder ficou impressionado.  O mesmo acontecia com as pessoas que vinham fazer algum tatuagem, ele não tinha nenhum mostruário de desenhos, a pessoa se sentava ou deitava, ele começava a trabalhar em silencio.   Sempre surpreendia as mesma por esse detalhe, contava suas vidas, seus desejos.

Wilder estava amando ficar por lá, enquanto o outro trabalhava, ele escrevia sobre tudo que tinha visto, inclusive falava desse sentido das pessoas não precisarem falar muito, mas sim observar a outra.   Pela manhã, o acompanhava nos seus exercícios de concentração, sentia que estava liberando uma parte dele mesmo.  Sentia-se em paz com tudo em sua volta.

Um dia falou do bosque que era de sua propriedade, o único que não tinha vendido.  Pela primeira vez, Tanaka disse que gostaria de explorar esse lugar.

Posso ir contigo?

Claro que sim, tinha decidido não seguir na polícia, aliás acreditava que tinha perdido seu trabalho pelo tempo que estava ausente, não tinha notado o tempo que estava lá.

Quando embarcaram, um policial lhe disse que seu tempo de permanência tinha sido extrapolado, que da próxima vez pedisse um tempo maior de permanência.

Levou Tanaka para seu apartamento, falou como Andrew, que olhou os dois, disse que tinha entendido por que ele tinha demorado tanto tempo.

Lhe comentou que Bill o tinha procurado várias vezes, foi falar comigo no bar, lhe disse que estava fora do pais.   Creio que esta enrolado com um jovem, não gosto muito do mesmo, mas claro não interfiro, cada um deve saber o que fazer da sua vida.

Deixou Tanaka no apartamento, lhe explicou que tinha que resolver seu problema na delegacia, depois iriam para seu bosque.

Claro já tinham feito um processo por abandono de trabalho, foi fácil finalizar tudo, pedindo a demissão.  O chefe lamentou sua perda, pois tinha como um dos seus melhores homens, lhe perguntou se ia retomar suas viagens.

Lhe respondeu que ainda não sabia, seus companheiros queriam ver suas novas tatuagens. Quando comentou que o tatuador estava ali, todos queriam fazer tatuagem, quando falou com o Tanaka, ele disse que sim, que precisava de uma cadeira, uma cama de armar, tinha trazido seu material de trabalho.  O primeiro a fazer um tatuagem imenso foi o Andrew, quando ele quis dizer o que queria, lhe explicou como funcionava a coisa, que ele tampouco falava enquanto trabalhava.  Trouxe uma mesa pequena para baixo, ali se sentava, escrevendo, sem falar.

Andrew disse que como era possível duas pessoas se entenderem sem falar muito.

Lhe explicou, desfrutamos disso, Andrew, através de nosso silêncio nos comunicamos.

Depois tiraram o final de semana para irem ao bosque, arrumou a moto, se vestiram como deviam, gostava desse contacto dele sentado atrás abraçado a ele, pela cintura.

Tanaka era mais baixo, mas inclusive para um japonês tinha uma boa estatura.

Quando chegaram mostrou ao Tanaka a mansão aonde tinha sido criado, lhe explicou que só usavam uma mínima parte da mesma, hoje era um hotel de luxo.

Tinham levado uma tenda, bem como sacos de dormir para acampar, avisou ao do hotel que não estranhassem, pois estariam acampado no bosque.

O dono lhe disse, que muitos clientes lhe tinham perguntado se podia caçar ali?

De maneira nenhuma, quero que o lugar siga como está.

Tanaka dava dois passos parava, para observar tudo em volta, começou a fazer como ele, isso o fez lembrar-se de coisas de sua infância, quando se escapava para o bosque, quando não aguentava mais sua mãe, que nessas alturas estava completamente bêbada, foi lhe mostrando seus lugares prediletos, o pequeno cemitério da família, foram cada vez se adentrando mais no bosque.  Chegaram a uma clareira que ele não se lembrava mais, em que um pequeno riacho em determinado momento, entrava por uma fenda.   Tanaka que até então estava em silencio, comentou que embaixo devia ter uma gruta, montaram as coisas, começaram a explorar, até que encontraram mais abaixo uma entrada, que estava tapada por arbustos.

Com muito custo conseguiram entrar, levavam lanternas poderosas, que tinham trazido, dava primeiro para uma pequena cova, mas seguindo o ruido da água que caia, foram entrando por um corredor estreito, acabaram num grande salão aonde caia a agua do riacho como uma cascata.   Ficaram surpresos, porque encontraram ali, caixas de armas, de munições, a maioria estragadas pela humidade.   Eram armas alemãs, com certeza escondidas ali, pelos partisanos dessa zona.

Não se via que outras pessoas pudessem ter entrado ali.  Aproveitaram para se banhar no pequeno lago que fazia a partir da cascata.  Como sempre que estavam nus, fizeram sexo ali mesmo.

Resolveram acampar, justo na primeira parte da cova, assim estariam protegidos caso chovesse.

No dia seguinte foram até a delegacia da pequena cidade, comentaram com o inspetor chefe do que tinham encontrado, rapidamente, juntou um pequeno grupo, recolheram tudo que estava ali, a partir de agora seria o pequeno paraíso deles.

Tanaka, ajudado por ele, construiu uma pequena cabana, justo na frente da entrada da cova, era mais um despiste para evitar a entrada de estranhos, comprou uma mesa, para poder escrever, bem como um laptop, com uma bateria a mais, quando iam a vila, carregava as mesmas.

Tanaka construiu um fogão de lenha rudimentar, para fazer a comida deles, o dia começava com um bom exercício, depois iam andar pela floresta, caçar, que faziam com arco e flecha, nada de armas de fogo.

Perdeu a conta dos dias da semana, meses, anos que viviam ali.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

lunes, 11 de julio de 2022

BRIAN STRIKE

 

                                       BRIAN STRIKE

 

Seu nome era Brian Strike, era tenente coronel do exército americano, as coisas começaram a andar mal, justo no dia que deixava o Afeganistão.    Estava num jipe indo em direção ao aeroporto militar, quando lançaram um projetil a larga distância, o veículo pareceu voar, a cara do rapaz que dirigia o mesmo, era surpreendente, não entendia o que acontecia, quando pousou na terra de cabeça para baixo, ao mesmo tempo começaram a metralhar o comboio que os seguia, ele estava preso nas ferragens, o rapaz ao contrário estava numa posição incrível.   Agora se lembrava de tudo, antes tudo, que podia ver era negro, ia aos poucos voltando a si.

Viu uma mulher com roupa de enfermeira, entendeu imediatamente que estava num hospital, mas se tocou que não era no acampamento, pois ali, as enfermeiras militar não se vestiam de branco.

Não podia falar pois sentiu que estava entubado. Nesse momento entrou um médico, com certeza chamado pela enfermeira, fez sinal de silêncio, não tente falar, já vamos tirar os tubos.  Ficou quieto, com os olhos passeando pelo local.

A primeira coisa que lhe deram foi um pouco de água, podia sentir a mesma descendo pelo seu corpo, pediu mais.  Agora aos poucos deixava de sentir a garganta seca.

Aonde estou, foi o que perguntou?

Estas na Alemanha, acabas de sair de coma, depois de um mês, foste operado duas vezes, mas está tudo estabilizado.  

Queria se mover na cama, mas não sentia as pernas, primeiro pensou como já tinha visto muitas vezes, os jovens com as pernas amputadas, andando com próteses dessas modernas.

Fez uma cara de interrogação? O que me aconteceu?

Bom houve primeiro um problema sério na sua coluna, foram destruídas duas vertebras, não sabemos quando poderás voltar a andar, nem quanto tempo de fisioterapia será necessário.

Tudo que sabemos até agora, é que tiramos duas balas que te atingiram, uma na perna, outra no ombro esquerdo. Quando te retiraram do veículo, estavas de cabeça para baixo, ou seja todo sangue foi para baixo, quiça isso tenha te protegido.

Mas até conseguirem te retirar foi difícil, já estavam dando como morto quando suspirastes perguntando pelo rapaz ao teu lado.

Infelizmente não sobreviveu, porque uma das balas atravessou sua cabeça.

Sentiu uma lastima imensa, era seu ajudante de ordens, um rapaz que nunca deveria estar na guerra, não estava preparado para o que ia encontrar.   Ele ao contrário, já tinha estado em muitos frente de batalha, tinha visto muitos desses jovens morrerem da maneira mais idiotas possíveis.

Pior é que sabia que era filho único, de pais mais velhos, sabia que eram controladores, que o mesmo tinha entrado no exército para fugir do mesmos.

Estavam indo para o aeroporto, porque ele voltava para Washington, para trabalhar um tempo no pentágono, estava contente, pois pelo menos sairia um tempo de tudo isso.

Dois dias depois conseguiu falar com seus pais. Estavam claro preocupadíssimos, pois tinham sido avisados.   Disse que não saberia o tempo que ficaria na Alemanha pelo que tinha falado o médico, tentaria que o levassem para um hospital em San Francisco, assim estaria perto de sua família.

Seus pais reclamavam sempre que ele não tinha se casado, nem poderia, pois via a quantidade de casais complicados, quase todos seus conhecidos, que tinham casado, tinham problemas, ou bebiam demais, ou as coisas nunca iam bem.    Ele tinha o dom de saber escutar as pessoas, por isso todos desabafavam com ele, pois nunca comentava nada com outras pessoas.

Muitos pesavam que era gay, pois nunca o viam com ninguém.  O que era uma verdade, nunca tinha se apaixonado na vida.   Não era feio, ao contrário, tinha uma boa aparência, alto, tinha quase um metro e noventa, um corpo espetacular segundo diziam.   Pensou vamos ver como me saio agora com os exercícios sempre tinha tido facilidade para fazer exercícios.

Tinha entrado para o exército, como uma maneira de subir escalões, pois graças ao seu irmão mais velho, que tinha limpado as economias de seus pais, não tinha podido ir à universidade.  Não era um estudante estupendo, mas sim esforçado, tinha vontade de ir em frente.   Seu irmão ao contrário era daqueles que queriam ficar rico sem muitos esforços.

Antes de voltar, apareceram seus superiores, queriam saber que queria se aposentar, ou se seguiria em ativo, seu novo cargo não tinha problemas de ir em cadeiras de rodas,

Então sigo ativo, não me imagino não fazendo nada.

Depois de se recuperar no hospital de San Francisco, conversou muito com os pais, não poderia viver na casa deles, precisava de uma casa que fosse térrea, que ele pudesse se valer sozinho.

Foram com ele a Washington, até que conseguiu um apartamento num edifício baixo, o mesmo era um térreo, com uma boa divisão, conseguiu que o adaptassem a ele.

Ao mesmo tempo conseguiu um carro, adaptado a sua situação.  Seus pais tinham sua vida em San Diego, nos subúrbios, não queria sair de lá.  O plano dos dois era justamente daqui algum tempo venderem a casa, irem viver numa residência, aonde pudesse passar seus últimos dias.

Sua mãe era o tipo de mulher que pensava que os filhos eram como as aves, para voarem do ninho, seguirem suas vidas.   Mais uma vez, reclamou que nessas alturas ele já poderia ter filhos, eles netos.

Um dia no hospital quando falou isso, falou com ela que tinha visto tantas famílias desfeitas, homens com problemas de bebidas, drogas, tudo isso, depois na verdade minha mãe, nunca me apaixonei por ninguém, nem sei se isso acontecera algum dia.

Alguns diziam que ele era receptivo a escutar aos demais, mas jamais falava nada de sua vida.

Durante um tempo, tinha verdadeiro horror ao seu irmão mais velho, ele na verdade era um filho que apareceu fora do tempo.  Seu irmão tinha doze anos quando ele nasceu, fez de sua infância um inferno, pois antes ele era o querido de sua mãe.    Mas ele nunca reclamou aos seus pais contra o mesmo.    Quando era adolescente, um dia que entrou pela janela de madrugada, colocadíssimo de drogas, abusou dele.   Depois lhe deu uma porrada tão grande nas costas dizendo, que ele era o seu animal.

A partir desse dia, fizesse calor ou não, mantinha a janelas fechadas, a porta também.  Temia o irmão.  Começou a aprender a se defender, fazendo aulas de boxe, mesmo artes marciais que gostava tanto.

Quando este tentou de novo, levou uma surra dele.  Foi logo em seguida quando desapareceu completamente.  Seus pais, denunciaram na delegacia, mas nunca mais souberam nada dele.

Isso depois de ter roubado tudo que tivesse valor na casa, bem como as poucas economias dos dois para ele poder ir à universidade.

Nunca reclamou, pois sabia que seus pais iam ficar triste, os pais foram com ele no seu retorno a Washington, assistiram que lhe davam mais uma medalha, riu quando sua mãe que era uma mulher alta, se abaixou para passar a mão em todas as medalhas que ele tinha.

Se adaptou a sua nova vida, tinha aprendido a conduzir, a entrar sozinho no veículo, a colocar a cadeira de rodas no mesmo, tudo sozinho, era muito moderna a mesma.  Todos os dias no final do dia ia ao ginásio, para fazer fisioterapia, bem como depois nadar, gostava disso, se sentia bem na água.

Seu novo posto, não era uma maravilha, mas aproveitavam sua inteligência nata.

Um final de semana estava em casa, lendo, esperando uma pizza que tinha encomendado, quanto tocaram o timbre, pensou que era a mesma, quando abriu a porta, eram dois homens, que se identificaram como sendo de DEA, agência ante drogas.  Os fez entrar.

Pensou que vinham lhe falar de algum soldado ou mesmo alguém do exército.

Quando se sentaram, perguntaram se era irmão de Jimmy Strike?

Sim, mas desapareceu a mais de vinte anos, nunca mais soubemos dele.

Bom, seu irmão trabalha para um cartel mexicano, se casou com uma americana. A pouco tempo fez contato conosco, ficou como infiltrado nesse cartel.   Achamos que descobriram sobre o mesmo, conseguimos resgatar tua cunhada, bem como seu filho.

Se chama Cameron Strike, tem doze anos, os temos bem guardados, o problema é que tua cunhada, está com um câncer terminal, não tem família, era órfã, foi criado num orfanato, por isso nos deu seu indicação, se você quer ir conhece-la, podemos te levar até lá.

Tenho que me vestir.  Isso para ele queria dizer que tinha que colocar o uniforme, tinha poucas roupas de civil, além do que estava vestido no momento, só uma calça jeans e camisetas.

Mas não demorou, pois estava acostumado a se vestir, mesmo dentro de suas possibilidades, tinha desenvolvido um método para isso.

Disse que os seguiria, assim não o tinham que trazer de volta, rapidamente se sentou no seu carro, colocou a cadeira de rodas atrás, um deles depois comentou, como te viras bem?

A gente tem que aprender a se virar, vivo sozinho, vem uma senhora duas vezes por semana, para fazer a comida, limpar o apartamento, preciso seguir trabalhando, para não estar ocioso. Por sorte dirijo um departamento que é fácil de conduzir.  Mas não disse o que era.

Quando chegaram ao hospital, entraram um quarto que estava custodiado.

A mulher era muito bonita, mas quando olhou o garoto sorriu, era a cara de seu pai quando jovem, se lembrava de uma foto que tinha em casa, seu pai de calças curtas, era o próprio garoto.

Ele perguntou por que do sorriso?

A verdade, me acabas de lembrar uma foto do meu pai, na tua idade, a tenho em casa, eles ficaram contentes de saberem que tem um neto.

A mulher se identificou como Cassandra, teu irmão sempre falava isso, que era parecido com o pai dele.

Os homens saíram, ficaram os três ali.  Ele perguntou se ela precisava de alguma coisa, ele estava ao seu dispor.   Ela pediu que ao filho sua bolsa que estava no armário.  Lhe mostrou os documentos dela, a certidão de casamento, os documentos do garoto.

O problema, estávamos num lugar protegido, mas claro, eu tenho que estar aqui no hospital, não creio que tenha solução.  Se você pode tomar conta do meu filho agradeço, inclusive se quiseres fazer um exame de ADN, se acha necessário, tudo bem, já conversei muito com o Cameron sobre isso.   Está perdendo este ano escolar por causa dessa confusão toda, acharam teu irmão morto, por isso a DEA, nos trouxe para cá.  Tinha lagrimas nos olhos, o garoto num movimento de amor a sua mãe, lhe secou as lágrimas, falou com uma voz rouca, como tinha seu pai, a senhora já chorou demais.

Se ele quiser ficar comigo, tudo bem, tenho uns horários complicados, mas encontraremos uma maneira de resolver isso.

Tirou seu celular, ver uma vídeo chamada para sua mãe, essa a primeira coisa que fez foi perguntar que fazia de novo num hospital.   Ele não disse nada, mostrou o Cameron, ela ficou de boca aberta, começou a chamar seu pai, ele apresentou primeiro a Cassandra, disse quem era, depois mostrou seu neto outra vez.   O deixou os dois conversando com eles.

Ao final, escutou sua mãe dizendo, vamos para aí imediatamente, era uma mulher sempre de armas a tomar, ou seja, nada era para amanhã, sempre para o momento, ele nesse ponto era igual a ela.

Só teve tempo de dizer que tudo bem.

Ela é assim, não se assuste, diz que está numa idade, que não pode deixar para amanhã, o que tem que ser feito imediatamente.

Cassandra sorriu, em sua cara fatigada, teu irmão falava o mesmo, que ela era dura de pelar, mais que teu pai.

Adoro os dois, explicou que tinha uma diferença grande de seu irmão, fui um filho temporão.

Teve que explicar o que era isso para o garoto.

Era alto, meio desengonçado, como ele era na mesma idade.

Tens roupas, uma bagagem.  De repente parou um momento.   Saiu na porta, perguntou a um dos homens se podia localizar uma médica chamada Elizabeth Morris, ou Beth Morris.

Esta apareceu imediatamente.  O abraçou, beijou nas faces, ele apresentou sua cunhada, bem como seu sobrinho.

Consegues arrumar uma pessoa para ficar com minha cunhada durante a noite.

Cameron disse que ele podia ficar.

Sinto Cameron, aqui no hospital, não admitem ninguém da família de noite, não se preocupe Brian, eu consigo.  Depois lhe perguntou como ia a recuperação.

Muito lenta, algumas vezes consigo mover os dedos do pé, mas não passamos disso.

Calma, ela tinha sido umas das médicas que o tinha atendido na Alemanha, sempre te disso que isso leva tempo.

Perguntou a um dos homens da porta, quem era o médico que estava atendendo a Cassandra, foi pelo mesmo.

Este quando voltou, olhou para ele, dizendo que no dia seguinte iam começar um tratamento pesado, o caso está muito adiantado, vamos ver o que podemos fazer.

O senhor faça tudo que estiver ao seu alcance, qualquer necessidade fale comigo.  Eu trabalho no Pentágono, tenho meios.

Quando ficaram sozinhos de novo, ele telefonou para a senhora que cuidava de sua casa, sabia que ela antes trabalhava na casa de um senador, lhe perguntou se podia passar por sua casa no dia seguinte, preciso da senhora.

Ela poderia passar o dia em casa, não podia pedir a sua mãe, para fazer nenhum serviço, ele pagava uma senhora que fizesse isso na casa dos pais.

A enfermeira disse que eles tinham que ir embora, o horário não permite mais ninguém. Nesse momento Beth entrou com uma senhora negra, essa disse que podia ficar pelas noites, acabo de terminar meu turno, um dinheiro a mais sempre vem bem.

Cameron soltou um suspiro, abraçou a mão, a beijou, amanhã venho logo cedo ok.

Tudo que ele tinha era uma mochila.

Quis ajudar com a cadeira de rodas, ele riu, obrigado garoto, mas estou acostumado, as pessoas aprendem a se defender.

Perguntou o que tinha acontecido, ele contou por alto, sem falar do rapaz que levava o jeep.

Contou que tinha levado meses em coma, bem como o tinham operado mais de uma vez.

Dizem que voltarei a andar, mas não tenho ideia, quando será isso.

A tempos atrás um conhecido tinha oferecido uma casa que tinha, maior, para ele, não era longe da sua.   Agora teria que conversar com seus pais para saber o que queriam fazer.

No que pensava nisso, sua mãe telefonou para dizer que chegavam no primeiro voo da manhã, ele disse que mandava seu ajudante ir busca-los, pois no seu carro com a cadeira de rodas era complicado.

Quando chegaram em casa, mostrou o mesmo ao Cameron, hoje terás que dormir no sofá cama, pois ele é muito baixo para me levantar sozinho.

Me fale de ti, quero te conhecer, nem sabíamos que existia, não sei nada do meu irmão a mais de vinte anos.

Ele nunca falou como foi parar no México, algumas vezes falava de vocês, mas nunca porque foi embora.  Só dizia que ele era complicado quando mais jovem.

Nós vivíamos numa cidade, ele em outra, nos víamos algumas vezes, uma ou duas vezes por semana, tudo muito complicado.   Mas me colocou numa escola americana, para que eu soubesse falar inglês direito.

A última vez que o vi, me disse, que se alguma coisa lhe acontecesse, sabia que seu irmão cuidaria dele.   Foi a primeira vez que falou do senhor, sabia que era do exército, que era Coronel, mais nada.

Não eres casado, nem tem filhos?

Não, as vezes me canso de explicar a tua avó, sobre isso, com a vida que levo, não digo agora, mas antes, nunca me foi possível formar família, me dava medo, por estar sempre de um lado para o outro, depois via meus colegas sempre com problemas.

Daqui a algum tempo irei para uma base americana na Itália, mas estou desenvolvendo ainda um projeto que quero aplicar.

Quando tua mãe melhorar, podemos ir juntos, claro se vocês quiserem ir.

Estamos sempre com medo, pois os da DEA souberam das ameaças, por isso nos tiraram do México, aqui sempre é igual, estamos vigiados. 

Não olhe para trás, mas pelo retrovisor, temos um carro nos seguindo, é um dos homens que me levaram até lá.

Se for o caso, peço que me mandem para a base, ali poderás ir à escola, enquanto trabalho, estarás mais protegido.   Mas te ensinarei a te defender, sem querer soltou, como aprendi, para me defender de teu pai.

O que ele fazia?

Vamos deixar prá lá, pois isso são coisas do passado.

Comeram alguma coisa, ficaram conversando, ele contou como era viver no México, que sua mãe trabalhava num hospital, na parte administrativa.   Foi lá que conheceu meu pai.

Ele sempre dizia a ela que trabalhava para o governo americano, mas descobrimos que não era verdade, traficava drogas.

Sim, na sua juventude, ele tinha esse problema. 

Minha mãe diz que nem devo provar, pois seria um adito imediatamente, fiz muitos exames desde pequeno.

Quantos anos tem?

Vou fazer treze.

Comentou que a senhora Greta, cuidaria bem dele, me deixa sempre comida para semana toda, assim não tenho trabalho de sair.  Faz as compras, arruma a casa.  Tua avó telefona para ela para saber se estou me alimentando.

Já verás como fará contigo, contou aonde viviam, que pensavam ir viver numa casa para pessoas de idade, acham que comigo fica complicado, na verdade estariam sozinho, pois passo o dia inteiro no Pentágono, mas contigo, quem sabe gostaram de ficar aqui, eles são muito independentes.   Se fazem pergunta sobre teu pai, deixe que tua mãe responda ok, senão ficaram o dia inteiro de perguntando coisas.  São piores que os inspetores da polícia.

Jantaram, o viu examinando seus livros, eram novos, lhe contou que tinha voltado ao hábito da leitura, quando ficou no hospital, assim ocupava sua cabeça, agora no final do dia, quando estou livre leio, para me ocupar, não tenho o hábito da televisão, nem de internet.   Já basta o que tenho que ver durante o dia no trabalho.

Viste muitas coisas ruins?

Sim, vou guardando em caixas na memória, talvez um dia escreva sobre isso.

Lhe disse que quando fosse tomar banho, tirasse a cadeira que tinha no box, pois tinha que tomar banho sentado.

Se o senhor precisar de ajuda, me chama.

Não me chame de senhor, Cameron, podes me chamar de Brian.   Antes de dormir, lhe mostrou a fotografia que tinha do pai, não sei por que, sempre gostei dessa foto dele.

Realmente eram iguais, até na maneira de falar.

No dia seguinte, quando chegaram seus pais, sua mãe, pegou a cara do neto, ficou olhando para ele, o beijando, o abraçou muito, soltou ao final olhando para o Brian, finalmente tenho um neto.

Seu pai foi diferente, abraçou o neto, chorou um pouco.   Depois de um café, foram para o hospital, os deixou conversando, foi falar com o médico que estava de plantão.  Tinham acabado os exames, falou francamente com ele, as chances eram mínimas pois o câncer estava muito estendido.   Sendo prático, se fosse o senhor, pedia a guarda do garoto, pois isso pode ser um problema, se a DEA queira ficar com a custodia dele, com a desculpa de o proteger.

Escutei os dois falando, não tem certeza de que seu irmão esteja morto, pois o corpo que encontraram estava muito desfigurado.

Viu que sua mãe gostava da Cassandra, isso era bom, seu pai tinha saído para dar uma volta como neto, sabia que um dos homens de guarda os tinham seguido.

Aproveitou para conversar com as duas, explicou a situação, se quiseres, confiar em mim, podíamos fazer o seguinte, me dás a guarda dele, pois se te acontece algo, a DEA não pode fazer nada, caso contrário, pedirão a guarda dele como proteção.

Tenho duas possibilidades, uma é mudar para uma casa maior, se meus pais resolverem ficar, outra é conseguir uma casa ou apartamento grande na base, lá ele estará mais protegido.

Faça como achar melhor, quero meu filho protegido.    Só a pouco tempo descobri o de teu irmão, mas ele nunca falava nada do que fazia, portanto não sei de nada.  Tampouco posso cuidar do meu filho, pois no momento não posso trabalhar.  Faça como achar melhor.

Eu, falarei com teu pai essa noite, acho que ele não vai querer se separar de seu neto, mas pensando nas duas opções, eu acho a ideia da base melhor.

Sim lá tem escola, pode fazer amigos, fazer esportes, inclusive vou sempre para nadar, fazer fisioterapia, não me incomodo em mudar.  Tentarei arrumar um apartamento térreo, assim não tenho problema de mobilidade.

Nem te perguntei como vai o tratamento?

Bem vou indo, já consigo mexer os dedos do pé direito, mas isso vai demorar.

Depois saiu, falou com um amigo que tinha servido com ele na guerra do Golfo, que era o coronel da base, falou com ele do problema, sem esconder nada.

Amanhã, te dou uma resposta, vou ver se consigo um apartamento como queres, pois os outros sempre são escadas, mas creio que tenho uma casa quase ao lado da minha, que pode te servir.

Ficou mais tranquilo.

Quando seu pai voltou, o Cameron foi com os avôs comer na lanchonete do hospital, ele iria depois.

Aproveitou para falar seriamente com a cunhada, estava preocupado, com a história da DEA, ela disse que realmente não tinha podido identificar seu irmão.  As vezes tenho a sensação de que na verdade nos sequestraram, para forçar teu irmão fazer alguma coisa.

Logo de manhã, falou com a Greta, ela disse que por ela tudo bem, que poderia ir a base todos os dias, ou mesmo se tivesse um quarto pequeno, viver lá.   Passo o dia aqui, enquanto eles vão ao hospital, preparo alguma coisa para o jantar.

Ele mexeu seus contatos, conseguiu com um juiz que fosse até lá com os papeis, para ficar com a guarda do Cameron.  Iria com ele no final do dia ao hospital.

Colocou um policia militar, para transferir seus pais, com o Cameron ao hospital, depois recolher.

Esse logo lhe comunicou que todo o tempo estavam sendo seguidos pelos homens da DEA, que tinha contatos, que ia se informar.

Ele cada vez mais tinha certeza de que as coisas estavam mal contadas, que acreditava mesmo que talvez seu irmão estivesse vivo.

Não queriam deixar o Juiz entrar, mas esse se identificou, quando o chefe dos da DEA chegou, era tarde, sua cunhada tinha assinado os papeis.

Depois falou com a Beth, ela como trabalhava também no hospital da base, disse que lá talvez até Cassandra tivesse um tratamento melhor.

O duro seria tirar ela de lá.   A DEA, não ia ter acesso a ela no hospital.

Teve uma larga reunião com o Coronel da base, esse lhe mostrou a casa, estava montada, dava para todos, falou do problema da cunhada.  Vou assumir que é tua família.  Amanhã, o policia militar, trás teus pais para cá, bem como tuas coisas e as deles.   Hoje a noite, faremos o translado de tua cunhada.  Telefonou para a Beth, ela disse que lhe passaria todos os exames da Cassandra, que de noite só tinha um homem tomando conta.   Pode ser esta noite?

Sim, mando a senhora que esta com ela colocar alguma coisa no café que vai oferecer ao homem.

Uma ambulância da base encostou numa saída de emergência, a retiraram de lá, ele estava dentro da ambulância, explicou para ela, que na base estariam mais protegida que com esses homens.

Logo de manhã, seus pais com o Cameron, uma caixa de suas coisas, foram para a base.

Quando ele ia saindo chegaram os de DEA, furiosos com o que tinha feito.

Creio que farias igual, se fosse tua família, lá na base eles estão protegidos.  A polícia militar cuidara deles. O dia foi complicado, mas correu tudo bem.

Sua mãe estava encantada com a casa, lhe perguntou quanto ia pagar de aluguel, que queriam cooperar. 

Nada mãe, tenho direito a uma se vou viver na base, para alguma coisa essa merda de status deve valer.

Seu pai tinha dado uma volta na base como Cameron, tinha indo a uma cantina, feito amizades.

Cameron disse que o velho tinha feito amizades, tem um horário que os velhos se reúnem para jogar, convidaram o avô para ir, dizem que o vão desplumar.

Greta tinha arrumado um quarto pequeno para ela, disse que o supermercado da base era excelente, posso cuidar de tudo.

Sua mãe disse que teu pai tem uma dieta que vive querendo saltar, mas eu o coloco na linha.

Pelo menos a casa tinha televisão, assim podiam as duas verem seus programas prediletos, sua mãe tinha comprando lã, estava começando a tecer uma blusa para o neto, daqui a pouco será inverno.   Estamos fazendo um rodizio, cada um vai por algumas horas com a Cassandra, já começaram as seções de quimioterapia, para ver como funcionam, a Dra. Beth já esteve lá hoje, crê, que lá vai estar mais bem atendida.

Ele foi pela noite passou um largo tempo conversando com Cassandra.

Me apaixonei por uma incógnita, teu irmão, nunca falava em que trabalhava, dizia que era algo do governo, que não podia falar.   Desconfio como tu, que nos trouxeram como uma maneira de fazer com que ele coopere em algo.   Mas se é assim não temos como avisa-lo.

Conheces alguém que ele conhecia?

Sim, um homem que trabalha num restaurante perto de casa, tenho o telefone dele, que me deu caso fosse necessário, tens que acrescentar o código de área.

Imaginava que a DEA, tinha seu telefone controlado, telefonou no outro dia desde o Pentágono, assim não podia rastrear, usou um telefone, de outra área.

Falou com o homem, se identificou como irmão, falou da sua cunhada e de Cameron, se por um acaso ver meu irmão, diga que estão protegidos, na base de Washington, que vai tudo bem.

Agora era esperar.

Os da DEA, tinham tentado entrar na base, mas tinham ordens do coronel, para não perturbarem a senhora Cassandra.  Estava num tratamento complicado, nada de visitas.

Uma semana depois o estado dela, não melhorava, a coisa estava complicada, o médico falou com ele a respeito.  A via mais cansada, tinha emagrecido muito.   Cameron, passava as tardes com ela.   No final do dia, o acompanhava a piscina, iam os três, até seu pai, gostava de se jogar na água.  Ficava olhando o filho fazendo exercícios na água, fazia junto, até o Cameron se juntou a isso.  Voltavam para casa os três, agora começava a mover os dedos do pé esquerdo.  O fisioterapeuta ensinou ao Cameron, a fazer exercícios como dois pés.   Antes de dormir o fazia.

Conversavam sobre o livro que ele estivesse lendo no momento.  Meu pai quando me via com um livro na mão, dizia que seu irmão estava sempre com um.

Sempre quando ia por aí, levava um na bagagem, lia nos momentos que tinha para me relaxar. Era como ter um mundo a parte de tudo aquilo que via.

Tinha comprado um celular desse de pré pago, deu o número para o homem que conhecia seu irmão.   Lhe chamou depois de vários dias, disse que tinha passado a mensagem.  Resolveu não falar nada da doença da Cassandra, pois senão seu irmão podia tentar sair de sua madrigueira, seria fácil a DEA, captura-lo.  Disse que chamaria uma vez por semana para falar deles.

Acho melhor o senhor chamar outro número, estou sendo vigiado.

Quando chamou o tal número, falou diretamente com seu irmão.

Agradeceu, não diga nada a Cassandra, nem ao Cameron, agora eles tem a possibilidade de uma nova vida.  Mandou um beijo para os pais.  Agradeceu, me desculpe as coisas do passado.

O que é passado, passado está.

O problema da Cassandra foi complicando, cada vez mais.  Só comentou com o irmão quando ela esteve muito mal, vou te chamar, assim podes te despedir dela.

Quando ela escutou a voz, deu um sorriso largo. Os deixou falando sozinhos.

Quando voltou ela tinha lagrimas nos olhos, só disse obrigado, mas não comente nada com Cameron, fica mais fácil assim, ele pode querer ir para lá, teu irmão não quer estragar a vida dele.

Quando ela morreu, a enterraram no pequeno cemitério da base, avisou aos da DEA, que vieram ao enterro, mas não os deixou falar com seu sobrinho.

A mulher do coronel, era professora da base, preparou o Cameron, para poder acompanhar a turma no ano letivo seguinte.    Ele se esforçava, mas os dois tinham sempre sua conversa noturna, as vezes saia com os amigos solteiros da base, para tomar uma cerveja, ou mesmo o pessoal do Pentágono, notava sempre que tinha alguém nos locais, que parecia ser da DEA.

Mas fingia que não via.

Nunca voltava sozinho para a base, sempre tinha alguém com ele.

No final do ano, já estava andando de muletas, conseguiram para ele, um esqueleto, desenvolvido no Japão, assim ele podia andar pelo Pentágono, já sem muitos problemas.

Atrasou, sua partida para a base Italiana, com a desculpa de esperar poder andar de novo dentro em breve.   Outra pessoa foi em seu lugar.

Não podia arrastar atrás de si, seus pais, como tampouco queria que Cameron ficasse para trás. Sua mãe disse, que se fosse por ela iria, mas seu pai agora, estava fazendo um tratamento no hospital, não convinha sair dali.

O velho cada vez mais era agarrado ao neto, que o acompanhava por todos os lados.

Ele arrumou outro projeto para desenvolver, que atendia a homens com problemas como o dele, assim foi ficando.

Um dia que saiu com os amigos, estavam num bar que iam sempre, os amigos bebiam mais do que ele, a dona do bar, lhe disse, que fosse ao banheiro, mas que entrasse na porta de privado, tem um telefone te esperando.

Se levantou como se nada, ainda falando com os amigos, foi ao banheiro, entrou no lugar que a mulher disse, pegou um telefone em cima da mesa.

Era seu irmão, este disse já sabem que estou vivo, creio que tentaram sequestrar meu filho, para me chantagear.  Tome cuidado.

No dia seguinte pediu desculpas ao Coronel da base, perguntou o que devia fazer, não tenho com quem falar no assunto, pois isso pode ser um problema para aqui.

Ele mandou a policia militar se reforçar, vigiarem a casa, não deu outra, pegaram dois da DEA, tentando entrar na casa de noite.

Ele tinha que encontrar uma saída.

Dois dias depois seu pai teve um enfarte, morrendo dormindo.

Foi mais uma porrada para o Cameron, que tinha seu avô como seu amigo.

Depois de uma longa conversa com sua mãe, essa resolveu voltar para sua casa, assim ele tinha caminho livre com o Cameron, Greta iria com ela, assim lhe faria companhia, bem cuidaria dela.

Dois dias depois ele embarcou com o Cameron num avião militar, foram para uma base no Alaska, agora ele andava apoiado em duas bengalas, ia muito melhor.

Cada vez mais estava agarrado ao seu sobrinho, era o filho que sempre tinha querido ter.

Mantinha o celular, para alguma coisa.  Tinha comunicado ao irmão a morte do pai, ele sabia que o filho estava vivo.

Sentiu que o irmão se preocupava, lhe disse que tinham saído da base, numa missão secreta, a DEA, se descobrir, vamos saber que temos alguém dentro, mas claro, ninguém sabe aonde estamos.  É como se eu estivesse numa missão secreta.

Uma coisa, obrigado por estar teu filho comigo, está sendo o filho que eu gostaria de ter.

O irmão perguntou se nunca tinha se casado.

Foi honesto, nunca amei ninguém na minha vida.

A base tinha um sistema de vigilância extremo, logo detectou homens da DEA na área, falaram com ele.   Ele tinha feito um processo, adotando o sobrinho, disse ao responsável, se eles se aproximassem os denunciaria ao supremo tribunal, estavam mexendo com seu filho.

Estes ficaram furiosos, mas não podiam fazer nada.

Falou na semana seguinte com seu irmão, este disse que acreditava que era o fim, estão me cercando cada vez mais, o chefe não está gostando do assunto.   Meu amigo te avisara de qualquer coisa.   Falou dois códigos, se ele te disse isso, é que estou morto, este outro número é que escapei.

Mas quando o homem chamou, foi para dizer que seu irmão tinha morrido nas mãos do próprio cartel, que não gostava de cabos soltos.

Ficou sentado, no seu escritório, com as lagrimas escorrendo, com os anos, falando sempre com o irmão, mesmo a distância, como lhe tinha dito, finalmente tinha uma família.

Os da DEA, lhe avisaram também que estava morto desta vez, não tinham dúvida.  Agora os deixariam em paz.    No final do ano letivo, voltaram para Washington.

Cameron tinha que ir à universidade.  Tinhas duvidas do que gostaria de fazer.  O levou para falar com um psicólogo que ajudavam jovens com dúvidas.

Lhe propuseram para ser coordenador dos militares americanos, integrados aos Cascos Azuis da ONU, para tanto tinha que viver em NYC.

Quando sua mãe morreu, os dois foram passar seus últimos dias com ela, mandou vender a casa, colocou num fundo para o Cameron, para o que ele quisesse fazer da sua vida.

Quando foram para NYC, Greta veio junto para cuidar do apartamento.

Era o momento de Cameron ir para a Universidade, estava preocupado, porque não o via entusiasmado, por precaução, estava protegido.

Um dia se sentou com o tio, soltou, estou farto de ser seguido, quero recuperar minha vida, aqui não posso. O que o senhor acha que devo fazer.

Ele o entendia, as vezes sentia isso no seu trabalho, as coisas nem sempre corriam como ele queria, dentro em breve podia escolher se aposentar, talvez mais uma promoção, teria um bom salário.

Talvez se eu estivesse no seu lugar, sairia daqui sem chamar muita atenção, iria passar um tempo fora, na Europa, sem dizer aonde estas.  Nos manteríamos em contato através de celulares descartáveis.   Assim estaríamos resguardados.

Tinha aberto uma conta para ele no banco, com o dinheiro da casa de seus pais, que era bastante, inclusive estava aplicado, mas lhe disse que tinha dinheiro guardado, que lhe serviria para se virar durante um tempo.

Dois dias depois, o policial militar que o vigiava, disse que alguém tinha tentado se aproximar, não sabia descrever o homem.

Ele disse ao Cameron, chegou o momento, não se preocupe, irei pessoalmente a universidade, trancarei tua matricula.  Mas se estão te vigiando o melhor é sair chamando atenção, tens teu passaporte em dia, temos a mesma altura, veste meu uniforme, prende esse teu cabelo ou melhor o raspamos, isso é contigo, mudamos tua cara, como agora escurece cedo, sais com o policial desde a garagem, procure tapar a cara, ele saberá se os estão seguindo ou não, sente-se atrás como faço eu.  No aeroporto, ele entrará, pela garagem, trocas de roupa, compras um bilhete no momento, para o primeiro lugar que te apareça, procure se sentar nos últimos assento, porque se entra primeiro, podes vigiar se te seguem.  Quando chegares lá, compra um celular com bastante carga, só me avisa, se estás bem, não me diga aonde estas. Ok.

Se abraçaram muito, ia sentir falta um do outro, mas era o momento dele se livrar dessa carga do pai.   Não tinham ideia de quem os estava seguindo.  Sabia que não era o FBI, parecia mais o cartel mexicano.

Foi o que fizeram, mesmo o policial, lhe chamou pelo celular que tinha ido tudo bem, não sabia o voo que ele tinha escolhido.

Nessa noite, sentiu pela primeira vez a solidão, estava acostumado, além de ter se apegado ao sobrinho, era como o filho que ele não tinha.   Dormiu mal, se virando muitas vezes na cama.

Se despertou com o celular, era ele dizendo que tinha chegado bem, que tudo estava ok. Vou sentir falto do senhor, dos nossos papos.

Dias depois, chegou em casa, viu que a porta do apartamento tinha sido forçada, pegou sua arma regulamentar, abriu a porta, sentado numa poltrona, estava seu irmão.

Levou um susto imenso.

Mal perguntou como ia, queria saber do filho.

Não sei, ele estava farto de tudo isso, foi por aí, um tempo, ora era o FBI, ora o cartel mexicano aonde trabalhavas.  Ele o que quer é paz.

Tens que me dar a direção!

Não posso, porque não sei, além de que, mesmo que tivesse não daria, afetaria a segurança dele.

Te vi saindo ontem com o carro, mas não voltando para casa.

Não era eu, era ele.

Está tão grande assim?

Sim, é um adulto, agora é meu filho, não teu. Todos pensamos que tinhas realmente morrido, inclusive tua mulher morreu tranquila por isso.

Acabou sendo da família.

Fizeste prova de ADN com o Cameron?

Sim porque ela pediu, além de que ele era a cara do nosso pai.  Os dois morreram tranquilos, amando seu neto.

Aonde andaste esse tempo todo?

Fugindo de lá para cá, sem saber muito aonde ir.  Não posso ficar parado muito tempo no mesmo lugar.  Tive que dar uma volta imensa, quando cheguei no Alaska, já não estavam mais ali, até descobrir aonde estavas, foi difícil.    Mas não fale com ele que apareci, iria se preocupar, um dia daqui algum tempo, quem sabe como será, eu também só queria abraça-lo, antes de desaparecer outra vez.   Talvez seja melhor assim.

Dormiu essa noite no quarto do Cameron, no dia seguinte quando Brian se levantou já não estava mais.

Não comentou nada com o Cameron, esse disse que tinha arrumado um emprego, que assim aprenderia mais fácil a língua do lugar aonde estava.

Seis meses depois, lhe chamou, de fundo escutava conversa, era em francês, imaginou que ele estava em algum lugar da França.

Sentia uma falta imensa dele. O trabalho não lhe completava mais, foi promovido, quando ia pedir a aposentadoria, lhe pediram que fosse para Tel Aviv, pois era um dos poucos que falava a língua de lá, bem como árabe.   Antes avisou o Cameron, aonde estaria, que lhe mandaria uma mensagem.

Greta se despediu dele, ia sentir falta dela, mas ia viver com uma irmã, disse que quando ele voltasse, teria muito prazer em trabalhar para ele, afinal era como da família.

Se desfez do apartamento, guardou o pouco que tinha dos dois, num armazém, foi para Tel Aviv, não era a primeira vez que estava lá, seu trabalho era descobrir quem de vez em quando soltava noticias para os jornais de lá.

Seu apartamento estava em frente a praia, pela primeira vez, não pertencia ao governo.

Quando falou com o Cameron, soltou, nunca me senti tão sozinho, chegar a esta idade sem ter amado ninguém, é duro.  Meu trabalho já terminou, irei ao Pentágono, para pedir minha aposentadoria, já consegui licença para viver aqui algum tempo, tenho boas amizades aqui.

Voltarei, não tenho nada que fazer nos Estados Unidos.  Voltei a ir a Sinagoga, vou a uma para gente jovem, gosto mais.

Foi o que fez, mudou quando voltou, pela primeira vez, deixou os cabelos crescerem, ia a praia todos os dias, estava moreno, deixou a barba crescer, eram fios loiros com brancos, mas lhe dava igual.  Ia todos os dias a sinagoga, conversar com as pessoas, conheceu um homem interessante que conversava com ele sobre literatura judia, começou a ler todos os livros que ele dizia, depois tinham papos imensos.  Ele era professor na universidade, justamente de literatura judia e árabe.

Um dia acabaram na cama, nunca tinha se sentido a vontade com ninguém seja homem ou mulher, mas com ele, estava feliz.

Na vez seguinte quando Cameron lhe chamou, comentou a respeito, finalmente assumi que gosto de um homem.  Estou tentando ter um relacionamento, não penso em sair daqui.

As vezes no final de semana, saiam para algum lugar, para ele conhecer, tinham projetado ir ao Mar Morto, quando Joseph tivesse férias.

Um dia andando na rua, viu um rapaz, teve a sensação de que era o Cameron, mas era impossível.

Dois dias depois, estava em casa estudando árabe, escutou baterem na porta, quando abriu, era ele.  Chegou a chorar abraçado ao seu sobrinho/filho, não sabes a falta que sentia de ti.

Quando chegaste?

Estou aqui já fazem um mês, estive te vigiando, para saber se ninguém estava fazendo o mesmo.

Nesse ponto fiquei neurótico.  Essa sensação de ser vigiado me angustiava, passei eu a vigiar os outros.

Te vi muitas vezes com o Joseph, é uma boa figura, o fez entrar, queria saber como tinha sido sua vida.

Ele lhe contou tudo, primeiro fui para Berlin, de lá escolhi uma cidade menor, aonde podia me mover e vigiar, arrumei um emprego em Münich, depois estive um tempo trabalhando em Praga, depois Roma, por último Paris, sempre depois de conhecer a cidade, arrumava um emprego.

Ele se abriu com o Brian, me decidi ir embora, porque reparei que o homem que me seguia era meu pai.   Não quero nada com ele, nos deixou numa enrascada muito feia, minha mãe morreu sem ele estar ao lado dela, nunca esteve para nós.  Meu pai verdadeiro é o senhor, por isso venho ficar aqui.

Quando conheceu Joseph, se deram bem, eles não viviam juntos, mas estavam sempre que podiam.  Foram os três para o Mar Morto, alugaram uma cabana, perto, logo Cameron fez amizade com rapazes terminavam o serviço militar, estavam ali de férias.   Saiam juntos, iam a bares discotecas.

Joseph vivia com os pais que tinham idade, mas acabou indo viver com Brian, tinham certeza de que se queriam.

Cameron conheceu uma moça, num dos cursos do Joseph que ele estava fazendo, acabaram ao longo dos anos se casando, tinham agora 3 crianças.

Brian um dia foi chamado a embaixada, tinham lhe mandado um envelope confidencial.

Dentro duas chaves, uma era de um banco na Suiça, o outro em Andorra.

Dentro um bilhete, a conta está em teu nome, esse dinheiro é para o futuro dos meus netos.  Estive aí, mas não me aproximei, meu filho tem uma vida perfeita, não quero estragar.

Desta vez mostrou para o Cameron, ele se abraçou ao tio, tenho medo de mexer nesse dinheiro, chamar atenção, hoje temos a tranquilidade, esperemos.

Se passaram três anos, quando Cameron tinha quatro filhos, queriam uma casa para viver, perto de aonde trabalhava, em Tiberíades, foi quando buscou o dinheiro, transferiu para uma conta sua, num banco internacional, não levou nada com ele.  Através desse banco foi transferido para o Cameron, comprou sua casa, em nome das crianças, assim não teriam problemas, ele e Joseph, faziam o papel de avôs.   Os dois compraram uma casa pequena na parte antiga de Haifa, passaram a viver lá.   Quando estavam os quatro juntos, as discussões sobre algum livro, ou qualquer coisa que estivessem lendo eram intermináveis.  O filho mais velho do Cameron que se chamava como ele Brian, ficava como louco prestando atenção, já falava inglês, espanhol que o pai lhe ensinava. 

Brian dizia que ele tinha futuro.

Nunca mais souberam nada do pai e irmão.  Tampouco voltaram mais aos Estados Unidos.