JULES
Sou Jasper
Köning, fotógrafo profissional, nasci na Alsacia, numa família com uma mistura
entre franceses, alemães, algum que outro suíço. Fui criado pelos meus avós que eram pessoas
muito estritas. Minha mãe desapareceu,
nunca soube quem era meu pai. Tampouco havia na casa nenhuma fotografia de
minha mãe. Dai talvez minha neurose com
a fotografia. Acredito que tampouco existia alguma foto minha, da infância, ou
mesmo juventude. Quando ia a casa de
algum companheiro de escola, ficava admirando as fotografias de família,
retratos de pessoas.
Fugi de casa
várias vezes, embora fosse considerado um aluno brilhante. Com 15 anos comecei
a trabalhar em qualquer coisa que desse dinheiro. Fazia de tudo, entrega de
supermercado, compra para os mais velhos.
Tudo para juntar dinheiro, para poder partir dali.
Por sorte ou
quem sabe por que, como tinha excelente notas, quando acabei a escola, consegui
uma bolsa de estudos para a universidade de Lyon, mas claro, em filologia. Tinha facilidade em apreender línguas. Contra a vontade dos velhos,
que acreditavam que eu ficaria para tomar conta da granja, cuidar deles. Apesar de tudo, desde que tinha consciência,
me cobravam isso. “tinham me acolhido,
para que cuidasse deles em sua velhice”.
Ao caralho com as obrigações.
Não sabia por
que todas essas imagens apareceram em minha mente, durante o voo de New
York/Paris. Mais uma semana da moda,
não sabia quantas tinha em meu haver. Não podia reclamar, pois fora meu
primeiro degrau em minha vida profissional.
Aquelas coisas que acontecem. O
fotografo para quem eu trabalhava, teve um enfarte, tive que substituir, só que
resolvi arriscar, fiz as fotos como pensava, era para a Vogue Americana. Em seguida, elogiaram meu trabalho, assinei
um contrato, depois de anos, deixei de renova-lo, mas seguia trabalhando para
eles e toda competência.
Tinha dormido
muito mal, na véspera de viajar. O pior
era ter rompido um relacionamento de anos, com quem considerava o amor de minha
vida. Tudo porque eu me negava a casar, adotar crianças. Nunca tinha pensado nisso, em toda minha
vida gay. Tinha um fator importante,
acreditava que as pessoas que deviam ter filhos deviam ser jovens. Os com mais idade sempre pensavam justamente
do que eu tinha fugido. Ter filhos para
lhe fazerem companhia quando fossem velhos.
Nessa noite,
despertei assustado, sonhava que tinha uma pessoa sentada na beira da minha
cama. Não conseguia ver a cara, somente uns cabelos largos ruivos. Como o que tinha quando era criança. Hoje tinham uma cor fantástica, pois era uma
mescla de brancos e ruivos escuro.
Não sei se
isso me fez pensar em tudo isso durante o voo.
Apesar de ser de primeira classe, estava completo. Muita gente que ia para a semana da
moda. Alguns querendo saber para quem ia
fotografar coleções. Sentado ao meu
lado, estava minha secretada todo terreno.
Quando alguém fazia algumas dessas perguntas incomodas, ela respondia de
modo brusco, “eu pergunto com quem dormes”.
Eu acabava rindo. Na sala vip,
antes do embarque, passou ao meu lado, um dos diretores de uma revista teenager,
me indicou o banheiro, como me dizendo, posso falar contigo. Não havia muito como disfarçar, quando todos
estavam olhando com quem falavas, esperei dez minutos, entrei no banheiro.
Foi direto ao
assunto, estou num apuro, não tenho fotografo, preciso de ti. Posso ser o último a ser atendido, mas
gostaria que fizesses as fotos da revista sobre a semana de moda. Me disse uma cifra, daquelas
irrecusáveis. Aceitei, dizendo que nos
veríamos no hotel para fazer o contrato.
Precisava de mais dinheiro, para comprar a parte de meu último
companheiro, no apartamento que tínhamos juntos. Essas burradas que fazemos na vida, quando
pensamos que viveremos o resto dos dias com uma pessoa.
Avisei minha
secretária, esta rapidamente preparou o contrato, a partir de agora, ela se
encarregaria de tudo. Só teria que
fazer as fotos.
Os desfiles,
as fotos presenciais, tudo fiz como sempre, a minha maneira. Ignorava tudo que
estivesse em volta, me dedicava exclusivamente a fazer o meu trabalho. O resto
do mundo nesse instante deixava de existir.
Éramos, minha câmera, cérebro, instinto.
Meu assistente dizia que era como se tivesse uma metralhadora, seu
trabalho consistia nesse momento a partir que acabasse um cartão ou bateria, me
passar outra câmera igual a anterior.
Tudo estava preparado ao mínimo detalhe.
Vogue tinha
pedido que fizesse uma série de fotos, com os assistentes dos desfiles, as
pessoas que me chamassem atenção. Num
determinado momento, num desfile de Dior, vi uma figura ao longe, era muita
magra, cabelos ruivos imensos, uma roupa toda especial. Fiz a foto, mas meu instinto ficou intacto,
segui trabalhando.
Depois foram
dias, no studio que sempre alugava por detrás da Ópera de Paris, um último
andar de um edifício antigo, antigamente usado para ensaio dos ballets. Conhecia o proprietário. Este reservava sempre pelo menos 15 dias
para mim, durante as semana da moda.
Tínhamos
preparado para começar a fazer as fotos da coleções Teenager, os manequins teen
eram sempre mais difíceis de trabalhar.
Inseguros, fúteis, se achavam sempre maravilhosos. Eram sempre exasperantes. Depois de dias e dias trabalhando, meu humor
era de um leão com muita fome, mas de estomago vazio.
Pareciam um
cuspido ao outro, mesmos gestos, mesmas caras, penteados etc. Para isso tinha exigido maquiadores,
cabelereiros, os que conheciam meu trabalho.
Necessitava de
dez, fui escolhendo com minha secretária, fazendo que assinassem um termo junto
com seus representantes, em que eu poderia mudar seus cabelos, maneira de posar
etc. Alguns rejeitavam imediatamente,
mas eram sempre os piores, que já se consideravam uma estrela. Coitados, mal sabiam que poucas pessoas
podiam superar uma barreira, se transformando em estrelas.
Outros
agradeciam que eu mudasse suas imagens.
Primeiro olhei as roupas a serem fotografadas, eram sempre de novos
desenhadores, algumas estapafúrdias. Foi meu primeiro choque com a chefe de
moda da revista. Fui retirando os
cabides com as roupas que não queria.
Quando esta reclamou, minha secretária, lhe mostrou o contrato. Este me permitia fazer isso. Lhe disse que era livre de fazer fotos com
essas roupas, mas com outros fotógrafos, mas se a incluíssem com as minhas
fotos, poderia processa-los. Por sorte,
quem tinha me contratado apareceu, contornou a situação.
Faltava um
manequim, olhei o grupo restante, não gostava de nenhum. Até que vi aquela figura andrógina, muito
branca, com os cabelos ruivos imensos, uma roupa diferente, mas com a cara
escondida embaixo dos cabelos.
Lhe disse que
se aproximasse, meu assistente colocou embaixo dos focos, fui até lá, tirei os
cabelos da cara, me enfrentei a um olhar furioso, azuis como o céu, uma cara
cheia de sardas. Super fotogênico. Não tinha contrato, lhe perguntei a idade,
disse 18, podia assinar um contrato.
Perguntei o
nome?
Jules Hoiex,
resmungou. Vi que era um garoto, com voz forte, fui até os cabides, separei as
melhores roupas que combinavam com o tipo. Chamei o cabelereiro, mandei corta
os cabelos, que deixassem um topete totalmente para cima, como se estivesse
pegando fogo.
Jules me
olhava sem pestanejar, perguntou, se não quero?
Agora é tarde,
acabaste de assinar o contrato, me dá direito a isso.
Deixei que
ficasse por último para ser fotografado.
Estava além de exausto, irritado, menos mal pensei, deixei para o últimos
dias. Se tenho um enfarte, já fiz o
resto do trabalho.
Quando
apareceu vestido com um traje de alfaiataria, de um novo costureiro, com um
corte impecável, a cara totalmente descoberta, lastima que lhe tinham maquilado
muito, chamei a maquiadora, disse que limpasse sua cara, queria uma cara limpa,
translucida.
Nesse momento,
me olhou profundamente, vi nele alguma coisa que me recordava, mas ainda não
tinha sentido na minha cabeça.
Mandei apagar
todas as luzes, lhe disse o que queria, somente um foco o acompanhando, fiz com
que viesse caminhando em minha direção, a metralha como dizia meu assistente
começou a funcionar, me joguei no chão, o fotografei em vários ângulos. Mandei acender a luzes, fiz um sinal para que
ele colocasse um novo traje, totalmente negro, vaporosos, em que aparecia seu
corpo branco, mandei que tirasse a cueca negra, se via os pelos do púbis
ruivo. Ficaria extremamente sexi.
Disse ao
assistente, que colocasse num dos focos, uma pantalha negra, nos outros azuis. De
novo a luz se apagou, nem deitei no chão, dizendo que fosse passando devagar
sobre mim. Pelo que via as fotos ficavam diferentes por causa dos ângulos.
Posou para
mais duas roupas, que eu não gostava muito, mas que ficavam bem nele.
Me levantei do
banco aonde estava, apertei sua mão, lhe disse tens futuro, adeus.
Dei ordem para
começarem a guardar todas as câmeras, holofotes, dizendo que deveriam embarcar
no próximo voo para NYC. Peguei a bolsa
de cartões, todos já marcados, o portátil, meu casaco, echarpe, o chapéu
preferido.
Jules já
vestia suas roupas originais, que agora já não combinavam com ele, faltava os
cabelos largos.
Fiz um sinal,
como uma pergunta, se ele queria alguma coisa.
Sim, quero
falar contigo. Não me reconheces?
Reconhecer? De
que.
Se parou ao
meu lado, me fez virar em direção ao espelho, deu um tapa jogando meu chapéu
preferido no chão.
Quando olhei
no espelho, senti um frio na barriga.
Era igual a mim, principalmente na idade dele, embora eu sempre tive a
pele mais escura.
Quem eres?
Sou teu filho.
Tudo que pude
dizer foi como?
Todo mundo
sabia que eu era gay, nunca tinha escondido, desde que tinha chegado a Paris.
Olhou minha
cara de espanto, sorriu, foi a mesma cara que fiz quando me disseram.
Peguei meu chapéu
no chão, disse a minha secretária, que queria um taxi, ia para o hotel, não
queria ser incomodado.
Sai o
arrastando.
Não disse uma
palavra, até chegarmos ao meu quarto no hotel, lhe disse que ficasse a vontade,
fui ao banheiro mijar, lavar a cara.
Quando voltei,
estava sentado numa das poltronas, me esperando.
Não entendo,
nunca tive uma aventura com nenhuma mulher a ponto de gerar um filho.
Sim, imagino,
estás espantado como eu. Sempre
acompanhei tuas fotos, sei que eres gay.
Por isso quando me disseram não quis acreditar, até que me mostraram uma
foto ao lado de minha mãe.
Quem é tua
mãe?
Beth Hoiex. Lembra
desse nome?
Menor
ideia. Aonde está a foto?
Me passou, lá
estava eu com meus cabelos largos como os dele, ruivos escuro, ao lado de uma
jovem loira de olhos azuis, quase translucida.
Uma data, atrás, Lyon.
Em minha
cabeça estourou imagens. Essa foto era
da festa de final de curso, tínhamos bebido muito, um de meus amigos, que sabia
que eu era virgem, me dizia, não podes ir para Paris, sendo virgem. Escolha uma dessas santas meninas para
estrear que finalmente serás homem.
Fazia isso para me provocar, para saber se eu era gay. Nessa época tinha vergonha disso.
Tinha sido
minha pior noite de sexo. Acordei num
quarto de hotel, me vesti, fui embora, passei no apartamento que vivia, peguei
minha maleta humilde, embarquei para Paris.
Nunca mais tinha pensado nessa garota.
Devia ter uma
cara espantosa, porque me disse fecha a boca.
Obedeci. Mas como isso é possível?
Não me digas
que não acreditas que o sexo de uma noite possa gerar um filho.
Como sabes
tudo isso?
Ela me contou
antes de morrer. Sofreu durante anos de
uma enfermidade degenerativa, sempre lhe perguntei quem era meu pai, mas nunca
disse. Chegou ser uma importante
advogada, mas sua doença a destruiu.
Por que nunca
me procurou?
Porque quando
descobriu finalmente quem eras tu, já tinhas aberto a porta de teu armário, se
declarando gay.
Eu ao
contrário, sempre admirei seu estilo de fotografia, te tinha como um ídolo.
Não te culpo,
nada pode analisar a cabeça de um jovem que foge em busca do sucesso. Felizmente conseguiste.
Se quiser
podemos fazer uma prova de ADN. Mas
antes tens que saber, que não quero, nem preciso de nada de ti. Em breve receberei a herança de minha mãe,
que me permitirá, ir estudar o que quero.
Queres comer
alguma coisa comigo?
Sim podemos
comer, enquanto conversamos?
Pedi alguma
coisa pelo telefone, em seguida tocaram na porta. Era minha secretária, assustada, nunca me
tinha visto sair arrastando um manequim.
A fiz entrar,
era tanto tempo companheira de trabalho, que além de tudo éramos amigos. Lhe apresentei, Jules, meu filho.
Ficou de boca
aberta, como devo ter ficado antes.
Se jogou na poltrona
restante, ufa que dia de surpresas.
Pedi comida e
bebida para mais uma pessoa. Foi
divertido, porque as vezes falávamos os três ao mesmo tempo. Algumas com a boca
cheia.
Solange Brush,
minha secretária, amiga, companheira de longos anos, as vezes olhava para um
ora para o outro. Examinando cada detalhe de nossa cara.
Como não
percebi isso na sessão fotográfica.
Jules foi o
único que teve uma resposta, pela confusão.
Mas eu te vi,
em vários desfiles, prestei atenção na tua figura, mas sem nunca ver a tua
cara.
Lhe mostrei a
foto.
Caramba, o
mesmo tipo de cabelos.
Sim deixei
crescer de proposito, pois sabia que ele vinha fazer a semana da moda, queria
que me reconhecesse assim.
Pois não
aconteceu, verdade, nem me lembrava que tinha usado cabelo assim naquela
época. Estive correndo tanto na vida,
que sequer me lembrava da fome que passei quando cheguei a Paris, todos os
trabalhos que tive, até começar a trabalhar com um fotografo famoso. A sorte que tive, ou oportunidade quando
ficou doente. Fiz do seu trabalho o meu,
ganhei meu primeiro contrato com a Vogue, fui para NYC.
Depois de
comer, Solange arrumou um jeito, se mandou.
Desci a
portaria, disse que meu filho estava comigo, se era possível um quarto com duas
camas. Arrumaram em seguida.
Fomos para o
outro quarto, esperei que trouxessem minhas coisas, este tinha uma pequena
varanda, ficamos sentados ali, um olhando para a cara do outro.
O que queres
fazer a partir de agora Jules?
Te conhecer,
mas antes para tiramos qualquer dúvida seria bom fazemos um teste de ADN.
Como queiras,
fazemos amanhã mesmo. Aonde vivias até
agora?
Em
Aix-en-Provence, aonde a família da minha mãe, tem casa. Ela viveu toda vida lá. Segundo ela, só te conheceu nesse dia, foi
com umas amigas de faculdade a Lyon acabaram numa festa de final de curso, no
dia seguinte, acordou num hotel sozinha.
Ninguém sabia nada de ti.
Pensou que não
tinha problemas, até descobrir que estava gravida. Seus pais aceitaram, nunca houve pressão para
que abortasse. A ajudaram a me criar,
nunca tampouco perguntaram quem era o pai, para essa criança sair com os
cabelos tão ruivos assim.
São vivos
ainda, digo teus avós?
Sim, continuam
vivendo lá.
Ok, depois do
exame de ADN, iremos falar com eles.
Quero recuperar o tempo contigo. As vezes pelo cansaço, afinal estava
desperto a muito tempo, dias dormindo mal, o olhava para saber se realmente
estava ali.
Lhe tocaram no
braço, Jasper é melhor deitares, estás a muito tempo dormindo na poltrona.
Ia me atirar
na cama de roupa e tudo, mas ele não deixou. Me tirou os sapatos, puxou as calças, a
camisa, me ajudou a deitar, cobrindo com a colcha.
Dormi como uma
pedra, me despertei porque me lembrei do que tinha acontecido, estranhando o
quarto, até que lembrei que tínhamos trocado de quarto, olhei para a outra
cama, procurando ver se continuava ali, que não era um sonho ou pesadelo.
Tornei a
dormir, mas logo me despertei, pois pelas cortinas entravam os primeiros raios
de sol. Olhei para o lado. Estava sentado na sua cama, me olhando.
Tudo que disse
foi, roncas muito.
Caímos numa
gargalhada geral. Ainda tentei explicar, que quando estava cansado, sabia que
roncava.
Se levantou
dizendo que ia tomar banho, pois teria que ir buscar roupas no seu hotel.
Posso ir
contigo, vou tirar uns dias de folga, para estar aqui contigo.
Descemos para
tomar café com Solange, ela se assustou com a quantidade de ordens que
dei. Que meu assistente, fosse
trabalhando as melhores fotografias, falasse com meu advogado, para saber se
meu apartamento em Chelsea, já estava pronto, ao mesmo tempo que procurasse meu
ex-namorado, pois se queria comprar minha parte no apartamento que tínhamos
juntos bem, senão vender, repartir o dinheiro entre os dois, que eu só queria a
escultura que Solange tinha me presenteado no meu último aniversário.
Jules me
olhava, disse que depois lhe explicaria.
Pedi a Solange
que localizasse um laboratório para fazer um teste de ADN.
Queríamos ter
certeza que éramos realmente pai e filho.
Tudo que Jules
comentou, mas falando com Solange, foi, é sempre assim?
Esta riu
muito, estou acostumada, a que tenha mal humor, que mude de ideia, como quem
solta um peido, que seja meu melhor amigo, que comparta comigo tudo. Vê poderia esconder que es seu filho, com
medo de algum escândalo. Mas qual o que, não se preocupa.
Voltou a
perguntar, crês que será um escândalo?
Bom os
americanos, adoram uma fofoca, serás perseguido por falso jornalistas, que
querem ser famosos, a famosa gloria dos 5 minutos. Mas depois tudo volta ao normal.
Bom vou
colocar em ordem tudo isso, evidentemente a sequência é primeiro o teste de
ADN, o resto tudo bem. Se levantou,
perguntou o número do meu novo quarto, já falo com vocês.
Quando ficamos
sozinhos, perguntou o que tinha acontecido com meu último namorado?
Uma decepção,
pensei que tinha encontrado a pessoa de minha vida, pois não era do meio em que
vivia. Mas queria uma coisa que nunca
pensei em fazer, me casar, adotar filhos.
Tive que
explicar o porquê do último. Contei,
que os que pensava que eram meus avôs, eu nunca tive certeza disso, a partir de
que não éramos sequer parecidos. Creio que me acolheram para ser uma pessoa que
cuidasse deles quando fossem velhos. Não quero isso. Os jovens têm direito a viverem suas próprias
vidas, com tudo a respeito, acertos, erros, enfim viver à sua maneira.
Quanto ao
apartamento de Chelsea, fica num edifício antigo, foi o primeiro que comprei
quando tinha dinheiro. Sempre gostei de
morar lá. Agora no final era um edifício em que as pessoas de idade ou morriam,
ou iam viver numa residência de idosos.
Uma empresa comprou o edifício, menos o meu, pois me neguei a vender,
sempre com um pé atrás, com relação a viver junto com alguém. Paguei sim que reformassem o mesmo, junto
com os outros. Demorou muito a ficar
pronto, mas creio que já se pode viver lá.
Vivi a última quinzena num apart-hotel, mas preciso de um pouso para
viver.
Bateram na
porta, Jeff seu ajudante, já tinha recebido as ordens de Solange, vinha buscar os
cartões fotográficos, para começar a trabalhar.
Antes de
entregar, queria ver as fotos do Jules.
Depois de
encontrar o cartão, colocou no portátil, localizou as fotos, eram excelentes, mostrou
a ele.
Caramba, não
imaginei que ia sair assim, sinalizou as fotos com a roupa transparente. Podemos
fazer alguma coisa, para que não apareça meu sexo?
Sim claro,
imediatamente usou um programa, fazendo com que essa área ficasse, neutra. Assim está melhor?
Sim, porque a
foto é fantástica, não tens que distrair a atenção para uma coisa particular
minha.
Concordou com
ele. Fez isso em todas as fotos,
guardou, assim Jeff não poderia recupera-las como eram.
Lhe disse que
deixasse o trabalho sobre os teenager por último, tenho vinte dias para
entregar.
Lhe disse que
passaria pelo menos dez dias aqui com seu filho.
Jeff sorriu,
dizendo na confusão ninguém prestou atenção, mas vocês são parecidos.
Pediu a ele
que fizesse uma foto direita dos dois nos celulares, tanto de um como de outro.
Depois te
deixo fazer uma reportagem exclusiva sobre isso, tirando o morbo das pessoas
sobre meu filho.
Solange os
avisou que tinham menos de meia hora para estarem no laboratório que ela tinha
conseguido. Não era longe, mas mesmo
assim foram de taxi.
Fizeram o
exame, depois saíram conversando, afinal tinham que se colocar em dia.
Uma das
perguntas claves era se não tinha raiva dele?
Não podia,
porque sabia que tu sequer imaginava isso.
Portanto não podia te culpar.
Queria sim
saber como era meu pai, como pessoa, não como o famoso fotografo.
Bom na verdade
a barreira que separa um do outro até eu mesmo confundo. Continuo sendo uma pessoa normal, quando não
estou com algum cliente, ou algum trabalho importante. Quando tenho a agenda despejada, saio para
algum lugar para fazer fotos das pessoas normais.
Ninguém sabe,
mas a meses atrás, fiz uma viagem a Africa, bem para o interior, estive no
mesmo lugar, convivendo com uma tribo, fazendo fotos, vídeo, em que
entrevistava essas pessoas, para saber o que anseiam. Muitos jovens vão para a cidade mais próxima
ou para a capital. Poucos voltam. A maioria acaba trabalhando como mulas, em
construção ou sendo explorada por alguém mais experto. Alguns juntam dinheiro para emigrarem para a
Europa.
Mas até agora
não tive tempo de sentar para fazer a edição.
É a parte mais trabalhosa, pois necessito que me deixem em paz.
Desde que
estou em Paris, fiz um curso da Nikon de fotografia, outro mais longo de
justamente isso edição, com os programas
de Adobe, claro o material não é nosso, é como se estivéssemos trabalhando grátis
para alguém.
Riram,
sentaram-se numa mesa de café, pediram ao mesmo tempo Capuccino e croissants.
Quem sabe
podes me ajudar com esses vídeos, sei usar o programa, mas apreendi sozinho.
Cometo muitas falhas, tenho que estar sempre revisando, com medo de perder
algum detalhe.
Puxa seria
ótimo. Não te contei, mas irei estudar
cinema em NYC, na universidade, não sei ainda se isso o que quero, mas não
custa tentar.
Ótimo, podes
ficar vivendo na minha casa, fica
relativamente perto, quem sabe podes me ajudar nisso. Tenho uma série de outros vídeos que fiz por
ai, alguns a princípio não fazia
entrevista, me interessava mais em registrar como viviam, só a partir de um que
fiz no Japão, comecei a gravar entrevistas com estas pessoas, como pensavam,
qual era o objetivo de suas vidas, com que sonhavam.
Depois te
mostro, tenho dois no portátil. Nunca
me sobra muito tempo para isso.
Tenho vontade
de montar esse do Japão, pois é um contraste entre a sociedade totalmente
moderna de um lado, do outro a vida no campo, dura, sem muito futuro, aldeias
de pescadores, que levam geração após geração trabalhando nisso, mas que os
filhos já foram embora. Tem uma
entrevista que amo de paixão, que é com um artista, que trabalha no aço,
fazendo um trabalho ancestral, mas desanimado porque não tem nenhum herdeiro,
tampouco alguém que se interesse em apreender.
Isso tudo tem
uma história, depois te conto.
Muito
interessante. Creio que vou adorar ver.
Solange tinha
conseguido com o laboratório, pagando mais e claro, para que o resultado saísse
no outro dia.
Logo de manhã,
saiu para buscar o resultado e o levou ao
hotel. Ela iria embora pela tarde
junto com o Jeff.
Os dois
estavam tomando café da manhã, sentados na pequena varanda do quarto.
Ela entregou o
envelope lacrado. Não disse nada.
Jasper, abriu
leu o resultado, sorriu, passou o mesmo para o Jules. O sorriso foi maior.
Era realmente
só para tirar uma dúvida, mas ali esta branco no negro, que sim eram pai e
filho.
Seria bom que
avisasse teus avôs, que vamos para lá, quero conhece-los, conversar com eles.
Não pretendo me separar de ti.
Se despediram
de Solange, que estava louca para voltar para casa, estava casada com uma empresária,
criavam duas crianças adotadas.
Jasper tinha
uma bagagem pequena, na verdade usava sempre um tipo de roupa, calças jeans
negras, camisetas brancas ou negras, casaco antigo, que deveria ter uns 10
anos, seu chapéu preferido, claro sua famosa echarpe negra também. Botas, pois em casa gostava de andar
descalço. Na maleta outra dupla de tudo,
roupa interior e pouca coisa mais.
Foram para a
Gare de Lyon para pegar um TGV, que fosse em direção a Marseille, na própria
estação pegariam outro para Aix-en-Provence, mais uns 15 ou vinte minutos.
Conseguiram
lugar na primeira classe, assim poderiam ir conversando. Jules, tinha
curiosidade acerca de sua infância.
Não foi nada
fácil, o velho era duro, o menor deslize te castigava. Acreditava que o castigo físico, ajudava
muito, ainda tenho cicatrizes dessa época.
No corpo, aqui dentro, bateu com o dedo na cabeça. A primeira vez que consegui guardar um
dinheiro, ele descobriu, ficou com tudo, me pegou duro. Fiquei dois dias, em
que me arrastava para a escola. Naquela
época ninguém se preocupava com isso, achavam se um pai castigava era porque
merecias. Somente uma professora me
cuidou. Me disse que tinha que ser o
melhor para conseguir uma bolsa de estudos, me largar dali.
Passei a
guardar o dinheiro que conseguia, numa lata, que escondia no meio da
floresta. Foi o que me salvou. Quando ganhei a bolsa de estudos para Lyon,
me disse que não podia ir, que minha obrigação era ficar para cuidar do campo, deles,
pois me tinham criado para isso. Foi quando
cheguei à conclusão que não eram nada meus, me tinham recolhido em algum lugar
para isso. Nessas alturas, eu já era
mais alto do que ele, forte pois fazia exercícios duros, além é claro de
trabalhos duros. Quando me ameaçou, me levantei peguei uma faca, cortei o
cinturão com que me costumava me pegar, o cortei em pedaços. Experimenta agora?
Peguei o pouco
de roupa que tinha, dormi essa noite na porta da escola, no dia seguinte
consegui os papeis da bolsa, peguei meu dinheiro, me mandei para Lyon de
ônibus.
Lá fiz todos
os tipos de trabalho, desde limpar banheiros, garçom, porteiro de hotel, com
esse último me mantive na faculdade.
Era um dos hotéis mais antigos da cidade, então no sótão tinham pequenos
quartos para os empregados. Como eu
falava várias línguas, me contrataram.
Assim pude me manter na faculdade, ao mesmo tempo juntando dinheiro para
Paris. Meu último dia foi quando me
arrastaram a tal festa, eu nunca tinha ido a uma. Não gastava dinheiro com bebidas, nem vícios,
hábito que mantenho até hoje. Bebo
quando muito um copo de vinho, com isso me basta.
Imagina quando
cheguei a NYC, a diferença de Paris, no qual tinha um círculo pequeno de
conhecidos, amigos nenhum. Lá a coisa
era diferente, te arrastavam para todas festas possíveis. Me diziam que tinha que ser conhecido. Mas quando chegava o momento em que começava
circular, drogas ou outras coisas, me mandava.
Vi muita carreira naufragar, gente boa desaparecer, para cair
nisso. Não tinha sofrido tanto para
desperdiçar meu tempo. Talvez por isso,
consegui ser respeitado. Pois sempre
cumpri os prazos das revistas, das reportagens. Mal me sobrava tempo para algum que outro
romance, todos de curta duração. As
pessoas não entendiam que meu trabalho era o que me salvava. Tive sempre medo de perder o meu instinto ao
fazer as fotos. As vezes basta olhar uma
roupa, ou mesmo um cenário, para imaginar como vou fazer as fotos.
Isso se
estivesse no mundo das drogas, ou alcoolizado, perderia. Era meu trunfo sobre os demais. Meu às na manga.
Naquela época,
como agora, as pessoas estão atrás do sucesso,
mas o querem rápido, sem sacrifícios.
Como digo sempre, festas, drogas e rock roll. Tudo na vida passa, se não
tem mantem em um patamar, desapareces.
Não se esqueça que todos os santos, ídolos, tem pés de barro.
Puxa pai, como
as revistas falam, parecias mais superficial, mas quando te vi trabalhando me
surpreendi.
Jasper ficou
emocionado, era a primeira vez que o chamava de pai. Colocou a mão sobre o braço de Jules. Obrigado meu filho.
Pediu que ele
falasse dos avôs?
Bom, minha avó
é um doce de pessoa, foi ela que me incentivou a ir te buscar, nenhum dos dois
sabiam que eras meu pai. Me disse sempre
que eu tinha que ir atrás de meus sonhos.
Minha mãe, apesar de ser uma advogada de respeito, não era o que sonhava
para sua vida. Tinha feito direito para
agradar aos pais.
Meu avô com os
anos, com a doença de minha mãe, foi abrandando, mas era muito sério quando era
criança. Agora que minha mãe morreu,
lhe disse que não pensava em estudar direito, vendeu sua parte aos sócios que
tinha. Ele herdou a anos, a casa que
vivemos. Uma mansão que tinha pertencido a família toda vida. É enorme, minha mãe o convenceu que era
grande demais. Assim as casas atrás, que
dão a uma outra rua, que eram dos empregados, foram reformadas, são pequenas,
ele aluga para os estudantes da universidade.
A casa principal, ficou só com o andar térreo, os outros dois transformou
em apartamentos. Quando ficou tudo
pronto, foi quando Beth começou a ficar mal.
Primeiro não podia andar sem muletas, em seguida estava em cadeira de
rodas, foi perdendo gradativamente os movimentos todos. Ele queria me mandar estudar num internato
para não ver a degradação dela. Mas me
neguei, ela também. Fazíamos um rodízio, para que ela nunca estivesse
só. Mas a verdade, ver uma pessoa que
amas definhar, é muito difícil.
Por isso te
entendo, meu colegas de estudos, tinham tempo para beber, fumar, drogas, rock
roll, como dizes. Eu nem queria, nem
podia. Já tinha poucos amigos, fiquei sem nenhum.
Então não eram
teus amigos!
Visto de certo
ângulo, concordo contigo.
Jasper se
surpreendia com a madures dele, agora entendia por quê.
Quando
desceram do trem em Aix-en-Provence, fez menção de pegar um taxi.
Não é
necessário, aqui tudo é perto, podemos ir andando.
Via Jules,
cumprimentando as pessoas, sorrindo.
Disse que eram pessoas que conhecia desde criança. Somente uma senhora o parou, lhe
beijou. Ele apresentou como sendo irmã
de sua avó.
Depois passo
lá para conhecer direito teu pai, comentou isso, depois de ter-lhe estalado
dois beijos em cada lado do rosto.
Quando
chegaram, Jules abriu a porta com sua chave, escutaram a voz de uma mulher,
“eres tu Jules, meu filho”.
Apareceu uma
senhora de cabelos brancos muito bem arrumados, era uma cópia da outra que tinham
encontrado na rua. Beijou o neto,
estendeu a mão, mas o atraiu até ela e como a outra, estalou beijos no seu
rosto.
Meu nome é
Elizabeth, mas todos me conhecem como Eliza, gritou para dentro da casa, Paul,
os meninos chegaram.
Ser chamado de
menino, fez Jasper rir.
O velho era
quase de sua altura, forte, com um sorriso na cara, abraçou o neto, beijou sua
cabeça. Conseguiste malandro,
conseguiste.
Apertou a mão
de Jasper, estas em casa, foi o que disse.
Mostraram a
casa, vão se refrescar, colocamos mais uma cama, no quarto de Jules, assim
podem compartir, conversarem.
Jules rindo
disse, ele ronca muito.
Menino,
respeito com o teu pai, sabes que não gosto de falta de respeito.
Jules rindo,
avó, vamos deixar esses dois que roncam, dormindo juntos, assim vamos ver quem
ganha.
Depois de
deixar as maletas, se reuniram no salão.
Paul fez questão de contar, o que tinham feito com a casa, minha filha
nos convenceu. Graças a Deus, nos
livramos de muito serviço.
Embora já
tivesse escutado Jules contar, escutou atentamente outra vez, pois sabia que as
pessoas maiores gostavam disso.
Sabemos que
vives em NYC, como é por lá.
Eu agora volto
a viver num antigo apartamento, em Chelsea, que acaba de ser reformado, mas
creio que terei que comprar tudo de novo.
Os moveis eram antigos, mas só quando chegue é que saberei. Contou como tinha sido, gostava muito do
local, ainda se encontram alguns desses restaurantes que se veem nos filmes,
cada vez há menos, mas são práticos.
Não eres muito
gordo, comentou Eliza.
Avó, se o
visse trabalhando entenderia. Parece uma
máquina, com outra máquina na mão. A estática fica no ar. Ele próprio riu da imagem que o filho fazia
dele.
Como se
encontraram?
Bom avó, fui a
todos os desfiles que sabia, que ele estava, mas claro, ele não vê mais que seu
trabalho. Não reparou que tinha os
cabelos iguais aos dele. Escutei alguns
manequins jovens dizendo que ele faria uma sessão para uma revista de teenager,
e fui. Cheguei um pouco tarde, o vi
trabalhando num studio. Parece uma
máquina a 100 por hora, disparando ordens a todo mundo, brigando, porque não
gosta das roupas. Quem apara as arestas
é sua secretária Solange, alias uma pessoa que a senhora ia adorar.
Faltava um
manequim para o trabalho, parece que não tinha gostado de nenhum dos que
estavam ali, veio até aonde estava, me levantou os cabelos, olhou na minha
cara, me fez assinar um contrato. Em
seguida fui agarrado por um batalhão de cabelereiros, me tosaram os cabelos, me
vestiram, a maquiadora disse que eu era muito branco, me maquilou demais. Me olhou, mandou tirar tudo, me queria ao
natural. Me mandou andar, bom aí, a
eletricidade começa a funcionar, vais fazendo o que ele diz. Mas parece que tem
uma metralhadora na mão, não uma câmera.
Quando acabou
tudo, respirei, nunca tinha imaginado que seria assim. Quando vi que ia embora, pensei, é agora ou
nunca. O parei na frente de um espelho,
me coloquei ao seu lado, o obriguei a olhar.
Ficou de boca aberta. Me disse
depois que era como se ver a si mesmo mais jovem.
Depois que lhe
disse que era seu filho, me arrastou com ele para o hotel, para falamos em
paz. Porque a volta dele, parece como
se estivesse numa colmeia, abelhas por toda parte, gente se movendo, correndo,
etc.
Quando viu a
fotografia dele com mamãe, ficou de boca aberta, não se lembrava de nada. Depois me contou o que tinha acontecido.
Era justo a
véspera de ir para Paris.
Essa parte de
sua vida, já me contou, não deve ter sido fácil vencer, mas quando teve a
oportunidade aproveitou.
Jasper,
escutava falarem dele, como se não estivesse presente. Olhava uma foto de Beth, grande pendurada em
cima da lareira. Como era bonita,
pensou. Lastima que realmente não
tivemos oportunidade. Tinha se
aproximado dela, porque a via como ele, perdida no meio daquela gente toda, que
mal conhecia.
Eliza
percebeu, comentou que a foto, era de quando tinha ganhado seu primeiro juízo,
que era muito boa no que fazia.
Sem se dar
conta, comentou o que na festa tinha feito que se aproximasse dela, estávamos
perdidos no meio daquela gente toda, todos bebiam muito, eu como não bebia,
creio que qualquer coisa me nublaria a cabeça. A ela também imagino, não tenho consciência
do que aconteceu. Não me lembro em absoluto.
Quando cheguei em Paris, só pensava em conseguir um emprego, conseguir
meu objetivo.
Tinha
recomendações do hotel que trabalhava em Lyon, mas isso era tudo.
Foi muito
duro. Mas sobrevivi, como faço até hoje.
O velho o
escutava atentamente, não estamos aqui para julga-lo, Beth nos contou como tinha acontecido, mas
nunca mencionou teu nome. Até que
esteve para morrer, nem sabíamos da foto.
Nunca disse
nada, tampouco reclamou ou fez disso uma tragédia. Quando Jules nasceu, com os cabelos assim
como que pegando fogo. Ela riu, disse
que eram iguais aos do pai.
Ele um dia
encontrou uma reportagem a teu respeito, numa revista de fotografia, pela
primeira vez, pediu a revista emprestada ao Jules, ficou olhando, leu com atenção
toda a reportagem, fez umas anotações num caderno que tinha. As pessoas diziam que parecia ser da
polícia, com aqueles blocos que usam os detetives.
Depois não
falou mais no assunto. Quando ficou
muito mal, me pediu um envelope que
estava no seu escritório, numa gaveta fechada a chave. Tinha pedido informações a teu
respeito.
Na reportagem
que estava junto, quem fazia a entrevista, dizia que justamente eras a pessoa
mais séria da profissão. Em uma
perguntas, respondias, que não tinha tempo para bebidas, drogas nem rock roll.
Ele vive
dizendo isso, comentou o Jules. Parece
ser seu mantra.
Riram todos,
nisso abriram a porta, entrou a senhora que tinha encontrado, viu que eram
idênticas. Uma mais bem cuidada que a
outra.
Ao perceber
seu olhar, disse, somos gêmeas idênticas, mas com uma diferença, ela é
certinha, eu sou a ovelha negra. Pelas
mãos via-se que era uma artista, sou pintora.
Pode me chamar
de tia Joanne.
Bom vamos
almoçar, pois eles devem estar mortos de fome.
Como o dia
estava bom, sentaram-se numa mesa colocada no jardim, entre as duas e Jules
foram trazendo a comida.
Quando foram
lhe servir vinho, pediu desculpas, mas preferia água.
Já tive que
beber todos esses dias, champagne, vinhos, etc. Na verdade, nas festas depois dos desfiles,
eu somente molho os lábios, pois tenho que ter a cabeça despejada para o
próximo trabalho.
Jules
comentou, que o tinha impressionado, no desfile de Dior, que ele quase não se
mexia, ali no meio dos outros fotógrafos,
tudo que fazia era algumas vezes, se abaixar para captar melhor o
manequim.
Imagine, são
uma multidão fazendo a mesma coisa, chego cedo, para me colocar justamente no
meio, assim, posso ter tudo de frente.
Os costureiros me dizem como vai ser o desfile, assim me coloco numa posição
estratégica. O pior são os dias
seguintes. Recebo cada um que Vogue
escolheu para as fotos, me tranco no lugar que alugo sempre, aí começa outra
roda viva, sem hora para terminar.
Quando chego ao hotel, repasso o seguinte, para saber como é a roupa, e
imaginar como vou trabalhar.
Já o último
trabalho, eu não tinha visto os desfiles, pois são as dos novos desenhadores, é para uma revista Teenager, então os
manequins são jovens, alguns são um pesadelo, se acham umas estrelas. Mas na verdade, poucos chegam a isso.
Depois da
sobremesa, mostrou as fotos que tinha feito do Jules. Quem apreciou mais foi a tia Joanne. Terás que ver um retrato que pintei
dele.
Depois foram
descansar. Quando tornou a sair do
quarto, a casa parecia deserta. O único
que estava no salão, lendo um jornal, era o Paul. Lhe perguntou se podiam conversar.
O levou até a
biblioteca, abriu as portas dizendo meus domínios. Ainda esta uma confusão, pois trouxe muita
coisa do escritório que tinha.
Sentaram-se
frente a frente.
Me desculpe
Jasper, mas gostaria de saber quais teus planos com relação a Jules.
Sim senhor,
entendo que não querem perde-lo, eu também. Ele disse que quer estudar em NYC, eu ofereci minha casa, para ele ficar. Mas creio que todas as decisões terão que
partir dele. Eu não sabia de sua
existência até a dias atrás, quero recuperar o tempo perdido. Mas tampouco
posso exigir nada. Tudo terá que partir
dele. Me surpreendeu o maduro que é
para sua idade. Imagino, pelo que me
contou, que amadureceu a golpes, pelo que passou a sua mãe.
Lhe contei que
a vida em NYC, é dura, ele tem que saber o que quer. Vi muita gente chegar, achar que tinha
vencido, em seguida desaparecer. Não
quero isso para ele.
Está
interessado em me ajudar num trabalho que estou fazendo de vídeo, me contou que
se preparou agora esses meses em Paris.
Sim, mas vinha
todos os finais de semana para casa. Ele
não é de grandes festas, nem nada do gênero.
Entendo, as
vezes que sou obrigado a ir, faço como diz minha secretaria, que parece que
deslizo pelo salão, olá, algum que outro beijo, apertos de mão, já estou saindo
pelo outro lado. Todo esse glamour é
efêmero, volto correndo para casa.
Pelo que sei,
estavas vivendo junto com outra pessoa.
Sim,
infelizmente nos separamos, ele queria coisas que não entram nos meus planos.
Contou sua infância, e a história de ser criado para cuidar de outra. Acredito que os jovens devem ter suas
oportunidades, não obrigações com as pessoas mais velhas. Os mais velhos já
viveram sua vida. Conheci uma senhora
que dizia, que os filhos eram feitos para voar como os pássaros, livres, leves,
soltos.
Concordo
contigo, ele tem uma herança para
receber, de sua mãe, mas quando fizer 21 anos.
Depois também é nosso herdeiro.
Eu tenho dinheiro
suficiente para cuidar dele. Vivo
parcamente, não tenho luxos, me criticam porque sequer tenho carro. Eu respondo sempre, para que quero um, se
tenho que me mover, mais fácil um taxi.
Como todas as cidades grandes, os problemas de estacionar. Nem sei conduzir na verdade.
Se ele achar
que deve vir comigo, eu serei o primeiro a obriga-lo a vir visita-los, como
teria o maior prazer em recebe-los em NYC.
Nisso entraram
a Eliza e Joanne, que caras serias, foram dizendo.
Ele perguntou
aonde estava Jules?
Saiu dizendo
que ia comprar algumas coisas para um lanche.
Ele gosta muito disso, de providenciar o lanche.
Em seguida
chegou, com sacos de croissant, pães, que cheiravam de maravilha. Na mesa, Jules
se virou para Jasper, já que conversaste com meu avô, saiba que dizem que é o
melhor daqui, além de advogado dizem que é um excelente detetive. Porque não lhe conta tua história, para ver
se ele descobre a verdade.
Posso contar
na frente das senhoras, não tenho vergonha.
Contou tudo da
sua infância, porque ele desconfiava que o tinham conseguido de outra
maneira. Não havia nenhuma foto na casa,
nem de sua mãe, nem dele. E a repetição que o tinham acolhido, para cuidar
deles quando fossem velhos.
Deu o nome da
vila, dos dois que ele não sabiam se eram de verdade seus avôs ou não. Que isso tinha sempre repercutido na sua
vida. As vezes que o velho o maltratava
com seu cinturão. Como tinha conseguido
escapar.
Paul tinha
anotado tudo, num caderno, como sempre fazia, farei umas chamadas para saber
alguma coisa. Como tenho tempo posso ir
até lá.
Já que estamos
em conselho familiar, Jules, queremos saber o que pretendes fazer?
Bom gostaria
de ir com meu pai para NYC, tentar fazer a faculdade, talvez trabalhar com ele
nos vídeos que é uma coisa que me apaixona.
Mas prometo
chamar todas as semanas, vir sempre que possível. Além de que o senhor está aposentado, poderia
ir com a avó, tia Joanne, tenho certeza que elas iam adorar, passear pelos
museus da cidade.
Jasper mais
pés no chão, perguntou se ele tinha passaporte?
A muito tempo,
creio que ainda está bem, ou amanhã mesmo vou atualizar.
Bom assim,
depois lá consigo residência para ti.
Eu hoje em dia tenho o green card, lhes explicou do que se tratava. Também se queres daqui algum tempo posso
pedir a partir do DNA, o reconhecimento que es meu filho, apesar de ser um
processo que acredito largo, possa servir para ficares lá.
Já veremos meu
pai, tudo entrará nos eixos, com o tempo.
Passeando
depois pelo jardim com Eliza, perguntou da possibilidade de Jules, ter a mesma
doença da mãe. Pelos exames, não é
hereditário, mas por exemplo se tivéssemos sabido a tempo, poderia ter sido
controlado, descobrimos muito tarde.
Bom conheço
médicos, marido de clientes, pedirei que o examine, se pudesses me dar o
diagnostico de Beth, seria mais fácil.
Claro que sim,
sem dúvida alguma, isso demonstra que estas preocupado com ele.
Quatro dias
depois, voltaram para Paris, de lá voaram a NYC.
Solange os
esperava no aeroporto, disse que o apartamento estava pronto para uso, mas
claro faltavam coisas. Tomei a liberdade
de comprar camas novas, como conheço teu gosto, mobiliei a toque de caixa o
salão, comprei tudo que faltava, roupa de cama, banho etc. Só não comprei coisas de cozinha, pois sei
que normalmente comes fora.
Jules disse
que podia cozinhar, mas que veriam isso com o tempo. Ele amou o apartamento, estavam cansados da viagem, mas tomaram um
bom banho, saíram com Solange no meio dos dois para comerem.
Viu que muita
gente cumprimentava seu pai. Quanta
gente te conhece pai?
Claro, vivi
aqui muitos anos, sempre fui educado com todos aqui da rua.
Durante o
almoço, Solange comentou do outro apartamento.
Só disse, ele já depositou tua parte, depois queria retirar, ao saber
que voltavas com teu filho. Te chamou de todos os nomes possíveis, pois o tinha
enganado, que não querias filho porque já tinhas.
Mas como tudo
estava assinado, ficou por isso mesmo, além de que, está vivendo com outro
tipo.
Vê meu filho,
neste mundo ninguém é insubstituível.
No dia
seguinte, foram para o studio, Jasper o
deixou com os vídeos, para que desse uma olhada. Me desculpe, mas me chame na hora de comer,
pois posso me esquecer da vida.
Jeff, tinha
trabalhado bem, adiantado todo material, só trocou umas duas fotos. Ficou analisando uma das fotografias, em que
ao fundo se via a cabeleira do Jasper.
Pediu ao Jeff
uma cópia da foto. Iria mostrar na hora
do almoço para ele. Olhou o relógio, viu
que era tarde, foi até a outra sala, Jules estava mergulhado no vídeo. Fiz uma cópia, para poder ir remontando,
assim não afeto a original.
Mostrou a foto ficaram rindo.
Saíram para
comer com Jeff, Solange, mais duas pessoas que trabalhavam no studio.
Quando estavam
comendo, conversando, uma pessoa se aproximou.
Parou por detrás de Jasper, com que então esse é seu filho?
Jasper se
levantou, encarou o outro que não estava sozinho, sim é meu filho, quem sabe um
dia, te conte a história.
É verdade,
basta olhar, se parece contigo. Como estás levando com esse pai que não gosta
de crianças.
Se lembrou de
como respondia a Solange, respondeu dizendo, eu tampouco, mas crianças em salsa
marinheira, pode ser bom.
Solange, não
pode conter a gargalhada. Como aprendes
rápido garoto.
O homem virou
as costas, indo embora.
Jasper não
perdeu tempo, Jeff, está é tua
oportunidade, vais fazer uma sessão de fotos conosco, Solange conta uma
história, que num casting, encontrei meu filho a muito perdido, ou que ele me
encontrou que cruza mais com a verdade.
Foi o que
fizeram quando voltaram, posaram os dois para o Jeff, escolheram as fotos,
Jeff, automaticamente se comunicou com as revistas que eles trabalhavam,
comentou do assunto, todas pediram o material.
Na semana seguinte saiam em todas, em algumas com destaque, os sites de
moda também publicaram, algumas com o título,
um filho da juventude perdida do grande fotografo Jasper Köning.
Bom isso já
está resolvido.
Jules,
fotografou todas as manchetes, mandou para seus avôs. Assim, não teriam surpresa. Em seguida como Jasper o obrigava fazer duas
vezes por semana, telefonou.
Soube pela sua
avó que Paul, estava justamente na Alsacia, já tinha informações, mas estava
checando no local.
Livre das
fotos, reuniões com Vogue, podia agora se dedicar com o Jules aos vídeos, se
surpreendeu a velocidade com que ele tinha trabalhado o vídeo do Japão,
posteriormente o da Africa.
Queria ver
como ele tinha tratado o do Japão que tinha sido suas primeiras entrevistas.
Em vez de
dublar, tinha feito as respostas em japonês legendadas. Assim ficaria mais fácil das pessoas
entenderem, não se perderia o som, nem o sentido forte das respostas.
Como
conseguiste isso?
Não reparaste,
mas aqui ao lado, tem uma empresa japonesa, pedi a uma secretária que fosse
traduzindo para mim, depois foi só montar.
O resultado da montagem era excelente, basicamente como tinha imaginado
Jasper. Fizeram pequenos retoques,
principalmente na parte que vão com o velho artista a seu local de trabalho,
cercado por oficinas de outros tantos artistas. A reclamação de todos era a mesma coisa, que
tudo que era tradicional, no Japão de hoje, estava sendo relegado a segundo
plano pelos jovens que ansiavam coisas modernas.
Jules tinha
cortado uma pequena parte, que agora fazia sentido, voltaram a incluir, era
entrando numa sala de exposição em Tóquio, que estava abarrotada de gente. Da
porta um zoom a todos os quadros expostos.
Todos tinham a mesma base, uma mesa com uma toalha quadrada, em cima
naturezas mortas, comida francesa, croissant com um café, tudo muito
realista. Quando leu quem era o autor,
entendeu, era um bolsista de uma fundação, que tinha passado meses em Paris,
ele mesmo dizia que tinha pintado tudo, como base um café abaixo de seu
studio. Todos os quadros estavam
comprados. Era um sem sentido. Tinha visitado, filmado todos os studios de
artistas plásticos japoneses, que pintava abstrato. Estes reclamavam que os compradores somente
se interessavam por arte realista, mas quando vinham expor no Japão artistas
Niseis, segunda geração de japoneses num país distinto, faziam mais sucesso,
evidentemente por sofrerem influências nas cores deste novo país.
Mas se
evidenciava justamente a diferença entre passado/presente. Tecnologia, que influenciavam a técnica. Mesmos os fotógrafos japoneses, tinham
influências, alguns optavam pelo erótico, outros por um minimalismo. O mundo
realmente estava cheio de evoluções.
Prepararam um
resumem para acompanhar o vídeo.
Primeiro fizeram uma apresentação com os amigos, alguns conhecidos, seus
contatos nas grandes revistas de moda.
Foi muito bem recebido, no dia seguinte saíram resenhas nas revistas
digitais, bem como algum jornal na parte de arte o mencionou. Um deles tinha como título, um grande
fotografo, surpreende ao se adentrar no mundo do vídeo.
Agora
trabalhavam a pleno vapor, o vídeo da Africa, como tinha usado duas câmeras ao
mesmo tempo para entrevista, estava sendo trabalhoso juntar os dois vídeos.
Esta
reportagem se poderia chamar desesperança.
Tinha filmado a maior parte do tempo, numa aldeia, aonde basicamente o
homem não estava presente, os maiores de 15 anos, tinham emigrado para as
cidades em busca de trabalho. O homem
mais velho que restava era um Babalorixá, muito magro, sentado num banco na
frente de sua choça, explicava, que primeiro vinham os católicos tentando
catequiza-los, depois os protestante e por último os mulçumanos, mas ninguém
podia conter o fluxo da migração as grandes cidades. Todos sonhavam em ganhar dinheiro, melhorar
suas vidas, pois todos esses missioneiros, falavam sem cessar nisso, melhorar
suas vidas.
Evidentemente
se referiam a espiritual, mas os homens entendiam que melhorar suas vidas, era
ser como eles, ter carro, roupas, sapatos, celulares, enfim tudo o que não
tinham. Porque na verdade, por mais que
se tornassem católicos, protestantes ou mulçumanos, não deixavam de acreditar
em seus deuses animistas.
Tinha feito a
gravação com o vídeo direto no rosto do homem, então todas suas expressões,
eram sérias, graves.
Depois o vídeo
mudava, indo para as cidades, aonde estavam esses emigrantes, alguns
trabalhavam na construção, outros vendiam qualquer coisa pela cidade, outros
eram explorados pelos mais inteligentes, uns tantos se sentindo derrotados
conheciam a droga, muitos estavam pedindo dinheiro pelas esquinas. A realidade mudava, era dolorosa. Discutiram os dois, se não podiam fazer o
seguinte. A parte da aldeia seria
colorida, com as mulheres, com seus panos coloridos, suas tranças, uma cuidado
da outra, as crianças nuas correndo livremente.
A parte relativa à cidade, seria em branco e preto. Quando experimentaram, o resultado era
surpreendente. Já sabia que alguns diriam que viver na miséria, de uma aldeia,
era mais bonito que a realidade de uma cidade.
A cena final, era um edifício em construção, com um andaimo, sem
segurança nenhuma, apenas troncos de madeiras, esses mesmo homens trabalhando
ali. Tinha filmado de uma certa
distância, com o zoom se aproximando lentamente, até enquadrar justamente num
quadrado desse andaimo um homem seminu se equilibrando para poder trabalhar.
Quando ficou
pronto, mostraram primeiro a Solange, Jeff, aos outros do studio. Tudo tinha
sido acompanhado em silencio, no momento que o velho começa a falar da migração
para a cidade, sua imagem de colorida, vai se transformando em branco e preto,
até chegar à parte da cidade. O final
era marcante. O vídeo durava mais ou
menos como um filme.
Quando
acenderam as luzes, todos aplaudiram.
Solange que tinha raízes negras, disse que era impressionante a imagem
do velho falando, com essa cara cheia de rugas da idade, a mão que ia afastando
as moscas de sua cara, a amargura de ver seu mundo aos poucos ruindo.
Creio que
devias, se me permite a sugestão, deixe ao meu cargo, falarei com a diretora de
Vogue que está ligada ao Metropolitan, quem sabe não conseguimos apresentar lá
primeiro, num evento, porque não acrescentando o contra ponto, de ricos, uma
coisa beneficente. Depois mandaria para
todos os festivais de reportagens.
Ele aproveitou
para sugerir a Solange, porque não montavam uma empresa de representação de
artistas, não só de modelos, mas de jovens que começavam uma carreira. Tinham espaço ali no studio para oferecerem a
pessoas que queriam fazer vídeo, material para montagem. Jules, foi quem mais gostou da ideia.
No curso que
estava fazendo na universidade, a maioria reclamava disto, não tinha dinheiro,
nem local para depois poder montar o trabalho que tinham feito.
Podíamos
experimentar justamente com a faculdade do Jules, colocando cartazes,
oferecendo espaço, junto com representação.
Para ti, seria como abrir um leque, junto a todos esses festivais não só
de reportagem, mas de curta-metragem.
Semanas depois,
já tinham uma data para a apresentação num evento no
Museu
Metropolitan.
Jules avisou
os avôs, que seria seu primeiro trabalho como montador de vídeos, se não
queriam vir visita-los. Avisaram que
comprariam os bilhetes de avião, que eles fizessem uma reserva de hotel, por
perto da casa de Jasper.
Mas um dos
vizinhos, comentou com eles no elevador, que estaria fora alguns meses, seria o
ideal. Foram ver o apartamento, tinha
como o deles, dois quartos, era extremamente moderno, mas confortável. O alugaram por um mês.
Quando
chegaram, estavam felizes por reencontra-los. Jules tinha mudado em muitas
coisas, se vestia agora mais ou menos como o Jasper, mas só que gostava de
camisetas estampadas. Estava com uma
cara mais de adulto.
Depois de
descansarem, ele contou aos avôs, a tia Joanne, tudo que tinha feito esses
meses, a faculdade, suas dificuldades em acompanhar, embora falasse um inglês
perfeito, mas claro, a maneira local de falar e a gíria do pessoal de arte, a princípio
não dominava. Mas agora inclusive tinha
alguns amigos. O trabalho que tinha
feito primeiro sozinho, depois junto com seu pai, tinha sido uma experiencia
fantástica.
Primeiro
porque Jasper era aberto a aceitar sugestões, ao mesmo tempo que explicava suas
ideias claramente.
Sua avó, Tia
Joanne, saíram no dia seguinte acompanhadas de Solange para comprarem roupas
para a noite do Metropolitan.
Foi quando Paul,
aproveitou para conversar com Jasper.
Sentaram-se os dois no escritório que tinha no Studio, contou tudo que
tinha descoberto.
Realmente ele
não era filho dos velhos, tampouco seu neto.
O velho já tinha morrido, mas a senhora a troca de dinheiro, concordou
em falar. O velho se fazia de guia de
pessoas que escapavam de Alemanha de Leste, durante a época do muro. Descobriu que muitas traziam alguma coisa de
dinheiro. Quando atravessavam alguma
floresta, aproveitava para roubar essa gente.
Numa das últimas vezes que se fazia de guia, havia um grupo de
poloneses, um deles um músico, com os cabelos como o teu, tudo que levava, era
um violino, um garoto, algumas vezes pela mão, outras amarado nas suas
costas. Paravam sempre num convento a
beira de um lago, as irmãs deste convento os abrigava na última noite, antes de
atravessarem uma floresta. Fazia muito frio.
Como nevava, ninguém percebeu um grupo de policiais que chegavam
vestidos de brancos, não se os notava no meio da neve. Começaram a disparar sem pensar em objetivos,
a ordem que tinham era de eliminarem todos.
O velho te viu no meio disto tudo parado, não teve conversa, te arrastou
para um lugar, ficaram ali abrigados, viram como matavam todos, exceto uma freira. A ela lhe deram dinheiro.
Ninguém tinha
visto o velho, nem o garoto. Assim que se
foram, ele voltou ao convento, aonde a falsa irmã, não só recolhia joias, ou
relógios dos que estavam ali, como alguma coisa de dinheiro. A matou, ficando com tudo para ele. Te
arrastou para França, dizendo a todo mundo que eras seu neto, não tinhas
documento nenhum, ele tampouco procurou, tudo que fez, foi colocar fogo no
convento, para que todos fossem queimados.
Agora eles tinham um neto ou um filho, que cuidasse deles quando ficasse
velho.
Segundo ela,
eras inteligente, rebelde, o velho te castigava sempre, nesse ponto ela dizia
que o velho tinha sido soldado do exército alemão, que era muito sádico, a um
ponto de te marcar com uma correia, depois colocar sal grosso em cima.
Ele não
respondeu, simplesmente, levantou a camisa, mostrando suas costas para Paul.
Caramba, foi
tudo o que ele pode dizer.
Então não há
maneira de descobrir quem eu sou?
A partir daí,
teríamos que conseguir através de ADN, se alguém te procurou a partir dessa
época, embora, como os documentos foram todos queimados, seria muito
complicado. Tudo o que temos é o teu
apelido. Porque Köning, não é o sobrenome dos velhos. Ela diz que quando foram te registrar, te
perguntaram qual o teu nome, respondeste prontamente, Jasper Köning. Terei que procurar a partir daí, não creio
que o sobrenome Köning seja polonês.
Creio mesmo que é Alemão, de alguém que ficou preso na Alemanha de
Leste, é tentava escapar. Terei que
procurar por alguém que fosse violonista.
Mas com o tempo quem sabe descobrimos.
Quero te
agradecer Paul, por todo esse trabalho.
Nada disso,
estas movimentando minha vida de aposentado, eu sempre gostei de buscar
provas. Quando era advogado, analisava
cada uma para saber se era verdade ou não.
Depois tem o
fato, que esse encontro teu com o Jules, foi fantástico, veja em que este
garoto se transformou, num homem com ideias, seguro de si mesmo. Eu é que estou
agradecido. Acredito mesmo que o
protegíamos demais. Agora vejo meu neto
feliz.
Nessa noite
Jasper teve um pesadelo, se via no meio da neve, perto de um lago, montanhas ao
fundo, uma freira balançando uma lanterna.
Em sua cabeça, o que está fazendo essa louca no meio de tanta neve.
Depois disparos. Se sentou na cama, sem
querer a conversa com o Paul, o fazia agora recordar instantes de sua primeira
infância. Era isso que tinha acontecido.
Não adiantava
querer descobrir quem era essa freira, porque pelo que tinha contado, o tal
suposto avô a tinha matado para levar o dinheiro.
Se lembrou
como num relâmpago, que o velho trazia junto o violino. Que o tinha sempre guardado, no celeiro,
embaixo de um monte de feno, havia um esconderijo.
Contou isso ao
Paul, este imediatamente fez um contato com um amigo da polícia local, para ver
o que descobria.
Mas depois com
toda a confusão da apresentação no Metropolitan Museum, se esqueceu desses
detalhes. As senhoras tinham conseguido roupas
como gostavam as americanas, mas claro como francesas, preferiram que fossem
discretas.
Quando
chegaram, foram cumprimentados por todos da Vogue, inclusive a diretora que foi
super simpática. Num dado momento, disse
ao Jules, que queria fazer uma matéria com ele, sobre o que estava fazendo.
A plateia era
extremamente eclética. Jasper imaginava
que se ia chocar com o conteúdo dos vídeos.
Tinha resolvido passar somente o da Africa, por causa do tempo.
O silencio
durante todo o tempo era impressionante, se houvesse moscas por ali, podia se
escutar o bater de suas asas. Quando
terminou, aplaudiram de pé.
Chamaram
Jasper, mas ele arrastou seu filho com ele.
Disse que todo o tempo, com tanto material, seu problema era a
montagem. Esta tinha sido executada pelo
seu filho, discutimos como montar, minha ideia inicial, como fui mudando ao
longo do tempo que filmava. Mas a ideia
final tinha sido somente de Jules, aproveitando o que tinha feito considerando
o final de sua viagem.
De novo
aplausos. Depois um largo coquetel,
desta vez ele não podia escapar, pois estavam seus convidados ali. Tia Joanne,
fez um comentário, fiquei impressionada com a plasticidade de teu vídeo. A ideia da entrevista do velho, acabar em
branco e negro, a última frase dele, estão rolando na minha cabeça. Quando
fores fazer uma próxima viagem, quero me candidatar para ir junto.
Foram entrevistados
os dois, mas ele juntou com ele toda sua equipe, preferia estar junto aos seus
para falar.
Viu que a
Solange falava com algumas figuras, muito alternativas por sinal. Depois venho lhe dizer, não te disse, já
temos distribuidores, convites para dois festivais. Apresentaremos as duas fora
de competição no Sundance, outra num festival em San Francisco, pela Europa,
temos que esperar fechar detalhes dos convites.
Um dos
convidados, um ator espanhol, se aproximou e lhe perguntou se conhecia o
problema do povo Saharaui.
Disse que não conhecia nada, mas que se
informaria a respeito.
Ok, tenho
muito material, aproveito, te mando.
Lhe deu um
cartão, embora lhe dissesse que no momento estava preparando um outro
projeto. Não queria assumir nenhum
compromisso, sem falar antes com Jules.
Depois foram
comemorar, somente a família, estavam todos contentes. No meio da velada, Paul recebeu uma chamada,
se levantou, saindo do restaurante, dizendo que não conseguia ouvir pois tinha
muito ruído.
Não disse nada
quando voltou.
Somente no dia
seguinte quando todos tomavam café, foi que falou. Que realmente, apesar que hoje pertenciam a
outras pessoas, permitiram que a policia vistoriasse o local. Encontraram objetos, passaportes, documentos,
além do violino de seu pai.
Ficaram de
mandar uma cópia dos documentos. Mas não
encontraram nenhum com o nome de seu pai, ou sobrenome.
Esse velho era
um filho da puta, se tem esses documentos, sinal que deve ter matado essas
pessoas.
Depois Jules,
foi fazer passeios pela cidade com os avôs, a tia Joanne, foi visitar o MoMA
Museum, pois nem todos gostavam de perder horas vendo obras de arte.
Diria mais
tarde, que tudo o que tinha visto, a fazia mudar de concepção com respeito a
arte americana.
Não lhe
interessava muito os pintores europeus, mas sim os americanos, os
contemporâneos.
Quando
comentou isso com a Solange, esta conhecia muitos artistas, saiu com ela para
visitar vários studios.
A viagem
estava sendo produtiva. Antes de ir
embora, Paul, perguntou ao neto se queria que ele adiantasse a herança de sua
mãe, pois no ano seguinte faria 21 anos.
Não necessito
de nada, meu pai, me ajuda, inclusive me dá um salário.
Agora como
vamos formar uma nova sociedade, terei inclusive um emprego.
Depois que
partiram, sentaram-se os quatro Jasper, Jules, Solange, Jeff, para discutir
qual o próximo passo.
Teriam uma
agenda apertada, pois apresentar os vídeos, nesse tipo de evento, necessitava
de se perder tempo com entrevistas, comparecer as apresentações, etc.
Já tinha
recebido toda a documentação sobre o povo Saharaui, mas sabiam que o próprio
ator, inclusive tinha feito um documentário.
Os cartazes,
tinham feito surgir vários candidatos, a ocupar uma parte do studio, bem como a
parte de edição. Procuraram informação,
Solange disse que conhecia uma senhora, que tinha sido montadora de filmes,
hoje estava aposentada. Era uma pessoa
fantástica, uma mulher alta, loira, mas hoje cabelos cinzas pela mistura dos
branco com o loiro. Olhos azuis
profundos.
Helga Durot,
disse que tinha além dos filmes, tentado se modernizar, feito uma série de
edição de vídeos, principalmente de cantores, tinha trabalhado um tempo na
universidade. Mas que a maioria dos
alunos, eram muito ególatras, ela já tinha aguentado suficientemente diretores
de cinema que pensavam que só existiam eles, que eram únicos. Vejam aonde estão hoje, a maioria
desapareceu.
Acabou
aceitando participar com eles, ao mesmo tempo ajudar na seleção dos
projetos. Nisso ela foi crucial. Analisava cada ideia a exaustão. Jules dizia que era enriquecedor ao mesmo
tempo difícil acompanhar a cabeça dela.
Um dia
conversando com ela, Jasper contou sua história.
Puxa, passei
pelo mesmo. Na vila de meus pais, não sobrou nada, durante a guerra, minha mãe conheceu
um soldado americano, se apaixonaram, veio para cá. Não se lembrava com o tempo nada com respeito
ao seu passado. Borrou completamente
tudo, quando lhe perguntava sobre essa parte do seu passado, mudava de assunto.
Um dia meu
pai, me contou que a tinha encontrado, sentada em cima de um monte de escombros
de uma casa. Só ela tinha se salvado,
pois tinha saído para ver se conseguia pão, para a família. A família estava toda sepultada, morta.
A maioria
depois da guerra, fazia um esforço supremo, para se esquecer do que tinha
passado, fome, medo, desesperança. Para
poder seguir em frente. Então tinha
deixado de lhe fazer pergunta. Alguns
anos antes de morrer, a viu vendo um documentário, justamente sobre essa
região. Ficou como em choque vários dias. Depois sem que nada lhe perguntasse, começou
a contar tudo, o que tinham sofrido durante a guerra, a continua fuga de casa
em casa, pois já não tinham lugar, a última aonde tinha perdido todos, era de
uma família judia, se esconderam ali, pois os Aliados tinham intensificado os
bombardeios. Perdi todo mundo, embora
muitos não eram da minha família, mas estávamos juntos para poder sobreviver. Quando
teu pai me encontrou, estava a dois dias sem comer. Me ofereceu chocolate, que devorei como um
animal, cuidou de mim todos esses anos.
Aguentou mau
humores, os dias que tinha pesadelo, as dúvidas de ter filhos, com medo que
acabassem como ela.
Em seguida,
com os anos, começou um processo, em que somente se lembrava disso, do passado.
Tinha ataques de pânicos, agressividade, quando comia, fazia como um animal,
que está morto de fome. Acabou se
suicidando. Levei muito tempo para
entender. O que uma guerra pode fazer
com uma pessoa. Podemos sobreviver, mas
as sequelas estão aí.
Com ela junto
a seleção dos projetos foi mais objetiva.
Primeiro sem ver o projeto, conversávamos com a pessoa. Escutávamos, o que queria, seus planos, só
então se via o vídeo. As vezes o que a
pessoa dizia, não tinha nada a ver com o vídeo. Eram superficiais, sem
profundidade. Acabamos ficando com três
pessoas, um negro vindo do Alabama, John.
Outro um descendente de japoneses, que tinham estado presos em campos de
concentração americanos. O terceiro era
um vietnamita, que a família tinha conseguido escapar, este o projeto era a
perda de identidade.
Montamos três
salas de edição, primeiro todos fizeram aulas com ela, que os obrigava a falar
de si mesmo. Na verdade as vídeos
reportagens, normalmente parte de suas próprias vivencias, ao contrário de um
filme. Este tem um roteiro, uma ideia
central, textos que não podem ser perdidos, muitos personagens.
Tanto para
Jasper como Jules, mesmo Jeff que se juntou aos cursos de Helga, tudo era
enriquecedor. Começaram a desenvolver
projetos, primeiro no papel, para depois pensarem em colocar em execução.
Jasper, estava
sempre buscando histórias desse desencontro de gerações, o confronto do passado
com o presente. Queria falar de uma
coisa, que era o confronto, dos anos que estiveram atrás do muro, a Europa de
Este, depois a visão de liberdade. Andou
falando com pessoas da Polônia, Alemanha, Lituânia, todos esses países que
tinham vivido como que apartados do mundo. Conseguiu um guia, um professor de
Universidade, que estudava justamente isso.
Fizeram juntos uma viagem que durou mais ou menos dois meses. Jules como não queria se afastar do pai,
fazia o contraponto, filmava, entrevistava os jovens que não tinham vivido nada
disso, mas que em casa, se enfrentavam aos pais, apegados a esse passado, na
verdade muito recente.
Paul se
encontrou com eles, como falava também um perfeito Alemão, os acompanhou. Fazia uma coisa, buscar uma referência para
o nome Köning, que pudesse estar ligado a Jasper.
A maioria das
pessoas, não gostavam de falar, nem lembrar dessa história, tudo que queriam
era possuir tudo o que tinha a Alemanha que tinha vivido em liberdade, já a
Polônia não, alguns se sentiam no meio de uma ultradireita versus socialismo.
Tudo era mais
lento nessa pesquisa, talvez por ser um fato atual, que ainda estava latente
nessa parte do mundo.
Tinham tentado
conseguir uma autorização para verem a parte de Rússia, aonde estavam os Gulag,
mesmo Sibéria. Esta parte ficou para o
final. Também foi a mais impressionante.
Hoje existiam cidades nesses locais.
Muitos se negaram a voltar a pseudo civilização. Tinham sofrido o suficiente, formado
famílias, filhos, mal viviam, mas pelo menos já não eram importunados.
O que
interessava na verdade ao Jasper, era o ser humano, que cada um contasse sua
história, mesmo que hoje em dia, isso realmente não passasse de uma história,
que não seria estudada nas escolas, universidades. Poucos eram os escritores que ousavam falar
no assunto.
Nesses meses
de viagem, Helga junto com Solange, trabalharam lado a lado, com os estudantes,
seus projetos. Como no caso de John,
foram com ele, a equipe toda, filmar justo o local de aonde tinha saído. John entrevistou casa por casa, com os que
quiseram falar, como era viver ali, na beira de um pântano, sem muitos
recursos, aonde o emprego, aparecia e desaparecia, como um toque de
mágica. Em algumas casas, quem colocava
o dinheiro para a família, eram as mulheres, que lavavam, passavam roupas, a
maioria empregadas domésticas, sem muita possibilidade de estudar. Uma das entrevistas importantes, foi
justamente da avó do John, que tinha feito tudo isso, mas exigia que seu neto
estudasse, não lhe dava trégua, nada de distrações como jogar bola, ou
beisebol, tinha que estudar, depois ele ensinou a sua avó a ler e
escrever. Como filmaram a senhora, sentada embaixo de
uma árvore nos fundos de sua casa, as mesmas tinham um tom sépia. Encarava a câmera como se fosse devora-la. Ansiava ainda com sua idade, apreender mais,
tudo o que não tinha podido estudar.
Conseguia falar, da trajetória da família, que tinha sido uma história
contada boca a boca, nas noites em volta das fogueiras. Por isso ajudava seu neto, queria que ele
contasse a história do povo da vila. Que de escravos, continuavam marginados
pela sociedade. Os brancos, se
negavam a fazer qualquer comentário, a única que deu uma entrevista, foi a
velha professora que tinha ensinado tudo ao John e incentivado para que
conseguisse uma bolsa de estudos da universidade. Normalmente essas bolsas eram dedicadas aos
filhos de brancos, mas ele tinha conseguido.
Já Barry, que
era um nome que ele próprio tinha adotado, porque normalmente pronunciavam mal
seu nome original. Tudo partia que tinha
sido criado pelo seu avô, já muito velho, tinha passado sua juventude
totalmente num campo de concentração no meio do deserto, quando finalmente a
guerra acabou tinha uma mágoa incrível, pois tinha nascido americano. Com muito
custo conseguiu recuperar as propriedades familiares, mas mesmo assim tocar o
barco para frente foi difícil. Seus filhos ao contrário, não viveram nada
disso, todos foram a universidade, se casaram com pessoas de outras raça. Misturaram a família, isso para ele, era
difícil de digerir.
Os apresentou
a pessoas como ele, muitos não queriam falar, com medo do que lhes podia
acontecer. Desta vez a figura chave, foi
uma senhora que não só não perdoava os americanos, como os próprios
japoneses. Era uma segunda geração nos
Estados Unidos, seu marido era americano.
Ele foi para a guerra, quando voltou ela tinha desaparecido. Com muito
custo conseguiu localiza-la. Ela tinha
sido uma rebelde no campo que estava. Inclusive tinha estado presa. Contava como tinha sido voltar a uma falsa
normalidade, como se nada tivesse acontecido.
Seus dois filhos, filho de pai americano, queriam logo esquecer tudo,
mas foi difícil. Ela acabou de
divorciando, tinha voltado a se casar, com um companheiro do campo de concentração. Os filhos nunca aceitaram. Em sua casa se negava falar inglês, somente
falava japonês. Apesar da idade,
continuava uma rebelde. O marido tinha
mais humor, já dizia que no campo, ela era o comandante de todos que se
rebelavam. Não se dobrava nunca a
qualquer poder. Tinham feito as mesmas perguntas aos dois, os pontos de vistas
eram na maioria divergentes. Mas numa única coisa concordavam. Não havia necessidade desses campos, todos na
verdade se sentiam americanos.
Já os jovens,
e a geração intermediaria, se negavam a falar do assunto, visto não saberem ou
não lhes interessar.
Do Francis,
tinha sido quase similar, mas eram de uma emigração mais recente, visto terem
vindo juntos a maioria com soldados americanos. Seu pai, era americano, mas do interior do
país. Sua família não aceitou sua
esposa, filhos, tiveram que vir para uma cidade grande, no bairro que viviam, havia
gangs de chineses, vietnamitas, de todas as raças de emigrantes asiáticos. Nunca se entendiam entre si. Os jovens não se encontravam não conseguiam se
encaixar nessa sociedade galopante. Seus
pais tinham sido contra ele estudar arte.
Não sabiam de aonde ele podia ter herdado esse gen. Mas tinha perseverado, tinha acabado em New
York, em uma revista, mas nunca contente com o resultado. Foi difícil gravar, pois tiveram que fazer
contato com cada gang, famílias destas, foram ajudados por um psicólogo chinês,
que era da polícia, conseguia se relacionar com as gangs por ter estudado cada
uma. Teriam que tomar cuidado, pois
senão o vídeo, acabaria como um filme de guerras de gangs.
Novamente
foram duas pessoas chaves, para tudo. O avô de Francis que tinha chegado depois
que a filha, não se encaixou facilmente, buscou trabalho no que sabia, pescar,
acabou com um frota pesqueira, com os barcos dos americanos, contratava somente
pessoas como ele, vietnamitas, a bordo só falavam sua língua. Tinham sempre
problemas com a polícia. Não respeitavam
a autoridade americana. Comentava que a
dificuldade estava, que tinham trabalhado lado a lado com os americanos durante
a guerra, mas que depois tinham esquecido completamente deles, ignorando,
talvez por vergonha de terem perdido essa guerra. Falava abertamente nisso. Nunca tinham sido vencedores, sangraram
nosso país completamente, sendo culpados de toda confusão final.
Depois de
muitos intentos, Paul estava desanimado, não encontrava nenhuma referência a
nenhum Köning que tivesse sido violinista. Ainda tentou pensando que fosse a
mãe do Jasper, a que era músico, nada.
Já estava desistindo, quando em Varsóvia, procurou por músicos que
tinham tocado justamente nessa época, aparecia um músico, Jasper Köning, que tinha desaparecido depois
de um recital, mas não era polonês, sim russo.
Com muito custo, auxiliado pela embaixada, conseguiu informação. Realmente seu último concerto tinha sido em
Varsóvia, aonde estava acompanhado de sua mulher, mas não falava em qualquer
criança. Sua mulher tinha permanecido
com a orquestra ainda estava viva. Ao
falar com ela, comentou que seu matrimonio era de fachada, para que ele pudesse
tocar. A criança que Paul devia estar mencionando, era filho dele, com uma
outra companheira, de cabelos vermelhos como raios de sol, isso tinha sido sua
menção. Tinha morrido um pouco antes da
ida a Varsóvia. Jasper Köning,
ansiava por se liberar da mordaça, tocar outro tipo de música, queria crescer
como tal. Por isso fugiu com o garoto.
Respondendo a
uma pergunta de Paul, disse que o garoto tinha o mesmo nome dele, que também
tinha os cabelos vermelhos.
Nunca mais
soube de nenhum dos dois.
Paul lhe
mandou uma foto de Jasper junto com Jules. Ela ao princípio confundiu, pensou
que Jasper filho, era o pai. Quando
disse que a foto era recente. Tudo que comentou foi que era impressionante como
se parecia com o pai.
Contou tudo a
Jasper numa larga conversa, justamente antes dele voltar a NYC.
Falou com a
senhora, ela ficou impressionada, como até na voz parecia com o pai.
Tudo que disse
ao final, foi seja feliz meu filho. Ele
tentou de tudo para ser feliz.
Não entendiam
bem por que tinham esse casamento tipo fachada?
Ela, explicou
que ele na verdade era de uma família judia, o Köning, era dela, por isso se
casaram, ele assumiu o sobrenome dela.
Jasper ficou
mais relaxado, mas passou a ter sonhos, lembrando de detalhes de sua
infância. Começou por isso ir a um
psicólogo, pois queria entender por que somente agora passava a se lembrar
disso.
Jules, cada
vez mais acompanhava o pai. Estavam
trabalhando a montagem do último vídeo, quando Paul, começou a se sentir
mal. Mal conseguiram chegar ao hospital,
tinha tido, talvez pela pressão um enfarte dos mais complicados. Acabou falecendo dias depois.
Jules, ficou
pasmo, agora que estavam juntos, eram acima de tudo amigos. Acreditava que os fatos, a pressão de saber
que era, tinham podido com ele.
Os jornais,
revistas fizeram sendas homenagem a Jasper Köning. Mas a mais emotiva, tinha sido a de Jules no
enterro.
Encontrei um
pai, um amigo, que me recebeu de braços abertos, quando apareci em sua vida,
compartiu comigo suas paixões pelo trabalho, seguirei com o que ele
começou. Agora tinha a herança de sua
mãe, a do pai. Conversou longamente com
Solange, continuaram o trabalho que estavam fazendo, uma agência que lançava
novos talentos.
Helga Durot,
ficou abalada, tenho eu a idade de pendurar as botas, mas Jasper, me fez
retornar ao campo de batalha, seguiremos em frente.
Os três de
quem tinha sido mentora, eram agora conhecidos, mas mesmo assim, voltavam
sempre para discutir os novos projetos.
Tinha aceitado outros três estudantes.
Jules montou a
reportagem que o pai tinha feito, junto com a sua. Foi como uma homenagem. Era um tema que a Europa queria esquecer, mas
que aceitou de braços abertos. Ganhou
prêmios em vários festivais. Agora
faziam o seguinte, depois de percorrer os festivais, colocavam para o público,
em seu site. Divulgavam através de
Youtube, como de outros meios.
Jules era honesto,
nunca levava a glória sozinho. Formava
com Solange uma equipe.
Levou muitos
anos para encontrar uma pessoa para compartir sua vida, mas isso já é para uma história
futura.