Saudade
torrente de paixão
Emoção diferente
Que aniquila a vida da gente
Uma dor que não sei de onde vem
Emoção diferente
Que aniquila a vida da gente
Uma dor que não sei de onde vem
Deixaste
meu coração vazio
Deixaste a saudade
Ao desprezares aquela amizade
Que nasceu ao chamar-te meu bem
Deixaste a saudade
Ao desprezares aquela amizade
Que nasceu ao chamar-te meu bem
Nas
cinzas do meu sonho
Um hino então componho
Sofrendo a desilusão
Que me invade
Canção de amor, saudade !
Saudade
Um hino então componho
Sofrendo a desilusão
Que me invade
Canção de amor, saudade !
Saudade
Se olhava no espelho do banheiro, seus primeiros cabelos brancos
começava aparecer na lateral da cabeça, as pessoas diziam que ficava super
bem. Mas não para ele. Significava que o
tempo estava passando, ele continuava sozinho. Se lembrava de uma palavra que sua mãe dizia
sempre “soledad” ela, seu pai, o irmão mais velho tinham vindo das ilhas, nunca
diziam ilha. Seria mais fácil dizer
Cuba. Mas quando lhe perguntavam era
das ilhas.
Em casa só falavam espanhol, inglês só na rua, mesmo assim todos
os dois tinham um sotaque inconfundível.
Seu pai tinha sido campeão de boxe, peso ligeiro. Tinha ganho vários campeonatos em Cuba, mas
chegou um momento que se queria ser conhecido, só saindo da ilha. Primeiro foram para Miami, depois New York. Quando ganhou dinheiro suficiente, comprou
uma casa antiga, bem como abriu um ginásio de Boxe, no Bronx.
Seu irmão não queria estudar, seguiu a carreira do pai, desde
criança estava no ginásio, treinava todos os dias. Quando começou a ganhar, ter um nome, fez
como todos emigrantes que em seguida ganham dinheiro, esbanjou. O muito idiota, se casou com uma
porto-riquenha, que só abria as pernas, se casasse. Logo estava gravida, o dinheiro ficou pouco,
voltou para a casa dos pais. Ele teve
logo que lidar com isso de ser um adolescente com um sobrinho que chorava todo
o tempo. Reclamava com sua mãe, que
precisava estudar, mas com aquele choro contínuo era impossível.
Seu irmão, um idiota rematado, por mais que o pai falasse,
começou a meter-se esteroides para poder se manter em forma. Um dia participou de um acordo entre
treinadores, deveria ganhar o primeiro assalto, perder os outros. Infelizmente o outro boxeador, não sabia da
história, deu-lhe golpes atrás de golpes.
Resultado no nocaute, saiu direto do ringue para o hospital. Morreu sem ver a cor do dinheiro. Minha cunhada, em vez de chorar, ficou
furiosa, a deixava numa casa que não era a sua, tinha que aguentar uma sogra
louca, com uma criança.
Para meu pai, foi um golpe difícil. O filho que tinha treinado com tanto amor,
lhe decepcionava.
Eu ia treinar boxe, mais para me defender de bullying na
escola. Todos me chamava de mariquita,
pois me dedicava a estudar com afinco.
Tinha noção que queria uma vida melhor para mim. Que me chamassem de mariquita, me importava
um caralho, eu sabia que era.
O pobre velho, quando chegava em casa, tinha que escutar as
lamurias da mulher que depois da morte do filho, vivia dizendo que tinha
saudade da ilha. Lá era feliz, aquilo
era vida, música, ritmo, além de tudo tinha que suportar o inverno da cidade
que odiava. Quando chegava o mesmo
parecia que tinha engordado cem quilos, pela quantidade de roupa que usava. Nessa
época as saudades aumentavam. Vivia
cantando as músicas que tinha na cabeça, dizia que era para entrar o calor.
Minha cunhada, que de tonta não tinha nada, logo arrumou um
emprego numa sapataria, tanto fez que se casou com o proprietário. Desapareceu levando o garoto. Saiu batendo a porta, dizendo que nunca mais
queria escutar essa palavra saudade.
Meu pai morreu logo em seguida, teve um enfarte, enquanto fazia
a siesta no ginásio, não se atrevia fazer em casa, para não ter que aguentar a
mulher.
Todo mundo pensou que ia fechar o ginásio. No dia seguinte ela tomou o mando de tudo, a
chamavam de todos os nomes, era pior que meu pai. De tanto escutar o velho falando com meu
irmão dos golpes, em qualquer programa de televisão que transmitissem um
campeonato, ela aprendeu tudo. Mantinha
todos na linha. Os velhos treinadores
gostavam dela, não permitia abusos lá.
Mas quando chegava o puto inverno, chegava junto à saudade.
Eu sei que fazia isso para que eu pudesse estudar. Quando entrei na universidade, a primeira
coisa que fez foi querer me comprar um terno, camisa social, gravata. Lhe dizia que não se usava para ir as aulas,
tive que a levar para ver que era verdade. Mas todos anos, me comprava um pelo
natal. Para quando terminasse os
estudos. Fui fazer arquitetura minha
paixão, entrei porque tinha notas excelentes.
Já nessa época tinha minhas paixões, gostava de um qualquer, ia
em frente até levar para a cama. Ela
descobriu cedo essa minha faceta, mas fazia que não via. Nunca soube bem por que, não duravam
nada. Ninguém queria um romance com um
sujeito que vivesse para estudar.
Mas não sobravam dinheiro para bares, discotecas, nada
disso. Só podia ir se alguém me
convidasse. Logo estavam todos meio
bêbados, queriam fazer sexo. Era
fácil, mas no dia seguinte, não se lembravam de nada.
Tinha os cabelos negros como os dela, olhos castanhos, uma cara
normal, corpo bem formado pelas aulas de boxe, mas usava óculos, que me dava
cara de intelectual de merda, como eu dizia.
Pois era tudo, menos intelectual.
Gostava sim de fazer sexo. Mas amor como sonhava, nada. Criava ilusões que num estalar de dedos, desapareciam. Mas não desistia, um dia encontrarei alguém.
Quando me formei, arrumei logo um emprego. No dia seguinte, me avisou que vendia o
ginásio, que iria voltar para as ilhas, não aguentava mais ter os ossos gelados
no inverno, não queria morrer ali.
Primeiro vou por uma temporada, depois resolvo. Nunca mais voltou, uma vez por ano mandava
uma carta, nada mais. Lhe mandava dinheiro,
sempre por alguém, pois por correio nunca chegavam.
A casa estava paga, resolveu com sua cabeça dura, que gastaria
dinheiro, mas passaria para o meu nome.
O dinheiro do ginásio iria para uma conta conjunta, que eu lhe mandaria
sempre um certo valor. Logo na primeira
carta, disse que esse dinheiro era muito ali, que se os tivesse na mão os
parentes não a deixariam em paz. Contava
para todo mundo que tinha sido eu que paguei a viagem. Tenho que ser pobre como eles. Arrumou um pretendente, que foi seu noivo até
que morreu. Casar de novo, é como
repetir uma besteira na vida.
Pois eu não aprendia, seguia tentando, até que um dia disse
basta. Agora como ganhava bem, começava
assinar meus próprios projetos, comecei a fazer nome. Me vestia bem, tinha um corte de cabelos
bonito, deixei de usar óculos para usar lentes de contato. Já me chamava de guapo. Mas sempre me chamavam de mariquita.
Um belo dia, fui procurado por um casal que tinha comprado um
apartamento em Chelsea, era muito bom,
um último andar, com uma pequena varanda.
Queriam reformar, iam se casar, tinham usado todas suas economias. No último momento, ela descobriu que ele era
gay. Foi tudo pro brejo. Eu tinha ficado
quieto, pois ele nem se lembrava que tinha dormido comigo uma só noite. Como já estava no final da obra, me deviam
dinheiro, lhes disse que comprava o apartamento. Vendi a casa no Bronx, comprei o
apartamento. Mobiliei com bom gosto,
mas simples. Tinha novos amigos, com
quem sair pelas noites. Gostava de sair
no final de semana para jantar, depois esticar ao Monster, aonde os viados
davam pinta cantando músicas da Broadway.
Me divertia ficar com meus amigos, encostado na barra, rindo, fazendo
comentários. Conheci muita gente ali, de
uma foda, de uma noite. Fiz também
amizades com os que me diziam na cara que não queriam nada comigo a não ser
amizade.
Eu me perguntava nas noites de lua cheia que me batia a filha da
puta da saudade, que eu não sabia de que era.
Devia ser dos homens com quem tinha feito sexo, mas que não dava certo.
Tinha um grande amigo, era do Texas, me dizia sempre, antes só
que mal acompanhado, pois ele arrastava um romance de anos com um homem casado,
que só aparecia quando o cu lhe ardia de desejo, como dizia Orson.
Era meu amigo para todas as horas, todos os segredos, todos os comentários
do dia seguinte. A eterna pergunta,
acreditas que voltará.
De repente o terror invadiu a cidade, tinha chegado à Aids, me
fechei em copas, fiz todos os exames,
mais de uma vez. Deixei de fazer
sexo. Agora me tocava ajudar a cuidar
dos amigos, ir aos hospitais visita-los, usando trajes especiais,
máscaras. Levava coisas que estes
gostavam, bombons, alguma coisa que pudessem fazer uma barganha com os
enfermeiros. Subornava aos mesmo que
qualquer coisa me telefonasse. Estava
sempre ansioso, ao primeiro toque de telefone.
Mas eram as pessoas que eu queria, não me importava cuidar deles. Alguns me chamava agora de mariquita
samaritana. Já não tinha paciência
para essas idiotices, mandava logo
tomarem no cu.
Uma das últimas vezes que fui a uma festa do grupo em Fire
Island, faltava a metade do pessoal, alugávamos sempre a mesma casa. A festa estava aborrecida, sai fui me sentar
na praia, justo nessa semana tinha morrido um amigo que visitava sempre,
tínhamos feito universidade juntos, tinha tido com ele, uma aventura de uma
noite. Numa das visitas, lhe
perguntei, porque não tinha dado certo entre a gente.
Me respondeu, você já se escutou, sempre sonhas com o príncipe
encantado, em plena primeira noite diz a pessoa que a ama, que quer viver toda
a vida com ela. Isso assusta qualquer um.
Fiquei com aquilo na cabeça.
Realmente fazia isso.
Estava ali sentado, quando apareceu uma sombra ao meu lado. Era um que estava sempre nas festas da casa
vizinha, as vezes nos juntávamos. Sentou-se,
chateado?
Sim, mais um amigo essa semana.
Anote, eu devo ir em breve, já sei que tenho a maldita. O olhava, não podia acreditar, era um
monumento de homem, forte, cabelos compridos, sempre bronzeado do sol. Estava triste, pior não tenho mais nenhum
amigo, desta vez vim para fechar definitivamente a casa, vou colocar a
venda. Eu a conhecia, era pequena, mas
muito interessante. Lhe disse que me
interessava. Não disse para ninguém, mas
comprei a casa. Tinha dinheiro para isso. Tinha diante de si uma paisagem
fantástica.
A partir do nosso contato, passamos a sair agora os três, Orson,
ele a quem chamávamos de Jim das Selvas, pelo seu tipo. Chegava no final da noite, íamos cada um
para sua casa. Um belo dia me chamou,
dizendo que estava hospitalizado.
Não queria avisar sua família, tinha metido todo seu dinheiro
num banco, quando morresse seu testamento era dinheiro para os cientistas que
buscavam a cura. Não é grande coisa
mais ajuda.
Comecei a fazer o seguinte, ia mais cedo trabalhar, ao meio dia
ia ao hospital, carregado de sopa, alguma coisa quente para ele comer. No final era um homem pele e osso, sem
cabelos, com feridas por todo o corpo.
Eu não me importava, lhe passava creme nos pés, nas pernas, nos
braços. Comprava os melhores hidratantes
que me aconselhavam os enfermeiros.
Morreu nos meus braços. Me disse
dias antes, quando te conheci, devia ter tido um romance contigo. Mas eras tão
fechado, triste as vezes.
Mais uma vez, lá fui eu analisar isso. Resolvi, que devia ir á um psicólogo, para me
ajudar a aguentar o tranco disso tudo.
Porque as perdas eram muitas.
Quase já não tinha amigos, lagrimas para derramar num enterro. Pior a maioria das vezes, o enterro só tinha
uma ou duas pessoas. Raras famílias
compareciam.
Nunca quis me ligar a nenhum movimento ativista, porque o que me
interessava era cuidar dos amigos. O
baque maior, foi quando ao fazermos nossos exames, Orson deu positivo. Começou
a gritar, esse filho da puta, me transmitiu essa merda. Ele era fiel ao seu amante, agora descobria
que esse nem tanto.
De vingança, no saguão do hospital, ligou para o mesmo e
contou. Dias depois me disse, olha no
jornal, página tal. Fui olhar, fiquei de
boca aberta, pois era uma pessoa famosa da alta sociedade, tinha se suicidado.
Orson ficou literalmente mal de todo. Não sei se isso ajudou, mas a doença logo fez
presença, foi uma coisa galopante, nenhum dos remédios que já tinham inventado,
ajudaram a parar, ele tampouco queria viver.
Segurava minha mão, dizendo por que não me apaixonei por ti, ah meu
amigo, como me arrependo. Do bonito que
era virou rapidamente um cadáver. Avisei
uma irmã sua que tinha conhecido, que encontrei no seu caderno de
endereços. Me disse na cara que era
impossível visita-lo, pois ela tinha família, podia ficar contagiada.
Santa ignorância pensei, por mais que tentasse explicar, me
bateu com o telefone na cara. Ia duas
vezes por dia visita-lo, agora levava comida, para todos que estavam no seu
quarto, as gente me dizia, como podes fazer isso, deixar tua vida para cuidar
da gente, devias estar nas discotecas.
Mas como explicar que tudo isso tinha morrido para mim. Meus melhores amigos, companheiros já não
existiam. No dia que ele morreu, me
derrubei. Sai dali, pedi pelo amor de
deus que o psicólogo me atendesse. Na
entrada da consulta, tinha outro nome. Ele tinha se internado também. Saiu um psicólogo, alto barbudo, me sentei,
nem sequer disse meu nome, comecei a chorar, não havia maneira de parar. A princípio ele pensou que Orson era meu
namorado. Lhe expliquei que não, era meu
melhor amigo. Conversamos muito. No dia seguinte fui ao enterro do Orson, eu,
seu advogado, ninguém mais.
Dois dias depois o advogado me chamou para me contar que sua
irmã tinha aparecido por se ele tinha deixado alguma herança. Telefonei para ela dizendo todos os
palavrões que sabia, liguei tantas vezes que tirou o telefone do gancho.
Foram meses em que nem sabia direito o que estava fazendo. Como nunca tinha tirado férias, apesar de ser
inverno, fui para minha casa de Fire Island, que sequer tinha estreado. As pessoas me olhavam, estava realmente
mal. Tinha emagrecido horrores, estava
exausto emocionalmente. Me sentava nas
escadas da frente da casa, chorando.
Agora entendia de solidão, de saudade.
Agora entendia o que sentia minha
mãe, não era o tipo de saudade que ela sentia, mas saudade das pessoas
amigas. Agora tinha até medo de fazer
amizade, porque em seguida podiam me avisar que estavam morrendo.
As vezes a vida tem coisas engraçadas. Voltei a trabalhar, já um pouco melhor, comia
direito, continuava indo ao psicólogo.
Um dia minha secretária me avisou que tinha um rapaz muito jovem que
queria falar comigo. Dizia que era meu
sobrinho. Já esteve aqui antes, mas não
estavas. Era o filho do meu irmão. Era tão bonito como ele.
Me disse que não suportava mais viver com sua mãe, estava no
terceiro matrimonio. Cada vez que se
casa, é com um bom filho da puta. Este
último, me deu uma surra de fazer gosto, pois me disse que não me atrevesse a
ser gay como meu tio.
Queria saber se podia ficar contigo.
Claro que pode, mas vamos resolver isso direito, me dê o
telefone de tua mãe. Pedi que viesse até
meu escritório. Ela pensou que ia
entrar num lugar de merda, mas quando viu meu escritório mudou de ideia. Tudo que deve ter pensado foi, meu filho vai
herdar tudo isso.
Autorizou os papeis que o advogado trouxe, me passando a guarda
do filho.
Era estudioso como eu, iria entrar para a universidade no ano
seguinte. Mas tinha uma dúvida, não
sabia o que fazer. Tinha muitas amigas,
um dia me perguntou se podia trazer uma namorada para dormir. Tudo que lhe disse foi, as mulheres vão
ficar loucas, porque eres bonito, nunca se esqueça de usar camisinha. Assim evitas ter que se casar.
Lhe pararam na rua, para fazer fotos, logo um studio conhecido
lhe chamou, passou a posar, virou
manequim. Falei serio com ele, nada de
drogas, teu avô morreu de desgosto quando descobriu que teu pai tomava. Portanto uma regra, drogas nada. Porque não entras para uma escola de
teatro. Assim fez, em vez de
universidade, teatro, moda. Logo foi
chamado para fazer um vídeo, deste, pulou para o cinema. Quando ficou maior de idade falei a sério
pela última vez com ele. Agora eres dono
da tua vida, sejas correto. Nada de
drogas, tenha sempre um advogado para ler os contratos, principalmente as
letras pequenas.
Fez uns dois filmes com sucesso, logo se meteu em tudo que eu
lhe disse para não fazer, morreu de sobre dose na casa um completo desconhecido,
que dava uma festa louca, o encontraram no banheiro morto. Trouxe seu corpo, o enterrei ao lado do meu
pai, de seu pai. Agora só sobrava eu
mesmo na família.
Puta que pariu, contínuo sozinho. Agora fazer amizades, complicava, pois os que
tinham sobrado eram mais jovens do que eu.
Resolvi fazer uma viagem para a Europa pela primeira vez. Lá se respirava de outra maneira. Na Itália, via que se aproximavam de mim,
imaginando, um coroa rico, americano.
Mal sabiam que dessa água eu já tinha provado, me negava a beber mais. Um dos arquitetos que conheci, pois gostei
de sua obra, me convidou para um final de semana em sua casa de campo. Que na verdade era um palácio. Só me avisou, vais encontrar a final flor da
sociedade burguesa italiana, que não faz porra nenhuma na vida. Vivem para desfrutar.
Cheguei no sábado, no domingo arrumei um jeito de ir
embora. O chofer que foi me buscar, me
perguntou, estranho, normalmente venho buscar gente aqui na segunda-feira. Soltei tudo que pensava, menos mal que o
proprietário me avisou. Estou farto
disso. Vim conhecer a Itália, todos
pensam em me explorar, porque sou americano, para eles sou rico. É a minha primeira férias em anos. Sem saber muito por que, comecei a conversar
com o homem, como estava sentado atrás, pedi que parasse, como ele me olhava
virando para trás, disse que ia provocar um acidente. Quando passei para frente, vi que era um
homem como eu. Inclusive tinha óculos.
Comecei a rir, perguntou logo por quê?
Lhe disse o que me diziam, que eu não enquadrava no tipo das
pessoas gays. Não era guapo, apenas me
vestia bem, era sério. Não gostava de
perder tempo com conversas idiotas.
Eu entendo, concordo contigo, tampouco atraio ninguém, nem
homens, nem mulheres, as que se aproximam querem se casar, para terem um filho,
ganharem uma pensão. Me contou que tinha
tido uma paixão com um amigo de adolescência, que esse quando soube que ele
estava apaixonado. Me deu uma surra,
rompeu meu óculos na minha cara. Tive que levar pontos, mostrou a
cicatriz. Tive que reconhecer aos meus
pais que era gay. No dia seguinte me
mandaram para um seminário, para ser padre.
Quando fiz 18 anos, escapei.
Trabalhei de tudo que possas imaginar, como sempre gostei de conduzir,
juntei dinheiro comprei um carro, fiz bons contatos no restaurante que
trabalhava, passei a levar, trazer turistas para aonde quisessem ir. Agora tenho um bom apartamento. Mas sigo igual, ninguém se interessa por
mim. O contratei, começou a me mostrar
um lado da Itália, que o turista normalmente não visita, nos sentávamos no final do dia, em algum
lugar com vista, tomávamos vinho, falávamos, acabamos na cama. Até nisso erámos iguais, gostávamos de fazer
certas coisas que os outros não gostavam.
Abraçar, beijar, fazer carinho.
Lhe perguntei se queria ir comigo para a América. Me disse que não, veja tu tens tua profissão,
eu sou um simples motorista. Não vou
encaixar no teu mundo. Acabei ficando
mais um mês com ele. Nos separamos, passamos a nos escrever um ao outro
incentivando que encontrasse seu par.
Ele encontrou num ex-seminarista como ele.
Eu continuei no hora vejam.
Às vezes me doía a solidão, se
fosse verão ou mesmo inverno, ia para Fire Island, gostava mesmo de ir no inverno. No verão, aquilo continuava sendo um mar de
homens gays, a procura de aventura.
Riam da minha cara, quando chegava vestido simplesmente como
sempre. Uma calças jeans, camiseta polo,
sandálias. Tampouco tinha interesse de
ter essas amizades, o que percebia era que eram totalmente superficiais. Vinham para a festa. Gostava sim das noites de lua, me sentar nas
escadas, ficar fumando maria, que me
relaxava. Volta e meia aparecia alguém
pelo cheiro. Pedia um tapa, ia
embora. Tampouco fazia nenhum movimento
para segurar a pessoa para fazer sexo.
Já estava farto. Um dia
passeando pela praia, passei por um grupo, em que estavam dois homens maiores,
o resto era tudo jovem. Um dos mais
velhos disse que eu tinha cara de amargado.
Só me faltava estar passeando com
um cachorro para arrumar alguém.
Virei é disse, bom conselho, pelo menos não fico fazendo
ridículo como vocês, com esses jovens, que os mandaram a merda, mas tenham
acabado a foda.
Um deles se ofendeu. Quis tirar satisfação, lhe avisei fui lutador
de boxe. Riu na minha cara, dizendo
desde quando uma mariquita hispana sabe isso.
Dei-lhe um murro, que rompeu o nariz.
No dia seguinte apareceu um homem da polícia para saber se era verdade a
denúncia.
Estava tranquilamente tomando café, o convidei para entrar,
ofereci café, lhe expliquei o que tinha acontecido. Ficou olhando na minha cara. É difícil acreditar que sabes lutar
boxe. Sim meu pai foi lutador,
treinador, meu irmão campeão várias vezes, eu resolvi estudar, ser arquiteto.
Ele ria, imagino a cara do sujeito quando levou o soco. Hoje fez a denúncia, os jovens se mandaram
inclusive lhe limpara de dinheiro.
Pois é prefiro isso, estar aqui sozinho, tomo meu banho de mar, fico
na minha. Não estou mais para aventuras, se tiver que ficar sozinho
ficarei. Não quero ser ridículo.
Posso vir tomar café contigo todos os dias se queres. Eu na verdade não sou da delegacia daqui, só
estou ajudando no verão. Acabo de me divorciar, um casamento que não
deu certo, porque sou gay. Ela vinha me
traindo com meu melhor amigo do corpo.
Então pedi um translado, assim vim parar aqui. Quando termine o verão, poderei ir para
qualquer outro lugar.
Começamos a conversar, no dia seguinte ele tinha folga, o
convidei para jantar, tenho comida demais.
As noites ficaram mais agradáveis, podia se falar em qualquer assunto
que ele entendia. Uma noite fizemos
sexo, foi uma coisa sensacional. Agora podia desfrutar mais do meu tempo, tinha
gente trabalhando para mim. Ia uma vez
por semana a cidade, para ver como iam os projetos, depois ficava na ilha. Ele agora dormia lá em casa. Tomávamos café bem cedo, pois ele tinha que
trabalhar. Depois voltava de noite para jantar, dormir comigo. Confessei que tinha medo de me apaixonar por
ele. Lhe contei que antigamente afastava
as pessoas, pois na primeira noite já lhes dizia que estava apaixonado.
Estou fudido me disse, imagina, quando abriste a porta, fiquei
olhando para ti, como pode esse homem dar um murro naquele idiota. Fui eu que me apaixonei por ti. Senão tampouco teria acedido o convite para
um café.
Lhe contei que gostava de vir no inverno, tem uma coisa que
gosto muito, raras vezes acontece, é ver a neve cobrindo a areia, me dá tranquilidade.
Tenho que ver. Pena que
quando acabe o verão, não sei para aonde me mandaram. Embora mandei curriculum para um escritório
de advogados, porque sou formado em direito.
Tenho experiência em lidar com a polícia, isso pode ser interessante.
Um dia estávamos conversando, agora já estávamos na época dos
celulares, quando tocou o seu. Lhe chamavam para uma entrevista.
Acabamos indo viver juntos, formamos um casal singular, somos
parecidos fisicamente, gostamos de muitas coisas em comum. Somos um para o outro, a outra meia laranja.
Me faz feliz como eu nunca pensei que podia ser. Não temos segredos nenhum um para o outro,
contamos toda nossa vida, para que os segredos, nunca viessem à tona, cheirando
mal.
Nossa próxima viagem, será a España, pois sua família era
emigrante de lá. Vamos conhecer a terra de seus pais. Visitar o resto. Creio que será uma bela viagem.
Nunca mais tive saudade de nada.